Resumo: O presente artigo tem o intuito de apresentar o uso do sigilo e da mídia nas investigações policiais. Afinal, apesar de o Inquérito Policial tratar-se de procedimento administrativo, cujo desenvolvimento se dá unilateralmente, não significa dizer que não devam ser resguardados, no seu desenrolar, os direitos fundamentais do investigado. E a maneira que o legislador encontrou para proteger esses direitos fundamentais foi aplicando a característica do sigilo ao inquérito policial, prevista no artigo 20 do Código de Processo Penal. No entanto, nos dias atuais, o sigilo está abalado pelo assédio desenfreado da imprensa sensacionalista, que utilizando meios ardilosos e até mesmo a vaidade de certos Delegados de Polícia, conseguem informações sobre as investigações criminais e as divulgam de forma irresponsável à população, proclamando o veredicto antes mesmo da produção de provas e da defesa dos acusados. Com a pesquisa conclui-se que a atitude, muitas vezes irresponsável, da mídia em divulgar informações sigilosas de Inquéritos Policiais prejudica inocentes. Sabendo que a censura é algo extremamente indesejável e repreensível para a imprensa, também a veiculação de notícias e opiniões antecipadas que tenham condão de destruir vidas e que não tenham embasamento técnico possui essas mesmas características.
Palavras–chave: Inquérito Policial; sigilo; mídia; direitos e garantias do Indiciado.
Abstract: This monograph is the purpose of presenting the use of secrecy and the media in police investigations. After all, although the police investigation it is the administrative procedure, whose development is done unilaterally, not to say that should not be guarded in their conduct, the fundamental rights of the investigated. And the way that the legislature found to protect these fundamental rights was applied to the secrecy characteristic of police investigation, under Article 20 of the Code of Criminal Procedure. However, nowadays, the secrecy is undermined by the unbridled harassment of the press sensational, that using cunning and even the vanity of certain delegates of Police, to information on criminal investigations and disseminate so irresponsible to the people, proclaiming the verdict even before the production of evidence and the defense of the accused. With the research concluded that the attitude, often irresponsible for the media to disclose sensitive information for Police Investigations affect innocent. Knowing that the censorship is something extremely undesirable and reprehensible to the press, also the running of news and early reviews that have condão of destroying lives and not having a technical has such characteristics.
Keywords: Police Inquiry, Confidentiality, Media, Rights and Guarantees of the index.
Sumário: 1. Introdução. 2. Inquérito policial. 2.1. Noções Preliminares. 2.2. Características. 2.2.1. Procedimento escrito 2.2.2 .Instrumentalidade. 2.2.3. Obrigatoriedade. 2.2.4. Caráter meramente informativo. 2.2.5. Discricionariedade. 2.2.6. Oficialidade. 2.2.7. Sigilo. 2.3. Início do Inquérito Policial. 2.4. Diligências Investigatórias. 2.5. Conclusão ou encerramento do Inquérito Policial. 3. O sigilo no inquérito policial. 4. Princípio constitucional da inocência presumida. 5. Direitos da personalidade e direito a informação: sigilo e mídia. 6. Conclusão. Referências.
1. Introdução
O presente estudo, que possui como título O INQUERITO POLICIAL: SIGILO X MÍDIA será realizado a partir de uma pesquisa bibliográfica específica sobre o uso devido da norma.
O inquérito policial trata-se de um procedimento administrativo e unilateral, onde não existe a aplicação do instituto do contraditório e da ampla defesa.
No entanto, essa ausência de defesa do indiciado não autoriza a Polícia Judiciária a desrespeitar as garantias jurídicas que o assistem. Não podemos esquecer que o indiciado é sujeito de direitos e dispõe de garantias, legais e constitucionais. E uma das maneiras que o legislador encontrou para proteger esses direitos fundamentais foi aplicando a característica do sigilo ao inquérito policial, prevista no artigo 20 do Código de Processo Penal.
Portanto, o inquérito policial será sigiloso. Sigilo esse que abrange à restrição à publicidade dos atos de investigação com relação às pessoas do povo e, a impossibilidade de o investigado tomar ciência das diligências realizadas e acompanhar os atos investigatórios a serem realizados.
Contudo, nos dias atuais ocorre o uso indevido e indiscriminado de tais dados por parte dos profissionais envolvidos nos trabalhos relacionados às investigações. Levando-se em consideração o uso dessas informações por parte da mídia, percebe-se na maioria das vezes o uso inconveniente destas pela sua veiculação incorreta e indevida, e que ocasiona danos muitas vezes irreparáveis na vida social e no aspecto psicológico do indivíduo que se encontra indiciado.
O que se persegue no presente estudo é apresentar o que seja o Inquérito Policial, bem como estudar aprofundadamente a característica do sigilo nas investigações policiais, e apresentar uma analise critica e minuciosa sobre a intervenção da mídia nessa fase pré-processual, que muitas vezes causa danos ao indiciado, por conta da veiculação de informações imprecisas.
Para tanto, inicia-se o trabalho com o estudo do que seja Inquérito Policial. Após, passa-se à apresentação das suas características, competência e seu valor probatório.
Ato contínuo será apresentado um breve relato do Inquérito Policial no Direito Comparado. Por fim, iniciam-se o estudo da característica do sigilo e o comportamento da mídia na divulgação de informações oriundas de Inquérito Policial.
Como dito, esta pesquisa pretende apresentar o poder de influencia que a mídia, como meio de comunicação eficaz, pode provocar na sociedade e o dano moral e até físico que pode causar ao indicado.
2. INQUÉRITO POLICIAL
O Decreto nº 4.824, de 22 de novembro de 1871, instituiu no Brasil o inquérito policial, estabelecendo a separação entre a polícia e o Poder Judiciário. O artigo 42 do referido diploma legal determinava que “o inquérito policial consiste em todas as diligências necessárias para o descobrimento do fato criminoso, de suas circunstâncias e dos seus autores e cúmplices”.
2.1 Noções Preliminares
Por inquérito policial compreende-se o conjunto de diligências realizadas pela autoridade policial visando à obtenção de elementos que apontem a autoria e comprovem a materialidade dos crimes investigados, permitindo, assim, ao Ministério Público – nos delitos de ação penal pública – e ao ofendido – nos delitos de ação penal privada – o oferecimento da denúncia e da queixa-crime.
Possui natureza administrativa, ao passo que é instaurado pela autoridade policial.
Tratando-se de um procedimento inquisitorial, destinado, a angariar informações necessárias à elucidação de crimes, não há ampla defesa no seu curso. Igualmente, não há o que se falar-se em contraditório, salvo em relação ao inquérito objetivando a expulsão de estrangeiro, pois quanto a este, o Decreto 86.715/1981, regulamentando os dispositivos da Lei 6.815/1980 (Estatuto do Estrangeiro), estabeleceu uma sequência de etapas que, abrangendo a possibilidade de defesa, devem ser observadas visando a concretizar o ato de expulsão (artigos 102 a 105 do Decreto 86.715/1981).
Considerando a ausência das garantias do contraditório e da ampla defesa, há muito vem a jurisprudência[1] compreendendo que o valor probante do inquérito policial é relativo, exigindo-se, então, que, como regra geral, as provas a ele incorporadas sejam renovadas ou ao menos confirmadas pelas provas judicialmente produzidas sob o manto do devido processo legal e dos demais princípios informadores do processo. Ressalva a esta necessidade de judicialização, porém, existe uma relação às provas técnicas que tenham sido realizadas no decorrer da sindicância policial, como é o caso das perícias destinadas à comprovação do vestígio deixado pela infração penal, as quais não exigem sua repetição em juízo como condição para que sejam valoradas pelo magistrado. Esta questão relativa ao valor relativo do inquérito, incapaz, em regra, de por si só formar o convencimento do magistrado quanto à responsabilização penal do imputado, com a edição da Lei 11.690/2008, foi expressamente incorporado à regulamentação do Código de Processo Penal, dispondo, agora, o artigo 155 que o juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas.
Em brilhante decisão, o Ministro Relator CELSO DE MELLO do Supremo Tribunal Federal afirma o seguinte:
“A unilateralidade das investigações preparatórias da ação penal não autoriza a Polícia Judiciária a desrespeitar as garantias jurídicas que assistem ao indiciado, que não mais pode ser considerado mero objeto de investigações. O indiciado é sujeito de direitos e dispõe de garantias, legais e constitucionais, cuja inobservância, pelos agentes do Estado, além de eventualmente induzir-lhes a responsabilidade penal por abuso de poder, pode gerar a absoluta desvalia das provas ilicitamente obtidas no curso da investigação policial” (STF – HC 73271 – SP – 1ª T. – Re. Min. Celso de Mello – DJU 04.10.1996 – p. 37100)
Desta forma, o que se conclui é que o inquérito policial, peça informativa, não pode servir com prova exclusiva para a condenação, aplicando assim o princípio constitucional inserto no artigo 5º, LVII, da CF/88[2].
Com relação à nulidade do processo criminal por vícios eventualmente constatados no inquérito policial, não há o que se falar. No caso de não serem observadas normas procedimentais estabelecidas para a realização das diligências que compõem o procedimento policial, a conseqüência será minimizar-se o já reduzido valor probante que, como referimos, é legalmente atribuído o precipitado expediente policial. Neste sentido, existem reiteradas decisões do Supremo Tribunal de Justiça[3], compreendendo que eventual nulidade do inquérito policial não contamina a ação penal superveniente, vez que aquele é mera peça informativa, produzida sem o crivo do contraditório.
O entendimento majoritário é que o inquérito administrativo nunca é nulo. O renomado advogado FLÁVIO MEIRELLES MEDEIROS[4] defende:
“O inquérito policial que contém irregularidades, no processo dos crimes que se inicia mediante denúncia, não acarreta nunca nulidade do processo. E por um motivo bastante simples: o inquérito nestes processos (iniciados por meio da denúncia) não é peça processual, e sim peça meramente informativa. Ora, não há de se falar em nulidade de processo devido a vícios de peças não processuais. O inquérito só é peça processual no processo das contravenções e dos crimes de lesões e homicídio culposo; neste caso, as nulidades do inquérito incidem sobre o processo”.
Diante do exposto, o que se conclui é que os vícios ocorridos no inquérito policial não têm o condão de contaminar a ação penal.
Além do mais, o inquérito policial não é imprescindível ao ajuizamento da ação penal. Na medida em que seu conteúdo é meramente informativo, se já dispuserem o Ministério Público ou o ofendido os elementos necessários ao oferecimento da denuncia ou queixa-crime, poderá ser dispensado o procedimento policial sem que isto importe qualquer irregularidade (artigos 39, §5º, e 46, §1º, do Código Processual Penal[5]).
2.2. Características
São as seguintes características que informam o inquérito policial:
2.2.1 Procedimento escrito
O inquérito policial destina-se imediatamente ao titular da ação penal (Ministério Público nas ações penais públicas e, em regra, o ofendido nas ações penais privadas) e mediatamente ao juiz. Portanto, para que o titular da ação penal possa formar sua convicção e para que o juiz exerça o controle da legalidade, bem como aproveite, para julgar, elementos colhidos na fase investigatória, deve o inquérito policial ser escrito.
Não se pode olvidar que a adoção da forma escrita constitui, também, uma garantia do investigado. Apesar do inquérito policial ser peça informativa, é possível que, no decorrer, atinja-se a liberdade ou o patrimônio jurídico do investigado, seja pela necessidade de acesso a informação ordinariamente cobertas pelo sigilo, seja, mesmo, pela possibilidade de decretação de sua prisão ainda durante o inquérito.
É no artigo 9, do CPP, que encontramos a determinação legal de que o inquérito policial deve ser escrito: “Todas as peças do inquérito policial serão, num só processado, reduzidas a escrito ou datilografadas e, neste caso, rubricadas pela autoridade”.
2.2.2. Instrumentalidade
O inquérito policial tem caráter essencialmente instrumental. Sua finalidade é possibilitar a reunião de elementos de prova que reforcem e fundamentem as suspeitas acerca da prática de delito de natureza penal. Nesse sentido, o inquérito policial é um procedimento preparatório para eventual ajuizamento de ação penal.
Além disso, o inquérito policial serve também como elemento de “filtragem” do sistema penal, ao prevenir a movimentação do Poder Judiciário para o processamento de fatos não esclarecidos ou de autoria ainda desconhecida.
2.2.3 Obrigatoriedade
A obrigatoriedade do inquérito policial deve ser analisada sob dois aspectos:
Uma vez oferecida a notitia criminis – ou seja, uma vez que a autoridade policial, por qualquer meio, tenha conhecimento da potencial prática de infração penal objeto de ação penal pública incondicionada, estará essa autoridade obrigada a instaurar, de ofício, inquérito policial para a sua investigação.
A obrigatoriedade decorre da redação do artigo 5º do CPP, que determina o seguinte: “nos crimes de ação pública, o inquérito policial será iniciado”, não deixando margem, portanto, para a discricionariedade da autoridade policial. É indeclinável que a autoridade policial promova a capitulação do fato investigado e, conquanto tal capitulação seja provisória e não vincule o Ministério Público, faz-se necessária, seja para justificar a decisão inicial de instaurar o inquérito, seja ainda para a solução de questões incidentais relevantes ao procedimento. O delegado de polícia, por exemplo, pode conceder fiança nos casos de infrações apenadas com detenção ou prisão simples (art. 322, do CPP). É através da capitulação provisória que o delegado analisará a possibilidade de concessão de fiança.
Além disso, uma vez instaurado, o inquérito policial não pode ser arquivado por iniciativa da autoridade policial. O artigo 17 do CPP[6] consagra a indisponibilidade do inquérito policial. Instaurado, deve o inquérito ser conduzido até seu encerramento, que se dará formalmente com a apresentação de um minucioso relatório final, da lavra da autoridade que o presidiu. É o que dispõe o artigo 10, §1º, do CPP[7].
Por outro lado, é certo que o exercício da ação penal não requer a previa conclusão – ou mesmo a prévia instauração – do inquérito policial. Poderá haver ação penal, pública ou privada, sem que tenha havido prévio inquérito policial. Essa facultatividade, se não encontra previsão legal expressa, pode ser deduzida da redação de diversos artigos do Código Processual Penal.
Com efeito, o artigo 12 do referido diploma prevê que o inquérito policial deverá acompanhar a denuncia ou queixa “sempre que servir de base a uma ou a outra”. Prevêem-se, assim, por exclusão, situações em que o inquérito policial não servirá de base à denúncia ou à queixa.
Ademais, o artigo 46, §1º, do CPP estabelece prazo para que o Ministério Público ofereça a denuncia no caso em que “dispensar o inquérito policial”. Também no artigo 39, §5º, do mesmo diploma legal, prevê-se hipótese em que “o órgão do Ministério Público dispensará o inquérito”, embora essa dispensa seja, no caso, condicionada à existência prévia de representação que permita, por seu conteúdo, o oferecimento da denúncia.
Outro argumento a favor da tese da facultatividade é a idéia de que os órgãos do Ministério Público, em razão da independência funcional a eles atribuída pela Constituição Federal, art. 127, §1º, e pela Lei Complementar nº 75/93, artigo 4º têm liberdade para formar convicção acerca da ocorrência do crime (o chamado opinio delicti). Desse modo, não seria razoável exigir que o Ministério Público seja obrigado a requerer e acompanhar diligências em inquérito policial se entender que os elementos já existentes são suficientes para fundamentar o ajuizamento de ação penal.
Ainda por força da independência funcional, o Ministério Público, recebendo os autos do inquérito policial, não fica vinculado às conclusões da autoridade policial acerca dos fatos apurados. Assim, mesmo que o delegado, uma vez encerrada a investigação, conclua pela prática de determinado crime, poderá o Ministério Público, à sua discricionariedade, oferecer denúncia pela prática de crime diverso.
Não se exige, portanto, que a ação penal seja necessariamente embasada nos elementos obtidos com a elaboração do inquérito. A denúncia ou queixa poderão fundar-se em dados colhidos de outros procedimentos administrativos ou mesmo em documentos idôneos obtidos de formas diversas, respeitada apenas a necessária licitude dos meios pelos quais as provas serão recolhidas.
O inquérito policial, portanto, é prescindível, na exata medida em que seu objetivo – apuração da ocorrência do crime e indícios do provável autor-, nas hipóteses referidas, foi alcançada.
2.2.4 Caráter meramente informativo
O inquérito policial tem caráter meramente informativo. Conquanto tenha por finalidade última possibilitar a punição daqueles que infringem a ordem penal, não se presta, em si mesmo, como instrumento punitivo, uma vez que não é idôneo a provocar a manifestação jurisdicional. A pretensão punitiva pode apenas ser veiculada pela ação penal, que não pode ser exercida pela autoridade policial, como se viu.
Os elementos de prova produzidos por meio do inquérito, portanto, servirão apenas para fundamentar a formação da convicção do órgão incumbido de exercer a ação penal (o Ministério Público, no mais das vezes) acerca da existência de crime.
Exatamente por ser o inquérito policial peça meramente informativa, os vícios incorridos durante seu trâmite não contaminarão a ação penal ajuizada. As irregularidades presentes no inquérito não invalidam o processo, atingindo somente a eficácia do ato viciado. Assim, a título de exemplo, eventual vício na lavratura do auto de prisão em flagrante deverá tão-só redundar no relaxamento de prisão, e não na necessidade de que seja reconduzido o inquérito policial a partir desse ato.
2.2.5 Discricionariedade
A autoridade policial tão tem o poder de arquivar o inquérito policial que presidir. Entretanto, a escolha das diligências investigatórias a serem realizadas no curso do inquérito é discricionária da autoridade. O delegado de polícia, assim, efetivamente conduzirá o trabalho investigatório, ordenando a realização das diligências que julgar necessárias à apuração da infração penal.
O delegado de polícia deverá, no entanto, realizar as diligências requisitadas pelo juiz ou pelo Ministério Público (artigo 13, II, do CPP[8]). Não estará a autoridade policial, contudo, obrigada a realizar as diligências requeridas pelo indiciado, pelo ofendido ou pelo representante legal deste último (artigo 14, do CPP[9]).
2.2.6 Caráter inquisitivo
O inquérito policial, como se viu, é procedimento meramente informativo, destinado à investigação de um fato possivelmente criminoso e à identificação de seu autor, com vistas à obtenção de elementos suficientes para a propositura de uma ação penal. Por isso, não integrando o processo penal em sentido estrito, conforme pacífica jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e Supremo Tribunal de Justiça, não está sujeito ao princípio do contraditório ou da ampla defesa. O suspeito ou indiciado apresenta-se apenas como objeto da atividade investigatória, resguardados, contudo, seus direitos e garantias individuais.
Ademais, o artigo 5º, LV, da CF/88[10], que consagra os princípios do contraditório e da ampla defesa, refere-se aos “litigantes” e aos “acusados em geral”, não se podendo aplicá-los ao indiciado, uma vez que não há nessa fase investigativa acusação propriamente dita. Caso se entendesse em sentido diverso, isto é, pela possibilidade de aplicar tais princípios ao inquérito policial, uma série de possibilidades se afiguraria possível, tais como o direito de reperguntar as testemunhas, arguir suspeição do delegado de polícia, etc. iniciada a ação penal, por intermédio do recebimento da petição inicial, nasce a figura do acusado, que, cientificado da ação penal, submeter-se-á ao devido processo legal, com a consequência observância dos princípios constitucionais informadores do direito processual penal.
2.2.7 Oficialidade
Trata-se de investigação que deve ser realizada por autoridades e agentes integrantes dos quadros públicos, sendo vedada a delegação de atividade investigatória a particulares, inclusive por força da própria Constituição Federal, que prevê em seu artigo 144, §4º:
“Art. 144 – A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos: […]
§4º – Às polícias civis, dirigidas por delegados de polícia de carreira, incumbem, ressalvada a competência da União, as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as militares.”
2.2.8 Sigilo
O inquérito policial será sigiloso, nos termos do artigo 20 do Código de Processo Penal, recepcionado pela Constituição Federal.
Em um capítulo específico, será explanada com profundidade a característica do sigilo que envolve o inquérito policial.
2.3 Início do Inquérito Policial
O art. 5° do CPP contempla as formas de início do procedimento policial, as quais dependem, sobretudo, da natureza do crime a ser investigado. Assim:
a) Crime de ação penal pública incondicionada. sendo esta a natureza do delito, o inquérito será iniciado:
– Artigo 5º, I: de oficio pela autoridade policial, mediante a expedição de portaria, a qual, subscrita pelo delegado de polícia, conterá o objeto da investigação, circunstâncias conhecidas em tomo do fato a ser apurado (dia, horário, local etc.) e as diligências iniciais a serem realizadas. Tal instauração independe de provocação de interessados, devendo ser procedida sempre que tiver a autoridade ciência da ocorrência de um crime, não importando a forma de que se tenha revestido a notitia criminis (registro de ocorrência, notícia veiculada na imprensa etc.). Observe-se que o art. 5º, § 3º, do CPP[11] refere que qualquer pessoa do povo que tiver conhecimento da existência de infração penal em que caiba ação pública poderá comunicá-la à autoridade policial, e esta, verificada a procedência das informações, mandará instaurar inquérito, sob pena de responsabilização disciplinar e, conforme o caso, até mesmo penal.
– Artigo 5º, II: mediante requisição da autoridade judiciária ou do Ministério Público ou a requerimento do ofendido ou seu representante legal. A requisição de instauração de inquérito pelo juiz ou pelo Ministério Público possui conotação de ordem, razão pela qual não pode ser descumprida pela autoridade policial, ainda que, no seu entender, seja descabida a investigação. Já o requerimento da vítima, opostamente, pelo sentido de solicitação, pode ser indeferido pelo delegado de polícia, por meio de despacho recorrível ao chefe de polícia (art. 5º, § 2.°, do CPP[12]).
– Auto de prisão em flagrante: apesar de não mencionado, expressamente, no art. 5º do CPP, o auto de prisão em flagrante (APF) é forma inequívoca de instauração de inquérito policial, dispensando a portaria subscrita pelo delegado de polícia. Note-se que é equivocada a praxe adotada em algumas delegacias no sentido de não procederem à instauração do inquérito policial quando se tratar de hipótese de flagrância. Considerando que o auto de prisão em flagrante é procedimento célere, formalizando o mínimo de elementos de convicção, ainda que possa o Ministério Público, com base nele, oferecer denúncia, mesmo assim deverá o inquérito ser realizado pela autoridade policial, aprofundando as investigações iniciadas com o APF.
b) Crime de ação penal pública condicionada à (ao):
— Representação: prevê o art. 5°, § 4°, do CPP[13] que o inquérito policial, nesta ordem de delitos, não poderá ser iniciado sem a representação. Por representação compreende-se a manifestação pela qual a vítima ou seu representante legal autoriza o Estado a desenvolver as providências necessárias à investigação e apuração judicial dos crimes que a requerem. Prescinde de rigor formal, bastando que incorpore a inequívoca intenção em ver apurada a responsabilidade penal do autor da infração, e poderá ser oferecida tanto ao delegado de polícia como ao Ministério Público e ao próprio juiz de direito. Evidentemente, realizada de forma oral, será reduzida a termo (art. 39 do CPP[14]).
— Requisição do juiz ou do Ministério Público: mesmo sendo crime de ação penal pública condicionada, poderá, eventualmente, ser o inquérito policial instaurado mediante requisição do juiz ou do Ministério Público, desde que a eles tenha sido dirigida, previamente, a representação da vítima ou de quem a represente, a qual deverá, inclusive, acompanhar o ofício requisitório.
— Auto de prisão em flagrante: considerando que o APF é forma de início do inquérito policial e levando em conta a regra inserida no art. 5º,
§ 4° do CPP, deduz-se que a lavratura do flagrante nessa espécie de crime
condiciona-se à existência prévia da representação ou que venha ela a ser apresentada antes do decurso do prazo do oferecimento da nota de culpa, sob pena de relaxamento da prisão.
— Requisição do Ministro da Justiça: sendo crime de ação penal pública condicionada à requisição do ministro da justiça, deverá esta ser dirigida ao Ministério Público, que, se tiver os elementos necessários, poderá, desde logo, ajuizar a ação penal ou requisitar à autoridade policial a realização de diligências.
c) Crime de ação penal privada:
— Requerimento: neste caso, a regra a ser observada é a que consta no art. 5º, § 5°, do CPP[15], segundo a qual, nos crimes de ação penal privada, a autoridade policial somente poderá proceder ao inquérito a requerimento de quem tenha qualidade para o ajuizamento da queixa-crime, vale dizer, qualquer das pessoas enumeradas no art. 31 do CPP[16]. A instauração do procedimento policial sem observância desta formalidade gera constrangimento ilegal, possibilitando o ingresso de habeas corpus visando ao trancamento do inquérito.
— Requisição do juiz e do Ministério Público: a despeito de estar correta a posição doutrinária segundo a qual o Ministério Público e a autoridade judiciária não poderão requisitar a instauração do inquérito policial nos crimes de ação penal privada, ressalva-se a hipótese de ter o ofendido (embora não seja isto próprio, também não é vedado) requerido ao juiz ou ao promotor de justiça provendências no sentido de ser desencadeada a investigação pela delegacia de polícia. Neste caso, nada impede procedeam estas autoridades à requisição de inquérito policial, fazendo acompanhar-se o ofício requisitório do requerimento a eles dirigido.
— Auto de prisão em flagrante: sendo forma de início de inquérito policial, é possível que seja formalizado nas hipóteses de flagrante em crimes de ação penal privada, desde que, à semelhança do que ocorre nos delitos de ação penal píblica condicionada, tenha a vítima autorizado ou ratificdo sua lavratura no prazo da nota de culpa.
2.4 Diligências Investigatórias
Dispõem os artigos 6º e 7º do CPP determinadas providências que, sendo cabíveis e monstrando-se adequadas à especie investigada, deverão ser adotadas com vista à elucidação do crime.
Embora seja dispensável a análise individual de cada uma delas — até porque a relação não é exaustiva, permitindo o art. 6.°, III, a determinação de “todas as provas que servirem para o esclarecimento do fato e suas circunstâncias” —, algumas merecem destaque, em especial:
a) Apreensão de objetos que tiverem relação com o fato (inc. II):
necessário atentar que as diligências de busca e apreensão devem observar as regras previstas no Código de Processo Penal (arts. 240 e ss), bem como as restrições constitucionais na hipótese de ser realizada em domicílio (art. 5º, XI, da CF[17]). Em síntese, realizando-se em local caracterizável como residência ou domicílio, deverá ser feita durante o dia, munido o executor de mandado judicial (salvo se executada pelo próprio juiz competente para expedição da ordem), excetuando-se desta regra apenas as situações de flagrante, desastre ou socorro, sob pena de ilicitude da prova assim obtida. Ademais, devem ser observadas as regras processuais estabelecidas pelo Código de Processo Penal sobre esse meio de prova, v.g., a lavratura de auto de apreensão após cumprimento da diligência (art. 245, § 7°, do CPP[18]), evitando-se, destarte, que a apreensão venha a reputar-se prova ilegítima.
b) Oitiva (interrogatório) do investigado (inc. V): preceitua referido inciso que a autoridade ouvirá o investigado, atentando, no que for cabível, às regras do interrogatório judicial (Título VII, Capítulo III, do CPP). Aqui é preciso ter bom senso e não esquecer que o próprio Código, ao determinar a aplicação das normas que regulamentam o interrogatório do réu perante o juiz (arts. 185 a 196 do CPP), ressalvou: “no que for aplicável”.
Uma das questões relevantes diz respeito à regra inserida ao art. 15 do CPP, determinando que o investigado menor de 21 anos deverá ser ouvido pela autoridade policial na presença de curador. Esta regra guardava correspondência com aquela constante no art. 194 do CPP, a qual, tratando do interrogatório judicial, disciplinava que o réu menor de 21 anos seria ouvido pelo juiz, igualmente na presença de curador. Ocorre, contudo, que precitado art. 194 do Código foi revogado expressamente pela Lei 10.792/2003, motivando tal revogação a previsão inserta ao art. 185 do CPP no sentido de que, independentemente da idade, o réu sempre será interrogado pelo juiz na presença de defensor, constituído ou nomeado.
Ainda, é assegurado ao investigado na fase policial o direito ao silêncio, pois, além de ter previsão constitucional (art. 5.°, LXIII, da CF[19]), decorre do privilégio de que ninguém pode ser obrigado à auto- incriminação. Entendendo o investigado que responder às perguntas da polícia não lhe convém, poderá ficar calado, sem que nenhuma sanção (processual e muito menos material) possa daí decorrer.
c) Reconhecimento de pessoas (inc. VI): o reconhecimento de pessoas envolve procedimento formal, previsto especialmente no art. 226, I e II, do CPP. Descumpridas estas regras, a prova será considerada apenas no plano dos indícios, ou seja, com reduzido valor.
d) Exame de corpo de delito (inc. VII): é fundamental que determine a autoridade policial a realização do exame de corpo de delito sempre que a infração deixar vestígios — homicídio, estupro, rompimento de obstáculo à subtração da coisa etc. Lembre-se que esta prova é necessária, não podendo substitui-la a confissão do acusado (art. 158 do CPP[20]), podendo ser suprida por outro meío de prova apenas quando o vestígio desaparecer (o corpo da vítima foi queimado pelo criminoso, por exemplo), nos termos do art. 167 do CPP. Tal é, aliás, a importância desta prova que, apesar de o art. 14 do CPP facultar ao Delegado de Polícia o indeferimento de diligências requeridas pelo ofendido ou pelo indiciado, esta discricionariedade não alcança o exame de corpo de delito que, se requerido por qualquer dos envolvidos, não poderá ser indeferido pela autoridade policial ou judiciária (art. 184 do CPP[21]).
e) ident(ficação civil do investigado (inc. VIII): trata-se da colheita das impressões digitais. Esta possibilidade trazida pelo Código deve ser harmonizada com a previsão constitucional inserida ao art. 5.°, LVIII, preceituando que “o civilmente identificado não será submetido a identificação criminal, salvo nas hipóteses previstas em lei”. E a lei, no caso, é a de n. 10.054/2000, limitando e restringindo a identificação criminal de quem já tenha sido identificado civilmente às seguintes situações:
A) indivíduo indiciado ou acusado pela prática de homicídio doloso, crimes contra o patrimônio praticados com violência ou grave ameaça, receptação qualificada, crimes contra a liberdade sexual ou crime de falsificação de documento público (art. 3.°, 1, da Lei 10.054/2000);
B) houver fundada suspeita de falsificação ou adulteração do documento de identidade (art. 3º, II, da Lei 10.054/2000);
C) o estado de conservação ou a distância temporal da expedição de documento apresentado impossibilite a completa identificação dos caracteres
essenciais (art. 3.°, III, da Lei 10.054/2000);
D) constar de registros policiais o uso de outros nomes ou diferentes qualificações (art. 3.°, IV, da Lei 10.054/2000);
E) houver registro de extravio do documento de identidade apresentado (art. 3.°, V, da Lei 10.054/2000);
F) o indiciado ou acusado não comprovar, em quarenta e oito horas, sua identificação civil (art. 3.°, VI, da Lei 10.054/2000);
G) indivíduo investigado pela prática de crime organizado (art. 5º, da Lei 9.034/1995).
2.5 Conclusão ou encerrado do Inquérito Policial
Esgotadas as investigações e concluídas as diligências determinadas no inquérito policial, o delegado de polícia deverá fazer minucioso relatório do que houver apurado, encaminhando os autos do procedimento ao juiz (artigo 10, §1º, do CPP[22]). Neste relatório, a autoridade policial deverá limitar-se a declinar as providências realizadas, resumindo os depoimentos prestados, a versão da vítima e do investigado, mencionando o resultado das diligências que tenham sido perpetradas durante as investigações e evidenciando, a partir de tudo isso, a tipicidade do delito investigado, sua autoria e materialidade.
Importante lembrar que de modo algum as conclusões do inquérito vincularão autor da ação penal no que concerne ao delito a ser imputador. Nada impede, por exemplo, que, indiciado alguém pela prática de crime de porte de entorpecentes para uso próprio, venha o Ministério Público denunciá-lo por tráfico. Há, portanto, completa e irrestrita desvinculação.
3. O SIGILO NO INQUÉRITO POLICIAL
O inquérito policial será sigiloso, nos termos do artigo 20, do CPP[23], recepcionado pela Constituição Federal. Há, entretanto, que fazer distinção entre sigilo externo e sigilo interno. O sigilo externo diz respeito à restrição à publicidade dos atos de investigação com relação às pessoas do povo. Já o sigilo interno constitui impossibilidade de o investigado tomar ciência das diligências realizadas e acompanhar os atos investigatórios a serem realizados.
Desta feita, sigilo no inquérito policial é uma cautela que toma a autoridade policial ou judicial para que não sejam divulgadas, no interessa da justiça, diligências ou providências relativas ao fato delituoso ou ao processo em andamento.
Visa assim evitar que a publicidade das provas já colhidas e aquelas que venham a ser posteriormente obtidas pela autoridade policial prejudiquem o desenrolar do procedimento e a apuração do ilícito penal para a devida propositura da ação penal cabível.
Enfatiza-se que a provável divulgação da ação investigatória muito provavelmente dificultaria sobremaneira o resultado final do inquérito, ou seja, as exposições das diligências iriam ocasionar embaraços ao desenvolvimento do fato investigado, bem como de suas circunstâncias com o desfazimento dos vestígios pelo autor do crime, intimando as testemunhas como também ocultando os instrumentos e até mesmo antepondo barreiras aos trabalhos realizados pela Polícia Judiciária para a elucidação do fato tipificado como delito.
O renomado jurista FERNANDO DA COSTA TOURINHO FILHO, afirma que:
“Não se concebe investigação sem sigilação. Sem o sigilo, muitas e muitas vezes o indicado procuraria criar obstáculos às investigações, escondendo produtos ou instrumentos do crime, afugentando testemunhas e, até, fugindo à ação policial. Embora não se trate de regra absoluta, como se entrevê da leitura do artigo 20, deve a autoridade policial empreender as investigações sem alarde, em absoluto sigilo, pra evitar que a divulgação do fato criminoso possa levar desassossego à comunidade. E assim deve proceder para que a investigação não seja prejudicada. Outras vezes o sigilo é mantido visando amparar e resguardar a sociedade, vale dizer, a paz social”.”[24]
No entanto, o sigilo que cerca o inquérito policial não é absoluto. A redação do artigo 155 em seu inciso I do CPC[25] também abandona este pensamento, contrapondo-se ao segredo de justiça, próprio a determinados processos, assim como o inciso LX do art. 5° da Lei Maior[26].
O sigilo do inquérito policial visa garantir o direito à inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem do indiciado, nos termos do art. 5°, X, da CF/88[27], em que a intimidade e a vida privada são aspectos pessoais e familiares de cada indivíduo e são tutelados pela inviolabilidade que não devem ser usurpados e nem vilipendiados ao público em geral em determinadas hipóteses, sem ter a certeza, a veracidade da prática do ato tipificado ilegal no ordenamento jurídico, caso em que só será alcançada depois da prolação de sentença penal condenatória transitada em julgado.
Não se deve esquecer também, o art. 5°, LVII da Lei Fundamental[28] que vem em benefício de qualquer sujeito com o instituto da presunção de inocência enquanto não houver tido o trânsito em julgado de sentença penal condenatória. “Não é demais afirmar ainda, que o sigilo no inquérito policial deverá ser observado como forma de garantia da intimidade do investigado, resguardando-se, assim, seu estado de inocência. (CAPEZ, 2000, p.69)
Será inoportuno trazer a tona que o sigilo no inquérito policial seria inconstitucional, frente ao direito de se obter informação, quer seja coletiva ou genérica de interesse particular, dos órgãos públicos previsto no art. 5°, inciso XXXIII, da Carta Política[29], eis que tal regulamento blinda o próprio direito que estatui os interesses de segurança da coletividade e do Estado, encontra-se nesse mesmo sentido o art. 3° da Lei n° 11.111, de 5 de maio de 2005[30].
Com relação de como será dado o sigilo no inquérito policial, verifica-se que pode acontecer por previsão legal; por despacho da autoridade policial ou por determinação judicial. Neste último caso, pode advir depois do requerimento do Ministério Público ou da defesa ou ainda ex officio.
Tem–se então que para ser decretado o sigilo no inquérito policial, o presidente do inquérito policial – Delegado de Policia de carreira, deverá analisar em cada caso concreto quatro valores essenciais, como a intimidade, a privacidade, o interesse público e a aplicação da lei penal, com o intuito de delimitar a condução dos métodos investigados por ele realizado – deste modo, a autoridade policial tem a gravosa tarefa de limitar qual o valor que deverá se sobrepor aos demais, ou seja, deve colocar no topo o que necessita de especial proteção.
Em consequência da sistemática inquisitorial adotada, dois são os tipos de sigilos admissíveis no nosso território, ainda que conexos, os quais sejam: o sigilo relativo aos atos investigatórios concretamente desempenhados e o sigilo dos autos propriamente dito do inquérito policial. Neste último, a liberdade de acesso do patrono é ampla, no entanto este não poderá retirar o inquérito das dependências da Delegacia, tendo simplesmente vistas no local e sem poder tirar fotocópia das peças que compõe o inquérito policial, já no tocante a realização dos atos investigatórios, limita-se tão somente aos atos que necessitem da presença do indiciado.
A propósito, DAMÁSIO E. DE JESUS[31] (“Código de Processo Penal Anotado”, Sariava, 20ª ed., p. 24) tudo confirma:
“Consulta dos autos do inquérito policial pelo advogado. Direito assegurado pela Lei 8906/94, art. 7º, XV (EOAB). Nesse sentido: TJSP, MS 301.392, 7ª Câm. de janeiro de 2000, Rel. Des. Rocha de Souza, RT 776/588; TJSP, MS 277.317, 5ª Câm. Crim., Rel. Des. Gomes de Amorim, RJTJ 220/383”.
O sigilo não incide sobre a autoridade policial, por se tratar este o presidente do instituto e a quem cabe ser o guardião imediato do sigilo; ao juiz, por ser esse o destinatário de toda persecução penal, motivo pelo qual não tem só acesso aos autos, como supervisiona o bom emprego da aplicação da norma jurídica; e nem tão pouco ao membro do Ministério Público, que tem a faculdade de acompanhar a investigações, conforme previsão do art. 26, inciso IV, da Lei n° 8.625, de 12 de fevereiro de 1993 (Lei Orgânica Nacional do MP)[32].
Em síntese, o sigilo previsto na norma do artigo. 20 do CPP almeja a segurança do sucesso da tarefa da investigação policial, resguardando os afazeres do investigador na colheita de provas, na identificação dos envolvidos, em fim, desempenhando o trabalho policial com serenidade.
No Brasil, existem várias legislações específicas que servem de elementos norteadores para a conduta do indivíduo em determinados casos que não são tratados de forma aprofundada na Carta Magna. A Constituição Federal resguarda de maneira clara e objetiva a obrigação por parte dos agente investigatórios e a garantia como direito do indivíduo acerca do sigilo nas investigações policiais.
Seguem-se alguns exemplos dessas leis brasileiras que redundam no expresso dever de manter o sigilo nas investigações policiais:
Lei do Crime Organizado: a Lei 9.034/95, no Capítulo II, que fala da preservação do sigilo constitucional, define que:
“Art. 3º Nas hipóteses do inciso III do art. 2º desta lei, ocorrendo possibilidade de violação de sigilo preservado pela Constituição ou por lei, a diligência será realizada pessoalmente pelo juiz, adotado o mais rigoroso segredo de justiça.
§ 1º Para realizar a diligência, o juiz poderá requisitar o auxílio de pessoas que, pela natureza da função ou profissão, tenham ou possam ter acesso aos objetos do sigilo.
§ 2º O juiz, pessoalmente, fará lavrar auto circunstanciado da diligência, relatando as informações colhidas oralmente e anexando cópias autênticas dos documentos que tiverem relevância probatória, podendo para esse efeito, designar uma das pessoas referidas no parágrafo anterior como escrivão ad hoc.
§ 3º O auto de diligência será conservado fora dos autos do processo, em lugar seguro, sem intervenção de cartório ou servidor, somente podendo a ele ter acesso, na presença do juiz, as partes legítimas na causa, que não poderão dele servir-se para fins estranhos à mesma, e estão sujeitas às sanções previstas pelo Código Penal em caso de divulgação.
§ 4º Os argumentos de acusação e defesa que versarem sobre a diligência serão apresentados em separado para serem anexados ao auto da diligência, que poderá servir como elemento na formação da convicção final do juiz.
§ 5º Em caso de recurso, o auto da diligência será fechado, lacrado e endereçado em separado ao juízo competente para revisão, que dele tomará conhecimento sem intervenção das secretarias e gabinetes, devendo o relator dar vistas ao Ministério Público e ao Defensor em recinto isolado, para o efeito de que a discussão e o julgamento sejam mantidos em absoluto segredo de justiça.”
Lei n° 9296/96, que dispõe sobre as interpretações telefônicas, no caput do seu art. 8° diz que: “A interceptação de comunicação telefônica, de qualquer natureza, ocorrerá em autos apartados, apensados aos autos do inquérito policial ou do processo criminal, preservando-se o sigilo das diligências, gravações e transcrições respectivas.”
Lei nº 9807/99, que dispõe acerca de proteção a vítima, testemunhar e colaboradores, também traz de forma clara a necessidade de sigilo durante as investigações policiais, dando ênfase à segurança de vida as vítimas e testemunhas:
“Art. 7o Os programas compreendem, dentre outras, as seguintes medidas, aplicáveis isolada ou cumulativamente em benefício da pessoa protegida, segundo a gravidade e as circunstâncias de cada caso: […]
VIII – sigilo em relação aos atos praticados em virtude da proteção concedida;[…]
Artigo 9º [… ]§ 4o O conselho deliberativo, resguardado o sigilo das informações, manterá controle sobre a localização do protegido cujo nome tenha sido alterado.”
De acordo com o exposto, faz-se notar a verdadeira valoração do sigilo em todas as fases do inquérito policial. O sigilo é imprescindível, e para que ele se efetive na prática, faz-se necessário que os profissionais envolvidos nas investigações policiais tenham ética.
4. PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA INOCÊNCIA PRESUMIDA
Combinando o inquérito policial com a situação do investigado, cujo seus direitos fundamentais devem ser preservados, temos o que seja necessário para analisar o princípio constitucional da inocência presumida, que tem como objetivo principal proteger a moral do indiciado.
Historicamente, o princípio da presunção de inocência surgiu na Roma Antiga, vindo a ser efetivado posteriormente como princípio do favor rei e princípio in dúbio pro reo.
Após sua efetividade como dogma fundamental, a Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 dispõe em seu artigo 11:
“ Toda pessoa acusada de um delito tem o direito de ser presumidamente inocente até que a sua culpabilidade tenha sido provada de acordo com a lei, em julgamento público no qual lhe tenham sido asseguradas todas as garantias necessárias à sua de defesa.”
Ainda, o Pacto de San José da Costa Rica, firmado pelo Brasil, adotou o princípio de que: “toda pessoa acusada de delito tem direito a que se presuma sua inocência até que não se comprove legalmente sua culpa”.
Apesar de diversas críticas sobre o conteúdo do princípio da presunção de inocência, este está presente em todos os Estados Democráticos.
No Brasil, o princípio foi recepcionado pela Carta Magna no artigo 5º, LVII[33] e se tornado direito fundamental, com aplicação imediata, considerando a presunção de inocência como um dos diversos princípios basilares do nosso Direito. Em função disso, cabe ao Estado comprovar a culpabilidade do investigado.
O princípio in dúbio pro reo possui intima ligação ao princípio da presunção de inocência, no entanto atual em setores diversos numa persecução penal. Enquanto este incide sobre o processo e extra judicialmente, aquele incide somente processualmente.
O que existe de comum entre os dois princípios trata da falta de certeza que o Estado não tem em tratar aquele indivíduo como culpado sem que exista sentença penal condenatória definitiva.
Alexandre Moraes[34] vai além ao afirmar: “Pode-se concluir no sentido de que a previsão do in dubio pro reo é um dos instrumentos processuais previstos para a garantia de um princípio maior, que é o princípio da inocência”.
Com isso, conclui-se que no campo da presunção, o princípio da inocência começa a partir do devido processo legal, e espalha-se por todo o procedimento de intervenção estatal de origem penal sobre um indivíduo. Ou seja, começa a partir da investigação pessoal do cidadão até o fim da instrução criminal com a aplicação ou não de uma pena criminal.
Como afirma Fernando Luiz Ximenes Rocha[35]:
A presunção da inocência não só é válida para os termos do processo, como também para os trâmites do inquérito policial, pois se não há qualquer indício de autoria do delito pelo indivíduo, não há como fundamentar-se juridicamente um decreto de prisão, a não ser que o texto constitucional seja relegado a terceiro plano em nome do arbítrio.
Por fim, o princípio da presunção de inocência nada mais é do que o caminho pelo qual deve pautar a atividade do Estado na esfera da persecução penal. Por conseguinte, partindo-se da concepção de um sistema punitivo cuja regra é a prevalência da liberdade sobre a atividade repressiva estatal, o princípio da presunção de inocência agirá como um critério inspirador de todo o ordenamento processual penal, impondo um modelo processual centrado em garantidas do investigado frente à acusação punitiva do Estado.
5. DIREITOS DA PERSONALIDADE E DIREITO A INFORMAÇÃO: SIGILO E MÍDIA
A Declaração dos Direitos Humanos das Nações Unidas, em seu artigo 29 apresenta que:
“Toda pessoa tem deveres com a comunidade, posto que somente nela pode-se desenvolver livre e plenamente sua personalidade. No exercício de seus direitos e no desfrute de suas liberdades todas as pessoas estarão sujeitas às limitações estabelecidas pela lei com a única finalidade de assegurar o respeito dos direitos e liberdades dos demais, e de satisfazer as justas exigências da moral, da ordem pública e do bem-estar de uma sociedade democrática. Estes direitos e liberdades não podem, em nenhum caso, ser exercidos em oposição com os propósitos e princípios das Nações Unidas. Nada na presente Declaração poderá ser interpretado no sentido de conferir direito algum ao Estado, a um grupo ou uma pessoa, para empreender e desenvolver atividades ou realizar atos tendentes a supressão e qualquer dos direitos e liberdades proclamados nessa Declaração.”
O direito a personalidade é um bem intrínseco do ser, é um direito elementar, porque sem este não há o que se falar nos outros subseqüentes, ou seja, para se aspirar e conseguir obter os demais direitos garantidos constitucionalmente tem que possuir o direito originário de todos os outros, que é o direito da personalidade.
O ordenamento jurídico confere ao indivíduo prerrogativas no tocando aos direitos da personalidade, para que este venha a dispor e gozar dos elementos que individualiza cada ser.
Com relação ao presente estudo monográfico, de todos os direitos inerentes a pessoa humana analisaremos apenas aquelas que se referem à imagem, intimidade e honra do ser humano.
Sabemos que os três elementos – a imagem, intimidade e honra – estão preservados na Constituição Federal, especificamente no artigo 5º, inciso X[36].
A imagem é o conceito externo que cada ser apresenta, são os atributos físicos.
Já a intimidade é tudo aquilo que se refere apenas ao ser dono da imagem, desde as relações familiares e de amizade, e relações comerciais. O direito busca proteger a indiscrição alheia, fazendo com que os assuntos privados de cada ser atinjam só a ele e ninguém mais.
“Os conceitos de intimidade e vida privada constitucionalmente consagrados, apresenta grande interligação, porém, diferenciam-se por ser, o primeiro, menos amplo que o segundo, encontrando-se, portanto, no âmbito de incidência deste. Desta forma, o conceito de intimidade refere-se às relações subjetivas e de foro intimo das pessoas como as relações familiares e de amizade. Já o conceito de vida privada engloba todos os relacionamentos das pessoas, inclusive os objetivos, como relações de trabalho, estudo, etc.[37]”.
Vale também expor as seguintes afirmativas:
“Suponha-se que um sujeito lance ao vento as penas de um travesseiro do alto de um edifício e determine a centenas de pessoas que as recolham. Jamais será possível recolher todas. O mesmo ocorre com a calúnia e a difamação. Por mais cabal que seja a retratação, nunca poderá alcançar todas as pessoas que tomaram conhecimento da imputação ofensiva”.[38]
Já com relação à honra, tem-se como conceito:
“[…] por honra dever-se-á entender não só a consideração social, o bom nome e a boa fama, como o sentimento íntimo, a consciência da própria dignidade pessoal. Isto é, honra é a dignidade pessoal refletida na consideração alheia e no sentido da própria pessoa”.[39]
Desta forma, quando tratamos de inquérito policial, cujo objetivo é investigar o indiciado, não existe ofensa à intimidade, pois o que se busca com a investigação é de interesse público, do bem comum.
É claro que sabemos que no decorrer de uma investigação sobre o acontecimento de determinado crime gera um transtorno não só para aquele suspeito, mas para todos ao seu redor, que indiretamente são expostos perante a sociedade.
São por essas circunstâncias que a Constituição Federal garante para todas as pessoas, inclusive o indiciado, a não exposição de sua vida privada quando esta nada tem a ver com o delito investigado, protegendo o elemento intimidade.
Mas, quando ocorre da imagem do investigado ser utilizada de forma indevida e de surgirem acusações antecipadas e irresponsáveis praticadas pela mídia, com o único intuito de conseguir altos níveis de audiência, a honra está sendo abalada. Não nota a mídia que causa prejuízos incalculáveis e até mesmo danos irreversíveis.
Devido a esses excessos, o diploma legal constitucional em seu artigo 5º, V, da CF/88[40] buscou garantir a retratação de forma justa e proporcional.
Como explicita o Desembargador Walter Guilherme, em Acórdão de número 743.255/1 do Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo:
“[…] cidadão privado, homem público, artista, não-artista e em certa medida a pessoa jurídica, todos têm direito de ver respeitado o seu cabedal íntimo, sujeitando-se o ofensor à responsabilidade civil e/ou penal, a par de exercício de resposta, se bem que esta frequentemente é inócua, não se habilitando como medida capaz de ressarcir a intimidade, vida privada, honra ou imagem violados […]”[41].
É notório que nos dias de hoje a mídia exerce sobre a sociedade um forte poder de convencimento e persuasão, transmitindo informações minuto a minuto da situação do mundo, influenciando a coletividade no comportamento diário.
Apesar disso, a mídia, com todo esse poder de informação, preocupa-se em veicular notas sobre ocorrências criminosas, por saberem que são notícias que causam maior impacto emocional e que mobilizam a sociedade emocionalmente.
Porém, a realidade vai além de apenas veicular a notícia de ocorrência criminosa expondo um ser humano. Muitas vezes o jornalista exerce papel de investigador policial, invadindo a área de atuação policial.
Por diversas vezes, sentados em nossas salas, nos entretendo com a televisão, assistimos flagrantes preparados por repórteres, escutamos gravações de conversas telefônicas por parte dos jornalistas e até câmeras ocultas utilizadas para invadir a privacidade alheia e sua exibição. Todas as ações consideradas inconstitucionais.
Mas o que mais choca é a quebra do sigilo do inquérito policial e a divulgação dos dados pela mídia.
Em 2008, o Brasil assistiu todas as informações sobre a morte da menina Isabela Nardoni. A matéria de capa da revista mais famosa do país é precisa: “Foram eles”, exibindo a foto do pai e da madrasta da vítima. A declaração é feita baseada em diversas perícias, depoimentos e conclusões dos responsáveis pela investigação. A informação que a capa do meio de imprensa escrita demonstra é que os indiciados realmente eram culpados.
Fica a indagação: e para que serve o sigilo no inquérito policial se a mídia tem acesso livre a desenvolvimento das investigações criminosas?
A mídia não passa ao telespectador que as provas produzidas em inquérito policial são provas não contestadas, que podem ser refutadas em momento futuro.
Esse tipo de ação praticada pela mídia, que se preocupa em transmitir notícias chocantes, informando todos os dados pessoais das pessoas envolvidas nessas ocorrências, desde imagem até seus nomes, e ignorando as proibições, demonstra claramente o desrespeito aos direitos da personalidade e do direito em si.
Esquece a mídia que apesar do seu direito de liberdade de imprensa[42], existe um cidadão, protagonista da notícia policial veiculada, detentor de direito maior do que os dos meios de comunicação, que são dos direitos individuais.
Contudo, apesar dos meios de comunicação não estarem presos à censura, a Constituição Federal em seu artigo 220, §1º, estabelece que “a constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social, observado o disposto no Art. 5º, IV, V, X, XIII e XIV.”
Assim, no ensejo de exercer a liberdade de imprensa, os operadores da mídia vão além dos direitos individuais das pessoas, ultrapassando o limite imposto pela Carta Magna. Destarte, como é notório que esse limite criado pelos direitos da personalidade não podem ser ultrapassados, cabe responsabilizar civil e penalmente aquele que ignore o perímetro.
Portanto, como resposta a ofensa dos direitos garantidos constitucionalmente, cresce a cada dia as ações oferecidas pelos ofendidos contra as empresas de mídia – escrita e falada. São ações resultadas de matérias com noticias ofensivas, ameaçadoras, injuriosas ou difamatórias, obtidas muitas vezes pela quebra do sigilo que reveste o inquérito policial.
Infelizmente essas ações são possuem o pode de reparar totalmente o que aquele cidadão sofreu quando teve os seus direitos violados, quando a investigação policial que existia em seu nome teve o escopo do sigilo abalado.
Então busquemos por funcionários que atuam na policia judiciária éticos, que preservem as características de suas atividades; e jornalistas dignos, que mostrem os acontecimentos do mundo mas sem violar os direitos fundamentais dos seres humanos, com conseqüências irreparáveis para a sua vida psicológica e social.
Não podemos esquecer que no nosso Estado Democrático prevalece o princípio da presunção de inocência, cujo ninguém poderá ser considerado culpado até o transito em julgado de sentença condenatória. Se o objetivo é informar, que informa, dentro dos limites que a Lei impõe, não significando censura.
6 CONCLUSÃO
Após os fundamentos acima alinhados em relação ao inquérito policial, a característica do sigilo, o direito da personalidade e o comportamento da mídia, foi possível depreender as seguintes conclusões:
No instituto do sigilo, focaliza-se primordialmente a garantia da defesa da privacidade do individuo que se encontra sob investigação criminal, visando à proteção desse indivíduo diante de inúmeros contextos relacionados ao seu foro intimo, tais como: a interferência em sua vida privada, familiar e domestica; a ingerência em sua integridade física e mental, ou em sua liberdade intelectual e moral; os ataques à sua honra e reputação; a comunicação de fatos relevantes e embaraçosos relativos à sua intimidade; o uso de seu nome, identidade e retrato; a espionagem e a espreita; a intervenção na correspondência; a má utilização de informações escritas e orais; a transmissão de informações dados ou recebidos em razão de segredo profissional.
Todavia, o referido instituto não se constitui apenas como uma forma de medida assecuratória contra ilicitudes praticadas por determinados profissionais da Polícia Judiciária, que usam do acessam a informações sigilosas para se beneficiarem de alguma forma ou se promoverem profissionalmente.
O sigilo é, antes de tudo, uma garantia individual conquistada e positivada pela Declaração dos Direitos do Homem, que tem como objetivo principal afastar as conseqüências nocivas, que podem ser geradas a partir da persecutio criminis, bem como validar a correta aplicação da lei penal.
Diante do exposto, em relação ao instituto do sigilo conclui-se que este é fator primordial para o bom andamento do inquérito policial, objetivando a elucidação dos fatos sem comprometer a integridade física e moral do indivíduo, resguardando seus direitos fundamentais previstos na Carta Magna.
Para auxiliar o sigilo, nosso Estado Democrático utiliza o princípio da presunção de inocência como direito basilar para se guiar as investigações criminais e a instrução criminal, onde o Estado terá que comprovar a culpabilidade do indivíduo, pois este é considerado inocente até prolação de sentença com transito em julgado.
Contudo, nos dias atuais, a mídia, com seu forte poder de influencia sobre todos os setores da sociedade, e por conta da busca incessante de altos níveis de audiência, estão ferindo os direitos fundamentais dos indivíduos, expondo o cidadão de forma brutal, gerando danos morais, profissionais e em alguns casos, físicos.
A veiculação da informação de forma inverídica e incompleta, como também a quebra do sigilo pelo sensacionalismo da imprensa faz com que os receptores da informação veiculada erroneamente acabem criando um juízo de valor de determinado indivíduo indiciado, acarretando transtornos a este ser no que diz respeito à sua retomada de vida normal durante e até mesmo após os trâmites investigatórios e processuais.
Afinal, a mídia como um todo tem o poder de formar o senso crítico da coletividade, nos mais diversos setores da vida humana, por isso, é necessário que os operadores dos meios de comunicação ajam com mais ética e respeito aos direitos fundamentais, direito da personalidade.
Portanto, à mídia, deve alterar sua linha de ação, deixando de lado essa competição por ibope, e buscando o crescimento da cidadania. Não se exige que os meios de comunicação deixem de noticiar os delitos que acontecem no meio social, mas que mostrem aos seus ouvintes, telespectadores e leitores que determinado fato delituoso aconteceu, mas o suposto responsável que manter seus direitos à imagem, honra e intimidade íntegros.
Antes de tudo, cabe aos Delegados de Polícia, ao Poder Judiciário e ao Ministério Público o dever, de proteger os direitos da personalidade do indivíduo indiciado, não podendo permitir que a mídia se utilize de informações sigilosas em detrimentos de direitos basilares do ser humano. Afinal de contas o Estado assumiu esse dever de protetor quando legislou na Constituição Federal e em Leis esparsas sobre a proteção à imagem, honra e intimidade.
Assim o Estado precisa exercer a proteção a fim de garantir o ressarcimento de determinada violação de direitos, mas se antecipar e exercer proteção visando a não violação dos direitos da personalidade, expondo ao indiciado os seus direitos. É desta forma que encontraremos uma investigação ética, e perante a certeza de que os meios de comunicação estarão limitados legalmente no que tange a personalidade de cada ser humano.
Especialista em Ciências Criminais pela Universidade Cândido Mendes; Oficiala de Promotoria I do Ministério Público do Estado da Paraíba; Juíza Conciliadora da Justiça Federal na Paraíba, subsecção Campina Grande
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