O
avanço da tecnologia na área da informática provocou uma grande revolução nas
relações sociais. As facilidades alcançadas pelo uso do computador e,
principalmente, a Internet, transformaram a vida moderna. É a era da
Informática.
Estas
inovações propiciaram o aparecimento de novos tipos de crimes ou novas formas
de praticar os já conhecidos tipos penais, surgindo os crimes de informática.
Assim,
crime de informática é aquele praticado contra o sistema de informática ou
através deste, compreendendo os crimes praticados contra o computador e seus
acessórios e os perpetrados através do computador. Inclui-se
neste conceito os delitos praticados através da Internet, pois pressuposto para
acessar a rede é a utilização de um computador.
Dos
crimes praticados através da Internet a pedofilia é sem sombra de dúvidas o que
causa maior repúdio e revolta na sociedade. É inaceitável o constrangimento ao qual as crianças e adolescentes são submetidos para saciar o
prazer doentio e repugnante de pessoas imorais. A pedofilia tira da criança o
que ela tem de mais valioso, sua inocência, sua infância. Uma conduta tão grave
como esta merece uma severa reprimenda por parte da sociedade, seja pelo Poder
Público, ao processar e julgar os criminosos, seja pela participação individual
de todo cidadão, ao denunciar os envolvidos nesta prática e apontar os sites de
divulgação.
A
pedofilia consiste num distúrbio de conduta sexual, no qual o indivíduo adulto
sente desejo compulsivo por crianças ou pré-adolescente, podendo ter caráter homossexual
ou heterossexual. Na maior parte dos casos trata-se de
homens, muitos deles casados, que se sentem incapazes de obter satisfação
sexual com uma pessoa adulta.
O
Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei 8.069/90, cuida dos direitos das
crianças e dos adolescentes. Criança, para o estatuto, é a pessoa até doze anos
de idade incompleto e adolescente aquela entre doze e dezoito anos (artigo 2º
da Lei 8.069/90).
A
Lei 8.069/90 possui vários tipos penais, dentre eles encontramos o referente à
pedofilia.
Art.
241. Fotografar ou publicar cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo
criança ou adolescente:
Pena
– reclusão de um a quatro anos.
Publicar
é tornar público, divulgar. Quem insere fotos de criança ou adolescentes em
cena de sexo na Internet está publicando e, assim, cometendo a infração. O
crime pode ser praticado através de sites, home pages, muitas delas destinadas à pornografia. É importante
salientar que não importa o número de internautas que
acessem a página, ainda que ninguém conheça o seu conteúdo, as imagens estarão
à disposição de todos, configurando a infração. Por outro lado, quem envia um
e-mail com uma foto anexada não está tornando público e sim enviando a pessoa determinada, destarte, a conduta é, infelizmente,
atípica.
O
bem jurídico protegido pelo ECA, é a criança e o
adolescente. Surge uma dúvida. Somente as brasileiras estão protegidas? E as
estrangeiras? Entendemos que todas as crianças estão amparadas, até porque
nossa Constituição não faz diferença de tratamento entre brasileiros e
estrangeiros residentes no País.
Como
a lei protege o menor, há quem sustente que só existirá crime quando a vítima
for conhecida e identificada. Ousamos discordar. Ainda que desconhecida, a
criança ou adolescente que tevê sua foto divulgada está protegida pelo ECA. Desta forma, a identificação pode facilitar a
persecução penal, mas sua ausência não tem o condão de impedir o processo.
Obstáculos
existem para a punição deste crime. Duas situações podem dificultar a
condenação de quem publica fotos na rede. Na primeira o agente conhece a
adolescente, trata-se de pessoa identificada e, quando é ouvida, esclarece que
afirmou ser maior de idade. Muitas vezes, a compleição física de uma moça de
16, 17 anos é semelhante à de uma mulher maior de idade. Se a moça disse ser
maior, é difícil comprovar que o agente conhecia sua real idade. Ausente o
conhecimento, não há dolo, elemento subjetivo do tipo. É lógico que a acusação
pode sustentar a incidência do dolo eventual, ou seja, o agente desconfiou da idade
e sem saber ao certo, divulgou as fotos. Caberá ao juiz, diante do caso
concreto, solucionar a questão.
Outro
problema para apuração do delito é o desconhecimento da identidade da vítima, o
agente recebeu ou capturou as fotos na rede e as divulga. Com base unicamente
na foto não será possível afirmar com grau de absoluta certeza, necessária a
condenação, se a moça possui: 16, 17 ou mais de 18
anos. Também aqui é admitido, em tese, o dolo eventual.
Observe-se,
que estes argumentos só poderão ser utilizados quando se tratar de adolescente
fisicamente desenvolvida, o que pode provocar dúvida sobre sua idade. Em
relação a crianças, é inadmissível este tipo de alegação. Ninguém pode
questionar o fato de uma menina de 8, 10 ou 12 anos ser menor. Aqui, é indiferente
estabelecer a idade exata da vítima, pois o legislador protege todos os
menores.
Outro
ponto que merece atenção é a autoria do delito. Na pedofilia, como nos outros
crimes praticados através da Internet, não é difícil identificar a máquina,
posto que todo computador possui um número, o problema
é saber quem utilizou o computador para divulgar as fotos de crianças e
adolescentes. Em se tratando de empresas, estabelecimentos de ensino, cafés e
outros locais em que o uso é feito por diversas pessoas, a investigação pode
ser infrutífera.
Quanto
à responsabilidade do provedor, entendemos que deva existir uma fiscalização
interna, a fim de coibir a prática da pedofilia. Todavia, não deve incidir a
responsabilidade penal nos fatos praticados pelos usuários.
Embora
a pena abstratamente cominada admita a suspensão condicional do processo,
entendemos ser impossível a concessão do benefício (art. 89 da Lei 9.099/95),
pelas seguintes razões: A conduta social de quem divulga fotos de crianças e
adolescentes em cena de sexo é extremamente reprovável, causando repúdio e
revolta na sociedade. Os motivos que levam o agente à prática do crime são
imorais e repugnantes. Acrescente-se que as conseqüências deste tipo de
infração podem ser gravíssimas. O agente que divulga as fotos de um menor, além
de expor sua privacidade, provoca traumas irreparáveis. Observe-se, que muitas
vezes tais fotos são divulgadas a outros menores, o que gera um distúrbio em
seu amadurecimento sexual. As circunstancias do fato são desprezíveis, o agente
utiliza as crianças para satisfazer sua lascívia. Assim, que comete tal conduta
é indigno, depravado e pervertido.
É
certo que tal proibição não pode ser genérica, mas também é certo que os
argumentos acima incidirão em 99% dos casos, daí sustentarmos a
inadmissibilidade do benefício.
Pelo
exposto, concluímos que a pedofilia praticada através da Internet é punível
desde que a conduta do agente se amolde ao tipo penal do art. 241 da Lei
8.069/90, ou seja, haja publicidade. Nos casos de envio de fotos anexadas a
e-mails ou transferências de arquivos a pessoas determinadas, lamentavelmente,
não há crime a punir.
Promotora de Justiça no RJ
Professora da Universidade Estácio de Sá
Autora do livro Crimes de Informática e seus aspectos processuais, Editora Lumen Júris
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