Rui Barbosa disse que, num país, o povo pode perder a crença em todas as instituições. Entretanto se, depois de um vendaval de decepções, restar a confiança na Justiça, esse povo recuperará as rédeas de seu destino.
Nos últimos tempos de Brasil fatos de grande repercussão têm comprometido a imagem do Poder Judiciário. Não importa se mil juízes, perdidos em comarcas distantes, cumprem sua vocação com dignidade. Basta que alguns magistrados profanem a toga para que a Justiça seja desmoralizada.
Visando justamente a destacar as coisas boas da Justiça, a Fundação Getúlio Vargas, com apoio do Ministério da Justiça, Associação dos Magistrados Brasileiros e outras instituições, criou o Prêmio Innovare que está tendo, neste ano, sua terceira edição.
O Prêmio Innovare, como é expresso na sua justificativa, foi criado para “identificar, premiar, sistematizar e disseminar práticas pioneiras e bem sucedidas” na Justiça (Juiz individual, Juizado Especial, Tribunal), no Ministério Público e na Defensoria Pública.
Em cada uma dessas categorias duas práticas são destacadas: uma que recebe um prêmio em dinheiro, outra que recebe um prêmio de honra (menção honrosa).
No ano passado, uma Juíza de Direito de meu Estado (ES) recebeu o prêmio de honra. Trata-se de Gladys Henriques Pinheiro com a prática denominada “Sistema integrado de atendimento à criança”. A experiência de Gladys desenvolveu-se no município da Serra, integrante da Grande Vitória.
Neste ano novamente um capixaba, juiz aposentado, recebe láurea idêntica à de Gladys.
O juiz aposentado apresentou uma prática que ele desenvolveu, em diversas comarcas do Espírito Santo, a partir de 1967. Sua experiência consistiu na utilização, em larga escala, de medidas que substituíssem o encarceramento de pessoas e foi denominada “Crime, tratamento sem prisão”. Depois de realizar a experiência, esse juiz, com ajuda de dezesseis alunos seus da UFES, fez uma pesquisa para verificar o que havia acontecido com as pessoas que foram beneficiadas pelas medidas liberalizantes. Constatou-se que o índice de reincidência nesse grupo foi de dez por cento, em números redondos, em contraste com o índice de reincidência de sessenta e sete por cento, nas prisões brasileiras. A experiência relatada mostrou que a questão não era somente soltar o preso, ou deixar de prender alguém. Era preciso que o juiz acompanhasse a vida desse alguém, estabelecendo com esse alguém um liame existencial, um como que “pacto de honra”.
Na época em que levou a cabo sua experiência, o juiz não foi compreendido no seu propósito.
Como é reconfortante que, quatro décadas depois, o juiz, ainda vivo, possa ouvir da Comissão do Prêmio Innovare que aquela experiência dos idos de 60 ainda é válida e atual no Brasil de 2006 e que, por esse motivo, será disseminada por todo o país.
Posso assegurar, sem qualquer sombra de dúvida, que o juiz aposentado está muito feliz porque esse juiz sou eu.
Livre-docente da Universidade Federal do Espírito Santo e escritor
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