Passada a discussão sobre a legalidade, ou não, do uso de algemas (v. o meu artigo “Algemas ainda não podem ser usadas”) – a respeito do que o E. Supremo Tribunal Federal chegou até a editar o verbete nº 11 da chamada Súmula Vinculante, – ora há de ser ventilada a questão das condições de transporte do preso em compartimento de viatura policial.
Como diariamente se vê em reportagens de emissoras de televisão, toda e qualquer pessoa que vem a ser presa é invariavelmente jogada no bagageiro de caminhonete policial, onde não há bancos, nem luz e nem ventilação, compartimento aquele que, por isso mesmo, é sintomaticamente chamado de “chiqueirinho”.
Na verdade, tal procedimento dos policiais não passa de mais uma violência contra a pessoa, perpetrada independentemente de ser o preso uma senhora idosa ou de um senhor de avançada idade, sendo mesmo de se acreditar que, absurdamente, haja algum “manual” policial determinando sejam todos os presos, obrigatória e indistintamente, jogados no aludido cubículo!!!
O odioso ato de jogar o preso no “chiqueirinho” pode até ser considerado criminoso, porquanto – por não corresponder ele a apropriada dependência de carro-celular, – ali viajam os coatos sentados no chão e uns por cima dos outros.
Veja-se que o Código de Trânsito Brasileiro (Lei nº 9.503, de 23/09/97 – in www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L9503.htm) no seu art. 230, considera infração gravíssima “Conduzir o veículo: .. II – transportando passageiros em compartimento de carga, salvo por motivo de força maior, com permissão da autoridade competente e na forma estabelecida pelo CONTRAN”
Como se vê, a exceção ali prevista depende de expressa permissão, tendo sito estatuído no respectivo diploma regulamentador (Resolução CONTRAN nº 82, de 19/11/98) que “O transporte de passageiros em veículos de carga, remunerado ou não, poderá ser autorizado eventualmente e a título precário, desde que atenda aos requisitos estabelecidos nesta Resolução” (art. 1º). (v. www.geipot.gov.br/download/1998/98-13-Resol82.doc).
Além de infringir disposições reguladoras do trânsito de veículos, a atitude das autoridades policiais fazendo transportar presos naquelas impróprias dependências dos chamados “camburões” configura solene desrespeito ao que é determinado no art. 1º da Lei nº 8.653, de 10/05/93, segundo o qual “É proibido o transporte de presos em compartimento de proporções reduzidas, com ventilação deficiente ou ausência de luminosidade”. Portanto, legem habemus!
A propósito, aliás, o próprio Ministro da Justiça reprovou aquele modo de agir, conforme se lê em página do site de “O Globo Online”, editado a 16/05/07, verbis:
“O ministro da Justiça, Tarso Genro, determinou que a Polícia Federal crie um modelo de carro para transporte de presos (camburão) sem as gaiolas, porta-malas com grades instaladas na parte trazeira das caminhonetes. Para o ministro, os novos camburões devem ter bancos e espaço suficiente para que os presos sejam conduzidos sentados. A idéia do ministro é evitar que os presos sejam submetidos a sofrimentos desnecessários. Em geral, as gaiolas são apertadas e obrigam os presos a ficarem encolhidos. Tarso Genro fez o pedido ao diretor da Polícia Federal, Paulo Lacerda, recentemente. Ele viu pela televisão imagens de presos sendo colocados dentro de gaiolas durante uma das várias operações de combate à corrupção da PF e não gostou das cenas. O ministro entende que as gaiolas implicam num castigo a todos os presos, inclusive aqueles ainda não condenados pela Justiça. O que custa fazer algumas mudanças nos veículos ? A PF está num grau de prestígio que pode fazer essas mudanças – disse Genro ao Globo. Caso a proposta dê certo, Tarso Genro acha que o modelo poderá ser implantado pelas polícias civis e militares. O ministro também pediu que a PF volte a examinar a possibilidade de transportar determinados presos sem algemas” (in http://oglobo.globo.com/pais/mat/2007/05/16/295775429.asp).
O respeito à pessoa do preso é cânone constitucional (CF, art. 5º, caput, inc. XLIX), não podendo ser ele humilhado, sob pena de o contrário caracterizar evidente abuso de autoridade, constrangimento ilegal e violência arbitrária, passíveis seus autores de serem responsabilizados administrativa e criminalmente.
Advogado
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