Proteção internacional aos direitos humanos dos trabalhadores: A declaração da OIT sobre princípios e direitos fundamentais no trabalho de 1988

Resumo: O artigo analisa os principais fatores que contribuíram para o surgimento da Organização Internacional do Trabalho, bem como a substancial relevância e as conquistas advindas da Declaração de Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho de 1988. Nesta tarefa, apresenta os momentos ou registros históricos e legislativos que vieram a espargir luzes pelo caminho percorrido na direção de ser seguro e sólido o processo de reconhecimento e de efetivação dos direitos humanos dos trabalhadores em âmbito internacional. Em seguida, demonstra o propósito da Declaração de Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho de 1988, deixando evidente e irrefutável o seu papel como verdadeiro e efetivo instrumento para se assegurar a garantia dos direitos humanos dos trabalhadores.

Palavras-chave: Organização internacional do trabalho – OIT; Direitos humanos; Declaração de princípio e direitos fundamentais no trabalho de 1988.

Abstract: The article analyzes the main factors that contributed to the emergence of the International Labor Organization, as well as the substantial relevance and achievements of the 1988 Declaration of Fundamental Principles and Rights at Work. In this task, it presents the historical and legislative moments or records that Came to shed light on the path taken in the direction of the process of recognition and effective realization of the human rights of workers at an international level. It then demonstrates the purpose of the 1988 Declaration of Fundamental Principles and Rights at Work, making clear its irrefutable role as a true and effective instrument to ensure the guarantee of the human rights of workers.

Keywords: International Labor Organization – ILO; Human rights; Declaration of Principle and Fundamental Rights in the Work of 1988.

Sumário: Introdução; 1. A criação da organização internacional do trabalho – OIT; 2. A declaração da OIT sobre princípios e direitos fundamentais no trabalho de 1998; conclusão. Referências.

INTRODUÇÃO

O objeto do presente artigo consiste no estudo sobre a criação da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e do papel da Declaração da OIT sobre Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho de 1988.

Será possível ver que a OIT revela-se como um marco notável na generalização do processo de afirmação dos direitos humanos sociais do trabalhador no mundo capitalista.

Por meio da Declaração Internacional de 1988, os Princípios Fundamentais do Trabalho passam a ser objeto de oito Convenções Internacionais, que foram reconhecidas como fundamentais por tornarem efetivos os princípios e os direitos mínimos reconhecidos como tal para o trabalhador. Nesta Declaração, a comunidade internacional admite e assume a obrigação de respeitar e de aplicar as Convenções da OIT que versam sobre os Direitos Humanos do trabalhador, quais sejam: a) Convenções 87 e 98 – sobre a liberdade sindical e o reconhecimento efetivo da negociação coletiva; b) Convenções 29 e 105 – sobre a eliminação de todas as formas de trabalho forçado ou obrigatório; c) Convenções 138 e 182 – sobre a abolição efetiva do trabalho infantil; d) Convenções 100 e 111 – sobre a eliminação da discriminação em matéria de emprego e ocupação.

O artigo ora apresentado tem como escopo demonstrar o propósito da Declaração de Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho de 1988, deixando evidente e irrefutável o seu papel como verdadeiro e efetivo instrumento para se assegurar a garantia dos direitos humanos dos trabalhadores, haja vista ser questão de caráter atual e de substantiva relevância para o Direito Internacional do Trabalho.

1.  A CRIAÇÃO DA ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO – OIT

A Organização Internacional do Trabalho (OIT) foi criada pela Conferência da Paz em Versalhes em junho de 1919. Constituída pelos países vitoriosos, logo após a Primeira Guerra Mundial, teve como objetivos promover a justiça social e, em particular, respeitar os direitos humanos no mundo do trabalho. Desde a sua criação, a OIT está assente no princípio inscrito na sua Constituição de que não pode haver paz universal duradoura sem justiça social.

Como informa Carlos Roberto Husek (2015), os países vencedores da Primeira Guerra Mundial reuniram-se em Paris, em 1919, negociaram e assinaram o “Tratado de Versalhes”. Por isso, o referido Tratado, que resultou da Conferência da Paz, criou a sociedade das Nações para assegurar a paz e, dentre várias decisões importantes, na sua Parte XIII, criou a Organização Internacional do Trabalho (OIT).

O Tratado de Versalhes – nome pelo qual a Conferência ficou conhecida – dispôs, na Parte XIII, sobre a criação da OIT, sendo um documento internacional elaborado para promover a paz social e enunciar a melhoria das relações empregatícias por meio dos princípios que iriam reger a legislação internacional do trabalho. Por ter sido um dos países vitoriosos, o Brasil tomou parte como um de seus signatários.

Luciane Cardoso Barzotto (2007) salienta que a OIT foi o primeiro regime internacional disposto funcionalmente em matéria de direitos humanos. A ação da OIT foi considerada pioneira ao internacionalizar e ao universalizar os direitos humanos. Por isso, o sistema da OIT é o mais desenvolvido na proteção dos direitos humanos.

Segundo Francisco Ferreira Jorge Neto e Jouberto de Quadros Pessoa Cavalcante (2015):

“A OIT era parte integrante da Sociedade das Nações. Poucos meses depois da constituição da ONU (maio de 1946), foi concluído o acordo entre a nova Organização Internacional e a OIT, pelo qual se reconheceu a OIT como uma agência especializada, competente para empreender a ação que considere apropriada, de conformidade com seu instrumento constitutivo básico, para o cumprimento dos propósitos nele expostos (art. 1º)”. (JORGE NETO; CAVALCANTE, 2015, p. 143).

Roseli Fernandes Scabin (2015, p. 3) argumenta que a OIT foi criada como “resultado dos esforços dos países integrantes da então existente Liga das Nações, no sentido de promover a paz mundial e de prevenir o mundo contra o surgimento de focos de potenciais conflitos através da humanização das condições de trabalho”.

Complementa a autora:

“Os dirigentes dos países integrantes da Liga das Nações perceberam, desde então, os perigos decorrentes das más condições de vida que atingiam a maior parte da população. Em outras palavras, ficou claro, para o mundo inteiro, que o povo submetido a condições de vida desumanas, ou até mesmo subumanas, torna-se vulnerável à disseminação de ideologias nem sempre honestas em seus propósitos, e transforma-se em “massa de manobra” a serviço de interesses políticos e de governantes equivocados ou mal intencionados”. (SCABIN, 2015, p. 3).

Neste aspecto, a OIT é uma entidade que visa a orientar as políticas legislativas para todos os Países-Membros, objetivando internacionalizar disposições sobre trabalho e seguridade social e outras correlatas, que ampliem o rol de tutela e de efetivação dos Direitos Humanos dos trabalhadores.

Na lição de Márcio Morena Pinto (2014), desde o momento de sua instituição, a OIT vem desempenhando relevante papel na internacionalização do Direito do Trabalho, fomentando a uniformização de preceitos trabalhistas fundamentais e a sua harmonização com a ordem interna dos países celebrantes de seus Tratados e de suas Convenções.

Luiz Eduardo Gunther (2012), ao traçar os motivos mais importantes para internacionalizar a proteção do trabalhador, assinala que a OIT constitui sua razão essencial de se internacionalizar, de forma eficaz e permanente, a proteção do trabalhador, estabelecendo-se um nível mínimo de benefícios que todos os países respeitem.

A criação da OIT baseou-se em argumentos humanitários e políticos que fundamentaram a formação da justiça social no âmbito internacional do trabalho. O argumento humanitário sustentou-se nas condições injustas e deploráveis de trabalho e de vida dos trabalhadores, a partir da Revolução Industrial, em virtude das mudanças no sistema de produção na Inglaterra no século XVIII.

A Revolução Industrial multiplicou a riqueza e o poderio econômico dos burgueses; todavia, em compensação, trouxe para a população operária o aprofundamento das desigualdades sociais, o aumento do desemprego e a alienação do trabalhador em relação aos meios de produção. Como o empresário capitalista tornou-se o detentor único dos meios de produção, agrupando em seu estabelecimento assalariados para operarem as máquinas (produção em série), dispensou-se a habilidade individual. Razão pela qual, a mecanização generalizou a divisão do trabalho e fragmentou a produção de cada artigo em etapas sucessivas, que exigem do trabalhador uma repetição de movimentos remetentes.

Neste contexto, assevera Lygia Maria de Godoy Batista Cavalcante (2007):

“A exigência cada vez menor com relação às habilidades individuais do trabalhador, a preponderância da grande máquina e o número cada vez maior de empregados povoando as grandes fábricas transformaram o trabalhador numa simples peça, sem maior importância e anônima, desconhecida; um objeto igual aos demais, carente de valor humano”. (CAVALCANTE, 2007, p. 144).

Assim, em decorrência da intensa industrialização nos países europeus, surgiram as condições sociais e políticas para os movimentos sociais de reivindicações dos trabalhadores, ante o crescente estado de miséria e de sofrimento a que estavam submetidos. Em face da tomada de consciência de classe e da luta por melhores condições de vida, de trabalho, de saúde e de dignidade, os trabalhadores influenciaram a intervenção social do Estado para criar políticas de proteção à classe trabalhadora.

A OIT funda-se no princípio da paz universal e permanente como instrumento de concretização e de universalização dos ideais da justiça social e da proteção do trabalhador no mundo internacional do trabalho. Como a Organização das Nações Unidas (ONU) surgiu no ano de 1945, após a Segunda Guerra Mundial, para que não houvesse dois organismos internacionais com as mesmas funções e atribuições, declarou-se a OIT integrante da ONU. Por isso, aquela é considerada um organismo internacional associado a esta, aliás, a uma das agências especializadas da ONU.

Conforme Arnaldo Sussekind (2000), impende ressaltar:

“O sistema das Convenções da OIT, sobretudo depois da criação da Organização das Nações Unidas (ONU) em 1945, e das suas agências especializadas (OMS, Unesco, FAO etc.) acabou por inspirar esses organismos internacionais, que se serviram do modelo vitorioso para assegurar e regular direitos fundamentais do ser humano e diversas relações jurídicas de relevante interesse geral. O mesmo se verificou nos organismos regionais. Ao lado do direito internacional clássico, nascia o que se chamou de direito comum da humanidade o qual teve incremento com a nova Declaração Universal dos Direitos do Homem, aprovada em 1948 pela Assembleia Geral das Nações Unidas, e os dois pactos de 1966 que regulamentaram os direitos civis, políticos, econômicos, sociais e culturais nela consagrados”. (SUSSEKIND, 2000, p. 19).

     Aprovada, então, a Carta das Nações Unidas, da qual resultou a criação da ONU e a revisão da constituição da OIT, fica afirmada, definitivamente, a personalidade da OIT como pessoa jurídica de direito público internacional, de caráter permanente, constituída de Estados, que assume, de forma soberana, a obrigação de observar as normas que se ratificam no plano interno.

Neste interregno, preceitua o Artigo 57 da Carta das Nações Unidas que a OIT é um organismo especializado e vinculado à ONU, in verbis:

“Artigo 57.

1. As várias entidades especializadas, criadas por acordos intergovernamentais e com amplas responsabilidades internacionais, definidas em seus instrumentos básicos, nos campos econômico, social, cultural, educacional, sanitário e conexos, serão vinculadas às Nações Unidas, de conformidade com as disposições do Artigo 63.

2. Tais entidades assim vinculadas às Nações Unidas serão designadas, daqui por diante, como entidades especializadas.”

Contudo, é preciso destacar, concorde Fernanda Rodrigues Guimarães Andrade (2012) que, apesar de a OIT tornar-se uma das agências especializadas da ONU, isso não acarretou impactos sobre a estruturação da primeira, tendo em vista que a aquela não foi constitucionalmente incorporada ao sistema desta. Sendo assim, pôde manter a sua autonomia e a sua independência técnica no tocante a questões políticas. De acordo com a autora, até o presente, a OIT preserva a sua independência financeira e administrativa em relação à ONU. Isso porque a primeira é financiada por seus próprios Estados-Membros e toma as suas próprias decisões sem a ingerência da segunda.

Reza o Artigo 39 da Constituição da OIT que a entidade possui personalidade jurídica e capacidade para contratar, adquirir bens móveis e imóveis e deles dispor, para comparecer em juízo, in verbis: A Organização Internacional do Trabalho deve ter personalidade jurídica, e, precipuamente, capacidade para: a) adquirir bens, móveis e imóveis, e dispor dos mesmos; b) contratar; c) intentar ações”.

Prescreve, ainda, o Artigo 40 da referida Constituição que a OIT possui imunidade de jurisdição no território de cada um dos seus Membros, in verbis:

“1. A Organização Internacional do Trabalho gozará, nos territórios de seus Membros, dos privilégios e das imunidades necessárias à consecução dos seus fins. 2. Os delegados na Conferência, os membros do Conselho de Administração, bem como o Diretor-Geral e os funcionários da Repartição, gozarão, igualmente, dos privilégios e das imunidades necessários para exercerem, com inteira independência, as funções que lhes competem, relativamente à Organização. 3. Tais privilégios serão especificados por um acordo em separado, que será elaborado pela Organização para fins de aceitação pelos Estados-Membros”.

Os ensinamentos de Américo Plá Rodrigues, citado por Sussekind (2000), são dignos de nota por destacarem a OIT como:

“Uma pessoa jurídica de direito público internacional, de caráter permanente, constituída de Estados, que assumem, soberanamente, a obrigação de observar as normas constitucionais da entidade nas Convenções que ratificam, integrando o sistema das Nações Unidas como uma das suas agências especializadas. A composição tripartida da sua assembleia geral (Conferência Internacional do Trabalho), do Conselho de Administração e de quase todos os seus órgãos colegiados, nos quais têm assento, com direito a voz e voto, representantes de Governos e de organizações de trabalhadores e de empregadores, constitui uma das características marcantes da OIT e fator de relevo na formação do alto conceito que desfruta nos planos da cultura, da produção e do trabalho”. (SUSSEKIND, 2000, p. 122).

No viés da temática, Pinto (2014) estatui que a OIT tem mantido uma representação desde a década de 1950, com programas e com atividades que cumprem os seus objetivos primordiais, refletindo-se em uma promoção permanente das normas internacionais do trabalho, do emprego, da melhoria das condições de trabalho e da ampliação da proteção social.

No Brasil, Pinto (2014) destaca a atuação da OIT, mais recentemente, caracterizando-se pelo apoio ao esforço nacional de promoção do trabalho decente nas seguintes áreas prioritárias: a) combate ao trabalho forçado; b) combate ao trabalho infantil; c) combate ao tráfico de pessoas para fins de exploração sexual e comercial; d) promoção da igualdade de oportunidades e do tratamento de gênero e de raça no trabalho; e) promoção de trabalho decente para os jovens; dentre outras. 

Observa Carlos Zangrando (2008, p. 257): “O objetivo da OIT é fortalecer o Direito do Trabalho, melhorar as condições de trabalho, auxiliar na geração de empregos e prover informação e oportunidades de treinamento e de especialização”.

A OIT, portanto, preconiza adotar uma política social de cooperação e de desenvolvimento social entre todos os sistemas jurídicos nacionais para a melhoria das condições de trabalho, mediante a adoção de normas protetivas sociais universais para os trabalhadores e o reconhecimento internacional dos Direitos Humanos do Trabalhador.

Consoante Nilmário Miranda (2004), enfatiza-se:

“[…] o verdadeiro resgate da cidadania é o direito ao trabalho, e ao trabalho decente, ao trabalho digno. Neste sentido, a OIT tem sido uma parceira inestimável da humanidade, desde que foi criada, em 1919; do Brasil, desde 1950, quando passou a trabalhar aqui, atingindo o nó do problema do trabalho no Brasil, quer o trabalho infantil, quer o trabalho forçado, escravo, obrigatório”. (MIRANDA, 2004, p. 86).

Na sempre oportuna visão de Gunther (2012), os notórios efeitos da globalização-mundialização apresentam desafios jurídicos no papel dos Estados, das Organizações Internacionais ou das empresas multinacionais. E o sentido fundamental da OIT consiste em equilibrar as relações entre o capital e o trabalho por se viver em um mundo unipolar com o predomínio do capitalismo.

Eduardo Biacchi Gomes e Andréa Arruda Vaz (2015) assinalam que os propósitos supratraçados por Gunther (2012) justificam a formação de uma pessoa jurídica internacional para a proteção e para a promoção do trabalho decente, de forma digna e com respeito, especialmente aos menos favorecidos, quais sejam: os trabalhadores.

Assim, estatuem com exatidão os referidos autores sobre a atuação da OIT:

“[…] volta-se à promoção de um mínimo de dignidade de forma a abarcar o máximo de países do planeta, em caráter universal, para um modo de vida minimamente decente, já que, na maioria das vezes, o trabalho, para grande parcela da população, pode ser o principal meio de se proporcionarem e de se efetivarem os direitos humanos”. (GOMES; VAZ, 2015, p. 158).

Logo, a preocupação da OIT se materializa na efetivação de políticas sociais e na busca pela promoção de um trabalho decente para todos os seres humanos, como forma de concretização dos direitos fundamentais ao trabalho e como dignificação das condições laborativas ao ser humano enquanto destinatário principal de todas as ações desta egrégia organização mundial.

Faz-se mister destacar, segundo Andrade (2012):

“Atualmente, o centro das atividades da OIT encontra-se em Genebra, mas ela possui diversos escritórios regionais instalados em locais estratégicos de todo o mundo, além de contar com serviços de informação estabelecidos nas capitais de todos os Estados-Membros”. (ANDRADE, 2012, p. 28).

Sussekind (2000), ao enfatizar a finalidade e o objeto do Direito Internacional do Trabalho, elucida:

“A expressão ‘Direito Internacional do Trabalho’ (DIT) vem sendo empregada cada vez mais para identificar o capítulo do Direito Internacional Público que trata da proteção do trabalhador, seja como parte de um contrato de trabalho, seja como ser humano, com as finalidades de: a) universalizar os princípios de justiça social e, na medida do possível, uniformizar as correspondentes normas jurídicas; b) estudar as questões conexas, das quais depende a consecução desses ideais; c) incrementar a cooperação internacional visando à melhoria das condições de vida do trabalhador e à harmonia entre o desenvolvimento técnico-econômico e o progresso social”. (SUSSEKIND, 2000, p. 17).

Também na mui apropriada visão de Husek (2015), a finalidade e o objeto do Direito Internacional do Trabalho são esclarecidos:

“[…] universalizar os princípios de justiça social, bem como, se possível, buscar a uniformização das normas jurídicas dos diversos Estados, quanto à matéria do trabalho, desenvolvendo a cooperação internacional. O objetivo básico é a condição da melhoria de vida do trabalhador, não importa raça, sexo, idade, cultura, nível social, espécie profissional, nacionalidade, religião etc”. (HUSEK, 2015, p. 63).

Durand e Jaussaud, citados por Sussekind (2000), definiram, com exatidão, as três motivações inspiradoras para a criação da OIT:

“a) um sentimento de justiça social por existirem, ainda, condições de trabalho que implicam, para um grande número de pessoas, miséria e privações; b) o perigo da injustiça social para a manutenção da paz, em vista do descontentamento que gera; c) a similaridade das condições de trabalho na ordem internacional, a fim de evitar que os esforços de certas nações desejosas de melhorar a sorte dos seus trabalhadores possam ser obstados pela não-adoção, por outros países, de regimes de trabalho realmente humanos”. (DURAND; JAUSSAUD apud SUSSEKIND, 2000, p. 124).

O autor, contudo, adverte que a similitude das condições de trabalho no plano universal, com o objetivo de formar um direito comum da humanidade nos campos do Direito do Trabalho e da Seguridade Social, não poderá ser alcançada enquanto vigorar a injusta ordem econômica internacional resultante do neoliberalismo irradiado pela globalização da economia, que dividiu o mundo em países globalizantes e globalizados, impedindo o desenvolvimento socioeconômico do "terceiro mundo".

Para Nicolas Valticos, também citado por Sussekind (2000), a filosofia da OIT apresenta as características a seguir:

“O objetivo da OIT não se restringe a melhorar as condições de trabalho, mas a melhorar a condição humana no seu conjunto; b) a OIT não procura unicamente a melhoria das condições materiais de existência. Ela dá ênfase tanto à luta contra a necessidade, visando ao progresso material e à segurança econômica, como à defesa dos valores da liberdade – notadamente da liberdade de expressão e de associação – de dignidade e de igualdade – em particular da igualdade de oportunidade, independentemente da raça, da crença ou do sexo; c) a ação da Organização não se limita à proteção dos trabalhadores propriamente ditos, porquanto alcança o conjunto dos seres humanos nas suas relações com o trabalho; c) os textos fundamentais da OIT insistem na necessidade de um esforço concentrado, internacional e nacional para promover o bem comum, isto é, para assegurar o bem-estar material e espiritual da humanidade; d) esses princípios de base da OIT sublinham que a ação para melhorar as condições sociais da humanidade, no sentido mais amplo do termo, não deve constituir um setor distinto das políticas nacionais ou da ação internacional, pois representa o próprio objeto dos programas econômicos e financeiros, e que estes devem ser julgados por esse prisma. Afirma-se, assim, a primazia do social em toda planificação econômica e a finalidade social do desenvolvimento econômico.” (VALTICOS apud SUSSEKIND, 2000, p. 129).

A OIT é uma entidade cujo objetivo basilar é orientar as políticas legislativas para todos os Países-Membros, pretendendo internacionalizar disposições sobre o trabalho e a seguridade social e outras correlatas, que ampliem o rol de tutela e de efetivação dos Direitos Humanos dos trabalhadores. Sua criação foi muito bem delineada pela Conferência da Paz que originou o Tratado de Versalhes, dispondo acerca da OIT, em sua Parte XIII, com o seguinte preâmbulo, in verbis:

“Considerando que a paz para ser universal e duradoura deve assentar (sic) sobre a justiça social;

Considerando que existem condições de trabalho que implicam, para grande número de indivíduos, miséria e privações, e que o descontentamento que daí decorre põe em perigo a paz e a harmonia universais, e considerando que é urgente melhorar essas condições no que se refere, por exemplo, à regulamentação das horas de trabalho, à fixação de uma duração máxima do dia e da semana de trabalho, ao recrutamento da mão-de-obra, à luta contra o desemprego, à garantia de um salário que assegure condições de existência convenientes, à proteção dos trabalhadores contra as moléstias graves ou profissionais e os acidentes do trabalho, à proteção das crianças, dos adolescentes e das mulheres, às pensões de velhice e de invalidez, à defesa dos interesses dos trabalhadores empregados no estrangeiro, à afirmação do princípio "para igual trabalho, mesmo salário", à afirmação do princípio de liberdade sindical, à organização do ensino profissional e técnico, e outras medidas análogas;

Considerando que a não adoção por qualquer nação de um regime de trabalho realmente humano cria obstáculos aos esforços das outras nações desejosas de melhorar a sorte dos trabalhadores nos seus próprios territórios.”

Concorde Lygia Maria G. B. Cavalcante (2008), o Tratado de Versalhes consagrou o Direito do Trabalho como um novo ramo da ciência jurídica e, para universalizar as suas normas, criou a OIT. O preâmbulo de criação da Organização contém o essencial da tríplice justificação de uma ação legislativa internacional sobre as questões de trabalho com expressiva ressonância nas Convenções correspondentes. Assim sendo, a primeira justificativa é a “política”, a fim de assegurar bases sólidas à paz mundial; a segunda é a “humanitária”, voltada à existência das condições de trabalho que despertam injustiça, miséria e privações; e, por fim, a terceira justificativa é “econômica”, com o argumento inicial da concorrência internacional como obstáculo para a melhoria das condições sociais em escala nacional.   

A esse respeito, lecionam Patrícia Tuma Martins Bertolin e Fabiana Larissa Kamada (2014) que a OIT tem desenvolvido, desde o seu surgimento em 1919, diversas ações para o fortalecimento da justiça social, quer elaborando, quer influindo decisivamente para o delineamento de políticas econômicas, sociais e trabalhistas.

Na lição de Pinto (2014), desde o momento de sua instituição, a OIT vem desempenhando relevante papel na internacionalização do Direito do Trabalho, fomentando a uniformização de preceitos trabalhistas fundamentais e a sua harmonização com a ordem interna dos países celebrantes de seus Tratados e de suas Convenções.

Américo Plá Rodriguez, citado por Gunther (2012), estabelece os motivos mais importantes para se internacionalizar a proteção do trabalhador, ou seja, as cinco razões que explicam por que a ideia de formar um Direito Internacional do Trabalho surgiu e se desenvolveu. De acordo com ele, a OIT constitui como razão essencial para se internacionalizar, de forma eficaz e permanente, a proteção do trabalhador, estabelecendo um nível mínimo de benefícios que todos os países respeitem. Por isso, os motivos que justificam tal propósito podem resumir-se em cinco pontos principais, a saber: a) universalidade dos problemas; b) perigo da concorrência desleal entre os Estados; c) solidariedade entre os trabalhadores de diversos países; d) desenvolvimento das migrações; e) contribuição para a paz.

Em tal contexto, assegura Cavalcante (2007):

“A exigência cada vez menor com relação às habilidades individuais do trabalhador, a preponderância da grande máquina e o número cada vez maior de empregados povoando as grandes fábricas transformaram o trabalhador numa simples peça, sem maior importância e anônima, desconhecida; um objeto igual aos demais, carente de valor humano”. (CAVALCANTE, 2007, p. 144).

Assim, em decorrência da intensa industrialização nos países europeus, surgiram as condições sociais e políticas para os movimentos organizados de reivindicações dos trabalhadores ante o crescente estado de miséria e de sofrimento a que estavam submetidos. Em face da tomada de consciência de classe e da luta por melhores condições de vida, de trabalho, de saúde e de dignidade, os trabalhadores influenciaram a intervenção social do Estado para construir políticas de proteção à classe trabalhadora.

E, ademais, Cavalcante (2007) clarifica:

“A chamada questão social, evidenciada no século XIX, representava a situação lamentável em que se encontravam os trabalhadores no alvorecer da sociedade industrial, sobretudo em razão dos salários insuficientes, das condições penosas de trabalho e de moradia, das jornadas extenuantes, dos riscos trazidos pelos trabalhos nas máquinas, das sequelas dos acidentes em seguridade social, do desamparo às enfermidades e à invalidez, além do abuso aos trabalhos das mulheres e das crianças, que eram pagos com salários ainda menores. A reação a todos esses problemas vividos pela classe trabalhadora se produziu a partir da tomada de consciência acerca da situação”. (CAVALCANTE, 2007, p. 144).

A burguesia industrial, em busca de maiores lucros e de menores custos, acelerou a produção de mercadorias com o aumento da exploração do trabalhador, numa fase histórica em que a Revolução Industrial propiciava o fortalecimento das empresas.

Consoante Sidney Guerra (2014):

“O surgimento da Organização Internacional do Trabalho é uma resposta aos anseios dos movimentos sindicais que pressionavam os Estados no que tangia à criação de uma organização que pudesse estabelecer mecanismos de proteção aos trabalhadores”. (GUERRA, 2014, p. 31).

Neste aspecto, “desde a Revolução Industrial, havia um forte apelo para que fossem asseguradas e protegidas prerrogativas dos trabalhadores, haja vista as condições insalubres e precárias em que as atividades eram desenvolvidas”. (GUERRA, 2014, p. 31).

 Então, inúmeros empregadores, valendo-se da plena liberdade contratual e do Estado Liberal, impuseram aos trabalhadores a aceitação das mais vis condições de trabalho. Dessa maneira, os problemas sociais gerados por aquela Revolução (miséria, desemprego, salários irrisórios, longas jornadas, grandes invenções tecnológicas da época, inexistência de leis trabalhistas etc.) contribuíram para consolidar o capitalismo como modo de produção dominante.

De tal modo, o trabalho retribuído por salário acarretou o surgimento dos direitos sociais, pela luta do proletariado por melhores condições de vida e de trabalho e por normas ou regras de justiça retributiva. O aumento da marginalização social e o embate entre o proletariado e o aparato político-estatal acabaram culminando na formação do Estado de Bem-Estar Social já em fins do século XIX e, principalmente, durante o século XX.

O Estado de Bem-Estar Social surgiu, pois, com a eclosão das reivindicações e dos movimentos sociais dos trabalhadores por melhores condições de trabalho e de subsistência. Isso levou o Estado a interferir diretamente nas relações privadas para regulamentar a relação de trabalho e para dar proteção social aos indivíduos alijados do mercado de trabalho. Assim, é a proteção social dos trabalhadores a raiz histórica e sociológica do Direito do Trabalho.

Sob o impacto da Primeira Guerra Mundial e do processo de reconstrução social, a OIT surgiu, no plano político, como o mais importante organismo internacional, sendo responsável por assegurar bases sólidas para a paz mundial e por obter melhores condições humanas para a classe trabalhadora. A ideia da internacionalização da legislação social trabalhista veio, pois, na primeira metade do século XX, quando se generalizou, em diversos Estados nacionais, a tese de que o Estado deveria intervir nas relações sócio-políticas e econômicas, com vistas a assegurar um mínimo de direitos sociais aos indivíduos. Tal movimento da classe operária subsidiou o nascimento do direito social ao trabalho regulado – considerado um dos direitos humanos de segunda dimensão.

A OIT funda-se no princípio da paz universal e permanente como instrumento de concretização e de universalização dos ideais de justiça social e de proteção ao trabalhador no mundo internacional do trabalho.

A partir deste ponto, cabe reiterar-se e enfatizar-se o que já foi dito alhures no decorrer desta seção.

Destarte, aprovada a Carta das Nações Unidas, de que resultou a criação da ONU e a revisão da Constituição da OIT, está afirmada, em definitivo, a personalidade da OIT como pessoa jurídica de direito público internacional, de caráter permanente, constituída por Estados, que assume, de modo soberano, a obrigação de cumprir e de aplicar as normas a se ratificarem no plano interno.

Insta lembrar Gomes e Vaz (2015) por argumentarem com exatidão que a atuação da OIT volta-se à promoção de um mínimo de dignidade, a fim de abarcar o máximo de países do planeta – em caráter universal – para uma vida minimamente decente, já que, na maioria das vezes, o trabalho, para grande parcela da população, pode ser o principal meio de se proporcionarem e de se efetivarem os direitos humanos.

Logo, a preocupação da OIT se materializa na promoção de políticas sociais e na busca pela garantia de um trabalho digno para todos, como meio de concretização dos direitos fundamentais do ser humano ao trabalho, enquanto destinatário principal de todas as ações da OIT.

Também como já é sabido, a OIT compreende uma pessoa jurídica de Direito Internacional Público, de caráter permanente, posteriormente vinculada às Nações Unidas. Todos os seus objetivos visam a estabelecer critérios básicos de proteção ao trabalhador, regulando a sua proteção no plano internacional e objetivando assegurar padrões mais condizentes de dignidade e de bem-estar social.

Desde a sua criação, a OIT está assente no princípio – inscrito na sua Constituição – de que não pode haver paz universal duradoura sem justiça social. Assim, com o Tratado de Versalhes, ficou estabelecida a criação da Liga das Nações, bem como a criação de uma Organização Internacional voltada aos interesses dos trabalhadores.

Portanto, a Organização Internacional do Trabalho – OIT – traduz-se como marco notável na generalização do processo de afirmação dos direitos humanos sociais do trabalhador no mundo capitalista.

2 A DECLARAÇÃO DA OIT SOBRE PRINCÍPIOS E DIREITOS FUNDAMENTAIS NO TRABALHO DE 1998

Cumpre ressaltar que, 50 anos depois da Declaração de Filadélfia, a Conferência Geral da Organização Internacional do Trabalho (OIT) adotou, durante a 86ª reunião, realizada em Genebra em junho de 1988, a Declaração sobre os Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho e o seu seguimento. Por meio desta Declaração, os Princípios Fundamentais do Trabalho passam a ser objeto de Convenções Internacionais reconhecidas como Fundamentais.

A Declaração da OIT designou as oito Convenções Internacionais do Trabalho para tornarem efetivos os princípios e os direitos mínimos reconhecidos como fundamentais para o trabalhador. A comunidade internacional, em tal Declaração, reconhece e assume a obrigação de respeitar e de aplicar as referidas Convenções que versam sobre os Direitos Humanos dos trabalhadores.

Assim, pela Declaração Internacional, todos os Estados-Membros são submetidos ao respeito, à promoção e à realização dos princípios relativos aos direitos fundamentais dos trabalhadores. Além do que ela confirma a necessidade de a OIT promover políticas sociais sólidas, estimular a formação profissional e promover políticas eficazes destinadas à criação de emprego e à participação justa do empregado nas riquezas para o pleno desenvolvimento das suas potencialidades humanas ao expor os Princípios Fundamentais do Trabalho suprarrelacionados.

Segundo Matteo Carbonelli (2015):

“Esta Declaração, em verdade, depois de reafirmar que, em uma situação de crescente interdependência econômica, é uma necessidade urgente reafirmar esses direitos, estabelece que todos os Estados-Membros da Organização, tendo aceitado os princípios e os direitos previstos na Constituição e na Declaração de Filadélfia, que foram, em seguida, expressos e desenvolvidos sob a forma de direitos e de obrigações específicos nas oito Convenções reconhecidas como Fundamentais, têm, portanto, mesmo que não tenham ratificado essas Convenções, a obrigação de respeitar, promover e tornar realidade, de boa-fé e de acordo com a Constituição da OIT, os princípios relativos aos direitos fundamentais consagrados nas referidas Convenções, e mais estabelecidas em outras Convenções e Recomendações sobre os mesmos assuntos […]”. (CARBONELLI, 2015, p. 26).

A Declaração de 1988 proclama a obrigação de todos os Estados-Membros respeitarem os princípios referentes aos direitos fundamentais, independentemente de terem ou de não terem ratificado as Convenções Fundamentais, por se tratarem de princípios já enunciados na Constituição da OIT e na Declaração de Filadélfia, além de estabelecer a obrigação de a OIT assistir os países no cumprimento dos direitos fundamentais, in verbis:

“3. Reconhece a obrigação da Organização de ajudar a seus Membros, em resposta às necessidades que tenham sido estabelecidas e expressadas, a alcançar esses objetivos fazendo pleno uso de seus recursos constitucionais, de funcionamento e orçamentários, incluída a mobilização de recursos e apoios externos, assim como estimulando a outras organizações internacionais com as quais a OIT tenha estabelecido relações, de conformidade com o artigo 12 de sua Constituição, a apoiar esses esforços:

a) oferecendo cooperação técnica e serviços de assessoramento destinados a promover a ratificação e aplicação das Convenções Fundamentais;

b) assistindo aos Membros que ainda não estão em condições de ratificar todas ou algumas dessas Convenções em seus esforços por respeitar, promover e tornar realidade os princípios relativos aos direitos fundamentais que são objeto dessas Convenções; e

c) ajudando aos Membros em seus esforços por criar um meio ambiente favorável de desenvolvimento econômico e social.”

Estatuem, ainda, os itens 4 e 5 da Declaração de 1988, in verbis:

“4. Decide que, para tornar plenamente efetiva a presente Declaração, implementar-se-á um seguimento promocional, que seja crível e eficaz, de acordo com as modalidades que se estabelecem no anexo que será considerado parte integrante da Declaração.

5. Sublinha que as normas do trabalho não deveriam utilizar-se com fins comerciais protecionistas e que nada na presente Declaração e no seu seguimento poderá invocar-se nem utilizar-se de outro modo com esses fins; ademais, não deveria de modo algum colocar-se em questão a vantagem comparativa de qualquer país sobre a base da presente Declaração e seu seguimento.”

Ana Virgínia Moreira Gomes (2014), ao analisar o item 3 da Declaração de 1988, defende:

“Enquanto seu objetivo imediato é a ratificação e o cumprimento das Convenções Fundamentais pelos Estados-Membros, a OIT também possui o papel de assistir os Estados que ainda não estão prontos para ratificar as Convenções. Essa assistência deve se dar no sentido de promover os princípios da OIT e as mudanças que possibilitarão a futura ratificação ou maior respeito aos princípios protegidos pelas Convenções”. (GOMES, 2014, p. 33).

Gomes (2014) informa que, além de ser a primeira norma da OIT a se utilizar do conceito de direitos fundamentais, a Declaração de 1988 tem caráter promocional, contrastando com as Convenções Internacionais da OIT que, quando ratificadas, geram obrigações internacionais aos Estados-Membros.

Enfatiza também a autora:

“Ao utilizar o rótulo 'direitos fundamentais', a OIT buscou fortalecer sua regulação no contexto da globalização econômica sem utilizar de fato nenhum mecanismo de imposição de suas normas. O uso dos direitos fundamentais revela o contexto no qual se encontrava a OIT, no qual a própria legitimidade da regulação trabalhista era colocada em questão por sua falta de eficácia. Ao declarar serem certos direitos trabalhistas fundamentais, a organização tinha como objetivo proteger esses direitos do questionamento econômico e político, enquanto ao mesmo tempo tornava sua atuação legítima”. (GOMES, 2014, p. 29).

Para Barzotto (2007, p. 44): “A OIT, ao fixar quatro princípios ou direitos fundamentais no trabalho, em 1988, elegeu quais seriam os direitos humanos básicos e proclamou-os como indicadores mínimos da dignidade dos trabalhadores”.

Ainda para Barzotto (2007, p. 45): “A harmonização de padrões internacionais do trabalho, em favor dos trabalhadores, sempre foi a função da OIT, que, em 1998, explicita o discurso dos direitos humanos já inseridos em seus primórdios”.

Neste aspecto, por “direitos humanos dos trabalhadores”, entendem-se aqueles que constam da Declaração da OIT relativa aos Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho de 18 de junho de 1998, que se dividem em quatro temas, quais sejam: 1 – abolição do trabalho forçado; 2 – erradicação do trabalho infantil; 3 – liberdade sindical; e 4 – não-discriminação.

 Barzotto (2007) destaca:

“Em todos os direitos humanos declarados existe um substrato de dignidade da pessoa que contempla direta ou indiretamente valores da liberdade e da igualdade. A dignidade é qualidade inerente do ser humano. É bem indeclinável frente a outros bens aos quais ordena.” (BARZOTTO, 2007, p. 19)

Em consonância com as lições de Barzotto (2007):

“Entendem-se como direitos humanos dos trabalhadores aqueles que constam da Declaração da Organização Internacional do Trabalho relativa aos Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho, de 18 de junho de 1988, que estão agrupados em quatro temas: abolição do trabalho forçado, erradicação do trabalho infantil, liberdade sindical e não-discriminação.” (BARZOTTO, 2007, p. 17).

A competência específica da OIT é promover, nos Estados-Membros, o respeito aos princípios fundamentais do homem trabalhador e a sua aplicação. Cabe retomá-los, neste ponto, a fim não só de rememorá-los, mas também de reafirmá-los dadas a sua abrangência e a sua relevância: 1 – liberdade de sindicalização; 2 – real reconhecimento do direito de negociação coletiva; 3 – eliminação de todos os modos de trabalho forçado; 4 – erradicação do trabalho infantil; 5 – supressão de toda a discriminação no emprego e ocupação.

Concorde Barzotto (2007):

“Quando a Declaração da OIT veda a utilização de trabalho escravo e trabalho infantil, tem-se, de um modo mais claro, a proteção à dignidade econômica do trabalhador, mas, ao afirmar a exigência da liberdade sindical, a Declaração adentra a esfera política, sendo os bens econômicos um efeito da organização dos trabalhadores. Por fim, ao prescrever a não-discriminação no trabalho, a OIT afirma a dignidade jurídica da pessoa com o seu caráter intrinsecamente igualitário”. (BARZOTTO, 2007, p. 21).

Ainda de acordo com Barzotto (2007):

“Através desta Declaração, a OIT, como resultado de sua cooperação no plano internacional para promover a justiça social, via harmonização de padrões de trabalho decente no mundo, entrega à comunidade mundial um plano de ação de direitos humanos para a promoção dos trabalhadores.” (BARZOTTO, 2007, p. 11).

Então, por Barzotto (2007), podem-se conceituar os direitos humanos como:

“[…] aqueles que visam ao reconhecimento de direitos à pessoa enquanto pessoa, derivados da dignidade própria da condição humana. Direitos humanos dos trabalhadores, por consequência, são os fundados na dignidade da pessoa humana nas suas dimensões jurídica, política e econômica”. (BARZOTTO, 2007, p. 21).

Destarte, “o significado desta nova terminologia baseia-se na consideração de que esses direitos fundamentais já estão inscritos na Constituição da OIT, que apenas atualiza a forma para promover sua aplicação universal”. (BARZOTTO, 2007, p. 93).

 E, para além:

“Assim como a Declaração de Filadélfia reafirmou certos valores fundamentais, para a OIT, a Declaração Relativa aos Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho e seu seguimento reiteram a vinculação da atividade normativa ao tópico dos Direitos Humanos, explicitando uma relação já existente.” (BARZOTTO, 2007, p. 94).

A OIT – como foro privilegiado das discussões trabalhistas e como uma das instituições internacionais responsáveis pela internacionalização do sistema de proteção dos direitos humanos no plano internacional – definiu o atual papel das normas internacionais do trabalho, propondo a Declaração Relativa aos Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho em 1988 como uma plataforma social mínima de âmbito mundial. Assim, a OIT vincula, expressamente, a discussão das normas trabalhistas internacionais aos direitos humanos.

Barzotto (2007) explana com exatidão:

“A referida Declaração tem efeitos importantes nos Estados nacionais, quanto à problemática dos trabalhadores, visto que enfatiza a existência de padrões mínimos de trabalho decente, trabalho digno, no mundo. Ainda que outras declarações de direitos humanos anteriores contemplassem indiretamente a proteção ao trabalhador, a Declaração da OIT, de 1988, torna explícito este nexo dos direitos humanos e a dignidade do trabalhador. Dado seu caráter positivado, a Declaração não apresenta apenas exigências morais, mas reafirma direitos básicos que passam a fazer parte dos ordenamentos jurídicos nacionais. Isso pelo fato de que os Estados nacionais que participam da OIT se obrigam a respeitar e seguir os princípios da Constituição da OIT ampliados ou reformulados em termos de direitos humanos pela Declaração Relativa aos Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho”. (BARZOTTO, 2007, p. 13).

Pela Declaração em tela, todos os Estados-Membros são submetidos ao respeito, à promoção e à realização dos princípios relativos aos direitos fundamentais. Conforme visto no excerto transcrito anterior, a obrigação também é válida para os Estados que não ratificaram as Convenções em questão, pois tais princípios e direitos fundamentais são enunciados na Constituição e na Declaração de Filadélfia a que aderem os Estados-Membros da OIT.

Prescreve o item 1 da Declaração de 1988, in verbis:

“A Conferência Internacional do Trabalho

1. Lembra:

a) que no momento de incorporar-se livremente à OIT, todos os Membros aceitaram os princípios e direitos enunciados em sua Constituição e na Declaração de Filadélfia, e se comprometeram a esforçar-se por alcançar os objetivos gerais da Organização na medida de suas possibilidades e atendendo a suas condições específicas;

b) que esses princípios e direitos têm sido expressados e desenvolvidos sob a forma de direitos e obrigações específicos em Convenções que foram reconhecidas como fundamentais dentro e fora da Organização.”

Nesta toada, Crivelli (2010, p. 69) ressalta: “O objetivo maior desta Declaração é impulsionar a ratificação das oito Convenções Fundamentais por todos os Estados-Membros”.

A ratificação das oito Convenções Fundamentais do Trabalho é considerada como prioritária, e os Estados-Membros estão, pela Constituição da OIT e pela Declaração de Filadélfia, comprometidos a aplicar os princípios nelas contidos e a mandar relatórios de forma periódica.

Por conseguinte, lembra Candy Thome (2014) que um dos passos para a garantia do trabalho decente é a garantia dos direitos humanos, o que pode se dar mediante a ratificação das Convenções da OIT ou, no mínimo, de suas Convenções Fundamentais, assim consideradas.

Para Gurgel (2010):

“O respeito aos preceitos das Convenções da OIT, em especial as inseridas na Declaração sobre os Princípios e Direitos Fundamentais do Trabalho, compõe o arcabouço jurídico do que se entende por trabalho decente”. (GURGEL, 2010, p. 120).

Sendo assim, as oito Convenções Internacionais que formam o ideal de princípios fundamentais do trabalho dispõem sobre temas que, devido ao status de jus cogens de suas normas, nenhum Estado-Membro pode desconsiderar, por serem essenciais à dignidade da pessoa humana e ao progresso da humanidade.

Ademais:

“Nenhuma das Convenções da OIT incluídas nos princípios e direitos fundamentais do trabalho são normas de aplicação progressiva. Todas gozam de plena eficácia jurídica desde sua entrada em vigor em qualquer ordenamento jurídico”. (GURGEL, 2010, p. 120).

Neste enleio, asseguram Gomes e Vaz (2015):

“No que diz respeito às normas internacionais, principalmente no caso das Convenções da OIT, que preceituam garantias, em determinados instrumentos, direitos e garantias fundamentais, há um ganho imensurável na proteção dos direitos humanos. Implementar os preceitos contidos nas Convenções é a mais visível concretização da dignidade da pessoa humana e de um trabalho decente, este como preceito maior da OIT.” (GOMES; VAZ, 2015, p. 177).

A esta altura, torna-se digna de nota a classificação de Barzotto (2007) para os direitos humanos dos trabalhadores sob três enfoques principais, quais sejam: 1º) como direitos subjetivos; 2º) como necessidades; 3º) como princípios. Cumpre, pois, destacá-los à luz dos direitos humanos dos trabalhadores em âmbito internacional.

Como direitos subjetivos, os direitos humanos dos trabalhadores se traduzem por normas específicas, normas de direitos fundamentais sociais, no interior dos Estados nacionais e pugnam pela sua efetividade e pela sua aplicabilidade. Direitos humanos dos trabalhadores – na esteira da concepção de necessidades – sublinham a urgência de fixação de padrões mínimos de trabalho digno no mundo e enfrentam os aspectos de desenvolvimento econômico das nações. Direitos humanos percebidos como princípios envolvem uma concepção de direitos que – sem perder o caráter obrigatório – permitem a sua aplicação gradual de acordo com a realidade fática de cada ordem jurídica. Pela OIT, foram privilegiados, em determinados períodos históricos, aspectos da dignidade jurídica, econômica e política do trabalhador que se vinculam às concepções de direitos humanos como direitos subjetivos, como necessidades e princípios. Contudo, é irrefutável a importância de se definir que o modelo predominante de direitos humanos está subentendido na Declaração da OIT de 1988.

A Declaração da OIT em comento de 1988 confirma a necessidade de esta Organização promover políticas sociais sólidas, estimular a formação profissional e promover políticas eficazes destinadas à criação de emprego e à participação justa do empregado nas riquezas para o pleno desenvolvimento das suas potencialidades humanas.

A propósito, novamente de acordo com Barzotto (2007):

“A Organização Internacional do Trabalho, ao privilegiar certos grupos de temas de direitos humanos dos trabalhadores e proclamar estes direitos como direitos humanos básicos, enfatizou uma versão universalista de direitos humanos, que, ademais, sempre esteve presente na sua atuação e normatizada em sua Constituição”. (BARZOTTO, 2007, p. 34).

Em tal diapasão, ainda conforme Barzotto (2007), a evolução da concepção da liberdade, da igualdade e da solidariedade, tendo em vista que tais direitos – recentemente consagrados na Declaração da OIT sobre Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho – contemplam todas as gerações de direitos humanos e representam conquistas históricas que devem ser mantidas.

Sendo assim:

“Nem todos os direitos humanos dos trabalhadores se identificam somente com a primeira, segunda ou terceira gerações. Embora sendo uma classificação útil, no prisma histórico, os direitos não se enquadram, em apenas uma ou outra geração. Por exemplo, o trabalho escravo atenta contra a liberdade, a igualdade e a solidariedade, afrontando todas as gerações de direito, apesar de que, num primeiro impulso, pensa-se em relacionar o trabalho escravo com os direitos de liberdade, da primeira geração”. (BARZOTTO, 2007, p. 38).

Cabe colacionar os objetivos contidos na Declaração da OIT sobre os Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho, in verbis:

“[…] Considerando que a criação da OIT procede da convicção de que a justiça social é essencial para garantir uma paz universal e permanente;

Considerando que o crescimento econômico é essencial, mas insuficiente, para assegurar a equidade, o progresso social e a erradicação da pobreza, o que confirma a necessidade de que a OIT promova políticas sociais sólidas, justiça e instituições democráticas;

Considerando, portanto, que a OIT deve hoje, mais do que nunca, mobilizar o conjunto de seus meios de ação normativa, de cooperação técnica e de investigação em todos os âmbitos de sua competência, e em particular no âmbito do emprego, a formação profissional e as condições de trabalho, a fim de que no âmbito de uma estratégia global de desenvolvimento econômico e social, as políticas econômicas e sociais se reforcem mutuamente com vistas à criação de um desenvolvimento sustentável de ampla base;

Considerando que a OIT deveria prestar especial atenção aos problemas de pessoas com necessidades sociais especiais, em particular os desempregados e os trabalhadores migrantes, mobilizar e estimular os esforços nacionais, regionais e internacionais encaminhados à solução de seus problemas, e promover políticas eficazes destinadas à criação de emprego;

Considerando que, com o objetivo de manter o vínculo entre progresso social e crescimento econômico, a garantia dos princípios e direitos fundamentais no trabalho reveste uma importância e um significado especiais ao assegurar aos próprios interessados a possibilidade de reivindicar livremente e em igualdade de oportunidades uma participação justa nas riquezas a cuja criação têm contribuído, assim como a de desenvolver plenamente seu potencial humano;

Considerando que a OIT é a organização internacional com mandato constitucional e o órgão competente para estabelecer Normas Internacionais do Trabalho e ocupar-se das mesmas, e que goza de apoio e reconhecimento universais na promoção dos direitos fundamentais no trabalho como expressão de seus princípios constitucionais;

Considerando que numa situação de crescente interdependência econômica urge reafirmar a permanência dos princípios e direitos fundamentais inscritos na Constituição da Organização, assim como promover sua aplicação universal;” […]

Além do já exposto, Antônio Rodrigues de Freitas Júnior (2014) sublinha que a Declaração de 1988 cuida de disposição declaratória de princípios, ou seja, de uma proclamação de princípios que se consideram, por quaisquer mecanismos, já vigentes e, portanto, aptos à exigibilidade desde sempre.

 No mesmo viés, Patrícia Tuma Martins Bertolin e Fabiana Larissa Kamada (2014) acentuam o fato de a Declaração estabelecer que todos os Estados-Membros da OIT devem respeitar, promover e aplicar os direitos e os princípios nela contidos – havendo ou não ratificado as Convenções referenciadas – por se tratar de valores universais, capazes de proporcionar um padrão mínimo de proteção ao trabalho. A Declaração de 1988 é importante instrumento a ser observado pelos Países-Membros da OIT para ser garantida a dignidade do trabalhador.

Em idêntica perspectiva, Daniel Damásio Borges, citado por Ivan Ervolino e Sandor Ramiro Darn Zapata (2014), reitera o argumento dos autores supracitados sobre esta Declaração ao destacarem a sua importância ou a sua relevância por ela ter identificado um conjunto de direitos, em matéria de trabalho, que todos os Países-Membros da OIT devem respeitar, promover e realizar, independentemente da ratificação das Convenções da OIT, justificados pelos próprios compromissos adotados na Constituição da OIT e na Declaração de Filadélfia, por suas disposições estabelecerem as linhas diretivas da regulamentação internacional do trabalho conforme já apontado por outros

Bertolin e Kamada (2014) também ressaltam que, para a efetivação de todos os princípios elencados na Declaração de 1988, a OIT estabeleceu a necessidade de monitoramento dos avanços alcançados em todo o mundo no tocante às temáticas. Neste sentido, a Organização tem elaborado, de quatro em quatro anos, um relatório global sobre tais temas.

De sua parte, Freitas Júnior (2014, p. 13) assegura que a Declaração de 1988, “representou um divisor de águas na estratégia de regulação do trabalho adotada pela organização desde sua criação em 1919”, por ter proclamado princípios constitutivos de direitos exigíveis prima facie, enunciando, expressamente, um elenco de direitos fundamentais, fazendo a referenciada Declaração ser considerada pioneira, representando um nítido giro estratégico na maneira pela qual a OIT passaria a orientar a sua estratégia regulatória.

É de suma importância frisar, em consonância com Barzotto (2007), que a evolução da concepção da liberdade, da igualdade e da solidariedade também afeta diretamente os direitos humanos dos trabalhadores. Isso acontece, porque tais direitos – consagrados na Declaração da OIT Relativa aos Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho – contemplam todas as gerações de direitos humanos e representam conquistas históricas que devem ser mantidas.

Após tal análise, concorde Barzotto (2007), chega-se à seguinte conclusão:

“Os direitos humanos dos trabalhadores, como conjunto de direitos individuais e sociais, podem ser resumidos numa constante luta pela liberdade e igualdade, que se expressam nas gerações de direitos humanos”. (BARZOTTO, 2007, p. 34).

Husek (2015), em valiosa apreciação do tema, defende que, embora a OIT se preocupe basicamente com as relações de trabalho – porque tais relações impõem grande parte da essência dos relacionamentos sociais – a promoção dos Direitos Humanos – na sua expressão amplamente considerada – é a sua finalidade maior.

Assim sendo, a OIT ultrapassa as suas primitivas fronteiras e influencia todos os tipos de relações – comercial, familiar, empresarial, tributária, penal, civil, administrativa – e cobra dos Estados-Membros a prática de atos administrativos condizentes com o estabelecimento de uma sociedade mais justa. O autor defende que a transformação da sociedade moderna, a ascensão do ser humano e de suas organizações na estrutura social – competindo com o Estado (com os seus braços dentro dos territórios) e com os organismos internacionais na sociedade global – alimenta a tendência normatizadora da OIT.

Husek (2015), brilhantemente, também esclarece que há, por exemplo, uma grande preocupação com as desigualdades, em todos os seus níveis, como revela a informação do Escritório da OIT no Brasil: "Promoção dos Direitos Humanos de Pessoas LGBT no Mundo do Trabalho – construindo a igualdade de oportunidades no mundo do trabalho – combatendo a homo-lesbo-transfobia". Este é um documento que aborda as questões trabalhistas ligadas aos direitos de lésbicas, gays, bissexuais e transgêneros (LGBT) por meio de histórias de vida. Ele é fruto de uma construção conjunta entre organismos internacionais da ONU (PNUD, OIT e UNAIDS) e mais 30 representantes de empregadores, trabalhadores, governos, sindicatos e movimentos sociais ligados aos temas LGBT e HIV/AIDS.

Por conseguinte:

“A OIT estende seus braços a todas as relações e contribui para a mudança de paradigmas e mesmo para a promoção de atores internacionais à dignidade de sujeitos de Direito internacional (o ser humano, as ONGs), ainda que não ostentem a mesma capacidade de atuação dos Estados”. (HUSEK, 2015, p. 109).

Ressalte-se, para além, no escólio de Cássio de Mesquita Barros Júnior, citado por Gunther (2012):

“A Constituição brasileira de 1988 mostra-se coincidente, em várias passagens, com os direitos fundamentais reafirmados no artigo 2º da Declaração de Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho da OIT:

a) a liberdade de associação, art. 5º, XVII;

b) o reconhecimento das convenções e dos acordos coletivos de trabalho,

art. 7º, XXVI;

c) a eliminação de todas as formas de trabalho forçado ou obrigatório, art.

5º, XLVIII, c, quando proíbe a pena de trabalhos forçados;

d) a efetiva abolição do trabalho infantil, art. 6º, ao proteger a infância;

e) a eliminação de qualquer forma de discriminação em matéria de emprego

e de ocupação, art. 7º, XXXII.”  (BARROS JÚNIOR apud GUNTHER, 2012, p. 34).

Na visão de Ervolino e Zapata (2014), o propósito principal deste diploma é impulsionar a ratificação das oito Convenções Fundamentais elencadas pelo Conselho de Administração por todos os Estados-Membros, o que significa estarem todos os princípios fundamentais, que compõem a base normativa da Declaração de 1988, contidos nas oito Convenções.

Como adverte Barzotto (2007):

“A ideia de justiça social não pode ser empobrecida pela ênfase ao desenvolvimento econômico. Assim, forma-se um novo compromisso entre os atores a respeito do mínimo, que são os direitos básicos do trabalhador na realização de um trabalho decente”. (BARZOTTO, 2007, p. 136).

Os Princípios Relativos aos Direitos Fundamentais no Trabalho, que são o objeto das principais Convenções da OIT – reconhecidas como Fundamentais – e cuja ratificação merece prioridade são os seguintes: a) Convenção n. 87, de 1948 – dispõe sobre a liberdade sindical e a proteção do direito de sindicalização; b) Convenção n. 98, de 1949 – dispõe sobre o direito de sindicalização e sobre o reconhecimento efetivo do direito de negociação coletiva; c) Convenção n. 29, de 1930 – dispõe sobre a abolição do trabalho forçado ou obrigatório; d) Convenção n. 105, de 1957 –  dispõe sobre a abolição do trabalho forçado; e) Convenção n. 138, de 1973 – dispõe sobre a idade mínima para a admissão no emprego; f) Convenção n. 182, de 1999 – dispõe sobre a proibição das piores formas de trabalho infantil e a ação imediata para a sua eliminação; g) Convenção n. 100, de 1951 – dispõe sobre o salário igual para trabalho de igual valor entre o homem e a mulher; h) Convenção n. 111, de 1958 – dispõe sobre a discriminação em matéria de emprego e de ocupação.

Cumpre ressaltar, como aponta Andrade (2012), que a Declaração de 1988 não implica desrespeito ao princípio da soberania, haja vista a exigência de seu cumprimento resultar desta mesma soberania – legitimamente exercida no momento em que o Estado se filiou à OIT.

A OIT visa, pois, a adotar uma política social de cooperação e de desenvolvimento social entre todos os sistemas jurídicos nacionais para a melhoria das condições de trabalho – mediante a adoção de normas protetivas sociais universais para os trabalhadores – em virtude do reconhecimento internacional dos Direitos Humanos dos Trabalhadores. Como foi visto, este se dá pela promoção do trabalho decente que, segundo a OIT, pode ser alcançada por meio da síntese de quatro estratégias básicas, quais sejam: 1ª – garantia dos princípios e dos direitos humanos no trabalho; 2ª – criação de melhores empregos e de oportunidades de melhores salários para mulheres e para homens; 3ª – extensão da proteção social; e 4ª – promoção do diálogo social.

CONCLUSÃO

A colimada efetivação dos direitos sociais dos trabalhadores representa importante instrumento de realização dos direitos humanos fundamentais no âmbito das relações de trabalho – sejam eles oriundos da seara internacional, sejam os de natureza constitucional nacional – visto que os mesmos constituem um importante mecanismo para a valorização da cidadania, para a erradicação da pobreza e da marginalização, para a redução das desigualdades sociais e regionais e para o reconhecimento do valor social do trabalho.

Então, é imprescindível perceber – cada vez mais – a urgência da adoção, de um novo paradigma para as relações de trabalho: servir como meio que garanta ao trabalhador uma existência digna.

Por isso, viram-se, nesta oportunidade, os principais fatores que contribuíram para o surgimento da Organização Internacional do Trabalho – OIT – bem como a substancial relevância e as conquistas advindas da Declaração de Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho de 1988. São momentos ou registros históricos e legislativos que vieram a espargir luzes pelo caminho percorrido na direção de ser seguro e sólido o processo de reconhecimento e de efetivação dos direitos humanos dos trabalhadores em âmbito internacional.

Não há que se falar em direitos humanos nem mesmo que se afirmar sua existência real na vida dos seres humanos sem – de fato – as normas internacionais protetivas dos trabalhadores tão bem elaboradas serem – efetivamente – respeitadas e aplicadas, o que requer de todos os obreiros atuantes e vigilantes inseridos nesta empreitada da seara justrabalhista extremada atenção e firme determinação, porquanto tem de ser ainda mais protetiva a sua nobre missão.

 

Referências
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Informações Sobre o Autor

Rúbia Zanotelli de Alvarenga

Doutora e Mestre em Direito do Trabalho pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Professora Adjunta da Universidade Federal Fluminense e membro pesquisadora do Instituto Cesarino Junior. Integrante do grupo de pesquisa da UFF – Direito, Estado, Cidadania e Políticas Públicas. Advogada.


Equipe Âmbito Jurídico

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