REDUCTION OF PENAL MAJORITY AGE AND IT’S (IM)POSSBILITY: CONSTITUTIONAL, POLITICAL AND SOCIAL ANALYSIS
José Antônio Neves Neto[1]
RESUMO
O presente artigo tem por escopo analisar uma hipotética redução da maioridade penal, enfocando se há possibilidade e viabilidade no âmbito jurídico, político e social, confrontando vertentes e propondo estudos comparados, no intuito de chegar-se a um avanço concreto. Apresenta, outrossim, minuciosa diligência quando do exame constitucional, vez que representa majoritária parcela do debate. Demonstra, ainda, a ineficácia estatal em suas políticas públicas, visivelmente no campo preventivo e, igualmente, no repressivo, falhando no cumprimento do poder punitivo. Será abordado, também, o sistema prisional, que influi frontalmente na problemática da ressocialização e, por corolário, na maioridade penal, idem. Ao final, expõem-se as considerações finais, tendo por objetivo esclarecer o estudioso a respeito dos institutos contemplados ao longo do trabalho.
PALAVRAS-CHAVE: Maioridade Penal; Sistema Prisional; Constitucionalidade; Direitos Fundamentais.
ABSTRACT
The present article’s scope is to analyze a hypothetical reduction of the penal legal age, focusing on it’s possibility and viability in the legal, political and social area, confronting different positions and submitting comparisons, aiming an material advance. The article also contains minutious diligence when it comes to the constitutional analysis, considering it represents the majority part of the discussion. It still demonstrates the failure of the state’s public policies, especially in both prevention and repression, showing the fall of the punishment system. The work includes an approach to the prisional system, which interferes directly in the rehabilitation issue, and, therefore, in the legal age, idem. In the end there will be exposed the final considerations, which goal is to make the studious reach the understanding of the institutes contemplated by this work.
KEYWORDS: Penal Majority Age; Prisional System; Constitutionality; Fundamental Rights.
SUMÁRIO: INTRODUÇÃO, 1 A MAIORIDADE PENAL, 2 FUNDAMENTOS PARA MAIORIDADE PENAL, 3 CRITÉRIOS PARA AFERIR A MAIORIDADE PENAL, 3.1 O CRITÉRIO BIOLÓGICO, 3.2 O CRITÉRIO PSICOLÓGICO, 3.3 O CRITÉRIO BIOPSICOLÓGICO, 3.4 O POSICIONAMENTO BRASILEIRO, 4 ANÁLISE POLÍTICA, 5 ANÁLISE CONSTITUCIONAL , 5.1 A MAIORIDADE PENAL: CLÁUSULA PÉTREA, 6 ANÁLISE SOCIAL, 6.1 O SISTEMA PRISIONAL BRASILEIRO, 7 CONSIDERAÇÕES FINAIS, 8 REFERÊNCIAS.
INTRODUÇÃO
O tema da maioridade penal e sua proclamada redução é diuturnamente estudado por toda a sociedade, que se encarrega de defender veemente seus posicionamentos. Mesmo que por um efêmero momento o assunto fique sobrestado, é suficiente a divulgação de crimes chocantes pela mídia para que, rapidamente, se rejuvenesça a contenda.
No entanto, ao revés do que se vê nos discursos prontos, a matéria em objeto não poderia ser pesquisada em seio de “senso comum”, mas sim sob o adequado método científico, com fulcro no ordenamento jurídico e, também, em boa medida, na questão social que circunda a questão.
A grande participação de adolescentes em empreitadas criminosas requer uma análise técnica-procedimental dos institutos correlatos ao tema, notadamente amparados no Direito Constitucional, Penal e Processual Penal, a fim de perquirir-se sobre a viabilidade ou não dos incessáveis projetos que reivindicam a redução da maioridade penal.
É nesse quadro que emerge, efetivamente, a necessidade de novos enfoques de pesquisa. A fúnebre situação pelo qual tem ficado refém a coletividade demanda propostas e soluções que só poderão vir a ser adotadas se tomadas com base em políticas públicas sensatas e pautadas em indispensáveis investigações acerca do assunto.
Nesse cenário de numerosas dissensões e poucas notas explicativas é que ganha forma uma abordagem holística da questão em apreço, sendo lídimo acrescentar: nunca olvidando a axiologia e a teleologia.
A maioridade penal é a idade a partir da qual o indivíduo pode ser processado e julgado através dos procedimentos comuns estabelecidos pelo Ius Puniendi estatal, na esfera penal. Trata-se do marco divisório entre o inimputável e o imputável. É dizer: tem-se por maior aquele no qual o ordenamento jurídico considera plenamente capaz de responsabilização por seus atos, tendo em vista sua presumida aptidão para tanto.
A maioridade penal é fixada tomando-se por base a política criminal, isto é, cada Estado soberano, perante uma análise de política criminal, determina como se marca a maioridade. Importa repisar: cuida-se de conteúdo estipulado e estabelecido por cada Estado-nação, integrando o conceito de direito positivo, vigente. Não existe uma fórmula universal ou preestabelecida para se adotar. Portanto, sendo opção de cada país eleger como se regula a maioridade penal, fundamental compreender que esta varia de local para local, não sendo um conceito imutável. Mirabete esclarece:
O limite para a idade penal é diferente em diversos países. Esse mesmo limite de idade para a imputabilidade penal é consagrado na maioria dos países (Áustria, Dinamarca, Finlândia, França, Colômbia, México, Peru, Uruguai, Equador, Tailândia, Noruega, Holanda, Cuba, Venezuela, etc.). Entretanto, em alguns países podem ser considerados imputáveis jovens menor de idade, como: 17 anos (Grécia, Nova Zelândia, Federação Malásia); 16 anos (Argentina, Birmânia, Filipinas, Espanha, Bélgica, Israel); 15 anos (Índia, Honduras, Egito, Síria, Paraguai, Iraque, Guatemala, Líbano); 14 anos (Alemanha, Haiti); 10 anos (Inglaterra). Algumas nações, porém, ampliam o limite até 21 anos (Suécia, Chile, Ilhas Salomão, etc.). Entretanto, há países em que funcionam tribunas especiais (correcionais), aplicando-se sanções diversas das utilizadas em caso de adultos. (MIRABETE, 2008, p. 214).
No Brasil, a maioridade penal, tal qual a civil, inicia-se aos 18 anos. A previsão legal pode ser encontrada no art. 27 Código Penal[2], bem como no art. 2º do Estatuto da Criança e do Adolescente[3]. Não obstante, é na Constituição Federal de 1988, art. 228, que com mais pujança se assenta a maioridade penal brasileira: são penalmente inimputáveis os menores de 18 anos, sujeitos às normas de legislação especial.
Não se pode olvidar que a esfera penal não se confunde com a cível, tampouco com a administrativa. Uma mesma conduta pode ser considerada infração penal e ser indiferente para o campo cível, como também pode ocorrer de ser relevante para ambos. Precisa é a lição de Igor Luis Pereira e Silva:
Uma determinada conduta pode caracterizar um ilícito civil, administrativo e penal ao mesmo tempo. Nesse caso, não há violação do princípio do ne bis in idem, que estabelece que ninguém poderá ser responsabilizado mais de uma vez pela prática de um determinado crime, pois as instâncias são em princípio independentes. (SILVA, 2012, p. 65).
Evidentemente, regras comportam exceções. Neste sentido, mister ressaltar que há hipóteses em que uma esfera pode interferir na outra, notadamente quando se está diante da área criminal. No Direito penal, caso seja o agente absolvido e fique demonstrada a inexistência do fato ou a negativa de autoria, o agente haverá de ser absolvido, invariavelmente, nas demais esferas que porventura esteja sendo processado.
A explicação é simples: o campo penal constitui a ultima ratio do Estado, que tutela os bens tidos como mais importantes, sendo considerado aquele que só deve ser utilizado quando os outros âmbitos não forem adequados, dada a gravidade do bem jurídico atingido. Em virtude do exposto, o processo penal é muito mais complexo que qualquer outro processo. Exige-se prova mais patente, mais sólida e substancial do que, por exemplo, no âmbito cível. Neste diapasão, na hipótese de pairar qualquer dúvida acerca do crime, deve-se proceder em benefício do réu, como consagrado pelo velho brocardo latino in dubio pro reo. Assim, provada a inexistência do fato ou a negativa de autoria no campo criminal, tendo em vista sua maior complexidade, a absolvição nas demais esferas torna-se imperativa.
Em tudo há uma razão de ser. O marco da maioridade penal funda-se na crença de que a criança em desenvolvimento necessita de tratamento diferenciado, partindo-se do pressuposto de que o procedimento comum (aquele dirigido ao imputável) figura-se inadequado ao ser humano em desenvolvimento. O raciocínio é irrefutavelmente lógico.
Conseguinte, os Estados passaram a procurar definir uma idade em que se presuma capaz o indivíduo, a fim de que possa responder por seus atos. Salutar compreender que os critérios escolhidos diferem entre os ordenamentos jurídicos – não somente nos critérios que verificam a maioridade penal, mas especialmente os variados sistemas jurídicos. Devem, aqui, receber enfoque os dois principais sistemas jurídicos, quais sejam, o civil law (também reconhecido por direito romanístico) e o common law (ou direito costumeiro, jurisprudencial). O Brasil traz em sua origem o suporte no direito romanístico, tendo a lei como principal fonte. Os países costumeiros trazem a jurisprudência e o costume jurídico enraizado como fonte normativa mais proeminente.
Miguel Reale aponto o direito costumeiro em face do romanístico:
Ao lado dessa tradição, que exagera e exacerba o elemento legislativo, temos a tradição dos povos anglo-saxões, nos quais o Direito se revela muito mais pelos usos e costumes e pela jurisprudência do que pelo trabalho abstrato e genérico dos parlamentares. Trata-se, mais propriamente, de um Direito misto, costumeiro e jurisprudencial. Se, na Inglaterra, há necessidade de saber-se o que é lícito em matéria civil ou comercial, não há um Código de Comércio ou Civil que o diga, através de um ato de manifestação legislativa. O Direito é, ao contrário, coordenado e consolidado em precedentes judiciais, isto é, segundo uma série de decisões baseadas em usos e costumes prévios. Já o Direito em vigor nas Nações latinas e latino-americanas, assim como também na restante Europa continental, funda-se, primordialmente, em enunciados normativos elaborados através de órgãos legislativos próprios. (REALE, 1998, p. 142).
E arremata: “temos, pois, dois grandes sistemas de Direito no mundo ocidental, correspondentes a duas experiências culturais distintas, resultante de múltiplos fatores sobretudo de ordem histórica” (REALE, 1998, p. 142).
O progresso do direito brasileiro nos mostra que é profundamente difícil falar-se em sistema puro, como nos tempos que prelecionava o ilustre Miguel Reale. Nos tempos atuais, o avanço jurídico em termos de estudo comparado é nítido, buscando influências nas mais diversas localidades do globo, formando um modelo misto, contemplando uma miríade de heranças externas. É o que adverte Fredie Didier:
O sistema jurídico brasileiro tem uma característica muito peculiar, que não deixa de ser curiosa: temos um direito constitucional de inspiração estadunidense (daí a consagração de uma série de garantias processuais, inclusive, expressamente, do devido processo legal) e um direito infraconstitucional (principalmente o direito privado) inspirado na família romano-germânica (França, Alemanha e Itália, basicamente). Há controle de constitucionalidade difuso (inspirado no judicial review estadunidense) e concentrado (modelo austríaco). Há inúmeras codificações legislativas (civil law) e, ao mesmo tempo, constrói-se um sistema de valorização dos precedentes judiciais extremamente complexo (súmula vinculante, súmula impeditiva, julgamento modelo para causas repetitivas etc.). (DIDIER, 2014, p. 42).
E conclui com a seguinte linha:
O Direito brasileiro, como seu povo, é miscigenado. E isso não é necessariamente ruim. Não há preconceitos jurídicos no Brasil: busca-se inspiração nos mais variados modelos estrangeiros, indistintamente. Um exemplo disso é o sistema de tutela de direitos coletivos: não nos consta que haja em um país de tradição romano-germânica um sistema tão bem desenvolvido e que, depois de quarenta anos, tenha mostrado bons resultados concretos. A experiência jurídica brasileira parece ser única; é um paradigma que precisa ser observado e mais bem estudado. (DIDIER, 2014, p. 43)
Não há como discordar da nova doutrina quando afirma que incabível falar em sistema único/puro. Entretanto, ainda assim, perdura a linha até então advogada, qual seja, a imensa diferença entre os países de origem jurídica distintas, em que pese o passar tempo nos mostrar uma tendência de miscigenação. Em verdade, a tradição jurídica preponderante ainda exerce pujante força sobre o Estado, resultando em cristalina diversidade de posicionamentos. Portanto, Fredie Didier está correto quando informa dos fatores supervenientes, mas a lição de Miguel Reale ainda está em uso, ainda serve como parâmetro.
À vista disso, a maioridade penal adquire diferentes sentidos conforme o sistema jurídico pelo qual se assenta. Nos Estados Unidos, por exemplo, há a possibilidade de um “menor”, isto é, um juvenil, ser julgado como adulto, mediante os ritos comuns do sistema punitivo, desde que o Poder Judiciário entenda que é cabível e adequado ao caso concreto, respaldando-se em jurisprudência consolidada ou mesmo leading cases. Veja-se, por exemplo, o que ocorreu no caso Graham v. Florida. O então juvenil Terrance Jamar Graham, à época com 16 anos, foi condenado à prisão perpétua, após tentativa de roubo em restaurante e, posteriormente, roubo consumado em invasão domiciliar[4]. A condenação vitalícia foi, a posteriori, reformada pela Suprema Corte. No caso em tela alegou-se que a pena perpétua era severíssima e violar-se-ia a oitava emenda. Entrementes, no caso Harmelin v. Michigan, a Suprema Corte americana manteve uma sentença de prisão perpétua por posse de cocaína[5].
É clarividente que não se defende postura semelhante. As respectivas penas representam manifesta agressão aos princípios fundamentais, lembrando que a Constituição da República Federativa do Brasil repele as de caráter eterno, bem como cruel. O que se pretende é provar que a maioridade penal não tem sentido substancial universal, ou seja, não há como discutir como se fosse assunto igualitário em qualquer local. No Brasil, como já é cediço, um menor não será julgado como se maior fosse, sendo irrelevantes os dados do caso concreto, se comprovado que era realmente menor de idade. Daí poder-se dizer que os sistemas jurídicos tradicionais ainda exercem, sim, influência em seus Estados.
Outro ponto precisa ser posto: mesmo inserido no contexto de determinado país, há, ainda, como a maioridade penal ser variável. Tome-se novamente o exemplo dos Estados Unidos. A origem é de qualidade centrípeta, significa dizer, de fora para dentro. Estados autônomos se uniram para formar a Federação. Conseguinte, têm os estados americanos imensa competência para legislar, ao passo que a “União” não se preocupa tanto com políticas locais. No Brasil ocorre o inverso, temos uma origem centrífuga, onde os estados tem competência residual[6].
Assim, os fundamentos para a maioridade penal sofrem inconstâncias em virtude do espaço e tempo em que estão postos. Hodiernamente, a Constituição Federal garante total proteção à criança e ao adolescente, coadunando-se aos preceitos internacionais de respeito à pessoa humana. Nesse sentido existe a previsão do ECA, legislação especial que visa tutelar de forma adequada a criança e o adolescente. Observe-se o inciso V, § 3º do art. 227, CF/88:
(…)
V – obediência aos princípios de brevidade, excepcionalidade e respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento, quando da aplicação de qualquer medida privativa de liberdade; (BRASIL, Constituição, 1988).
Nota-se que, no que diz respeito à tutela do jovem infrator, pouca ênfase recebe a qualidade repressiva do sistema punitivo, prevalecendo o caráter preventivo e com vistas à ressocialização.
São elencados, basicamente, três critérios-pilares para se verificar a imputabilidade, quais sejam: biológico, psicológico e biopsicológico. Impende esclarecer que, neste tópico, a discussão cinge-se no âmbito da imputabilidade referente à maioridade, excluindo-se os aspectos da sanidade mental.
3.1 O CRITÉRIO BIOLÓGICO
Pelo método biológico, adota-se uma idade padrão para ser o marco divisório entre o inimputável e o imputável. Também chamado de critério etiológico, presume-se que, a partir da idade predefinida, o indivíduo é capaz de responder por sua conduta. Desse modo, não há qualquer fase de transição: ou o agente é imputável ou não é.
Não há, aqui, necessidade de qualquer exame ou perícia, sendo necessária tão somente a comprovação (normalmente documental) da data de nascimento, a fim de se aferir se poderá ou não ser responsabilizado por intermédio dos ditames ordinários.
3.2 O CRITÉRIO PSICOLÓGICO
Diferentemente do critério biológico, não há o marco de divisão entre faixa etária. Pelo parâmetro psicológico, levam-se em consideração as condições psíquicas do indivíduo. Busca-se saber o que levou o agente a cometer o crime e se tinha condições ou não de compreender o caráter ilícito de sua conduta. Existe a necessidade categórica de exame, especificamente psiquiátrico, efetuado por profissional habilitado, com vistas a analisar a capacidade de discernimento do indivíduo.
3.3 O CRITÉRIO BIOPSICOLÓGICO
Também reconhecido como critério misto, ganha relevo quando do estudo do desenvolvimento mental do agente, estudando tanto o aspecto psicológico (capacidade de discernimento) como o biológico (idade predefinida).
3.4 O POSICIONAMENTO BRASILEIRO
Em primeiro instante, cumpre dizer que antes de apontar o critério pátrio é preciso reforçar a ideia de que o presente artigo restringe-se ao debate referente à maioridade, não comportando o estudo relacionado ao desenvolvimento mental do agente (doenças mentais etc.), posto que tal distinção fará diferença na prática.
Costuma-se dizer que o Brasil adotou o critério biopsicológico como regra, e o biológico como exceção. A assertiva está correta, desde que inserida em contexto amplo, contemplando a análise do desenvolvimento mental (investigação da sanidade mental do agente). Contudo, no que tange à maioridade penal stricto sensu, o ordenamento jurídico brasileiro optou pelo critério biológico puro, como se depreende do ensinamento de Damásio de Jesus:
O Código Penal adotou o sistema biológico para a maioridade penal, sujeitando os menores de 18 anos à legislação especial (ECA). Cuida-se de presunção absoluta de inimputabilidade. Acatado o critério biológico, não é preciso que, em face da menoridade, o menor seja “inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento”. A menoridade, fator biológico, já é suficiente para criar a inimputabilidade. Não se admite prova em contrário, como ter se casado ou ser um sábio. (JESUS, 2014).
Deveras, o Brasil optou pelo critério puramente biológico, vez que não há qualquer fase de transição. Aos 17 anos é inimputável, aos 18, imputável. Significa dizer: antes de completar os 18 anos reputar-se-á como menor independentemente de circunstâncias outras.
A redução da maioridade penal, seguindo-se com a ideia meramente hipotética de ser bem-vinda, teria de passar, inevitavelmente, pelo crivo do Poder Legislativo. Sim, uma vez ultrapassado o fervoroso embate sobre a viabilidade constitucional de uma redução, e aceitando-se a polêmica possibilidade, o próximo caminho seria através do legislador brasileiro. O Congresso Nacional é que estaria, agora, na incumbência de discutir o projeto. Destarte, não há como dissociar o aspecto político da questão da maioridade penal. A matéria não é integralmente jurídica.
Portando, estar-se-ia adstrito à atuação legiferante. Trata-se de vereda perigosa, pois como é cediço o legislador não costuma ter precisão técnica, sendo guiado, normalmente, pelo bom senso, vez que sua função é eminentemente representativa.
Continuando o raciocínio, não é demais reconhecer que o belo modelo democrático, que visa a atender os anseios do povo, “democracia é o governo do povo, pelo povo e para o povo[7]”, também apresenta uma imperfeição: é que o representante, de algum modo, há de agradar o eleitor, sob pena de não obter sucesso em sua carreira, mesmo que para isso precise agir de forma que sabe ser menos inteligente – afinal, seu trabalho é justamente refletir a voz do cidadão.
É o que se tem observado no cenário brasileiro. Às vistas dos posicionamentos radicais abordados por diversos segmentos da sociedade, o legislador vem sendo verdadeiro porta-voz, transmitindo aquilo que se deseja ouvir. O problema é que o presente tema não pode, jamais, ser assim analisado. Com efeito, trata-se de questão por demasiada complexa, além de importante, que não pode ser deixada ao simples bom senso. Exige-se, francamente, análise técnica.
Não obstante, uma crítica precisa ser feita: o político não pode se contentar em simplesmente reproduzir aquilo que lhe é demandado. O legislador não pode, ou não deveria, ser mero reprodutor. Há em seu mister um dever de alcançar os fins sociais, logo, se o mesmo percebe que as percepções sociais são inconclusas e que deve proceder de outro modo, assim o deve fazer. O eleitor tem o seu voto como uma arma, e se vota em determinado candidato é porque o julga conhecedor dos problemas e embates públicos e da vida política. Portanto, em que pese o dever de prestar contas (sentido conotativo incluído), o representante deve manter-se fiel àquilo que acredita ser melhor para a sociedade.
No que tange ao aspecto político da maioridade penal, conclui-se que não se pode definir como viável ou inviável a redução. A manifestação política é que decidirá, ou seja, é discricionário para o político manifestar seu posicionamento, sendo livre para tanto, devendo ser enfatizado que há a tendência de seguir sua banca de eleitores.
Destarte, dois pontos merecem destaque na análise do campo político: i) a análise mostra que, no campo político, a redução da maioridade penal é aberta; ii) em que pese ser aberta, a vontade política é indispensável para a redução (ou manutenção) da maioridade, vez que eventual projeto passaria pelo crivo do Poder Legislativo.
Tudo o que se passa em um Estado Democrático de Direito necessita passar por uma análise constitucional. Aliás, é das primeiras questões a serem pensadas. Sobre a magnitude do impacto de uma Constituição em determinado ordenamento jurídico, brilhante são as palavras do ministro Gilmar Ferreira Mendes:
O conflito de leis com a Constituição encontrará solução na prevalência desta, justamente por ser a Carta Magna produto do poder constituinte originário, ela própria elevando-se à condição de obra suprema, que inicia o ordenamento jurídico, impondo-se, por isso, ao diploma inferior com ela inconciliável. De acordo com a doutrina clássica, por isso mesmo, o ato contrário à Constituição sofre de nulidade absoluta. (MENDES, 2012, p. 123).
Nas palavras de Hans Kelsen, encontrar-se-ia na Constituição “a ideia de um princípio supremo que determina integralmente o ordenamento estatal e a essência da comunidade constituída por esse ordenamento.” (KELSEN, 1981, p. 152). Uma das mais altas autoridades do Direito Constitucional, José Afonso da Silva, coroa a intelecção:
Nossa Constituição é rígida. Em consequência, é a lei fundamental e suprema do Estado brasileiro. Toda autoridade só nela encontra fundamento e só ela confere poderes e competências governamentais. Nem o governo federal, nem os governos dos Estados, nem os dos Municípios ou do Distrito Federal são soberanos, porque todos são limitados, expressa ou implicitamente, pelas normas positivas daquela lei fundamental. Exercem suas atribuições nos termos nela estabelecidos. Por outro lado, todas as normas que integram a ordenação jurídica nacional só serão válidas se se conformarem com as normas da Constituição Federal. (SILVA, 2013, p. 48).
O que se pretende afirmar é que, seguramente, a Constituição da República de 1988 é o pico mais alto do ordenamento jurídico brasileiro, o vértice superior da célebre pirâmide kelsiana. Logo, tudo aquilo que se queira implementar no Estado há de ter o consentimento, seja expresso ou tácito, da Carta Magna. Nesse diapasão, uma suposta redução da maioridade penal demanda uma análise constitucional, ou seja, uma apreciação fundamentada de compatibilidade entre a dita alteração legislativa e a Constituição Federal, pois, caso entenda-se que a redução seria inconstitucional, tese amplamente defendida por autoridades e considerável parte da doutrina, chegar-se-ia à conclusão de que juridicamente impossível reduzir a maioridade penal. Veja-se, por exemplo, o que disse o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo: “a redução tem sido mal colocada, pois a Constituição tem isso como cláusula pétrea e, portanto, mexer nisso seria inconstitucional”. (CARDOZO, 2013). Rogério Greco, por outro lado, diz o seguinte:
Apesar da inserção no texto de nossa Constituição Federal referente à maioridade penal, tal fato não impede, caso haja vontade política para tanto, de ser levada a efeito tal redução, uma vez que o mencionado art. 228 não se encontra entre aqueles considerados irreformáveis, pois não se amolda ao rol das cláusulas pétreas elencadas nos incisos I a IV, do §4º, do art. 60 da Carta Magna. (GRECO, 2013, p. 391).
Como é de fácil apreensão, existe forte divergência no que diz respeito ao enfoque constitucional da maioridade penal. Não obstante, o centro da questão é comum em ambos os posicionamentos, e gira em torno das cláusulas pétreas. Antes de adentrar nesse mérito, cabe destacar qual inconstitucionalidade está em discussão. Como se sabe, a inconstitucionalidade pode ser material ou formal. Os vícios formais seriam aqueles que traduzem defeito de formação do ato normativo, pela inobservância de princípio de ordem técnica ou procedimental ou pela violação de regras de competência (MENDES, 2012, p. 1108), já os vícios materiais dizem respeito ao próprio conteúdo ou aspecto substantivo do ato, originando-se de um conflito com regras ou princípios estabelecidos na Constituição (MENDES, 2012, p. 1110). O quesito suscitado pela problemática da maioridade penal envolve tão somente a dimensão material, vez que a polêmica é referente a uma agressão substancial ao texto magno, não cabendo falar em inconstitucionalidade formal, que se verifica a posteriori. Agora, pode-se avançar ao centro da controvérsia: as cláusulas pétreas.
5.1 A MAIORIDADE PENAL: CLÁUSULA PÉTREA
Os operadores do direito, como demonstrado alhures, travam uma guerra grega em função do quesito em tela: a maioridade penal – cláusula pétrea ou não? Passemos, assim, a essa diagnose.
As fundamental clauses estão alocadas no art. 60, § 4º da Constituição Federal, que diz o seguinte:
Art. 60, § 4º. Não será objeto de deliberação a proposta tendente a abolir:
I- a forma federativa de Estado;
II- o voto direto, secreto, universal e periódico;
III- a separação dos Poderes;
IV- os direitos e garantias individuais. (BRASIL, Constituição, 1988).
Significa dizer que os elementos contidos nesses quatro incisos não podem ser abolidos, não tendo o legislador (nem ninguém) legitimidade para desfazer-se deles. O único meio para bani-las seria através de uma nova Assembleia Nacional Constituinte, o que, obviamente, não é o caso. A maioridade penal estaria inserida, de acordo com doutrina de escol, no inciso IV, isto é, enquanto um direito fundamental. Ingo Sarlet nos dá uma ideia do que seria um direito fundamental: “ao menos de forma geral, podem ser considerados concretizações das exigências do princípio da dignidade da pessoa humana” (WOLFGANG, 2006).
O art. 5º da Carta Magna consagra um extenso rol de direitos fundamentais, evidenciando uma das maiores conquistas do povo brasileiro. Garantias como vedação ao tribunal de exceção, proibição da tortura e tratamento desumano, inviolabilidade da liberdade, da crença e do domicílio, juiz natural etc., foram alicerçadas na Constituição. Contudo, não se encontra a maioridade penal no art. 5º, como se observa no art. 228 – é este um dos argumentos daqueles que são favoráveis à redução da maioridade penal.
Posto que a proteção da maioridade penal não venha consagrada no rol do art. 5º, poder-se-ia atestar que não se trata, então, de um direito fundamental?
Absolutamente não, o fato de determinado direito não constar não constar no rol dos direitos fundamentais não implica dizer que o mesmo não é direito fundamental. Não se pode olvidar a vontade da Constituição, os seus elementos intrínsecos, sua análise contextual, daí se falar em interpretação conforme a Constituição. Nesse diapasão, nada impede que existam direitos fundamentais não expressos no art. 5º, bastando a anuência da Constituição para que algum direito possa ser classificado como fundamental, vale dizer: é o seu teor como um todo, em toda sua conjuntura, que estabelece um direito como fundamental ou não(…).
Não obstante, para que não restasse qualquer dúvida, a Constituição Federal dispôs, no parágrafo segundo do art. 5º, o seguinte: ‘os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte’. (NEVES NETO, 2014, p. 79).
Isto posto, infere-se que o simples fato de não encontrarmos a maioridade penal no art. 5º não nos permite atestar que a mesma não seja. É de se reconhecer, numa interpretação sistêmica: a maioridade penal é uma proteção especial à criança e ao adolescente e é, de fato, um direito fundamental.
Malgrado a confirmação de que a maioridade penal é sim um direito fundamental e, por conseguinte, cláusula pétrea, não é acertado dizer que a mesma não possa ser reduzida. Soa contraditório, mas não é. É que até mesmo as cláusulas pétreas podem ser modificadas através de uma emenda à Constituição. O que não se permite, sob nenhuma hipótese (tangível), é abolir as cláusulas pétreas, ou atingir seu núcleo essencial. Todo o direito fundamental decorre de um princípio fundamental, que concentra em seu âmago um núcleo essencial, que não pode ser atacado. Fora desse núcleo, entretanto, é possível eventual afastamento da incidência da garantia fundamental. Precisamente, é o que se constata na garantia da maioridade penal, insculpida implicitamente em todo o ordenamento jurídico e expressamente no art. 228 da Constituição. É uma cláusula que não pode ser abolida, logo, é imperioso que exista tratamento distinto entre adolescentes e adultos – não obstante, nada impede que o marco etário seja alterado, desde que se atente aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade.
Portanto, a análise constitucional da maioridade penal nos releva que a questão está sim firmada no seio das cláusulas pétreas, mas também que reduzir a maioridade penal não é proibido pela Constituição. Proíbe-se, na realidade, anular a tutela diferenciada para a criança e o adolescente.
A análise social deve processar-se em toda problemática das ciências humanas. No âmbito da redução da maioridade penal, a análise social sinaliza-se como um dos fatores que mais pode pesar na balança.
O Estado tem mostrado uma tremenda incapacidade de resolver os conflitos que surgem na sociedade, especialmente na prevenção. Observa-se o colapso da educação, que não tem frutificado como deveria, mantendo as desigualdades sociais. As políticas públicas estão em débito com o povo brasileiro. Rogério Greco, com o tato que lhe é peculiar, disserta:
Não há como se falar em existência digna se a pessoa, em virtude da ausência do Estado Social, não tem o que comer ou o que vestir, se não tem um teto onde possa repousar, se não consegue cuidar das doenças que, ao longo de nossa vida, surgem a toda hora. Enfim, há um conjunto de necessidades que, se satisfeitas, tornam a existência humana mais digna. (GRECO, 2014, p. 151).
Neste aflitivo cenário, desponta a criminalidade. Uma gama de pessoas que não possuem meios para se sustentar, sendo completamente ignoradas pelo Estado, findam por recorrer aos meios ilícitos. A sociedade, que vira refém, passa a exigir o Ius Puniendi estatal. Quer-se, a todo custo, punir os jovens infratores. É preciso, todavia, compreender que os infratores são, também, vítimas. A ausência de políticas públicas adequadas contribui, em grande medida, para esse quadro. Ademais, a responsabilidade não é exclusiva dos governantes (nem dos infratores), mas também da própria sociedade. Trata-se do que a doutrina convencionou chamar de teoria da coculpabilidade:
A teoria da coculpabilidade ingressa no mundo do Direito Penal para apontar e evidenciar a parcela de responsabilidade que deve ser atribuída à sociedade quando da prática de determinadas infrações penais pelos seus ‘supostos cidadãos’. Contamos com uma legião de miseráveis que não possuem um teto para se abrigar, morando embaixo de viadutos ou dormindo em praças ou calçadas, que não conseguem emprego, pois o Estado não os preparou ou os qualificou para que pudessem trabalhar, que vivem a mendigar por um prato de comida, que fazem uso da bebida alcoólica para fugir à realidade que lhes é impingida. Quando tais pessoas praticam crimes, devemos apurar e dividir essa responsabilidade com a sociedade. (GRECO, 2013, p. 414)
O presente trabalho não defende a ideia de que os infratores juvenis não têm capacidade de discernimento, pois, como diz Guilherme de Souza Nucci:
Há uma tendência mundial na redução da maioridade penal, pois não mais é crível que os menores de 16 ou 17 anos, por exemplo, não tenham condições de compreender o caráter ilícito do que praticam, tendo em vista que o desenvolvimento mental acompanha, como é natural, a evolução dos tempos, tornando a pessoa mais precocemente preparada para a compreensão integral dos fatos da vida. (NUCCI, 2000, p. 109).
O problema, porém, não é esse. Malgrado os infratores tenham consciência do que fazem, a despeito do que dizem outros, o ponto nevrálgico do assunto é refletido no retorno após a sanção. Tem-se testemunhado que aqueles que são recolhidos ao cárcere têm voltado pior, falhando o Estado na ressocialização.
Há, inegavelmente, muito que se fazer no campo social antes de resumir a redução da maioridade penal à questão puramente legislativa. Não se trata de mero problema legislativo. Encontra sua raiz, outrossim, nas questões sociais. Aprofundando o tema, é hora de analisar um fator que integra a equação da maioridade penal: o sistema prisional brasileiro.
6.1 O SISTEMA PRISIONAL BRASILEIRO
Trata-se de ponto crucial. É erro crasso ignorar o sistema prisional na discussão da maioridade penal, julgando serem temas independentes, quando, na realidade, estão umbilicalmente interligados. É que as condições do cárcere interferem, diretamente, na ressocialização (ou não) do preso.
Cada vez mais a população carcerária cresce e pouca ou nenhuma melhoria na infraestrutura prisional se observa, que fica muito aquém, caracterizando um absurdo superpovoamento.
A LEP (Lei de Execução Penal) diz, nos arts. 85 e 88, respectivamente, que o estabelecimento penal deverá ter lotação compatível com a sua estrutura e finalidade, e que o condenado será alojado em cela individual que conterá dormitório, aparelho sanitário e lavatório, devendo ter condições adequadas para a existência humana e uma área mínima de seis metros quadrados. Não é preciso dizer que os preceitos legais estão sendo violados.
Segundo os dados do Superior Tribunal de Justiça, a população carcerária do Brasil já é a quarta maior do mundo. Torna-se, assim, inviável qualquer ressocialização. Existem na prisão, genuinamente, mestrado e doutorado no crime. Os indivíduos que representam um custo altíssimo para a sociedade não recebem a tutela apropriada, e voltam a praticar infrações cada vez mais graves. Beccaria, ainda no século XVIII, já explicava:
Entre as penalidades e o modo de aplicá-las proporcionalmente aos delitos, é necessário, portanto, escolher os meios que devem provocar no espírito público a impressão a impressão mais eficaz e mais durável e, igualmente, menos cruel no corpo do culpado. (BECCARIA, 2003, p. 49).
Logo, tendo em vista a ausência de qualquer espaço para alojar novas pessoas, bem como a falência da recuperação do preso, apresenta-se como inócua a proposta de reduzir a maioridade penal, posto que não será possível punir o jovem infrator, além de que, punindo-o, retornará ainda pior para a sociedade. Neste contexto é que se clama por uma reformulação geral por parte do Estado, das políticas públicas preventivas (notadamente na educação) e reforma prisional, por um ambiente com estrutura material e pessoal capaz de punir o preso de forma adequada, permitindo que volte com chances de ter vida nova. Sob a ótica da análise do sistema prisional, revela-se totalmente inadequada a redução da maioridade penal.
A partir das análises feitas visualizou-se que a redução da maioridade penal está longe de se restringir a mera alteração legislativa, tratando-se de problemática que envolve uma interdisciplinaridade de fatores. Percebe-se, outrossim, que não se deve mais continuar a referir-se à maioridade como se fosse um conceito estável e universal, posto que adstrito ao direito positivo e ao tempo.
A adoção de um critério puramente biológico, no que diz respeito ao inimputável por idade, é claramente ultrapassada, fazendo-se mister buscar um novo panorama de direito. O modelo comparado também não pareceu adequado, afrontando outros direitos fundamentais, como é o caso dos Estados Unidos e outros países de direito costumeiro. Na verdade, inclina-se, como já defende alguma doutrina de vanguarda, para uma nova ordem, que rompa com os liames das clássicas tradições e correntes puras, apurando o que há de bom e sopesando os valores, de modo a consagrar soluções novas, isentas de radicalismos.
A redução da maioridade penal ganha vulto, notoriamente, em três diferentes análises: política, constitucional e social. O balanço político revelou que não existe qualquer óbice a reduzir a maioridade, pois o Legislativo está livre para apreciar. Não se quer dizer, entretanto, que a visão política não tenha importância – afinal, só por intermédio dela é que se chega à produção de leis. Neste sentido, a aquiescência do Poder Legislativo e Executivo mostra-se obrigatória.
A leitura constitucional, onde impera majoritária fatia da controvérsia, nos aponta que a maioridade penal está protegida constitucionalmente e que é, malgrado divergência oposta, uma cláusula pétrea. Conclui-se, desse modo, que a Constituição Federal determina a tutela diferenciada entre adolescentes e adultos, não se podendo negar essa garantia. No entanto, também se indicou que essas premissas não podem levar a conclusão de que a maioridade penal não pode ser reduzida. Há, interpretando sistematicamente (bem como axiologicamente e teleologicamente) a Constituição, uma permissão para eventual redução, desde que se mantenha a proteção especial à criança e ao adolescente.
Os enfoques político e constitucional mostram que a redução da maioridade penal, embora não pareça adequada, é possível, isto é, não é vedada. É no campo social que se destaca a inviabilidade da redução da maioridade penal. O Estado (e juntamente a sociedade) tem falhado em suas políticas públicas, conseguinte, também na prevenção de crimes. Não fosse suficiente, tem pecado no meio repressivo, submetendo os reclusos a situações nada ressocializadoras, evidenciadas nos presídios brasileiros.
No balanço geral, a redução da maioridade penal é, formalmente, possível. Porém, manifestamente inviável. Portanto, só se poderá começar a pensar numa hipotética redução quando o Estado demonstrar eficácia na solução dos conflitos da sociedade, após uma completa reforma prisional e educacional – neste cenário, sim, poder-se-ia discutir a redução, mas não no atual.
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[1] Advogado, pós-graduando em Direito Penal, Processual Penal e Segurança Pública pelo Centro Universitário de João Pessoa – UNIPÊ.
[2] Art. 27 – Os menores de 18 (dezoito) anos são penalmente inimputáveis, ficando sujeitos às normas estabelecidas na legislação especial.
[3] Art. 2º Considera-se criança, para os efeitos desta Lei, a pessoa até doze anos de idade incompletos, e adolescente aquela entre doze e dezoito anos de idade.
[4] Julgado 130 S. Ct. 2011 (2010).
[5] Julgado 501 U.S. 957, 996 (1991).
[6] Incumbe explicar, para finalidade didática, que a dicotomia centrípeta-centrífuga é oposta nos dois critérios-bases, quais sejam, origem e distribuição.
[7] Expressão idealizada por Abraham Lincoln.
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