Regime jurídico dos contratos administrativos

INTRODUÇÃO

O regime jurídico dos contratos administrativos, ou seja, a forma como estes são tratados pelas normas jurídicas, é identificado por meio da verificação dos princípios que lhe dizem respeito, os quais devem ser extraídos do próprio ordenamento jurídico (SUNDFELD, 1996, p. 135-136).

Indispensável, pois, delimitar, inicialmente, quais as normas básicas do instituto, ou seja, seu fundamento juspositivo.

Feito isso, é possível traçar uma definição de contratos administrativos.

Tendo em vista a presença da Administração nesses contratos, indubitavelmente eles serão atingidos pelos princípios que a regem. Daí a necessidade de analisar os efeitos que referidos princípios tem sobre eles.

Então poderão ser tratadas as normas que regem especificamente a formação, execução, alteração e extinção dos contratos administrativos, e constatar as peculiaridades que lhe dão identidade.

1.Fundamentos Juspositivos dos contrtos administrativos

Antes de mencionar as normas que regem os contratos administrativos, vale mencionar, inicialmente, aquelas que tratam da própria competência para criar tal legislação.

À União, compete privativamente a competência para legislar sobre normas gerais de licitação e contratação, nos termos do inciso XXVII do art. 22 da CR:

Art.22 – Compete privativamente à União legislar sobre:

[…]

XXVII – normas gerais de licitação e contratação, em todas as modalidades, para as administrações públicas diretas, autárquicas e fundacionais da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, obedecido o disposto no art. 37, XXI, e para as empresas públicas e sociedades de economia mista, nos termos do art. 173, § 1º, III;

Essa competência “importa o poder de a União veicular regras mínimas, vinculantes para todas as órbitas federativas, inclusive as integrantes da Administração indireta e outras entidades sob controle do Poder Público” (JUSTEN FILHO, 2000, p. 14).

Com fulcro nessa atribuição, a União editou a Lei n.º 8666/93, conhecida como Lei de Licitações e Contratos Administrativos – LLCA, que foi alterada pelas Leis n.º 8883/94, 9032/95, 9648/98, 9854/99 e 10438/02.

Aos Estados-membros, por meio de lei complementar, pode a União autorizar que legislem sobre questões específicas sobre licitações e contratações administrativas (§ único do art. 22 da CR)

O Distrito-Federal, assim como os Municípios, podem legislar para atender seus interesses peculiares, respeitando as normas gerais (art. 30 e 32 da CR).

2.DEFINIÇÃO DE CONTRATO ADMINISTRATIVO

Envolve grande controvérsia a definição de contrato administrativo, ora se defendendo que somente alguns contratos celebrados pela Administração seriam desta espécie, ora sustentando que qualquer contrato da Administração seria administrativo, ou ainda, que não haveria referido contrato (DI PIETRO, 2001, p. 240; GASPARINI, 2002, p. 523).

O problema todo parece girar em torno de consenso terminológico sobre determinado fenômeno.

A LLCA oferece uma definição, na combinação do caput do art. 1.º com o parágrafo único do art. 2.º, verbis:

Art. 1.º Esta Lei estabelece normas gerais sobre licitações e contratos administrativos pertinentes a obras, serviços, inclusive de publicidade, compras, alienações e locações no âmbito dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.

[…]

Art. 2.º […]

Parágrafo único. Para os fins desta Lei, considera-se contrato todo e qualquer ajuste entre órgãos ou entidades da Administração Pública e particulares, em que haja um acordo de vontades para a formação de vínculo e a estipulação de obrigações recíprocas, seja qual for a denominação utilizada.

Contratos administrativos, como uma subespécie de contratos de direito público interno, nas palavras de MARCELLO CAETANO (2001, p. 579), são aqueles “celebrados entre a Administração e outras pessoas, singulares ou coletivas, para fins administrativos”.

No direito nacional, costuma-se enquadrar os contratos administrativos com espécie do gênero contratos da administração.

A interpretação sistemática demonstra que, sem embargo das opiniões em contrário, o direito positivo considera todos contratos firmados pela Administração Pública como administrativos. Mesmo os chamados “contratos de direito privado” são tratados pela LLCA, por exemplo, no inciso I do § 3.º do art. 62, o que, combinado com o art. 1.º e parágrafo único do art. 2.º, também da LLCA, corrobora a asserção feita.

Justamente nesse dispositivo, há determinação expressa para a aplicação dos artigos 55 e 58 a 61, os quais estipulam prerrogativas nitidamente de direito público.

Nada obstante a controvérsia apresentada, um fato é inegável: a Administração deve figurar no contrato (art. 2.º, Par. Único, LLCA), ainda que por quem lhe faça as vezes (GASPARINI, 2002, p. 526).

Por essa razão, necessário fixar a noção do que seria exatamente a Administração Pública.

3.BREVES CONTORNOS DA ADMINITRAÇÃO PÚBLICA

LUCIA VALLE FIGUEIREDO (2001, p. 34) a identifica como função administrativa, assim definida:

A função administrativa consiste no dever de o Estado, ou de quem aja em seu nome, dar cumprimento fiel, no caso concreto, aos comandos normativos, de maneira geral ou individual, para a realização dos fins públicos, sob regime prevalecente de direito público, por meio de atos e comportamentos controláveis internamente, bem como externamente pelo Legislativo (com o auxílio dos Tribunais de Constas), atos, estes, revisíveis pelo Judiciário.

MARIA SYLVIA ZANELLA DI PIETRO (2003, p. 54), aponta os seguintes sentidos utilizados para a expressão Administração Pública:

a) em sentido subjetivo, formal ou orgânico, ela designa os entes que exercem a atividade administrativa; compreende pessoas jurídicas, órgãos e agentes públicos incumbidos de exercer uma das funções em que se triparte a atividade estatal: a função administrativa;

b) em sentido objetivo, material ou funcional, ela designa a natureza da atividade exercida pelos referidos entes; nesse sentido, a Administração Pública é a própria função administrativa que incumbe, predominantemente, ao Poder Executivo.

Com efeito, a Administração Pública não pode ser identificada com a atividade exercida pelo Poder Executivo, seja porque este não realiza apenas Administração, seja porque os demais poderes também administram (DI PIETRO, 2003, p. 49).

Delineados os contornos da Administração, necessário que se analise os princípios a que está adstrita sua atuação, ante os reflexos que terão nos contratos administrativos.

4.PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E OS CONTRATOS ADMINISTRATIVOS

Tendo ficado assente a imprescindível presença da Administração nos contratos administrativos, é inegável que os princípios que a regem irradiarão seus efeitos aos atos por ela praticados, justificando seu estudo.

Nas palavras de CARLOS ARI SUNDFELD (1996, p. 137), “os princípios são as idéias centrais de um sistema, ao qual dão sentido lógico, harmonioso, racional, permitindo a compreensão de seu modo de organizar-se”.

Partindo-se da Constituição da República, inicialmente, verifica-se, no art. 37, caput, o que segue, verbis:

Art.37 – A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (grifou-se)

Além desses princípios expressos na Constituição da República, a doutrina aponta ainda a supremacia do interesse público sobre o privado (MELLO, 2003, p. 87; MELLO FIGUEIREDO, 2001, p. 65; DI PIETRO, 2003, p. 68; MEDAUAR, 1998, p. 141), a indisponibilidade do interesse público (MEDAUAR, 1998, p.141; FIGUEIREDO, 2001, p. 66), motivação (FIGUEIREDO, 2001, p. 51, DI PIETRO, 2003, p. 82, MELLO, 2003, p. 102), razoabilidade (FIGUEIREDO, 2001, p. 50; DI PIETRO, 2003, p. 80, MELLO, 2003, p.99), proporcionalidade (MELLO, 2003, p. 101), isonomia (FIGUEIREDO, 2001, p. 47), finalidade (MELLO, 2003, p. 97; GASPARINI, 2002, p.13), devido processo legal e ampla defesa (MELLO, 2003, p.105), controle judicial dos atos administrativos (MELLO, 2003, p. 110), responsabilidade do Estado por atos administrativos (MELLO, 2003, p.110), segurança jurídica (MELLO, 2003, p.112).

Nota-se a divergência entre os princípios apontados. Mesmo o sentido que a eles é atribuído varia de autor para autor.

Buscar-se-á, por isso, abranger os pontos de maior consenso.

4.1.LEGALIDADE

A legalidade exige que toda e qualquer atuação da Administração esteja previamente autorizada por lei (MELLO, 2003, p.95).

A vontade da Administração decorre da lei, que a orienta, dirige-a e fixa os limites de suas condutas.

A Administração só faz o que a lei lhe manda fazer.

Note-se a semelhança em relação ao princípio da inércia, que vige no Poder Judiciário. Entretanto, enquanto esse Poder é provocado por um sujeito de direito, a Administração é provocada pela lei.

Nesse passo, todos os contratos administrativos devem estar fundados em prévia autorização legal. Esta se encontra basicamente no plano plurianual, nas diretrizes orçamentárias e nos orçamentos anuais (CR, art. 165), que, por sua vez, devem buscar seu lastro nas competências constitucionalmente atribuídas.

4.2.IMPESSOALIDADE

A impessoalidade está intimamente ligada ao princípio da igualdade (MELLO, 2003, p. 104), uma vez que, para haver tratamento igual, esse não pode ser guiado por interesses subjetivos e pessoais, mas sim pelo interesse público. Mesmo internamente, na relação entre os agentes administrativos, deve haver a impessoalidade (DI PIETRO, 2003, p. 71).

MARCELLO CAETANO (2001, p. 30) apresenta esse entendimento, tratando-o, porém, como inerente à observância da legalidade.

Há ainda outro enfoque acerca da impessoalidade, segundo o qual, os atos administrativos não são imputados à pessoa que os pratica, mas ao cargo, ao órgão e, em última análise, à pessoa política. (SILVA, 1998, p. 645)

Em razão desse princípio, a regra, quando a Administração pretende contratar, é a realização de licitação prévia, conforme art. 2.º da Lei n.º 8666/93, de modo que, por meio de critérios objetivos, se firme o melhor negócio para o erário, ao mesmo passo em que não se escolha o contratante com base em critérios pessoais, como amizade, simpatia etc. (MELLO, 2003, p. 104).

A propósito, o inciso XXI do art. 37 da CR, traz menção expressa nesse sentido.

4.3.MORALIDADE

É certo que a lei e a moral não necessariamente coincidem (FERRAZ JUNIOR, 2003, p.356; KELSEN, 1994, p. 67). Entretanto, enquanto o particular que fere tão-somente a moral pode eventualmente vir a sofrer apenas reprimenda social, a Administração fica sujeita à sanção. Isso decorre da positivação da moral no caput do art. 37 da Constituição da República como ditame a ser por ela seguido.

A moral se extrai dos valores sociais em determinado tempo e lugar, e consiste num conjunto de normas que também regem o comportamento (KELSEN, 1994, p.67, 68, 77, 78), distinguindo-se do direito, contudo, pela característica da coercitividade de que este é dotado. Além disso, o direito é o que se encontra positivado, seja de conteúdo moral ou não, ressumando, assim, a independência da esfera jurídica em relação à moral (KELSEN, 1994, p. 78).

No mundo dos fatos é possível uma conduta da Administração estar em conformidade com determinado mandamento legal, sendo, porém, do ponto de vista da moral, indevido.

Se isso ocorrer, o ordenamento lhe negará validade.

ODETE MEDAUAR (1998, p. 138) oferece um exemplo esclarecedor de ofensa à moralidade, com obediência da lei:

em momento de crise financeira, numa época de redução de mordomias, num período de agravamento de problemas sociais, configura imoralidade efetuar gastos com aquisição de automóveis de luxo para “servir” autoridades, mesmo que tal aquisição revista-se de legalidade.

Essa aquisição de automóveis não será válida juridicamente, pois, enquanto atende a lei isoladamente considerada, viola-a se ampliado o foco de análise.

Também pode ocorrer violação simultânea da legalidade e da moralidade, em razão de em certos pontos haver situações que são abrangidas tanto pela moral, quanto pela lei. Note-se isso no seguinte exemplo: duas empresas contratadas pela Administração para fornecer gêneros alimentícios estão em situação idêntica. Com o advento de um fato imprevisto e extraordinário que repercute violentamente na relação contratual, ambas pleiteiam revisão do ajuste, de modo a manter o equilíbrio econômico-financeiro (art. 37, XXI, CR e art. 65, II, d, da Lei 8666/93). Em resposta, verificando ser caso de concessão, a Administração atende a um pedido, mas rejeita o outro, porque formulado por empresa pertencente a pessoa inimiga do administrador.

Como se vê, houve, com relação ao pedido rejeitado, em primeiro lugar, ofensa à legalidade. Em segundo, não se nega ser imoral tal conduta.

Por fim, note-se que também foi desrespeitado o princípio da impessoalidade e o da igualdade.

4.4.PUBLICIDADE

A publicidade garante a observação dos demais princípios, servindo de eficaz mecanismo de controle. Esse princípio “exige a ampla divulgação dos atos praticados pela Administração Pública, ressalvadas as hipóteses de sigilo previstas em lei.” (FIGUEIREDO, 2003, p. 75)

O agente administrativo, tendo ciência de que seu ato é acessível ao público, tem um peso maior em sua atuação.

De outro lado, caso ocorra alguma falha, os administrados, tomando conhecimento dela em razão da publicidade, tem como promover sua correção.

Nos contratos administrativos, nota-se a aplicação desse princípio, tanto previamente, quando se verifica a necessidade de ampla divulgação do edital de licitação (§ 1.º do art. 40 da Lei 8666/93), abertura de envelopes em ato público (§ 1.º do art. 43 da Lei 8666/93), quanto na sua formação e execução (parágrafo único do art. 61 da Lei n.º 8666/93).

Além do caput do art. 37 da CR, CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO (2003, p. 114) cita ainda, como bases constitucionais do princípio da publicidade o art. 5.º, inc. XXXIII e inc. XXXIV, “b”.

4.5.EFICIÊNCIA

Leciona MARIA SYLVIA DI PIETRO (2003, p. 83):

O princípio da eficiência apresenta, na realidade, dois aspectos: pode ser considerado em relação ao modo de atuação do agente público, do qual se espera o melhor desempenho possível de suas atribuições, para lograr os melhores resultados; e em relação ao modo de organizar, estruturar, disciplinar a Administração Pública, também com o mesmo objetivo de alcançar os melhores resultados na prestação do serviço público.

Esse princípio determina que a Administração almeje a otimização de sua produtividade, ou seja, que cumpra seus misteres, no menor tempo possível, com o menor gasto possível, e com a máxima qualidade possível.

Com relação aos custos, a concorrência garante a obtenção da melhor proposta para a Administração quando esta pretende firmar um contrato.

De outro lado, vale lembrar que também pode ser eleito como critério de seleção a melhor técnica, garantindo assim melhor qualidade do produto ou serviço adquirido.

Mesmo em relação ao tempo de execução do contrato, imaginando-se que se trata de uma obra, pode a Administração, em razão da possibilidade de fiscalizar e aplicar sanções ao contratado, obter o adimplemento no prazo acordado.

4.6.SUPREMACIA DO INTERESSE PÚBLICO

Nas palavras de CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO (2003, p. 87), esse princípio é “pressuposto lógico do convívio social”.

Ressalta referido autor que, estando a Administração adstrita à legalidade, não pode simplesmente, sob o pretexto de uma genérica e abstrata supremacia, cometer atos arbitrários sem uma base legal (2003, p. 88).

Ou seja, a supremacia do interesse público deve estar na lei que fundamenta o agir da Administração.

É nessa linha que, nos contratos administrativos, a ela é permitido, por exemplo, alterá-los ou rescindi-los unilateralmente e, nos casos de serviços essenciais, ocupar provisoriamente bens móveis, imóveis, pessoal e serviços vinculados ao objeto do contrato, na hipótese de acautelar apuração administrativa de faltas contratuais pelo contratado, bem como na hipótese de rescisão (art. 58, incisos I, II e V da Lei 8666/93).

4.7.INDISPONIBILIDADE DO INTERESSE PÚBLICO

Em decorrência desse princípio, a competência conferida à Administração é intransferível, mas apenas delegável (FIGUEIREDO, 2001, p. 66).

ODETE MEDAUAR (1998, p. 141), por outro lado, afirma que, em conseqüência da indisponibilidade, não pode deixar a autoridade de tomar as providências legais, ou mesmo retardar seu cumprimento. Verifica-se aqui nítida ligação ao princípio da legalidade.

Nessa esteira, numa relação contratual, não pode a Administração deixar de aplicar uma sanção ensejada por uma infração cometida pelo contratado, se essa sanção está cominada pela lei.

A autorização legal, mencionada quando foi tratado do princípio da legalidade (1.2.1), é também dever, chamado por CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO de função (2003, p. 88-89).

4.8.MOTIVAÇÃO

Não basta haver previsão legal para que se realize um ato administrativo. Os pressupostos fáticos previstos na lei devem estar presentes.

Assim, quando o Administrador pratica seus atos, deve expor as circunstâncias fáticas para justificar a subsunção à autorização legal (MELLO, 2003, p.102). Com isso, garante-se transparência à Administração Pública, permitindo um melhor controle, inclusive quando de eventual apreciação pelo Poder Judiciário.

Por isso, a título de exemplo, não é suficiente que a Administração apenas aplique a penalidade devida a um descumprimento do contrato, mas deve justificar essa atitude, motivando-a.

4.9.RAZOABILIDADE

Se o cumprimento da lei, na prática, fosse simples atividade mecânica, os seres humanos seriam dispensáveis na atividade Administrativa.

Mesmo nos semáforos são necessárias programações, feitas por humanos, para que permaneçam maior tempo permitindo o tráfego nas vias de maior movimento.

A razoabilidade como princípio é a exigência de medidas adequadas e coerentes.

Lembra CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO (2003, p. 100) que, sem embargo de não se saber, em muitos casos, qual seria a medida ideal, é possível constatar quando certas decisões desbordam o razoável.

Trazendo esses ensinamentos ao campo contratual, note-se o seguinte exemplo: O fato de haver uma previsão legal autorizando a aquisição de 100 toneladas de alimento não significa que deva o Administrador adquiri-las totalmente quando, analisando as circunstâncias fáticas, verifica que apenas 70 já são suficientes e, o restante possa vir a perecer.

A própria Lei 8666/93 autoriza a Administração a fazer acréscimos e supressões do valor inicial do contrato, até 25% em obras, serviços e compras, consoante art. 65, § 1.º.

4.10.PROPORCIONALIDADE

Para CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO (2003, p. 101) a proporcionalidade é faceta da razoabilidade.

ODETE MEDAUAR (1998, 141) engloba esta naquele princípio.

Apesar dessas divergências, concordam no sentido de que a proporcionalidade está relacionada com a intensidade e extensão das medidas tomadas.

Seguindo essa noção, não deve a Administração fazer nem mais nem menos do que o necessário para atingir a finalidade legal. Serve aqui o exemplo dado acima (item 4.9).

4.11.ISONOMIA

Também conhecido como princípio da igualdade (GASPARINI, 2002, p. 18), assegura o tratamento dos iguais de maneira igual, e dos desiguais desigualmente.

Essa igualdade deve ser observada tanto na elaboração das leis, quanto na sua aplicação, conforme preceitua o art. 5.º da CR.

Observa-se a incidência desse princípio no instituto da licitação que garante igualdade aos participantes.

4.12.FINALIDADE

Considerado inerente ao princípio da legalidade por CELSO ANTONIO BANDEIRA DE MELLO, consiste na “aplicação da lei tal como ela é; ou seja, na conformidade de sua razão de ser, do objetivo em vista do qual foi editada.” (2003, 97).

Ferir a finalidade da lei pode gerar abuso de poder (MELLO, 2003, 98), desafiando impetração de mandado de segurança.

Assim, verifica-se não bastar a mera obediência à letra fria da lei, pois a aplicação desta, além de calcada em moralidade, também deve ater-se aos fins a que ela se destina.

Semelhante idéia é prevista no art. 5.º da Lei de Introdução ao Código Civil, que dispõe: “Art. 5.º Na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum.”

Acrescenta DIOGENES GASPARINI (2002, p. 13) que a finalidade buscada deve atingir o interesse público, sem o que se configuraria desvio de finalidade.

Trazendo essas idéias para o âmbito das contratações, verifica-se que a mera autorização legal para a aquisição de certos produtos, por exemplo, não se justifica quando se percebe que não são mais necessários.

4.13.DEVIDO ROCESSO LEGAL E AMPLADEFESA

Dispõe o art. 5.º, incisos LIV e LV da CR, verbis:

Art. 5.º […]

LIV – ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal;

LV – aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes.

Segundo CELSO ANTONIO BANDEIRA DE MELLO (2003, p. 105), é necessário que referidos princípios sejam atendidos antes de a Administração “tomar decisões gravosas a um dado sujeito”.

Nada mais representa do que um freio ao poder extroverso da Administração, equilibrando sua relação com o particular.

Por isso que, nos contratos administrativos, os casos de rescisão contratual devem ser formalmente motivados, “assegurado o contraditório e a ampla defesa”, nos termos do parágrafo único do art. 78.

4.14.AUTOTUTELA

A adstrição da Administração à legalidade importa seu dever de retirar do mundo jurídico os atos inválidos.

Mesmo aqueles atos que, embora legais, sejam inoportunos ou incovenientes, podem ser extintos, porém mediante revogação.

Esse entendimento está sumulado pelo SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL no verbete n.º 473.

Ressalta DIOGENES GASPARINI (2002, p. 17-18) que somente os atos administrativos estão sujeitos à autotutela, de modo que não podem os atos e contratos regidos pelo direito privado serem invalidados ao talante da Administração.

Porém, se a invalidação está restrita aos casos em que haja legalidade, pode, sim, a Administração anular os atos e contratos ilegais, e de ofício.

Terá, entretanto, de se socorrer do Poder Judiciário quando, por exemplo, não houver fundamento legal para rescisão unilateral e de ofício do contrato.

4.15.CONTROLE JUDICIAL DOS ATOS ADMINISTRATIVOS

Corolário da separação constitucional dos poderes, incumbe ao Poder Judiciário o controle da legalidade dos atos do Poder Executivo e do Poder Legislativo.

O princípio do controle judicial é mencionado por CELSO ANTONIO BANDEIRA DE MELLO (2003, p. 110), que lembra a unidade de jurisdição e sua inafastabilidade no direito brasileiro, consoante o art. 5.º XXXV da CR.

4.16.4RESPONSABILIDADE DO ESTADO POR ATOS ADMINISTRATIVOS

De acordo com o art. 37, § 6.º, da CR, o Estado responde objetivamente pelos danos causados por seus agentes, nessa qualidade, ou terceiros prestadores de serviço público.

O mesmo dispositivo constitucional, contudo, assegura ao Poder Público o direito de regresso contra o causador do dano, quando este agiu com dolo ou culpa.

Os reflexos desse princípio nas relações contratuais está em que, se o contratado causar dano a terceiros, poderá o próprio Poder Público ser obrigado a ressarcir os prejuízos, e objetivamente.

4.17.SEGURANÇA JURÍDICA

Lembrado por CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO (2003, p. 112-114) como um dos mais importantes entre os princípios gerais do direito, consiste na previsibilidade das conseqüências jurídicas dos comportamentos sociais, garantindo certa paz e estabilidade nas relações.

Justamente porque o particular prevê que a Administração Pública irá cumprir suas obrigações nas relações contratuais, ele se sente motivado a participar dos certames licitatórios. Sabe ainda que, caso haja inadimplemento por parte da Administração, a lesão de seus direitos poderá ser submetida ao crivo do Judiciário (item 4.14 supra).

4.18 CONTINUIDADE

Na realidade, a continuidade liga-se mais aos serviços públicos, e não à Administração em toda sua atuação.

De qualquer forma, tendo em vista que muitos serviços públicos são prestados por meio de terceiros contratados pela Administração Pública, a menção a esse princípio torna-se relevante.

Decorre o princípio em tela da inafastável constatação de que certas incumbências do Estado são imprescindíveis ao convívio social e, às vezes, à própria integridade das pessoas.

Cite-se, por exemplo, segurança pública, saúde, transporte, combate a incêndios (GASPARINI, 2002, p.15).

O princípio da continuidade, segundo DIOGENES GASPARINI (2002, p. 16), impede, de certa forma, que aquele que contrata com a Administração se utilize da exceção do contrato não cumprido. Obviamente que a LLCA estabelece limites até os quais deve o particular continuar a cumprir suas obrigações independentemente do adimplemento por parte da Administração.

Somente quando ultrapassados referidos limites, abrir-se-ia ao contratado requerer a rescisão contratual ou eventual indenização.

5.REGRAS GERAIS DOS CONTRATOS ADMINISTRATIVOS

Embora regidos por preceitos de direito público, aplicam-se aos contratos administrativos, supletivamente, os princípios da teoria geral dos contratos e as disposições de direito privado, nos termos do art. 54 da Lei 8666/93.

Independentemente de ser dispensada ou inexigida a licitação, haverá vinculação do contrato ao ato que o autorizou bem como à respectiva proposta, conforme se infere dos parágrafos 1.º e 2.º do art. 54 da Lei 8666/93, sob pena de nulidade (JUSTEN FILHO, 2000, p. 506).

A Lei de Licitações estabelece em seu art. 55 cláusulas necessárias aos contratos administrativos. Porém, MARÇAL JUSTEN FILHO (2000, p. 506) entende ser obrigatória a presença apenas das mencionadas nos incisos I, II, III, IV e VII, sendo as demais, ou dispensáveis, ou facultativas, conforme a “natureza e as peculiaridades de cada contrato”.

Deve ser lembrado que, certas cláusulas, ainda que não previstas no contrato, decorrem da lei e, em razão de sua cogência, não podem ser afastadas pela vontade das partes. São implícitas, consoante lição de HELY LOPES MEIRELLES (1996, p. 181).

Uma cláusula mencionada no § 2.º do art. 55, a qual determina que conste no contrato, como foro de eleição, a sede da Administração, é apontada por MARÇAL JUSTEN FILHO (2000, p. 513), como parcialmente inconstitucional, porque restringiria a regra prevista no art. 109, §2.º da CR.

O §3.º do art. 55 demonstra a aplicação do princípio da publicidade e do controle a que está sujeita a Administração ao determinar a comunicação das despesas efetuadas com a discriminação de sua natureza.

Pode a Administração exigir garantia dos contratados, nos termos do art. 56 da LLCA. A exigência da garantia é ato discricionário.

Se fosse obrigatória a exigência de garantia, e se esta fosse de valor considerável, isso poderia prejudicar a própria contratação, ou até inviabilizá-la, uma vez que traria grande encargo para o contratado (JUSTEN FILHO, 2000, p. 515).

Conforme apontado quando tratado do princípio da legalidade, nota-se no art. 57 da LLCA sua aplicação, onde exige vinculação do contrato à autorização orçamentária.

Os traços mais marcantes dos contratos administrativos são arrolados no art. 58 da LLCA, que dispõe, verbis:

Art. 58. O regime jurídico dos contratos administrativos instituído por esta Lei confere à Administração, em relação a eles, a prerrogativa de:

I – modificá-los, unilateralmente, para melhor adequação às finalidades de interesse público, respeitados os direitos do contratado;

II – rescindi-los, unilateralmente, nos casos especificados no inciso I do art. 79 desta Lei;

III – fiscalizar-lhes a execução;

IV – aplicar sanções motivadas pela inexecução total ou parcial do ajuste;

V – nos casos de serviços essenciais, ocupar provisoriamente bens móveis, imóveis, pessoal e serviços vinculados ao objeto do contrato, na hipótese da necessidade de acautelar apuração administrativa de faltas contratuais pelo contratado, bem como na hipótese de rescisão do contrato administrativo.

Sem embargo da posição que a Administração ocupa em relação ao contratado, verificada pelas prerrogativas que detém, o ordenamento, como forma de compensação, estabelece o direito de indenização ao último, a teor do parágrafo único do art. 59 da LLCA, quando houver nulidade contratual.

Outrossim, o equilíbrio-econômico financeiro deve sempre ser mantido, sendo que qualquer alteração que lhe afete deve ser precedida de concordância por parte do contratado.

6.FORMAILIZAÇÃO DOS CONTRATOS ADMINISTRATIVOS

O contrato administrativo é realizado por escrito, exceto nas hipóteses de pequenas compras de pronto pagamento, a teor do parágrafo único do art. 60.

A forma escrita garante a possibilidade de controle dos atos praticados pela Administração (JUSTEN FILHO, 2000, p. 537; MEIRELLES, 1996, p. 177).

Lembra HELY LOPES MEIRELLES (1996, p.177) que “é nulo o contrato administrativo omisso em pontos fundamentais, ou firmado sem licitação quando exigida, ou resultante de licitação irregular ou fraudada no julgamento”.

O parágrafo único do art. 61 retrata mais uma aplicação do princípio da publicidade, como condição indispensável à eficácia do contrato. Novamente esse princípio é observado no art. 63 ao determinar a acessibilidade do processo a qualquer interessado.

Não são em todos os contratos que o instrumento será obrigatório, conforme se infere do art. 62 da LLCA.

O § 3.º do art. 62 mostra um aparente contrasenso ao mencionar, no inciso I, que certos contratos se regem, predominantemente, por preceitos de direito privado, mas, ao mesmo tempo, determina também a aplicação das regras do art. 55 e 58 a 61, que são eminentemente de direito público.

A Administração dispõe de prazo para contratar o vencedor da licitação, que ficará adstrito aos termos de sua proposta. Porém, o prazo para contratar é decadencial, nos termos do art. 64 da LLCA, findo o qual não pode mais a Administração exigir a contratação.

Se o vencedor se recusar a assinar o contrato, poderá sofrer uma série de sanções, abrindo para a Administração a possibilidade de convocar os próximos classificados do certame licitatório, que, se quiserem contratar, deverão sujeitar-se às condições propostas pelo primeiro colocado (art. 64, § 2.º, da LLCA).

7.ALTERAÇÃO DOS CONTRATOS ADMINISTRATIVOS

Conquanto permitida a alteração do contrato, inclusive unilateralmente pela Administração, um preceito de ordem constitucional deve ser observado: a manutenção do equilíbrio econômico-financeiro (art. 37, XXI, CR).

Esse verdadeiro princípio regente dos contratos administrativos vêm expresso do art. 65 da LLCA, que trata da alteração dos contratos.

Art. 65. Os contratos regidos por esta Lei poderão ser alterados, com as devidas justificativas, nos seguintes casos:

[…]

II – por acordo das partes:

[…]

d) para restabelecer a relação que as parte pactuaram inicialmente entre os encargos do contratado e a retribuição da Administração para a justa remuneração da obra, serviço ou fornecimento, objetivando a manutenção do equilíbrio econômico-financeiro inicial do contrato, na hipótese de sobreviverem fatos imprevisíveis, ou previsíveis porém de conseqüências incalculáveis, retardadores ou impeditivos da execução do ajustado, ou ainda, em caso de força maior, caso fortuito ou fato do príncipe, configurando área econômica extraordinária e extracontratual.

Entre outras coisas, esse dispositivo garante que se observe a proibição do enriquecimento ilícito, agora contemplado expressamente no Código Civil, em seu art. 884:

Art. 884. Aquele que, sem justa causa, se enriquecer à custa de outrem, será obrigado a restituir o indevidamente auferido, feita a atualização dos valores monetários.

Além disso, também aqui se verifica o respeito à boa-fé dos contratantes, o qual consta do atual Código Civil, em seu art. 422, devendo ser observado tanto na formação quanto na execução dos contratos.

Esse princípio é de observância obrigatória nos contratos administrativos, seja pela aplicação supletiva do referido dispositivo do diploma civil, por força do art. 54 da LLCA, seja por decorrência do princípio da moralidade administrativa.

Certos fatos supervenientes são de extrema relevância para a relação contratual, razão pela qual a lei os considera para efeito de permitir a alteração contratual.

Segundo HELY LOPES MEIRELLES (1996, p. 204), esses fatos seriam abrangidos pela Teoria da imprevisão:

Quando sobrevêm eventos extraordinários, imprevistos ou imprevisíveis, onerosos, retardadores ou impeditivos da execução do ajustado, a parte atingida fica liberada dos encargos originários e o contrato há que ser revisto ou rescindido, pela aplicação da teoria da imprevisão provinda da cláusula rebus sic stantibus, nos seus desdobramentos de força maior, caso fortuito, fato do príncipe, fato da administração e interferências imprevistas.

Para MARIA SYLVIA ZANELLA DI PIETRO (2003, p. 255), porém, a teoria da imprevisão seria aplicável tão-somente na chamada álea econômica.

Além desta, nas palavras dessa autora, haveria a álea ordinária ou empresarial, sendo o “risco que todo o empresário corre”, o qual, se for previsível, será arcado pelo contratado (2003, p. 255).

Quanto ao fato do príncipe e fato da administração, são enquadrados por MARIA SYLVIA ZANELLA DI PIETRO (2003, p. 256) como álea administrativa, juntamente com demais hipóteses de alteração unilateral por parte da Administração.

Rapidamente, veja-se como são tratados cada um desses institutos, acompanhando, todavia, a lição de HELY LOPES MEIRELLES (1996):

7.1.TEORIA DA IMPREVISÃO 

Nas palavras de HELY LOPES MEIRELLES (1996, p. 205):

A teoria da imprevisão consiste no reconhecimento de que a ocorrência de eventos novos, imprevistos e imprevisíveis pelas partes, autoriza a revisão do contrato, para seu ajustamento às circunstâncias supervenientes. É a moderna aplicação da velha cláusula rebus sic stantibus aos contratos administrativos, à semelhança do que ocorre nas avenças de Direito Privado, quando surgem fatos não cogitados pelos contratantes, criando ônus excessivo para uma das partes, com vantagem desmedida para a outra. Esse desequilíbrio retira a comutatividade do ajuste e impõe a revisão do contrato, para que se possibilite sua execução sem a ruína econômica do particular contratado.

Ressalte-se que, se não fosse aplicada tal teoria, a própria Administração poderia sofrer sérias conseqüências: os concorrentes, sabendo dos riscos a que estariam sujeitos, incluiriam isso no custo de suas propostas, elevando-as consideravelmente. Isso, obviamente, na hipótese de haver algum interessado em contratar com a Administração.

Essa idéia de que certos fatores são pulverizados nos custos do empresário é difundida por FÁBIO ULHOA COELHO (2002, p. 37-46), que a denomina de direito-custo.

7.1.1.FORÇA MAIOR

A força maior é um evento humano, imprevisível e inevitável, que impede absolutamente a execução do contrato (MEIRELLES, 1996, p. 206).

A conseqüência da força maior é a liberação de ambas as partes do cumprimento do contrato (DI PIETRO, 2003, p. 263), ensejando sua rescisão, conforme art. 78, XVII, da LLCA.

7.1.2.CASO FORTUITO

É o evento da natureza, imprevisto e inevitável, que impede absolutamente a execução do contrato (MEIRELLES, 1996, p. 207).

Um extenso período de chuvas torrenciais, como é cediço, impede que muitas obras sejam realizadas.

HELY LOPES MEIRELLES (2001, p.228) salienta que não basta a imprevisibilidade para a caracterização do caso fortuito, mas também a absoluta intransponibilidade do obstáculo surgido.

Como conseqüência deste evento, a LLCA admite a rescisão contratual.

7.1.3.FATO DO PRÍNCIPE

É definido como “toda determinação estatal, geral, imprevista e imprevisível, positiva ou negativa, que onera substancialmente a execução do contrato administrativo” (MEIRELLES, 1996, 207).

CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO (2003, p. 592) refere-se a ele como “agravos econômicos resultantes de medidas tomadas sob titulação jurídica diversa da contratual, isto é, no exercício de outra competência, cujo desempenho vem a ter repercussão direta na economia contratual”.

A criação de determinado tributo, normalmente é citada como exemplo deste instituto.

7.1.4.FATO DA ADMINISTRAÇÃO

Enquanto o fato do príncipe decorre de ato geral, o fato da administração é praticado pela própria contratante e afeta determinado contrato (MEIRELLES, 1996, p. 209).

Pode-se citar, por exemplo, o disposto nos incisos XV e XVI do art. 78 da LLCA, ou seja, quando a Administração atrasa por mais de 90 dias os pagamentos devidos ou quando não deixa disponível área, local ou objeto para a execução do contrato.

7.1.5.iNTERFERÊNCIAS IMPREVISTAS

“São ocorrências materiais não cogitadas pelas partes na celebração do contrato, mas que surgem na sua execução de modo surpreendente e excepcional, dificultando e onerando extraordinariamente o prosseguimento e a conclusão dos trabalhos.” (MEIRELLES, 1996, 210).

Exemplifica MARIA SYLVIA ZANELLA DI PIETRO (2003, p. 263): “é o caso de empreiteiro de obra pública que, no curso da execução do contrato, esbarra em terreno de natureza imprevista que onera ou torna impossível a execução do contrato.”

7.2.OREESTABELECIMENTO DO EQUILÍBRIO ECONÔMICO-FINANCEIRO E O REAJUSTE

Após demonstradas as ocorrências que ensejam a alteração do contrato administrativo, tratar-se-á, agora, do restabelecimento do equilíbrio econômico-financeiro.

Esse restabelecimento independe de previsão contratual (JUSTEN FILHO, 2000, p. 558), pois decorre do princípio da manutenção do equilíbrio econômico-financeiro, corolário da igualdade e da moralidade administrativa.

Um cuidado que deve ser tomado na aplicação do restabelecimento é o princípio da obtenção da proposta mais vantajosa, previsto no art. 3.º da LLCA.

Com efeito, pode ocorrer de ser mais conveniente e vantajoso realizar outra licitação em vez de restabelecer o equilíbrio econômico-financeiro, seja porque o contratado não aceita as condições da Administração, seja porque esta não aceita o pleito daquele.

Ao lado do restabelecimento do equilíbrio econômico-financeiro, existe o “reajuste de preços”, criado pela constatação da impossibilidade de manutenção do contrato com os preços nominais, em razão da notória inflação e seus efeitos (JUSTEN FILHO, 2000, p. 557). O reajuste, porém, exige previsão no edital.

MARÇAL JUSTEN FILHO (2000, p. 558) diferencia o reajuste, que “se baseia em índices setoriais vinculados às elevações inflacionárias quanto a prestações específicas”, da atualização monetária, a qual “se refere aos índices gerais de infração”.

8.EXECUÇÃO DOS CONTRATOS ADMINISTRATIVOS

A execução do contrato administrativo nada mais é do que o cumprimento de suas cláusulas (MEIRELLES, 1996, 186).

Conforme assinalado no tópico 7, também na execução as partes devem observar a boa-fé, seja pela aplicação supletiva do art. 422 do Código Civil, seja pelo que determina o caput do art. 66 da LLCA, que menciona expressamente o dever de as partes cumprirem “fielmente” o contrato.

Na execução do contrato, a LLCA, em seu art. 67, determina a obrigatoriedade de fiscalização por um representante da Administração, ainda que com auxílio de terceiro contratado. De outro lado, por parte do contratado, há a obrigação de manter um preposto no local da execução do serviço, conforme art. 68.

Nota-se a preocupação da lei em garantir a perfeição do serviço prestado ou produto fornecido quando, em seu art. 69, obriga o contratado a reparar às suas expensas quaisquer defeitos presentes, ainda que decorrentes dos materiais utilizados.

Embora o art. 70 da LLCA atribua ao contratado responsabilidade direta por eventuais danos causados a terceiros ou à Administração, decorrentes de dolo ou culpa, ainda que fiscalizado por esta, o fato é que, se o administrado for lesado, poderá acionar diretamente o Poder Público, que é objetivamente responsável, nos termos do § 6.º do art. 37 da Constituição da República.

Com exceção dos encargos previdenciários, em relação aos quais a Administração é solidariamente responsável, os demais são de incumbência exclusiva do contratado, a teor do art. 71 da LLCA. Aqui se encontra um dos motivos de assegurar à Administração o direito de fiscalizar, o qual abrange a tomada de contas a fim de se saber se estão sendo pagos os tributos à Seguridade Social.

A Administração pode admitir que haja subcontratação do objeto do contrato, estabelecendo limites para tanto.

Finda a execução do contrato, a LLCA estabelece solenidades a serem observadas para o recebimento do objeto, como a constatação da adequação do adimplemento contratual. Vale ressaltar que o recebimento não exclui a responsabilidade do contratado pela segurança e solidez da obra ou serviço.

Essas solenidades, todavia, admitem exceção, conforme assinala o art. 74 da LLCA, ou seja, quando se tratar de gêneros perecíveis e alimentação preparada, serviços profissionais, obras e serviços de valor até R$ 80.000,00, desde que não se componham de aparelhos, equipamentos e instalações sujeitos à verificação de funcionamento e produtividade. Nessas hipóteses, o recebimento será feito mediante recibo.

A obediência do objeto do contrato às normas técnicas oficiais é de obrigação do contratado, salvo se o edital dispuser em contrário.

Havendo descompasso entre as estipulações contratuais e o adimplemento, poderá a Administração rejeitar, no todo ou em parte a obra, serviço ou fornecimento executado.

9.DA INEXECUÇÃO E RESCISÃO DOS CONTRATOS ADMINISTRATIVOS

Tendo em vista a obrigatoriedade do fiel cumprimento contratual, a inexecução deste, ainda que parcial, dá ensejo à sua rescisão e, por conseguinte, às sanções aplicáveis, previstas em lei ou regulamento.

A LLCA estabelece taxativamente quais são os motivos para rescisão do contrato, em seu art. 78, o que oferece uma garantia ao contratado. Além disso, um princípio que vem expressamente mencionado no parágrafo único desse art. 78 é a observância do devido processo legal em caso de rescisão contratual.

Vale registrar que JOSÉ TORRES PEREIRA JUNIOR (1994, p. 453) entende ser o elenco do art. 78 “mínimo, não impedindo que o contrato, em cada caso, crie outras hipóteses ensejadoras de rescisão”. Porém, o não cumprimento ou cumprimento irregular de quaisquer cláusulas contratuais enquadram-se nos incisos I e II respectivamente do art. 78 da LLCA, evidenciando a taxatividade.

Das hipóteses arroladas no art. 78, somente as enumeradas nos incisos I a XII e XVII dão ensejo à rescisão por ato unilateral, conforme preceitua o art. 79 da LLCA.

O que têm em comum os demais incisos é o fato de haver um ato da Administração impedindo a execução do contrato, exceto o inciso XVIII, que foi incluído pela Lei nº 9854 de 27.10.99, e visa à proteção do menor, proibindo seu emprego em trabalho noturno ou insalubre e, em qualquer trabalho, caso tenha menos que 16 (dezesseis) anos.

Estipula a LLCA como modalidades de rescisão: por ato unilateral da Administração, por acordo entre as partes e judicial.

A rescisão com base nos incisos XII a XVII do art. 78 pode ensejar indenização do contratado, desde que não seja culpado e tenha comprovado os danos sofridos, tendo direito ainda à devolução da garantia, a pagamentos devidos pela execução até a data da rescisão e ao pagamento do custo da desmobilização.

Como medidas de que pode a Administração fazer uso, em caso de rescisão contratual fundada no inciso I do art. 79 da LLCA, pode-se citar: assunção imediata do objeto do contrato, no estado e local em que se encontrar, por ato próprio da Administração; ocupação e utilização do local, instalações, equipamentos, material e pessoal empregados na execução do contrato, necessários à sua continuidade, na forma do inciso V do art. 58 desta Lei; execução da garantia contratual, para ressarcimento da Administração, e dos valores das multas e indenizações a ela devidos; retenção dos créditos decorrentes do contrato até o limite dos prejuízos causados à Administração.

Além dessas medidas, podem ser aplicadas sanções previstas no contrato e na legislação como, por exemplo, advertência, multa, suspensão temporária de participação em licitação e impedimento de contratar com a Administração e declaração de inidoneidade para licitar ou contratar com a Administração Pública.

Vale mencionar que as penalidades sempre deve ser precedidas do devido processo legal.

Por fim, reitera-se que a ocorrência de eventos imprevisíveis e independentes da vontade das partes, como a força maior e o caso fortuito, por exemplo, ensejam a rescisão e, em princípio, sem ônus para os contratantes, que ficam liberados de suas obrigações.

CONCLUSÃO

O regime jurídico dos contratos administrativo compõe-se, predominantemente, pela Constituição da República e pela Lei n.º 8666/93 e posteriores alterações.

Com base, mormente, nos artigos 1.º e 2.º da Lei 8666/93 é possível delinear o conceito de contrato administrativo, no qual se verifica que a presença da Administração é indispensável.

Corolário dessa sua presença, é a irradiação dos princípios que a regem aos contratos que firma.

Por isso, verificam-se situações peculiares nos contratos administrativos, como, por exemplo, a possibilidade de a Administração rescindir e alterar unilateralmente as cláusulas, bem como impede que o contratado se socorra da exceção do contrato não cumprido.

Nota-se assim a incidência da supremacia e a indisponibilidade do interesse público.

Mas ao lado da instabilização do vínculo por parte da Administração, vale ressaltar que qualquer abalo na relação contratual que acabe por onerar significativamente uma das partes, em razão de eventos alheio a vontade delas (força maior, caso fortuito), ou até decorrente dessa vontade (fato da administração) em certos casos, enseja a revisão do contrato e, às vezes, até sua rescisão. Tudo isso decorre do princípio, constitucionalmente assegurado, da observância do equilíbrio econômico-financeiro.

Dessa forma, evita-se que o contratado tenha que suportar sozinho os encargos decorrentes da supremacia do interesse público, bem como se vela pela observância da boa-fé contratual, decorrente do princípio da moralidade e da aplicação supletiva do direito privado.

 

Referência bibliográfica
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FERRAZ JUNIOR, Tercio Sampaio. Introdução ao estudo do direito: técnica, decisão, dominação. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2003.
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Informações Sobre o Autor

 

Leandro Sarai

 

Advogado Público. Mestre em Direito Político e Econômico e Especialista em Direito Empresarial pela Universidade Presbiteriana Mackenzie

 


 

Equipe Âmbito Jurídico

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