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Relação avoenga e a obrigação de alimentar

Resumo: O presente estudo apresenta uma reflexão sobre a relação avoenga e a obrigação de fornecer alimentos. A pesquisa foi realizada com base em livros, doutrinas e jurisprudência, sendo atualmente assunto bastante questionado.  O objetivo geral compreende investigar quando os avós serão responsabilizados pelo pagamento dos alimentos e em que medida. Nos objetivos específicos verifica a possibilidade do alimentante e a necessidade do alimentado e as possíveis conseqüências. O instituto dos alimentos faz parte do Direito Civil, mas especificamente do Direito de Família. Apresenta um breve relato sobre o Direito de Família, sobre o instituto dos alimentos e suas peculiaridades, sobre os alimentos decorrentes do poder familiar e a obrigação alimentar. No Capítulo III relata sobre a relação avoenga, juntamente com a natureza da responsabilidade, litisconsórcio passivo contra os pais e avós e a complementação dos alimentos pelos avós, com julgados dos Tribunais sobre o assunto.  Desta forma, demonstra até que ponto é possível, frente aos dispositivos legais que regulam o dever alimentar os avós prestarem alimentos aos netos.  

Palavras chave: Direito de família, relação avoenga, alimentos, possibilidade, necessidade.

Abstract: This study presents a reflection on the relationship avoenga and the obligation to provide food. The research was based on books, doctrines and jurisprudence and is currently subject frequently questioned. The overall objective includes investigating when the grandparents be held liable for payment of maintenance and to what extent. In the specific objectives of alimentante verifies the possibility and necessity of the fed and the possible consequences. The institute of food is part of civil law, but specifically of Family Law. Presents a brief report on Family Law, about the institute of food and its peculiarities, on foods under the family power and maintenance. In Chapter III reports on the relationship avoenga, along with the nature of responsibility, liability joinder against parents and grandparents and grandparents complementary foods, with the trial courts on this subject. He demonstrates to what extent it is possible, in the face of legal provisions that regulate food should provide food grandparents to grandchildren.

Keywords: Family law, respect avoenga, food, possibility, necessity.

INTRODUÇÃO

A presente pesquisa tem como objetivo demonstrar a importância da prestação dos alimentos decorrentes do poder familiar e da relação avoenga, tendo como base os princípios da solidariedade familiar e do dever de assistência mútua que deve reinar entre os parentes. Pode-se afirmar que o primeiro direito fundamental do ser humano é o de sobreviver. Todo indivíduo possui direito à subsistência, assegurada pelo próprio trabalho, exercido livremente e preconizado constitucionalmente (Constituição Federativa da República de 1988, artigo 5º, XIII). Quem não possui meios e nem condições básicas de prover à subsistência necessária não pode ser deixado à sua própria sorte. É imposto, então, aos parentes, ou às pessoas ligadas por um vínculo civil, a obrigação de proporcionar-lhe as mínimas condições necessárias para a sobrevivência, não sendo caracterizado como favor ou ato de generosidade, mas sim como uma obrigação judicial descrita em lei.

A obrigação de prestar alimentos, além de um dever moral, é um dever jurídico, permitindo a lei que os parentes exijam uns dos outros os alimentos de que necessitem para a subsistência.

Na linguagem comum, a palavra alimentos diz respeito à alimentação propriamente dita, ao sustento, àquilo que o indivíduo necessita para viver; na acepção jurídica, alimentos, além do sustento, compreende vestuário, habitação, assistência médica e, se o alimentado é menor, despesas com educação.

O atual Código Civil Brasileiro inovou a disposição dos alimentos ao englobar em um único dispositivo legal o dever de prestar alimentos, entre parentes, cônjuges ou companheiros, pretendendo sempre com esses alimentos, para usar a linguagem colhida no artigo 1.694, que todos possam viver de modo compatível com a sua condição social.

A obrigação alimentar resultante do parentesco possui como pressuposto a necessidade do alimentado e a possibilidade do alimentante em fornecê-lo, sendo dever mútuo e recíproco entre os ascendentes e descendentes em virtude do qual, os que possuem recursos financeiros devem conceder alimentos para o sustento dos parentes que não podem prover o sustento pelo seu próprio trabalho.

O dever de alimentar possui natureza diversa da obrigação de sustento, vinculando-se ao poder familiar e aos parentes de pessoas menores e incapazes.

Na solidariedade familiar havida entre pais, filhos menores de dezoito anos e filhos incapazes, os quais se encontram sob o poder familiar, vigora um dever alimentar com característica ilimitada, podendo até ser exigida a venda de bens pessoais dos genitores para assegurar por todas as formas o direito à vida, onde todos os esforços devem ser exercidos pelos mesmos para atender todas as necessidades dos filhos ainda menores e incapazes.

   No direito de alimentar prevalece o interesse da sociedade na proteção e preservação tanto da vida como da família, associando a ordem pública com o princípio constitucional preceituado no artigo 3º, inciso I, da Constituição Federal de 1988, quando aponta ser objetivo construir uma sociedade livre, justa e solidária.

Já no âmbito do relacionamento familiar, havido pela mesma carta política Brasileira como sendo à base da sociedade, a merecer especial proteção do Estado (artigo 226), os componentes de cada grupo familiar carregam o dever da solidariedade alimentar.

 Este trabalho monográfico utilizou o método de pesquisa bibliográfica com coleta de dados condizentes com o tema, sendo estruturado em três capítulos. O primeiro capítulo é dedicado a apresentação do estudo, exemplificando o método, a metodologia e a técnica utilizada.

O segundo capítulo aborda o Direito de Família e um breve histórico do instituto dos alimentos onde é analisado o conceito e a natureza jurídica dos alimentos; o binômio necessidade x possibilidade inclusive a proporcionalidade, reciprocidade, e espécies de alimentos; o poder familiar, onde são apresentados o conceito do poder familiar, o conteúdo, e os alimentos decorrentes do poder familiar; e por último a obrigação alimentar, o conceito, os deveres, os sujeitos da obrigação, a natureza jurídica, as características e pressupostos da obrigação.

E finalmente, o terceiro capítulo que trata sobre a relação avoenga, citando a natureza da responsabilidade, o litisconsórcio passivo contra os pais e avós, a complementação dos alimentos pelos avós, jurisprudência dos Tribunais sobre o assunto e uma breve conclusão sobre a obrigação avoenga em geral.

Objetiva-se com esta pesquisa levar o tema para discussões, fazendo-se com que a sociedade reflita sobre a obrigação alimentar e a responsabilidade dos avós em face dos menores.

I. SITUANDO A PESQUISA

O Direito de Família é um ramo do direito privado conceituado pelo Direito Civil, o qual abrange o título Dos Alimentos. Várias indagações surgem a respeito do tema alimentos, sendo este estudo delimitado à relação avoenga e à obrigação de alimentar.

Sendo o assunto alimentos foco de várias discussões, preceitua o artigo 5º da Constituição Federal Brasileira, a igualdade entre todas as pessoas e a garantia ao direito à vida. O pedido de alimentos é mais corriqueiro de filhos para pais, havendo chamamento dos avós apenas nos casos em que os genitores não possam arcar com as despesas sozinhos ou estejam impossibilitados.

Realizado este comentário, evoca-se a razão desta proposta de pesquisa, visando estimular a consciência da sociedade, revendo conceitos e também a visão assistencialista, com o intuito de fazer nascer a idéia de reflexão para a questão da prática desse ato.

Propõe-se, portanto, o seguinte enunciado: o artigo 1.696, e, sobretudo o artigo 1.697, ambos do Código Civil, embasados no Princípio da Solidariedade Familiar, estabelecem os alimentos originários do vínculo de parentesco e revelam a possibilidade de transferência do pagamento dos alimentos aos progenitores, quando houver a falta dos primeiros obrigados, ou seja, os pais. Assim, até que ponto é possível, frente aos dispositivos legais que regulamentam o dever alimentar, condenar os avós a prestarem alimentos ao neto?

A delimitação da pesquisa realiza-se na cidade de Pato Branco, situada na região Sudoeste do Estado do Paraná, com aproximadamente 64.566  habitantes.

A época do estudo compreende os meses de março a novembro de 2007, sendo assistido pela Orientadora Professora Ludmila Defaci.

Na justificativa, verifica-se a possibilidade da concessão de alimentos pelos avós, diante dos dispositivos legais que regulam o dever familiar.

Entretanto, cumpre ressaltar que a justificativa envolve a identificação com fatos presentes no cotidiano social e forense, pois, conforme cita GONÇALVES, “a prestação alimentícia é exigível no presente e não no futuro, (…) a necessidade que a justifica é, por sua vez, ordinariamente inadiável.” (GONÇALVES, 2002, p. 370).

Para a intenção institucional, o tema é de extrema importância, pois pretende auxiliar na formação cultural de colegas acadêmicos que se interessam pelo assunto, indicando material e fontes utilizadas na pesquisa.

Sob outro âmbito, a justificativa pessoal vem tentar esclarecer pontos obscuros quanto a encontrar meios necessários para solucionar as dúvidas geradas na questão dos alimentos em face dos avós. Como agir diante da criança que necessita deste amparo, originário da relação de parentesco. Como reagir diante de tal situação, sem que a mesma gere possíveis traumas futuros e lembranças que influenciarão na formação do caráter da criança.

Para o meio cientifico em geral, pretende-se levar o tema para discussões, estimulando assim, a repercussão do assunto na sociedade e a consciência acadêmica. Tarefa esta, de estimular a sociedade, a qual exige estudos e pesquisas mais aprofundados, com a pretensão de encontrar respostas, que venham ao encontro com dúvidas existentes.

Assim, na descrição do objetivo geral, busca investigar quando os avós poderão ser responsabilizados pelo pagamento dos alimentos e em que medida.

Nos objetivos específicos, busca analisar em que medida os avós serão condenados a prestarem alimentos aos netos, verificar as possibilidades do alimentante e necessidades do alimentado e a reflexão sobre a relação avoenga e suas possíveis conseqüências.

Como hipótese registra-se a possibilidade que a pesquisa esclareça até que ponto é possível os avós serem obrigados a prestarem alimentos ao neto, confirmando que nem todos os avôs possuem condições de arcar com as despesas do alimentado. Tudo indica que o amor, carinho, o respeito mútuo e a compreensão para com a criança devem prevalecer.

Esclarece a metodologia de pesquisa de natureza não original, pois “lida com trabalhos ou estudos já realizados e são motivo de análise e interpretações do(s) proponente(s) da pesquisa” (RUARO, 2004, p. 16).  

Corrobora com o mesmo entendimento ANDRADE, ao ensinar que:

“É um tipo de pesquisa que dispensa a originalidade, mas não o rigor cientifico. Trata-se de pesquisa fundamentada em trabalhos mais avançados, publicados por autoridades no assunto, e que não se limita á simples cópia de idéias. A análise e interpretação dos fatos e idéias, a utilização de metodologia adequada, bem como o enfoque do tema de um ponto de vista original são qualidades necessárias ao resumo de assunto”. (ANDRADE, 1999, p. 25).

Segundo os objetivos, a pesquisa realiza-se dentro dos parâmetros exploratórios, visando buscar maiores informações sobre o assunto. Neste sentido, RUARO, assim manifesta:

“A pesquisa exploratória é um estudo que tem por finalidade buscar maiores informações sobre determinado assunto, facilitando a delimitação de um tema de trabalho, bem como definir objetivos e/ou formular hipóteses de uma pesquisa. Pode ainda descobrir um novo enfoque para a pesquisa que se tem em mente, visando aproximar o pesquisador do tema de investigação”. (RUARO, 2004, p. 24).

A pesquisa possui caráter exploratório visando realizar a aproximação da sociedade com a realidade. Assim SELLTIZ citado por GIL ensina:

“Estas pesquisas têm como objetivo proporcionar maior familiaridade com o problema, com vistas a torná-lo mais explícito ou construir hipóteses. Pode-se dizer que estas pesquisas têm como objetivo principal o aprimoramento de idéias ou a descoberta de intuições. Seu planejamento é, portanto, bastante flexível, de modo que possibilite a consideração dos mais variados aspectos relativos ao fato estudado. Na maioria dos casos, essas pesquisas envolvem: levantamento bibliográfico, entrevistas com pessoas que tiveram experiências praticas, análise de exemplos que estimulem a compreensão”. (SELLTIZ apud GIL, 1999, p. 63).

Em relação aos procedimentos, os dados coletados são de fontes de papel, abrangendo a pesquisa bibliográfica e também a pesquisa documental, “assim consideradas por terem os dados coletados por meio de material bibliográfico ou documental”. (RUARO, 2004, p. 25).

O método de estudo é a pesquisa bibliográfica, compreendendo toda a bibliografia já tornada pública sobre o tema, tendo como finalidade “colocar o pesquisador em contato direto com tudo o que foi escrito, dito ou filmado sobre determinado assunto”. (MARCONI, 1996, p. 66).

Neste mesmo sentido, para GIL, “a principal vantagem dessa pesquisa reside no fato de permitir ao investigador a cobertura de uma gama de fenômenos muito mais ampla do que aquela que poderia pesquisar diretamente”. (GIL, 1999, p. 65).

O método de abordagem é discutido pelo método dedutivo, diferenciando-se do método indutivo na finalidade de explicar o conteúdo das premissas. Assim, pronuncia LAKATOS (1991, p. 58):

“Diríamos que os argumentos dedutivos ou estão corretos ou incorretos, ou as premissas sustentam de modo completo a conclusão ou, quando a forma é logicamente incorreta, não a sustentam de forma alguma; portanto não há graduações intermediárias”.

O método de procedimento é tratado pelo método monográfico, “constituindo no estudo de profissões, condições, instituições, grupos ou comunidades, com o objetivo de obter generalizações”. (LAKATOS, 1991, p. 83).

Segundo GIL, o procedimento monográfico, “parte do princípio de que o estudo de um caso em profundidade pode ser considerado representativo de muitos outros ou mesmo de todos os casos semelhantes”. (GIL, 1999, p. 35).

Como técnicas de pesquisa, o procedimento utilizado são as técnicas de documentação indireta, subdividindo-se em pesquisa documental e pesquisa bibliográfica, sendo compreendidos como “os procedimentos usados especificamente pela ciência na busca de seus propósitos”. (RUARO, 2004, p. 27).

Sobre a interpretação de dados, a presente pesquisa, é realizada através de uma interpretação dedutiva, objetivando alcançar o êxito esperado.

A disposição de informações realiza-se através de levantamento de informações retiradas de bibliografias, dados, artigos, códigos, equipamentos para digitação disponíveis, sob a orientação da Professora Ludmila Defaci

II. O DIREITO DE FAMÍLIA E A RELAÇÃO COM A OBRIGAÇÃO DE FORNECER ALIMENTOS

2.1 O DIREITO DE FAMÍLIA

O Direito de Família é um ramo do direito privado, com características peculiares, conceituado pelo Direito Civil, onde família são pessoas unidas pelo vinculo conjugal, de parentesco, de afinidade e também as pessoas vinculadas pela adoção. Depois de constituída a família pela associação das pessoas, esta gera múltiplas relações, direitos e deveres, ou seja, “é um círculo dentro do qual se agitam e se movem ações e reações estimuladas por sentimentos e interesses pessoais”. (BEVILAQUA, 2001, P. 34).

Dentre outras instituições de direito público e de direito privado, a família “representa, sem contestação, o núcleo fundamental, a base mais sólida em que repousa toda a organização social”. (MONTEIRO, 2001, p. 01).

No conceito sociológico, coincidente com o Direito Romano, “a família é considerada como o conjunto de pessoas que vivem sob um mesmo teto, sob a autoridade de um titular” (VENOSA, 2003, p. 16).

 Segundo VENOSA, a família num conceito mais restrito, “compreende somente o núcleo formado por pais e filhos que vivem sob o pátrio poder”. Desse modo, deve-se considerar a família em um sentido amplo, “como o conjunto de pessoas unidas por vínculo jurídico de natureza familiar”. (VENOSA, 2003, p. 16).  

Em relação à origem da família, no século XIX, percebe-se que a mesma não é fundada em relações individuais, conforme ensina ENGELS citado por VENOSA:

“As relações sexuais ocorriam em todos os membros que integravam a tribo. Disso decorria que sempre a mãe era conhecida, mas se desconhecia o pai, o que permite afirmar que a família teve de início um caráter matriarcal, porque a criança ficava sempre junto a mãe, que a alimentava e a educava.” (ENGELS apud VENOSA, 2003, p. 17).

Somente com a Revolução Industrial surge a necessidade de um novo modelo de família, “fazendo-se da família a instituição na qual mais se desenvolvem os valores morais, afetivos, espirituais e de assistência recíproca entre seus membros”. (BOSSERT-ZANNONI apud VENOSA, 2003, p. 18).

Atualmente, com a industrialização, a família difere-se dos conceitos estabelecidos antigamente, trazendo inúmeras conseqüências, tais como: a mulher passa a ocupar o mercado de trabalho igualmente ao homem, alcançando os mesmo direitos e deveres; a igualdade entre a família constituída pelo matrimônio e pela união estável, passando a ser aceitas pela legislação e pela sociedade; a possibilidade de novos casamentos de cônjuges separados; a igualdade entre os filhos; os relacionamentos afetivos de pessoas do mesmo sexo; o planejamento familiar; entre outros.

Neste sentido conceitua VENOSA:

“O direito de família estuda, em síntese, as relações das pessoas unidas pelo matrimonio, bem como daqueles que convivem em uniões sem casamento; dos filhos e das relações destes com os pais, da sua proteção por meio da tutela e da proteção dos incapazes por meio da curatela”. (VENOSA, 2003, p. 16).

Não se pode considerar a família como sendo um instituto patrimonial, pois as relações contidas em seu contexto são consideradas secundárias, “pois são absolutamente dependentes da compreensão ética e moral da família”. (VENOSA, 2003, p. 16). Considera-se a família não como sendo titular de diretos, pois titulares de direitos serão sempre seus membros, devendo ser considerada como uma instituição. 

Com o advento do Código Civil de 2002, forma-se uma nova idéia de família, a família nuclear, indo ao encontro do que a Constituição Federal de 1988, em seu artigo 226 e seguintes já estabelecia, sendo os direitos familiares considerados imprescritíveis, irrenunciáveis e personalíssimos. Percebe-se neste ponto o interesse do Estado no posicionamento da família, “pois não se pode conceber nada mais privado, mais profundamente humano do que a família, em cujo seio o homem nasce, vive, ama, sofre e morre”. (VENOSA, 2003, p. 25).

Levando em conta as peculiaridades do Direito de Família, o legislador deve estar atento às alterações legislativas, analisando que o Direito de Família desvincula-se gradativamente do Direito Civil, podendo vir chegar a um Estatuto da Família. (DINIZ, 2004, p. 497).

2.2 DOS ALIMENTOS

2.2.1 Histórico do Instituto dos Alimentos

Em Direito, a palavra alimento compreende tudo o que é necessário à vida, como: sustento, habitação, roupa, educação, lazer, tratamento de moléstia, etc.

Como observa ARRUDA citado por MUJJALI:

“A figura dos alimentos não é recente e constitui um autêntico arquétipo social oriundo do príncipio primário da integração entre os componentes do gregário.” (ARRUDA apud MUJJALI, 2001, p. 9).

Relata a Bíblia Sagrada que os hebreus seguiam o dever de solidariedade entre parentes. No livro de Gênesis, José após apresentar seu pai ao Faraó e instalá-lo no Egito, “forneceu viveres a seu pai, a seus irmãos e a toda sua família, segundo o número de filhos”. (MUJJALI, 2001, p. 9).

A obrigação de alimentar iniciou-se com as relações de patrono e clientela, posteriormente aplicando-se nas relações familiares, fato este comprovado pelo inicio da legislação romana a qual não faz menção à obrigação alimentícia que se origina a relação familiar. Desta forma, atribui-se este fato como característico da família romana, porque nela o vínculo existente entre os familiares é advindo do pátrio poder. Assim, “a própria estrutura da família romana, sob a direção do pater famílias, que tinha sob o seu manto e condução todos os demais membros, os alieni juris, não permitia o reconhecimento dessa obrigação”. (VENOSA, 2003, p. 372).

Já as Ordenações Filipinas seguiram a doutrina romana, consagrando a obrigação de alimentar “somente em relação aos pais, ascendentes, e reciprocamente”. (BEVILAQUA, 2001, p. 371).

Só mais tarde, com o nascimento das normas disciplinadoras do Direito de Família, puderam, então, ser os alimentos reivindicados como direito emergente de relações jurídicas, existentes entre credor e devedor, passando a assumir característica de dever legal, com indiscutível conteúdo de ordem pública.

O pátrio poder passou, após longa construção jurisprudencial e doutrinária, a denominar-se poder familiar, e quanto aos direitos civis, a comunidade de existência entre pai e filho impunha a este o poder absoluto daquele. Os filhos não podiam praticar nenhum ato de cunho patrimonial e portanto, eram totalmente desprovidos de patrimônio. Desta forma, não havia reciprocidade de exigência da obrigação alimentar. 

Segundo CAHALI citado por VENOSA, na época de Justiniano era conhecida uma obrigação recíproca entres os ascendentes e descendentes em linha reta, “que pode ser vista como ponto de partida”. (CAHALI apud VENOSA, 2003, p. 372).

O Código Civil de 1916, no seu texto original, atribui o pátrio poder ao marido, e em sua falta à mulher (art. 380). O direito tem, contudo, passado por enormes transformação a esse propósito. A idéia predominante é que o pátrio poder deixou de ser uma prerrogativa do pai, para se afirmar como a fixação jurídica dos interesses do filho, visando protegê-lo e não beneficiar quem a exerce. A doutrina há muito, aconselha a mudança da designação de pátrio poder para pátrio dever.

Como desdobramento do princípio da isonomia estabelecido no artigo 226, parágrafo 5º, da Constituição Federal, o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069 de 1990) estabelece em seu artigo 21 que “o pátrio poder será exercido igualmente pelo pai e pela mãe”. (ANGHER, 2003, p. 433).

Em decorrência, o que era meramente um dever moral se transformou em obrigação jurídica, e a estrutura familiar adquiriu uma maior importância no transcurso da transformação do dever de alimentar

2.2.2 Conceito de Alimentos

Alimentos, em direito, denomina-se as prestações fornecidas a uma pessoa, denominada alimentado, para que possa atender às necessidades de subsistência, educação, habitação, vestuário e lazer.  A palavra possui conotação muito mais abrangente do que na linguagem vulgar, em que significa o necessário para o sustento.

Trata-se não só do sustento, mas também de vestuário, habitação, assistência médica, lazer, e, em casos que o alimentado for maior de idade, compreenderá educação e formação intelectual.

Segundo o doutrinador ROCHA citado por MUJALLi:

“Por alimentos entendem-se não só as despesas de sustento, – vestuário, habitação, e tratando de moléstias, a que chamam naturais, mas também as da educação e de um tratamento decente, conforme os teres e qualidade das pessoas, a que chamam civis”. (ROCHA apud MUJALLI, 2001, p. 12).

Para RODRIGUES, “alimentos, em direito, denomina-se a prestação fornecida a uma pessoa, em dinheiro ou em espécie, para que possa atender às necessidades da vida”. (RODRIGUES, 2004, p. 418)

 No Direito de Família, os alimentos traduzem todas as coisas necessárias para a conservação da vida do ser humano, ou seja, são as prestações efetuadas pelo alimentante para aqueles que não têm como prover seu sustento por si só. Sendo, portanto, uma obrigação imposta em função de uma causa jurídica.

Quando se fala em alimentos, fala-se no direito de exigi-los e na obrigação de prestá-los, marcando, desse modo, o caráter assistencial do instituto.

Em sendo a obrigação de prestar alimentos de ordem inderrogável por convenção entre as partes, não devem renunciar o direito de alimentos e também não podem fixar um montante definitivo, onde o mesmo jamais poderá ser modificado.

A prestação alimentícia implica a idéia de atualidade, não importando o passado, visto ser a necessidade de alimentos completamente inadiável.

São os alimentos, tanto os chamados alimentos naturais (alimentação, vestuário, habitação) quanto os civis, que, sob outro aspecto, se designam como côngruos – educação, instrução e assistência.

Esclarece que o conceito de alimentos no artigo 1.694 do Código Civil de 2002 compreende os alimentos naturais ou necessários indispensáveis à subsistência, e os civis ou côngruos destinados a manter a qualidade de vida do credor, de acordo com as condições dos envolvidos.

A Constituição Federal de 1988 determina em seu artigo 229 que “os pais tem o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores tem o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade”.

Questiona inicialmente, se teria sido extinta a obrigação alimentar entre os colaterais. A doutrina é unânime ao recepcionar o artigo 1.697 do Código Civil de 2002, ao determinar que “na falta de ascendentes ou descendentes, estende-se aos irmãos, assim germanos, como unilaterais”. Consagra, assim, a reciprocidade alimentar como um direito essencial à vida e á subsistência em todas as idades.

Conforme BEVILAQUA ensina: “Os alimentos são somente devidos, se o alimentário está impossibilitado de prover à sua subsistência, e quando o alimentador possui bens além dos necessários para a sua sustentação”. (BEVILACQUA, 2001, p. 373).  

Também pela relação conjugal e pela união estável existe obrigação alimentar decorrente da mútua assistência, preconizada pelo artigo 1.566, inciso III, do Código Civil. Ostenta, por seu turno, que o parágrafo único do artigo 1.704, com algumas ressalvas, que o consorte responsável pela separação deve ao outro, se deles necessitar, alimentos necessários para sua subsistência.

  Não se pode confundir a obrigação de prestar alimentos com os deveres familiares, pois estes consistem na obrigação de sustento e socorro que um cônjuge tem para com o outro e seus filhos menores, e devem ser cumpridos sem imposição de qualquer norma legal. Enquanto que a obrigação de prestar alimentos significa reciprocidade, e esta somente poderá ser exigida se o alimentante tiver condições de cumpri-la, sem prejudicar seu próprio sustento, conforme disposto no artigo 1.695 do Código Civil:

“Art. 1.695. São devidos os alimentos quando quem os pretende não tem bens suficientes, nem pode prover, pelo seu trabalho, à própria mantença, e aquele, de quem se reclamam, pode fornecê-lo, sem desfalque do necessário ao seu sustento”. (ANGHER, 2003, p. 214).

Portanto, a obrigação de prestar alimentos é decorrente de imposição legal entre pessoas ligadas através do vínculo familiar, e não poderá deixar de ser cumprida, pois não se trata de liberalidade. Esta imposição está sedimentada no princípio da solidariedade familiar e no princípio da preservação da dignidade da pessoa humana, conforme previsto na Constituição Federal, em seu artigo 1º, inciso III.

2.2.3 Natureza jurídica dos Alimentos

Bastante controvérsia surge sobre a natureza jurídica do instituto dos alimentos. Alguns doutrinadores como RUGGIERO, CICU e GIORGIO BO, citados por DINIZ, (DINIZ, 2004, p. 501) consideram os alimentos como sendo um instituto de direto extrapatrimonial, pois a prestação alimentar paga pelo alimentante não irá aumentar o patrimônio do alimentado, indo apenas lhe assegurar o sustento e o direito à vida, direito este, personalíssimo.

Outra parte da doutrina, incluindo os doutrinadores GOMES e DINIZ classificam os alimentos com conteúdo patrimonial e finalidade pessoal, “uma vez que consiste no pagamento periódico de soma de dinheiro ou no fornecimento de remédios e roupas, feito pelo alimentante ao alimentando, havendo, portanto, um credor que pode exigir de determinado devedor uma prestação econômica”. (DINIZ, 2004, p. 501).

2.3 REQUISITOS: BINÔMIO NECESSIDADE X POSSIBILIDADE

Preconiza o artigo 1.694, §1º e o artigo 1.695 do Código Civil Brasileiro, descrevendo a relação do binômio necessidade do alimentado e a possibilidade do alimentante:

“Art. 1694. Podem os parentes, os cônjuges ou companheiros pedir uns aos outros os alimentos de que necessitem para viver de modo compatível com a sua condição social, inclusive para atender às necessidades de sua educação.

§1º. Os alimentos devem ser fixados na proporção das necessidades do reclamante e dos recursos da pessoa obrigada.

Art. 1.695. São devidos os alimentos quando quem os pretende não tem bens suficientes, nem pode prover, pelo seu trabalho, á própria mantença, e aquele, de quem se reclamam, pode fornecê-los, sem desfalque do necessário ao seu sustento.” (ANGHER, 2003, p. 214).

2.3.1 Necessidade do Alimentado

A necessidade do alimentado compreende aqueles casos onde o indivíduo não possui bens suficientes para sua mantença, ou por qualquer fato está impossibilitado de exercer seu trabalho, “por estar doente, inválido, velho, etc”. (DINIZ, 2004, p. 500).

Para MONTEIRO, “se o alimentando se acha em situação de penúria, tem certamente direito de impetrar alimentos, ainda que possa ser responsabilizado pela própria situação de miséria”. (MONTEIRO, 2001, p. 304).

As necessidades pleiteadas são aquelas essenciais para a vida, tomando em consideração a condição social, o grau de instrução, a formação profissional, etc

Entendem LAMARTINE e MUNIZ:

“A propósito dessa situação é corrente tomar em conta: os proventos do trabalho; as rendas de capital; os benefícios sociais, pensões e indenizações, bolsas de estudos; a capacidade de trabalho efetiva e a possibilidade de emprego de acordo com a sua formação e condição (apreciação subjetiva); as previsíveis modificações nem futuro próximo. São estes os elementos que assumem significado quanto ao estado de necessidade do alimentando.” (LAMARTINE; MUNIZ, 1998, p. 67).

Quanto ao estado de necessidade, “o juiz deve tomar em consideração as particulares circunstâncias da pessoa do alimentando: idade, sexo, estado de saúde, formação profissional, situação social, etc”. (LAMARTINE; MUNIZ, 1998, p. 66).

Assim, só pode reclamá-los o indivíduo que não possui recursos ou bens, ou não está em condições de trabalhar para seu próprio sustento.

2.3.2 Possibilidade do Alimentante

O alimentante fica obrigado a cumprir a obrigação alimentar desde que não prejudique seu sustento, devendo ficar comprovada sua capacidade econômica.

Segundo ensina BEVILAQUA, “cessa a obrigação alimentar, quando desaparece a necessidade, ou quando o alimentador não está mais em condições de cumpri-la”. (BEVILAQUA, 2001, p. 374).

Em havendo diminuição na capacidade econômica do alimentante, pode o encargo ser reduzido ou até mesmo ser exonerado da obrigação:

“Se, fixados os alimentos, sobrevêm mudança na fortuna de quem os supre, ou na de quem os recebe, poderá o interessado reclamar do juiz, conforme as circunstâncias, exoneração, redução ou agravação do encargo”. (ESPÍNOLA, 2001, p. 572).

2.3.3 Proporcionalidade e Reciprocidade

A relação entre a proporcionalidade e a reciprocidade deverá ser feita caso a caso, em virtude dos alimentos possuírem características ad necessitatem.

Quanto à proporcionalidade na fixação dos alimentos o valor fixado pode sofrer variações de acordo com as necessidades do alimentado e as possibilidades do alimentante, podendo a parte interessada vir a reclamar, sempre se baseando o magistrado em provas.

Conforme cita DINIZ:

“Imprescindível será que haja proporcionalidade na fixação dos alimentos entre as necessidades do alimentando e os recursos econômicos financeiros do alimentante, sendo que a equação desses dois fatores deverá ser feita, em cada caso concreto, levando-se em conta que a pensão alimentícia será concedida sempre ad necessitatem.” (DINIZ, 1997, p. 358).

Caracteriza a reciprocidade dos alimentos entre os ascendentes, descendentes e colaterais, cônjuges ou companheiros, podendo um reclamar dos outros. Assim, “tais pessoas são, potencialmente, sujeitos ativo e passivo, pois quem pode ser credor também pode ser devedor”. (MUJALLI, 2001, p. 28).

2.3.4 Espécie de Alimentos

Os alimentos classificam-se quanto à sua finalidade, quanto à natureza, quanto à causa jurídica e quanto ao tempo.

Quanto à finalidade subdividem-se em: provisionais, provisórios e definitivos.

Os alimentos provisionais encontram-se previstos no artigo 1.706 do Código Civil, e artigos 852 a 854 do Código de Processo Civil, sendo aqueles que a parte pede liminarmente em cautelares. São fixados pelo magistrado, nos termos da lei processual. 

 Para MUJALLI, “provisionais, são os alimentos relativos ao abastecimento, munição, mantimento, viveres, que se origina do vocábulo provisio”. (MUJALLI, 2001, p. 14).

Já os alimentos provisórios são arbitrados liminarmente em ação própria, e serão devidos até a decisão final. Sobre os alimentos provisórios:

“O artigo 4º da Lei (Lei de Alimentos) atribui a este, o sentido de passageiros, temporários; ou seja, os alimentos suficientes e necessários destinados à subsistência do alimentário, até a decretação definitiva da forma e do valor que deverão ser observados no cumprimento efetivo da obrigação alimentar”. (MUJALLI, 2001, p. 15).

Alimentos definitivos são os de caráter permanente, fixados por sentença homologatória de acordo ou condenatória..

Quanto à natureza subdividem-se em alimentos naturais ou necessários e civis.

 Alimentos naturais são aqueles necessários para a manutenção da vida do alimentado, indispensáveis a sobrevivência, tais como: cura, vestuário, habitação e alimentação.

Alimentos civis são destinados as necessidades intelectuais e morais, bem como recreação. Os alimentos civis “referem-se aos dispositivos de lei, em se tratando de obrigação alimentar legitima, isto é, entre parentes”. (ESPÍNOLA, 2001, p. 568).

Quanto à causa jurídica podem ser: voluntários, ressarcitórios ou legítimos.

Alimentos voluntários são aqueles resultantes de vontade das partes. Já os alimentos ressarcitórios destinam-se a ressarcir dano originário de ato ilícito. Legítimos são os determinados em lei como conseqüência do vinculo de consangüinidade e parentesco.

Quanto ao tempo em que podem ser reclamados, dividem-se em: alimentos atuais, futuros ou pretéritos.

Alimentos atuais podem ser reclamados a partir do momento do ajuizamento do pedido que já esteja instruído com prova pré constituída do direito.

Alimentos futuros decorrem de sentença, e quase sempre são devidos retroativamente à citação, de acordo com a Súmula 277, do Superior Tribunal de Justiça: “Julgada procedente a investigação de paternidade, os alimentos são devidos a partir da citação”.

Alimentos pretéritos são os que antecedem a ação e não são devidos.

2.4 ALIMENTOS DECORRENTES DO PODER FAMILIAR

2.4.1 Conceito de Poder Familiar

Preceitua o artigo 1.630 do Código Civil: “Os filhos estão sujeitos ao poder familiar, enquanto menores”.

Desta forma, poder familiar é o poder concedido a ambos e conjuntamente os genitores, exercido no interesse e proteção da pessoa dos filhos menores.

Conceitua poder familiar o doutrinador ROCHA citado por DINIZ:

“O poder familiar pode ser definido como um conjunto de direitos e obrigações, quanto à pessoa e bens do filho menor não emancipado, exercido, em igualdade de condições, por ambos os pais, para que possam desempenhar os encargos que a norma jurídica lhes impõe, tendo em vista o interesse e a proteção do filho.” (ROCHA apud DINIZ, 2004, p. 475).

Possui o mesmo entendimento FRANÇA, em dizer que “é o complexo de direito e obrigações, que, em virtude do direito positivo, se atribuem ao pai, coadjuvado pela mãe, em relação à pessoa e aos bens dos filhos menores”. (FRANÇA, 1999, p. 321).

Este poder é concedido simultaneamente a ambos os genitores, ou excepcionalmente a um na falta do outro, segundo artigo 1.690, 1ª parte, do Código Civil. É exercido no interesse e proteção da pessoa e dos bens dos filhos menores, “uma vez que todo ser humano, durante sua infância, precisa de alguém que o crie, eduque, ampare, defenda, guarde e cuide de seus interesses, regendo sua pessoa e seus bens”. (DINIZ, 2004, p. 476).

Estabelece o artigo 22 do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº. 8.069/90), sobre o dever de sustento, guarda e educação dos filhos menores:

“Aos pais incumbe o dever de sustento, guarda e educação dos filhos menores, cabendo-lhes ainda, no interesse destes, a obrigação de cumprir as determinações judiciais.”

Em havendo divergência entre os genitores, qualquer um dos pais poderá recorrer ao juiz para solucionar o problema, de acordo com o que discrimina o artigo 1.690, parágrafo único, do Código Civil.

Assim, preceitua o artigo 21 do Estatuto da Criança e do Adolescente:

“O pátrio poder será exercido, em igualdade de condições, pelo pai e pela mãe, na forma do que dispuser a legislação civil, assegurado a qualquer deles o direito de, em caso de discordância, recorrer à autoridade judiciária competente para a solução da divergência”. (ANGHER, 2003, p. 433).

O poder familiar abrange todos os filhos menores, sendo filhos matrimoniais, extramatrimoniais ou adotivos.

Em casos de pais separados, “cinde-se o exercício do poder familiar, dividindo-se as incumbências”. (VENOSA, 2003, p. 359).

Caracteriza-se o poder familiar como sendo de cargo privado, irrenunciável, inalienável, imprescritível e incompatível com a tutela.

2.4.2 Conteúdo do Poder Familiar

Compete aos pais a criação e educação dos filhos menores, proporcionando meios de subsistência e instrução conforme as possibilidades dos genitores. Segundo DINIZ:

“Os pais deverão dirigir a criação e educação dos filhos menores, proporcionando-lhes meios materiais para sua subsistência e instrução, de acordo com suas posses econômicas e condição social, amoldando sua personalidade e dando-lhes boa formação moral e intelectual”. (DINIZ, 2005, p. 1337).

O poder familiar compreende normas com direitos e deveres pertinentes aos pais quanto à pessoa dos filhos menores, conforme artigo 1.634 do Código Civil:

Art. 1.634. Compete aos pais, quanto à pessoa dos filhos menores:

I – dirigir-lhes a criação e educação;

II – tê-los em sua companhia e guarda;

III – conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para casarem;

IV – nomear-lhes tutor por testamento ou documento autêntico, se o outro dos pais não lhe sobreviver, ou o sobrevivo não puder exercer o poder familiar;

V – representá-los, até os dezesseis anos, nos atos da vida civil, e assisti-los, após essa idade, nos atos em que forem partes, suprindo-lhes o consentimento;

VI – reclamá-los de quem ilegalmente os detenha;

VII – exigir que lhes prestem obediência, respeito e os serviços próprios de sua idade e condição”.

O inciso I menciona quanto à criação e a educação dos filhos menores.

O inciso II menciona o direito de guarda, tendo o dever de tê-los em sua companhia e guarda, dirigindo-os a formação, formando a personalidade e o caráter da criança.

O inciso III refere-se ao consentimento dos pais aos filhos menores para o casamento. Este consentimento para casamento corresponde uma faculdade dos pais. Em sendo injusto o consentimento e o filho comprovar através de provas, caberá ao magistrado conceder o consentimento.

Quanto ao inciso IV, havendo morte de um dos genitores, caberá ao outro a nomeação de tutor, por meio de testamento ou documento público.

O inciso V retrata a representação nos atos civis até os dezesseis anos e após esta idade a assistência nos atos em que for parte. Convém citar VENOSA em relação às nulidades dos atos: “Ato praticado por menor absolutamente incapaz sem representação é nulo; ato praticamente por menor relativamente incapaz sem assistência é anulável”. (VENOSA, 2003, p. 361).

Já o inciso VI trata sobre o dever dos pais de reclamar os filhos de quem os detenha ilegalmente. Isto geralmente ocorre nos casos em que os pais encontram-se separados, fazendo-se necessário utilizar-se da ação de busca e apreensão, objetivando a liminar para buscar o menor.

Quanto ao inciso VII, trata sobre a exigência de obediência, respeito e sobre a prestação de serviço compatível com a idade por parte do filho menor.

2.4.3 Alimentos no Poder Familiar

De acordo com o artigo 1.690 do Código Civil, o poder familiar é exercido conjuntamente pelos pais, quanto à pessoa e bens dos filhos menores e não emancipados.

O artigo 1.634, inciso I, do Código Civil preceitua que compete aos pais, quanto à pessoa dos filhos menores, dirigirem-lhes a criação e educação.

Assim, a obrigação alimentar no poder familiar é indivisível, devida conjuntamente pelos genitores aos filhos, devendo os pais proporcionar os meios de subsistência necessários para a vida.

2.5 OBRIGAÇÃO ALIMENTAR

Anteriormente considerada como um dever moral é através do Direito Romano que a obrigação alimentar constitui-se uma obrigação jurídica derivada do vinculo do parentesco, disciplinada pelo legislador. (MUJALLI, 2001, p. 17).

2.5.1 Conceito

O direito à prestação de alimentos é recíproco entre pais e filhos, e extensivo a todos os ascendentes, recaindo a obrigação nos mais próximos em grau, uns em falta dos outros, de acordo com o artigo 1.696 do Código Civil.

Segundo BEVILAQUA, “a obrigação de prestar alimentos, pode ainda, derivar também do contrato do testamento e do ato ilícito”. (BEVILAQUA, 2001, p. 378)

Logo, podem os filhos exigir alimentos dos pais e vice-versa, ou seja, a obrigação alimentar é recíproca. É também a obrigação extensiva a todos os ascendentes recaindo nos de grau mais próximo.

Portanto, MUJALLI cita:

“A obrigação de prestar alimentos decorre de diversos fatos e acontecimentos, entre eles, a obrigação constitucional de prover alimentos aos parentes que dele venham a necessitar, em decorrência, de separação judicial, alimentos para sustento de filhos, e ainda, em virtude de responsabilidade por ato ilícito”. (MUJALLI, 2001, p. 18).

Desta forma, o direito à prestação alimentícia é recíproco e extensivo entre parentes; na falta dos ascendentes caberá a obrigação aos descendentes, e faltando estes aos irmãos germanos e também aos unilaterais.

São devidos os alimentos quando a pessoa não consegue provê-los pelo seu próprio trabalho, e a pessoa de quem os reclama possui plenas condições para isto, sem que prejudique sua subsistência.

Os alimentos deverão ser fixados de acordo com as necessidades do alimentado e as possibilidades do alimentante. Em ocorrendo mudança no estado de fortuna de qualquer uma das partes, cabe reclamação dirigida ao magistrado, mediante a comprovação do fato ocorrido.

2.5.2 O Dever de Alimentar

Segundo o Código Civil Brasileiro, dos artigos 1.694 a 1.710, juntamente com a doutrina, existem duas modalidades de obrigações entre ascendentes e descendentes: a primeira originária do poder familiar dos genitores sobre os filhos menores de idade, sendo a necessidade desta presumida; e a segunda, resultante do vínculo de parentesco dos indivíduos em linha reta, ou seja, dos filhos maiores.

Para o doutrinador MUJALLI:

“O que diz respeito ao dever pensional vinculado à relação de parentesco, (parental) este, deverá ser dimensionado entre os parentes de graus distantes, como avós e irmãos, sobre os quais pesa igualmente um dever de solidariedade, no entanto, sem lhes impor sacrifícios, pois atrelados à assistência nos limites das forças de seus recursos”. (MUJALLI, 2001, p. 25).

O dever de alimentar é decorrente do poder natural dos pais sobre a prole, deveres estes tanto morais quanto materiais. Significa proporcionar aos filhos alimentação, educação, habitação, vestuário, lazer, etc.

Em atingindo o filho a maioridade civil cessa essa obrigação. Entretanto, unânime está sendo para a doutrina e para a jurisprudência o fato de que a maioridade civil não cessa o dever alimentar dos genitores nas situações em que o filho freqüenta curso superior e não exerça atividade que garanta sua própria subsistência.

2.5.3 Sujeitos da Obrigação

Estão sujeitos a prestar alimentos: os pais e os filhos; os ascendentes na ordem de proximidade; os descendentes na ordem de sucessão e os irmãos germanos e unilaterais.

Conforme preceitua o artigo 1.697 do Código Civil: “Na falta dos ascendentes cabe a obrigação aos descendentes, guardada a ordem de sucessão e, faltando estes, aos irmãos, assim germanos como unilaterais”.

A obrigação de alimentar entre parentes da linha reta é recíproca, entre pais e filhos maiores, menores ou emancipados, casados ou solteiros, não havendo discriminação entre os filhos havidos fora do casamento ou ilegítimos.

Para LAMARTINE e MUNIZ, a obrigação na linha reta, não conhece limites de grau. “Entre os diferentes devedores de alimentos há uma hierarquia em função da proximidade do grau: a obrigação é sucessiva”. (LAMARTINE; MUNIZ, 1998, p. 60).

Desta forma, são primeiramente chamados a prestar alimentos os parentes em linha reta. Assim, podendo o pai prestar alimentos não se acionará o avô.

Caracteriza-se esta obrigação como sendo subsidiária e sucessiva. Quem necessitar de alimentos deverá pedir inicialmente aos genitores, na falta destes aos avós paternos e maternos, na ausência aos bisavós, e sucessivamente,

Segundo DINIZ: “existindo ascendentes de grau mais próximo, o de grau mais remoto liberar-se-á da obrigação alimentar”. (DINIZ, 2005, p. 1388).

Com relação à prestação de alimentos por irmãos, estes cumprirão a obrigação de acordo com as possibilidades de seus haveres. Não pode a obrigação alimentar ultrapassar a linha colateral de segundo grau, “logo, tio não deve alimentos ao sobrinho, nem primos devem-se reciprocamente; consequentemente excluídos estarão os afins”. (DINIZ, 2005, p. 1389).

Porém, não pode o alimentado eleger a pessoa a prestar-lhe alimentos, cabendo isto ao grau de sucessão.

2.5.4 Natureza jurídica da obrigação

São os alimentos providos de uma determinação legal, de um contrato, de um testamento ou de um ato ilícito, todas reguladas pelo Código Civil.

A obrigação de alimentar determinada na lei encontra-se regulamentada pelo Direito de Família. Já a obrigação alimentar descrita em contrato é regida pelo Direito das Obrigações. A prestação alimentar originária de testamento é regulamentada no Direito das Sucessões. E sendo originária de ato ilícito é regulada pelo Código Civil.

2.5.5 Características

As características da obrigação alimentar, de acordo com a doutrinadora DINIZ, são: condicionalidade, mutabilidade do montante da pensão alimentícia, reciprocidade e periodicidade.

Em se tratando da condicionalidade, observa que fica condicionada a relação obrigacional aos pressupostos legais. Em havendo falta de alguns dos pressupostos encerra a obrigação alimentar.

O quantum da prestação alimentícia é fixado pelo magistrado, podendo sofrer alteração do valor em qualquer momento, desde que devidamente comprovada a necessidade e/ou a possibilidade, de acordo com cada caso. Estas alterações são questionadas mediante ação revisional ou de modificação perante o juízo que fixou a obrigação.

Esclarece DINIZ:

“As decisões que fixam alimentos trazem ínsita a claúsula rebus sic stantibus, o que equivale dizer que são modificáveis, dado que a fixação da prestação alimentar se faz em atenção às necessidades do alimentando e às possibilidades do alimentante.” (DINIZ, 2004, p. 505).

A disposição do artigo 1.696. 1ª parte, do Código Civil, esclarece que o direito à prestação de alimentos é recíproco entre pais e filhos. Assim, o parente que é devedor de alimentos, pode vir a reclamá-los quando necessitar.

Como as necessidades da pessoa que pleiteia alimentos são necessidades atuais, ou seja, alimentos necessários para sua subsistência, não podem os mesmos ser pago em prazo temporal longo e também em uma parcela única. Vigora aqui a característica da periodicidade, devendo ser pagos quinzenal ou mensalmente, de acordo com o que for acordado ou estabelecido pelo juiz.

2.5.6 Pressupostos

Preceitua o artigo 1.695 do Código Civil o principio básico da obrigação alimentar, onde o valor dos alimentos deve ser fixado depois de observadas a necessidade do alimentado e a possibilidade do alimentante.

Como salienta BEVILAQUA, “o instituto dos alimentos foi criado para socorrer necessitados, não para fomentar a ociosidade ou favorecer o parasitismo”. (BEVILAQUA, 2001, p. 387).

Assim, só pode vir a reclamar alimentos a pessoa que não possui condições próprias ou está impossibilitada de obter através de seu trabalho, seja através de doença, idade avançada ou desemprego.

Desta forma, “não pode requerer alimentos, não pode viver a expensas de outro, quem possui bens, ou está em condições de subsistir com o próprio trabalho”. (MONTEIRO, 2001, p. 304).

Em virtude de serem os alimentos mutáveis, pode o valor fixado pelo magistrado ser modificado em qualquer ocasião através de revisional de alimentos. Pode igualmente vir a obrigação ser extinta, onde o alimentado ou o alimentante serão exonerados da obrigação quando houver alteração na situação econômica de qualquer das partes, através de ação de exoneração de obrigação.

III. RELAÇÃO AVOENGA

3.1 NATUREZA DA RESPONSABILIDADE

A obrigação alimentar devida pelos avós é subsidiária, onde os progenitores são obrigados a pagar alimentos nas situações que ficar comprovado que o genitor não possui condições de sustentar sua prole sem a ajuda de uma terceira pessoa.

O artigo 1.696 do Código Civil é taxativo em dizer que a prestação de alimentos é recíproca entre pais e filhos, se estendendo a todos os descendentes e recaindo nos de grau mais próximo, sendo uma obrigação de alimentar diferenciando-se do dever de sustento

Portanto, são chamados os avós a atender a obrigação em virtude do vinculo de parentesco, caracterizando a responsabilidade subsidiária:

 “O STJ vem manifestando o entendimento de que a responsabilidade dos avós não é sucessiva, mas complementar, podendo ser chamados a subsidiar a pensão prestada pelo pai, que não supre de modo satisfatório a necessidade dos alimentandos”. (DIAS, 2006, p. 424).

Estes alimentos subsidiários apenas serão devidos na falta dos pais ou na impossibilidade de custear as despesas com a subsistência dos filhos, pois é dever primeiramente dos pais.

A responsabilidade dos avós é excepcional e subsidiária. A partir do momento em que os genitores possuem condições financeiras de arcar sozinhos com a obrigação alimentar, a responsabilidade dos progenitores é exonerada de tal obrigação.

Levando em conta que haja obrigação alimentar imposta aos pais, e os mesmos se tornarem impossibilitados de pagar, não serão os avós condenados ao mesmo valor, “dadas às características de divisibilidade e não solidariedade da obrigação”. (CAHALI, 2006, p. 480).

3.2 LITISCONSÓRCIO PASSIVO CONTRA OS PAIS E AVÓS

O Código Civil de 2002, em seu artigo 1.694 englobou o dever de prestar alimentos de que necessitem para viver, de acordo com a condição social, autorizando os parentes, cônjuges e companheiros, a pedirem uns aos outros alimentos.

O dever de sustento dos pais compreende os alimentos civis e os alimentos naturais, isto é, alimentação, habitação, educação, vestuário, lazer, etc.

Segundo DIAS: “o dever de prestar alimentos passa de um dos pais para o outro e só depois é que se transmite aos ascendentes”. (DIAS, 2006, p. 424).

Declara MIRANDA:

“Na falta dos pais, a obrigação passa aos avós, bisavós, trisavôs, tetravôs, etc., recaindo a obrigação nos mais próximos em grau, uns em falta de outros. Pelo antigo direito brasileiro (Assento de 9 de abril de 1772, §1º), na falta dos pais, a obrigação recaia nos ascendentes paternos, e faltando esses, nos ascendentes maternos; mas a distinção não tem razão de ser, pois não fez o Código Civil, que diz explicitamente uns em falta de outros. Se existem vários ascendentes no mesmo grau são todos em conjunto”. (MIRANDA, 2001, p. 150).

Preceitua o artigo 1.698 do Código Civil a respeito do litisconsórcio passivo:

“Art. 1.698. Se o parente, que deve alimentos em primeiro lugar, não estiver em condições de suportar totalmente o encargo, serão chamados a concorrer os de grau imediato; sendo várias as pessoas obrigadas á prestar alimentos, todas devem concorrer na proporção dos respectivos recursos, e, intentada ação contra uma delas, poderão as demais ser chamadas a integrar a lide”. (ANGHER, 2003, p. 214).

Sendo assim, a obrigação alimentar compete primeiramente aos pais, e na falta destes aos parentes de grau imediato, ou seja, aos ascendentes, isto é, aos avós paternos e maternos conjuntamente.

Segundo VELOSO:

“Os parentes em grau mais próximo são os devedores da pensão alimentar. Assim, havendo pais (ascendentes de 1º grau), não se pode pleitear alimentos dos avós (ascendentes de 2º grau). Mas pode faltar o parente em grau mais próximo, ou este não ter meios ou recursos para atender à obrigação (o que equivale à falta), e, então, o pedido pode ser endereçado ao parente de grau mais afastado. Para que requeira alimentos de parentes mais distantes, o necessitado deve provar que os mais vizinhos já não existem, são incapazes, ou não têm recursos para cumprir a prestação. Portanto, o fato de existirem ascendentes em grau mais próximo não exclui, definitivamente, a obrigação dos ascendentes longínquos, que podem supletivamente, serem convocados”. (VELOSO, 2003, p. 26).

Constitui-se litisconsórcio passivo facultativo sucessivo quando a ação de alimentos é intentada conjuntamente contra o pai e os avós. Ensina a doutrinadora DIAS:

“Ainda que não disponha o autor prova da impossibilidade do pai, o uso da mesma demanda atende ao princípio da economia processual. Na instrução é que, comprovada a ausência de condições do genitor, evidenciada a impossibilidade de ele adimplir a obrigação, será reconhecida a responsabilidade dos avós.” (DIAS, 2006, p. 423).

Sobre o litisconsórcio passivo contra os pais e avós na demanda de alimentos, a jurisprudência vem admitindo o chamamento dos avós ao processo nos casos em que os genitores, tanto o pai como a mãe, não podem prover a subsistência da prole e garantir-lhe a sobrevivência.

Em casos em que qualquer dos genitores do menor possua condições de custear com suas despesas e mesmo assim for intentada ação em face dos progenitores, ocorrerá carência da ação, “pois o avô só está obrigado a prestar alimentos ao neto se o pai deste não estiver em condições de concedê-los, estiver incapacitado ou for falecido”. (CAHALI, 2006, p. 471).

E mais:

“A má vontade do pai dos menores em assisti-los convenientemente não pode ser equiparada á sua falta, em termos de devolver a obrigação ao avô; se o pai não está impossibilitado de prestar alimentos, porque é homem válido para o trabalho, nem está desaparecido, a sua relutância não poderá ser facilmente tomada como escusa, sob pena de estimular-se um egoísmo anti-social.” (CAHALI, 2006, p. 471).

Em possuindo os avós situação financeira favorável, não podem ser integrados à lide quando o genitor possui emprego ou algum recurso, devendo sempre os netos ingressarem primeiramente contra os genitores.

3.3 COMPLEMENTAÇÃO DOS ALIMENTOS PELOS AVÓS

Como fenômeno atual, cada vez mais se faz necessária a participação de membros da família no custeamento ou auxílio a parentes.

A relação avoenga possui caráter excepcional e complementar, no sentido dos avós auxiliarem os pais no sustento dos filhos e deve ser distribuída entre os progenitores paternos e maternos conjuntamente.

“Quando ocorre de virem os avós a complementar o necessário à subsistência dos netos, o encargo que assumem é de ser entendido como excepcional e transitório, a título de mera suplementação, de sorte a que não fique estipulada a inércia ou acomodação dos pais, primeiros responsáveis”. (CAHALI, 2006, p. 476).

De acordo com a primeira parte do artigo 1.698 do Código Civil, caracteriza a responsabilidade complementar dos alimentos devidos pelos avós: “Se o parente que deve alimentos em primeiro lugar não estiver em condições de suportar totalmente o encargo serão chamados a concorrer os de grau imediato”.

O chamamento dos avós ocorre nas seguintes hipóteses: inexistência dos pais; incapacidade dos pais para o trabalho ou nos casos que a pensão paga pelo genitor não é suficiente.

Assim, para CAHALI, “para que os filhos possam reclamar alimentos dos avós, necessário é que faltem os pais. Ou pela falta absoluta, que resulta da morte ou da ausência. Ou pela impossibilidade de cumprir a obrigação, que se equipara à falta”. (CAHALI, 2006, p. 470). 

Os alimentos originários da relação avoenga devem ser vistos como complementares, não podendo os avós prover o sustento de seus netos se os genitores puderem arcar com as necessidades da prole.

Somente em casos que os genitores não conseguem manter a subsistência dos filhos, os avós serão chamados a integrar a lide, observando o binômio necessidade do alimentado x possibilidade do alimentante.

Nos casos em que o pai deixa de cumprir a obrigação alimentícia para com o filho, não deve recair a responsabilidade aos avós pelo mesmo quantum, visto ser de natureza complementar a obrigação e não solidária.

Sobre a execução de alimentos em face dos avós, DIAS declara: “Não cabe intentar contra os avós execução de alimentos não pagos pelo genitor, o que seria impor a terceiro o pagamento de dívida alheia”. (DIAS, 2006, p. 423).

Neste mesmo sentido ensina CAHALI: “O simples descumprimento pelo pai do acordo firmado com o filho para a prestação de alimentos não é suficiente para autorizar a constrição do avô ao seu pagamento”. (CAHALI, 2006, p. 472).

Assim, a responsabilidade dos avós vem após a responsabilidade dos pais, não sendo responsabilidade sucessiva, mas sim complementar.

3.4 JURISPRUDÊNCIA DOS TRIBUNAIS SOBRE ASSUNTO

Neste momento torna-se importante realizar uma breve análise dos julgados sobre o presente assunto.

O entendimento dominante dos Tribunais defende que a obrigação dos avós só é possível quando restar provada a incapacidade dos genitores em sustentar a prole.

Com relação ao caráter da relação avoenga, possui esta responsabilidade subsidiária e complementar:

“A obrigação avoenga possui caráter subsidiário e complementar, sendo o dever de sustentar a prole primordialmente dos genitores. No entanto, ante o falecimento do varão, cabível o direcionamento da pretensão alimentar contra os avós paternos que, pelo menos por ora, não demonstraram a insuportabilidade de arcar com o pensionamento arbitrado”. (TJ/RS, Agravo de Instrumento 70009729435, Sétima Câmara Cível, Rel. José Carlos Teixeira Giorgis, julgado em 03.11.2004).

Nesse sentido também é o posicionamento do Superior Tribunal de Justiça, citando que a obrigação dos avós apenas ocorrerá quando da inexistência dos pais ou incapacidade dos mesmos para prover o sustento ou em havendo insuficiência do valor pago:

“A obrigação alimentar dos avós em relação aos netos, não é solidária, sendo meramente subsidiária ou suplementar, e somente poderá acontecer nas seguintes hipóteses: a) inexistência dos pais, desde que não deixem pensão previdenciária ou rendimentos outros em favor do filho ou filhos; b) incapacidade dos pais para o trabalho, desde que eles não tenham pensão previdenciária ou rendimentos outros suficientes para o sustento da família; c) se a pensão paga pelos pais não é suficiente para o sustento do menor.” (STJ, Recurso Especial 50153/RJ, 4ª Turma, Rel. Min. Barros Monteiro, publicado em 14.11.1994).

Em casos em que ocorre a omissão do pai, estende-se aos avós a obrigação alimentar, sempre levando em consideração o binômio possibilidade do alimentante x necessidade do alimentado.

Entendeu o Superior Tribunal de Justiça que, “os avós tendo condições, podem ser chamados a complementar o pensionamento prestado pelo pai que não supre de modo satisfatório a necessidade dos alimentandos”.  (STJ, Recurso Especial 119336/SP, 4ª Turma, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, publicado em 10.03.2003).

Em sendo insuficiente a prestação alimentícia do pai, possuem os avós responsabilidade complementar perante os netos. Neste sentido decidiu o Superior Tribunal de Justiça:

“A responsabilidade dos avós não é apenas sucessiva em relação a responsabilidade dos progenitores, mas também é complementar para o caso em que os pais não se encontrem em condições de arcar com a totalidade da pensão, ostentando os avós, de seu turno, possibilidades financeiras para tanto.” (STJ, Recurso Especial 70740/SP, 4ª Turma, Rel. Min. Barros Monteiro, publicado em 25.08/1997).

Com relação ao binômio da fixação dos alimentos, ou seja, necessidade x possibilidade, devem os alimentos atender a necessidade do alimentado sem acarretar ônus excessivo aos avós: “Sendo insuficiente a capacidade econômica do pai para arcar integralmente com o dever jurídico dos alimentos devidos ao filho, poderão suplementar a pensão os ascendentes próximos (avós), na medida de suas possibilidades, apuradas em juízo.” (STJ, Recurso Especial 81838/SP, 4ª Turma, Rel Min. Aldir Passarinho Junior, publicado em 04.09.200).

Não cumprindo o pai a obrigação alimentar, recai a responsabilidade pelo seu cumprimento aos avós, conforme Superior Tribunal de Justiça:

“Os avós podem ser instados a pagar alimentos aos netos por obrigação própria, complementar e/ou sucessiva, mas não solidária. Na hipótese de alimentos complementares, tal como no caso, a obrigação de prestá-los se dilui entre todos os avós, paternos e maternos, associada à responsabilidade primária dos pais de alimentarem os seus filhos.” (STJ, Recurso Especial 366837/RJ, 4ª Turma, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, publicado em 22.09.2003).

Tendo os ascendentes condições de integrar a lide, podem ser chamados em caráter complementar: “Os avós, tendo condições, podem ser chamados a complementar o pensionamento prestado pelo pai que não supre de modo satisfatório a necessidade dos alimentandos.” (STJ – Recurso Especial 119.336/SP – Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, publicado em 10.03.2003).

Partindo desse pressuposto, entende-se que a obrigação alimentar dos ascendentes é subsidiária com caráter complementar, admitindo-se litisconsórcio passivo entre os progenitores e a complementação alimentar.

3.5 CONCLUSÃO SOBRE A OBRIGAÇÃO AVOENGA EM GERAL

A Constituição Federal de 1988 preconiza em seu artigo 227, sobre o dever da família, da sociedade e do Estado:

“Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los salvo de toda forma de negligencia, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão”.

Em relação à prestação alimentícia, no artigo 229 tem-se: “Os pais tem o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores tem o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade”.

Assim, vivendo o homem em sociedade é fato que necessite de meios para sua subsistência, dividindo este encargo em especial com os familiares.

Conforme afirma WALD:

“A obrigação alimentar caracteriza a família moderna. É uma manifestação de solidariedade econômica que existe em vida entre os membros de um mesmo grupo, substituindo a solidariedade política de outrora”. (WALD, 2000, p. 271).

Em sendo a obrigação alimentar regida e regulamentada pelo Código Civil, a relação avoenga é considerada uma exceção e possui natureza diversa dos alimentos devidos pelos genitores, pois se encontra baseada no dever da solidariedade entre os parentes próximos, diferenciando-se da obrigação alimentar devida pelos pais, a qual está baseada no dever de sustento.

A obrigação alimentar dos avós assemelha-se aos alimentos em geral, levando em consideração a possibilidade do alimentante em efetuar o pagamento sem que cause prejuízo para sua própria subsistência, e a necessidade que o alimentado possui para sobreviver dignamente, conforme artigos 1.694 e 1.695, ambos do Código Civil:

Art. 1.694. Podem os parentes, os cônjuges ou companheiros pedir uns aos outros os alimentos de que necessitem para viver de modo compatível com a sua condição social, inclusive para atender às necessidades de sua educação.

§1º. Os alimentos devem ser fixados na proporção das necessidades do reclamante e dos recursos da pessoa obrigada.

§2º. Os alimentos serão apenas os indispensáveis à subsistência, quando a situação de necessitar resultar de culpa de quem os pleiteia.

Art. 1.695. São devidos os alimentos quando quem os pretende não tem bens suficientes, nem pode prover, pelo seu trabalho, à própria mantença, e aquele, de quem se reclamam, pode fornecê-los, sem desfalque do necessário ao seu sustento”. (ANGHER, 2003, p. 214).

Cita a doutrinadora SORROSAL:

“Nestes casos, além da verificação do binômio traduzido na necessidade de quem pleiteia os alimentos X a possibilidade de quem os deve prestar, deve restar comprovada a impossibilidade dos pais, ônus que cabe inteiramente ao credor dos alimentos.  Isso porque, como já dissemos a lei não atribuiu ao credor dos alimentos a faculdade de escolher de quem os pleiteará, uma vez que o devedor principal é sempre o pai ou a mãe e somente na hipótese de ausência de condições destes é que surge a obrigação dos demais ascendentes.  Não basta, portanto, que o pai ou a mãe deixem de prestar os alimentos, há que ficar comprovada a impossibilidade da prestação, conforme tem sido decidido acertadamente pelo Superior Tribunal de Justiça, confirmando decisões de tribunais estaduais.” (SORROSAL, 2007)

Portanto, os alimentos prestados pelos avós caracterizam-se pela natureza subsidiária, pois somente são devidos mediante a falta dos genitores ou a impossibilidade, ou seja, da prova inequívoca de insuficiência destes de arcar financeiramente com as necessidades do menor, visto em virtude do poder familiar, ser obrigação de ambos, tanto do pai como da mãe.

Não sendo provado que os pais são inexistentes ou que não possuem condições de arcar com as despesas do filho e que os avós possuem meios para o cumprimento da obrigação, não pode o juiz determinar a prestação de pensão de caráter alimentar.

Deve também a obrigação dos avós ser dividida entre os avós maternos e avós paternos na medida de seus rendimentos, incorrendo na forma de litisconsórcio passivo contra os avós.

Conforme MIRANDA:

“Assim, intentada a ação, o ascendente (avô, bisavô etc.; avó, bisavó etc.) pode opor que não foram chamados a prestar alimentos os outros ascendentes do mesmo grau. Se algum dos ascendentes não tem meios com que alimente o descendente, o outro dos ascendentes do mesmo grau os presta. Se o descendente já recebe de algum ascendente o suficiente para a sua alimentação (no sentido largo, que é o técnico), podem os outros opor esse fato; mas, se a quantia ou recursos fornecidos pelo alimentar não bastam, é lícito ao alimentário argüir a insuficiência do que recebe, ou a precariedade de seu sustento em casa do ascendente, e pedir ao outro ou aos outros ascendentes que completem o quanto, ou prestem o necessário à sua vida normal”. (MIRANDA, 2001, p. 276).

Desta forma, a prestação alimentícia devida pelos progenitores é estritamente complementar, onde os avós não podem ser acionados em casos que os pais podem prover o sustento e sobrevivência dos filhos, sendo considerada indispensável a prova da necessidade dos alimentos.

Atualmente, a dura realidade remete a dados onde a maioria dos idosos são beneficiários da Previdência Social, recebendo na maioria dos casos, um salário mínimo para arcar com todas suas despesas e necessidades, visto que em virtude da idade avançada, aumenta a necessidade de medicamentos especiais, assistência médica, de uma alimentação balanceada, etc.

Desta forma, deve o magistrado levar em conta na ação de alimentos em face dos avós, a real possibilidade de pagar, levando em consideração a condição de vida dos progenitores, sobrepesando o princípio da dignidade humana, não acarretando ônus excessivo aos avós, visto estarem ao final da jornada da vida e tomando cuidados para os mesmos não serem banidos de suas comodidades.

CONCLUSÃO

Dispõe o artigo 227 da Constituição Federal de 1988, que é dever da família, da sociedade e do Estado, assegurar a criança e ao adolescente, o direito á vida, á saúde, á alimentação, á educação, á cultura, ao lazer, á profissionalização, á liberdade, á dignidade e á convivência familiar.

Possuem os pais, o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores tem o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, na carência ou em situações de enfermidade, segundo o artigo 229 da Constituição Federal.

De acordo com o artigo 1.630 do Código Civil, os filhos, enquanto menores, estão submetidos ao poder familiar, e podem reclamar dos pais os alimentos de que necessitem para a sua subsistência.

Quanto aos alimentos, os pais são obrigados a fornecer aos filhos, a título de pensão alimentícia, o necessário para a conservação da vida. Compreende sustento, vestuário, habitação, assistência médica, lazer, e em casos de filho maior de idade compreenderá educação e formação profissional, baseando-se no princípio da solidariedade.

Mesma situação aplica-se ao Poder Familiar, onde ambos os pais conjuntamente devem arcar com as despesas dos filhos menores e não emancipados, exercido na proteção da pessoa e dos bens dos filhos.

O direito aos alimentos obedece a certos requisitos, a saber: a necessidade do alimentado, a possibilidade do alimentante, a proporcionalidade e a reciprocidade dos alimentos.

Aplica-se à fixação do valor dos alimentos o princípio da proporcionalidade, levado em conta a necessidade do alimentado e a possibilidade do alimentante, de acordo com o artigo 1.694, 1ª parte, do Código Civil.

Desta forma, só pode reclamar alimentos o individuo que não possui bens suficientes para sua subsistência ou se encontra em situação de desemprego, velhice, e ainda em virtude da pouca idade. Já o alimentante fica obrigado a cumprir a obrigação, desde que não prejudique seu próprio sustento.

A obrigação alimentar, oriunda do vinculo de parentesco é recíproca e extensiva a todos os familiares, na falta dos ascendentes caberá a obrigação aos descendentes, e faltando estes, caberá aos irmãos germanos e unilaterais, conforme artigo 1.696 do Código Civil.

Desta forma, a obrigação de alimentar compete inicialmente aos pais, e na falta destes aos ascendentes, ou seja, aos avós paternos e maternos conjuntamente, devendo cada um concorrer na medida das suas condições financeiras.

Sendo assim, quem recebe alimentos pode vir a ficar na situação de ministrá-los, e quem os supre, na situação de recebê-los.

No tocante à obrigação alimentar pelos progenitores, possui esta natureza distinta dos alimentos devidos pelos pais.

A obrigação alimentar devida pelos avós é excepcional e subsidiária, sendo os progenitores chamados ao processo nos casos em que os pais encontram-se ausentes, ou impossibilitados de prover o sustento da prole, e havendo insuficiência do valor pago, sendo devidamente comprovados.

Os alimentos devidos pelos avós também serão fixados com base no binômio da necessidade do alimentado e na possibilidade do alimentante, sem que isto acarrete ônus excessivo e prejudique o sustento e a sobrevivência do progenitor.

Assim, caracteriza-se a natureza da relação avoenga como natureza complementar, pois não devem os avós prover o sustento dos netos se os genitores puderem arcar com a subsistência dos filhos.

Se não ficar provado no ajuizamento e instrução da ação inicial a impossibilidade dos pais em prover o sustento da prole, não pode o juiz fixar alimentos em face dos avós.

Portanto, resta configurado que a obrigação avoenga é de natureza subsidiária, excepcional e temporária, já que se em algum momento os genitores puderem arcar com os encargos alimentícios, os progenitores serão exonerados.

A dura realidade é que os indivíduos beneficiários da Previdência Social são idosos e recebem um valor baixo como aposentadoria, valor este gasto com medicamentos, assistência médica especial em virtude da idade mais avançada, dieta balanceada, restando ao final muito pouco dinheiro disponível, ou na grande maioria dos casos, nada disponível. (SORROSAL, 2007)

Desta forma, a previsão legal em relação à obrigação alimentar pelos avós existe e deve ser cumprida, devendo o magistrado no momento da fixação do valor na ação de alimentos, ter cautela, levando em conta a condição de vida dos avós, onde o valor fixado não venha banir o bem-estar do progenitor.

 

Referências
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Informações Sobre o Autor

Susély Aparecida Fonseca Gonçalves


Equipe Âmbito Jurídico

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