Resumo: A teoria da revisão atípica da coisa julgada encabeçada pela doutrina de José Augusto Delgado e Humberto Theodoro Jr vem ganhado forças na doutrina pátria. Ela prega a simples desconsideração da coisa julgada em determinadas hipóteses tidas como atentatórias à constituição ou em casos em injustiças da decisão. Prega também a não utilização da via rescisória como instrumento para a quebra da coisa julgada. Porém o meio atípico de revisão é uma forma nociva o ordenamento jurídico uma vez que não vem disciplinada na legislação.
Sumário: Introdução.1 Coisa julgada e segurança jurídica. 1.1Fundamento político da coisa julgada.1.2 O status constitucional da coisa julgada. 2 Coisa julgada. 2.1 Terminologia:2.2 Conceito de coisa julgada. 2.2.1 Antes de Liebman. 2.2.2 Conceito de Liebman.2.2.3 Crítica de Barbosa Moreira ao conceito de liebman. 2.2.4 Crítica de Ovídio Batista sobre o conceito de coisa julgada de Barbosa Moreira. 2.3 Conceito de trânsito em julgado. 2.3 coisa julgada formal e material. 2.3.1 Coisa julgada formal. 2.3.2 coisa julgada material. 2.4 Limites objetivos, subjetivos e temporal da coisa julgada.2.4.1 Limites objetivos. 2.4.2 Limites subjetivos da coisa julgada.2.4.3 limites temporais. 2.5 Funções da coisa julgada. 2.5.1 Função negativa. 2.5.2 Função positiva. 2.6 Coisa julgada total ou parcial. 2.7 Eficácia preclusiva da coisa julgada. 2.8 Coisa julgada nas ações coletivas. 2.9 Arguição de coisa julgada. 2.10 Coisa julga e decisão determinativa. 2.11 Eficácia da sentença e coisa julgada. 2.12 Indiscutibilidade e a imutabilidade. 3. relativização da coisa julgada. 3.1 Origem da tese da desconsideração da coisa julgada. 3.2 Terminologia: 3.3 Premissas da tese da relativização da coisa julgada. 3.4 Hipóteses em que caberia a relativização da coisa julgada. 3.4.1 Relativização típica: ação rescisória. 3.4.2Relativização atípica da coisa julgada.3.4.3 Hipóteses da revisão atípica. 3.4.3.1 Coisa julgada inconstitucional. 3.4.3.2 Injustiça da decisão. 3.4.3.3 A questão da paternidade e do exame de DNA. 3.4.4 Instrumentos da revisão atípica. 3.4.4.1 A competência para o julgamento na revisão atípica. 4. Crítica a relativização atípica da coisa julgada. 4.1 Aspectos gerais. 4.2 A coisa julgada como uma garantia constitucional. 4.1.1 Ondas de mitigação das garantias constitucionais. 4.2 A visão de marinoni. 4.3 A ideia de relativização da coisa julgada pela ponderação. 4.3 Os problemas advindos da técnica da revisão atípica.4.4 A solução : Uso do meio típico da ação rescisória como forma de relativizar a coisa julgada. Conclusão. Referência.
INTRODUÇÃO
Este trabalho tem como objetivo analisar o intrincado tema da relativização da coisa julgada. A teoria da relativização atípica da coisa julgada vem sendo defendida pelos brilhantes doutrinadores José Augusto Delgado e Humberto Theodoro Jr., e ganha prestígio em boa parte da doutrina nacional.
Tal teoria da revisão atípica da coisa julgada, prega que em determinadas situações poder-se-ia simplesmente desconsiderar a coisa julgada, em face de algum vício contido na sentença. Para isso não se levaria em consideração a ação rescisória, podendo a denominada coisa julgada ser desconsiderada por uma simples ação declaratória de nulidade, “ querela nullitatis”.
Para tanto, o método utilizado foi o dedutivo e dialético, valendo-se também da pesquisa bibliográfica, tentando comparar a proposta da teoria da revisão atípica, com a proposta da revisão típica da coisa julgada.
No primeiro capítulo abordamos o tema da coisa julgada e sua relação com o postulado da segurança jurídica. Além disso, relacionamos a coisa julgada ao direito de ação e assentamos o seu status de garantia constitucional, estabelecida no art. 5º, XXXVI, da Constituição Federal.
No segundo capítulo investigamos os diversos aspectos da coisa julgada. Como a sua terminologia; a sua evolução conceitual; os seus facetos materiais e formais; as suas funções positivas e negativas; os seus limites objetivos, subjetivos e temporais; a sua eficácia preclusiva; coisa julgada total e parcial; coisa julgada nas ações coletivas; coisa julgada nas sentenças determinativas; e, por fim a forma de arguição da coisa julgada.
No terceiro capítulo abordamos a questão da relativização da coisa julgada; a origem da tese da desconsideração da coisa julgada no processo civil; as premissas da tese da Relativização da coisa julgada; as hipóteses em que caberia a relativização da coisa julgada; hipóteses da Revisão atípica; a da Revisão típica; a questão do exame de paternidade e o exame do DNA; a hipóteses da coisa julgada inconstitucional; os instrumentos da revisão atípica; a competência para o julgamento na revisão atípica.
No quarto capítulo atacamos a teoria da revisão atípica da coisa julgada; abordamos a coisa julgada como uma garantia constitucional; enfrentamos as ondas de relativização das garantias constitucionais; expomos a visão de Marinoni; tratamos da ideia de relativização da coisa julgada pela ponderação; colacionamos as críticas à teoria defendidas pelo ministro José Augusto Delgado e Humberto Theodoro Jr.;
Enfrentamos os problemas advindos da técnica da revisão atípica; e por fim trazemos a solução : uso do meio típico da Ação rescisória como forma de relativizar a coisa julgada, com fundamento nos argumentos levantados pela melhor doutrina.
1 COISA JULGADA E SEGURANÇA JURÍDICA
1.1. Fundamento político da coisa julgada
A coisa julgada tem como fundamento político a pacificação social, dando um fim ao litígio, dando imunidade as decisões transitadas em julgado.[1]
Vejamos o que Fredie Didier fala sobre o instituto da coisa julgada: “A coisa julgada é instituto construído ao longo dos séculos e reflete a necessidade humana de segurança. Ruim com ela, muito pior sem ela. Relativizar a coisa julgada por critério atípico é exterminá-la.”[2]
Vejamos ainda a eminente doutrina de Simone Rodrigues Ferreira e João Armando Bezerra:
“Em que pesem as divergências quanto a ser ou não a coisa julgada um efeito da sentença, a doutrina é unívoca em um ponto: a coisa julgada possui um caráter político. É um instrumento de política judiciária e com um sentido dúplice: quer porque exclui a possibilidade de recurso ou a reapreciação de questões já decididas e incidentes sobre a relação dentro do mesmo processo- caso julgado formal-, quer porque a relação material controvertida é decidida em termos definitivos, impondo-se a todos os tribunais e a todas as autoridades”.[3]
Há quem relacione a segurança jurídica com o sistema capitalista e o liberalismo econômico. Nesse sentido vejamos a exposição de Carlos Valder do Nascimento:
“A segurança concebida na pressuposição de contribuir para o desenvolvimento do capitalismo, em face do assaz difundido mito da cientificidade do processo civil, jamais demonstrada por teoria nenhuma, deixa raízes no pensamento político liberal dos séculos XVII e XVIII. Por isso, foram determinantes nos estudos teóricos feitos por Hobbes, Locke, Hume, Montesquieu, Adam Smith e outros renomados pensadores”.[4]
O mesmo autor também ressalta que existe posição extremista na doutrina de que a segurança jurídica não seria um valor constitucional, não tendo importância no sistema legal.[5]
1.2 O status constitucional da coisa julgada
A coisa julgada possui uma função garantista, uma vez que o cidadão possui o direito de ter uma prestação jurisdicional definitiva, com a certeza de que houve um fim na discussão da lide, que não se perpetuará indefinidamente para todo o sempre.
Essa garantia não se limita a proteção em face do legislador, mas se estende em relação ao poder judiciário e ao poder executivo.
Sobre a função garantista da coisa julgada:
“Em relação aos sujeitos do processo, o ordenamento quer evitar o constrangimento de um litigante ser submetido novamenteà via crucis judicial pela mesma pretensão: nemo debet bis vexari pro una et eadem causa. Trata-se de uma função garantista da coisa julgada,destinada a não submeter o indivíduo duas vezes à mesma pretensão em juízo.Neste ponto, o instituto aproxima-se muito do ne bis in idem romano, a genérica proibição de dupla litigância, mas assume também, no moderno Estado de Direito, outros contornos.”[6]
Além mesmo que a constituição não tivesse previsto expressamente a coisa julgada no art. 5º. XXXVI, ela decorreria implicitamente do Estado democrático de direito, assim como ocorre na Alemanha. Senão vejamos:
“Ora, a coisa julgada não apenas tem sustentáculo no art. 5º, XXXVI, da Constituição Federal, como constitui elemento estruturante do Estado de Direito. Lembre-se que na Alemanha, onde não há proteção constitucional expressa à coisa julgada, o seu fundamento constitucional está ancorado no princípio do Estado de Direito. O Bundesverfassungsgericht foi o principal responsável por esta elaboração, frisando que o princípio do Estado de Direito tem como componente essencial a garantia da certeza do direito, que exige não apenas o desenvolvimento regular do processo, como também a estabilidade da sua conclusão.”[7]
Porém, há quem negue o status constitucional da coisa julgada, servindo essa como base de construção da teoria da coisa julgada inconstitucional, senão vejamos:
“Conquanto tenha sido prestigiada pelo legislador constituinte, não se pode dizer que a matéria em questão tem a sua inserção na Constituição da República, porque esta não regula matéria de natureza estritamente instrumental. O dispositivo que nela se contém é, todavia, no sentido de proteger a coisa julgada na seara infraconstitucional, impedindo que a legislação ordinária pudesse alterar a substância daquilo que foi decidido, restringindo ou ampliando o seu objeto”.[8]
Existe ainda aqueles que afirmam ter a coisa julgada assento constitucional,como Cândido Rangel Dinamarco, porém também defendem a tese da coisa julgada inconstitucional.[9]
Outra vertente aceita o status constitucional da coisa julgada, mas nega que a sua intangibilidade tenha assento constitucional. Assim, a intangibilidade da coisa julgada, nos termos constitucionais, só abrange a proteção contra os atos do poder legislativo. Esta de a posição adotada por Humberto Theodoro júnior e serve de premissa básica para a sua tese da coisa julgada inconstitucional. [10]
Assim se manifesta o eminente doutrinador:
“Por sua vez, o princípio da intangibilidade da coisa julgada, diferentemente do que se da no direito português, não tem tratamento constitucional, mas é contemplado apenas na legislação ordinária. Isto significa, segundo assinalado no item anterior, que é ele, no direito nacional, hierarquicamente inferior. Não se pode, assim, falar no Brasil, de conflito entre princípios constitucionais, evitando-se com isso a séria angústia de se definir aquele que prevalece sobre o outro, como se dpa em Portugal, a partir do princípios da proporcionalidade e razoabilidade”.[11]
Data máxima vênia, a coisa julgada, como já afirmado acima, tem assento constitucional, art.5º, XXXVI, e sua intangibilidade não se refere somente a atos do poder legislativo, mas também a atos do poder judiciário e do poder executivo.
1.3 A Coisa julgada como corolário do direito fundamental de ação ( à tutela jurisdicional efetiva):
O direito de ação não só abrange o direito de bater na porta do judiciário para que ele venha resolver um litigio. O cidadão tem o direito de acesso, de obter uma prestação jurisdicional e de ter um fim na discussão jurídica. Senão vejamos:
“Direito fundamental à tutela jurisdicional significa, além de direito a uma decisão que resolva o litígio tomando em consideração os argumentos e provas e de direito à preordenação das técnicas processuais idôneas à obtenção da tutela de direito material, direito à obtenção de uma tutela jurisdicional indiscutível e imutável.”[12]
2 COISA JULGADA
2.1 Terminologia:
Ao longo da história a coisa julgada vem sendo denominada de diversas formas. A denominação romana de res iudicata é a adotada no ocidente. Sobre as diversas formas de denominação da coisa julgada vejamos o que sinaliza Antônio Cabral de Passos:
“Mas foi o instituto romano da res iudicata que irradiou suas características e fixou a terminologia enraizada no direito ocidental contemporâneo. O termo italiano influenciou as expressões italiana ( cosa giudicata) e francesa(chose jugée), assim como a nomenclatura da língua portuguesa: (coisa julgada) ou caso julgado (Portugal). Os ordenamentos de origem germânica( Alemanha,Áustria e Suíça) denominam a coisa julgada ‘força jurídica’(Rechtskraft). A palavra ‘força’ é adotada também na Escandinávia e encontra, aqui e ali, algumas referências em outros países, embora o termo proporcione diversas incompreensões, já que, na língua alemã, o vocábulo kraft pode também assumir o significado de ‘validade’,’vigência’, tanto de uma lei, como de contratos. Já os Sistemas jurídicos do common law, de tradição anglo-americana, sempre utilizaram a própria expressão latina res iudicata, ainda que modernamente, como veremos a seu tempo, tenham começado a fundir a terminologio com o estudo das preclusões: a coisa julgada seria a ‘preclusão da causa’ ou ‘preclusão da demanda’( claim preclusiom) e as preclusões de outras questões são chamadas de issue preclusions.”[13]
2.2 Conceito de coisa julgada:
2.2.1 Antes de Liebman
Antes de Liebman a coisa julgada era definida como um efeito da sentença.[14]
2.2.2 Conceito de Liebman.
Liebman foi o responsável por dá um salto no que tange a definição de coisa julgada. Para o ilustre doutrinador, a coisa julgada não era um efeito da sentença, como afirmava a doutrina da época, mas uma qualidade da mesma, que a empresta os atributos de imobilidade e indiscutibilidade.
Sobre a coisa julgada depois de Liebman, vejamos o que leciona Antônio Cabral de Passos:
“Liebman, em obra clássica sobre a coisa julgada, procurou quebrar esta herança romana, diferenciando efeito da sentença da autoridade de coisa julgada( auctoritas rei iudicatae), no que foi amplamente acompanhado pela doutrina brasileira e latino-americana. Para ele, haveria um erro lógico em considerar a coisa julgada como um efeito da sentença, pois os efeitos seriam elementos decorrentes da decisão, ou seja, algo que a sentença gera ou produz, porque oriundo de seu comando; já a coisa julgada seria algo completamente diferente, um predicado que se apõe à decisão após o esgotamento das instâncias recursais. A coisa julgada seria, então, uma qualidade, um atributo, um plus que adere à sentença e assim não poderia ser considerada um efeito da decisão porque não decorre da sentença ou tampouco das normas do direito objetivo por ela aplicadas. Ao contrário, o que torna a sentença imutável e indiscutível é uma norma externa à própria decisão e que não se encontra entre as normas de direito material ou processual aplicáveis ou efetivamente aplicadas para a resolução do conflito de interesses. Assim, não há qualquer elemento interno da sentença, expresso ou implícito, que afirme sua imutabilidade após o momento do trânsito em julgado.”[15]
2.2.3 Crítica de Barbosa Moreira ao conceito de Liebman.
A iminente doutrina de Barbosa Moreira verifica que a coisa julgada é uma qualidade da sentença, adotando, portanto, a ideia de Liebman, mas que não incidiria sobre os efeitos da sentença, como afirmará Liebman, tornando-a imutável, mas,sim, sobre o conteúdo da sentença.
Nestes termos :
“Embora esses ensinamentos ganhassem larga aceitação na Itália e em outros países europeus, na doutrina pátria, a natureza jurídica da coisa julgada viria a ser objeto da crítica de Barbosa Moreira. Segundo tal processualista, a coisa julgada consistiria na imutabilidade do conteúdo do comando da sentença. Isso porque os efeitos da sentença poderiam eventualmente ser modificados ou extintos – seja por força da sua natureza, seja em face da disponibilidade do direito que faculta às partes a (re)composição das situações jurídicas- sem que isso significasse a alteração da própria res judicata.”[16]
Portanto, segundo o doutrinador a coisa julgada seria uma qualidade que tornaria imutável e indiscutível o conteúdo da sentença, e não os seus efeitos, que podem ser mutáveis.
2.2.4 Crítica de Ovídio Batista sobre o conceito de coisa julgada de Barbosa Moreira
Segundo Ovídio Batista a coisa julgada não incidiria sobre todo o conteúdo da sentença, como afirmou a doutrina de Barbosa Moreira supramencionada, mas sim sobre o elemento declaratório contido no conteúdo. Assim, somente o elemento declaratória ganharia a qualidade de imutável.
Vejamos a referência de Sérgio Gilberto Porto sobre o ponto:
“No Brasil, especialmente, a questão se agrava, pois Liebman difundiu a ideia de que a autoridade da coisa julgada não é um efeito da sentença, mas uma qualidade que os efeitos se ajunta para torna-los imutáveis. Essa orientação sofreu crítica da pena talentosa de Barbosa Moreira, quando afirmou, concordando inicialmente com Liebman, que efetivamente a autoridade da coisa julgada é uma qualidade da sentença; contudo, não uma qualidade apta a tornar os efeitos imodificáveis, pois estes seriam absolutamente mutáveis. Diz Barbosa Moreira, após impugnar parcialmente a ideia de Liebman, que aquilo que, em verdade, adquire o selo da imutabilidade é o conteúdo da nova sentença, assumindo, portanto, autoridade de coisa julgada a nova situação jurídica decorrente desta. Não bastasse o dissenso entra a orientação de Liebman e a de Barbosa Moreira, surge o combativo e sempre atento Ovídio Araújo Baptista da Silva e sustenta que : (a) tanto Liebman, quanto Barbosa Moreira têm razão ao entenderem a autoridade da coisa julgada como uma qualidade da sentença; (b) contudo, aplaudindo Barbosa Moreira, admite ter Liebman se equivocado ao sustentar que os efeitos adquirem o selo da imutabilidade, pois são estes realmente modificáveis; e, finalmente, (c) aduz não ter razão Barbosa Moreira, ao argumentar que todo o conteúdo da sentença adquire autoridade de coisa julgada, pois apenas o elemento declaratório adquiriria tal condição, na medida em que ele é o único imune a modificação – vale dizer que em nenhuma hipótese imaginável poderá ser modificado.”[17]
Nesse sentido, também segue a doutrina de Botelho de Mesquita, para quem só o elemento declaratório, e não toda o conteúdo da sentença, faz coisa julgada[18].
Vale apena lembra que efeitos da sentença não se confundem com o conteúdo da sentença. Os efeitos referem-se as modificações realizadas nas relações jurídicas existentes fora do processo. Já o conteúdo da sentença é o juízo lógico que se realiza na sentença[19].
2.3 Conceito de trânsito em julgado
Também é imperioso conceituar o trânsito em julgado. Define-se trânsito em julgado como o momento que não cabe mais nenhum recurso contra uma decisão. Ainda leciona Botelho de Mesquita que pode haver trânsito em julgado sem a imutabilidade, mas a recíproca não se confirma.[20]
2.3 Coisa julgada Formal e material
2.3.1 Coisa julgada formal
A coisa julgada formal refere-se à imutabilidade e indiscutibilidade que se projeta para dentro do processo, em razão da impossibilidade de se recorrer da decisão que transitou em julgado. Porém, não produz efeito para fora do processo, não impedindo, assim, que uma outra ação verse sobre o mesmo tema.[21]
2.3.2 Coisa julgada material
A coisa julgada material, por sua vez, tem a aptidão de produzir efeitos para dentro(intraprocessual) e para fora do processo(panprocessual), impedindo a rediscussão da lide, seja no mesmo processo, seja em um novo processo.
Nessa linha, pode haver coisa julgada formal e não ocorrer coisa julgada material, mas a reciproca não é verdadeira.[22]
Ainda sobre a coisa julgada material leciona Fredie Didier Júnior:
“Para que determinada decisão fique imune pela coisa julgada material, deverão estar presentes quatro pressupostos: a) há de ser uma decisão jurisdicional ( a coisa julgada é característica exclusiva dessa espécie de ato estatal); b) o provimento há que versar sobre o mérito da causa( objeto litigioso) ; c) o mérito deve ter sido analisado em cognição exauriente; d) tenha havido a preclusão máxima(coisa julgada formal)”[23]
2.4 Limites objetivos, subjetivos e temporal da coisa julgada
2.4.1 Limites objetivos
O art. 469 do Código de Processo Civil trás uma definição, por exclusão dos limites objetivos da coisa julgada. Vejamos:
“Art. 469. Não fazem coisa julgada:
I- Os motivos, ainda que importantes para determinar o alcance da parte dispositiva da sentença;
II- a verdade dos fatos, estabelecida como fundamento da sentença;
III- a apreciação da questão prejudicial, decidida incidentalmente no processo.”
Assim, o legislador, por exclusão, fixou que o limite objetivo da coisa julgada será o dispositivo na sentença.
Vale lembra que a Ação Declaratória Incidental também possibilita a formação da coisa julgada, uma vez que também será resolvida na parte dispositiva da sentença.
2.4.2 Limites subjetivos da coisa julgada
Por sua vez o limite subjetivo da coisa julgada vez regulado pelo art. 472 do Código de Processo Civil:
“A sentença faz coisa julgada às partes entre as quais é dada, não beneficiando,nem prejudicando terceiros. Nas causas relativas ao estado de pessoa, se houverem sido citados no processo, em litisconsórcio necessário, todos os interessados, a sentença produz coisa julgada em relação a terceiros.”
Vale ressaltar algumas exceções ao limite subjetivo da coisa julgada. Vejamos algumas delas:
“[…]1)ações de estado,como a paternidade, os limites subjetivos da coisa julgada se estendem a terceiros caso todos os interessados tenham sido citados para o processo.Ex. ação declaratória de paternidade, o único intereesado é o suposto pai, sendo que se este for citado a decisão vale para os avós. ) 1)ações de estado,como a paternidade, os limites subjetivos da coisa julgada se estendem a terceiros caso todos os interessados tenham sido citados para o processo.Ex. ação declaratória de paternidade, o único intereesado é o suposto pai, sendo que se este for citado a decisão vale para os avós.(p.548)
2)Substituição processual:quando o legitimado extraordinário vem a juízo tutelar alegado direito alheio e o aventado titular não participa do contraditório.Tanto o substituto quanto o substituído estarão vinculados subjetivamente à coisa julgada.Art. 42, §3º do CPC.”
3)Legitimação processual concorrente:autorização conferida a diversas pessoas para tutelar determinada situação de direito material controvertida.Ex.: compossuidores e condôminos
4)Sucessão mortis causa ocorrida após o trânsito em julgado[24].
A razão para a existência dos limites subjetivos da coisa julgada é pelo fato de as partes terem se manifestado no processo, sendo ouvidas e influenciando no julgamento da causa, em respeito ao contraditório e ao devido processo legal.
2.4.3 Limites temporais
Alguns doutrinadores também afirmam existir limites temporais da coisa julgada, apesar de tal posição ser minoritária, já que para a maioria esta está incluída nos limites objetivos.
Os limites temporais estariam vinculados às alterações de fato que decorrem das relações jurídicas continuativas.
Os limites temporais da coisa julgada, portanto, decorreria do art. 471 do Código de Processo Civil:
“Art. 471. Nenhum juiz decidirá novamente as questões já decididas, relativas à mesma lide, salvo:
I – se, tratando-se de relação jurídica continuativa, sobreveio modificação no estado de fato ou de direito; caso em que poderá a parte pedir a revisão do que foi estatuído na sentença;
II – nos demais casos prescritos em lei.”
Nesse sentido Antônio do Passo Cabral:
“A chegada a este marco temporal faria com que a disciplina da coisa julgada estivesse atrelada à situações fática até então existente, à conjuntura observável naquele preciso instante. A fixação deste ponto teria importante aplicação prática: os fatos posteriores, ocorridos supervenientemente ao marco temporal de formação da coisa julgada, estariam excluídos da indiscutibilidade e poderiam ser alegados e debatidos pelos litigantes a despeito da coisa julgada anterior”.[25]
Porém, a parte da doutrina não verifica a formação de coisa julgada material nas relações jurídicas continuativas. A razão levantada para isso é que fatos novos levam a diferentes ações, em função de diferentes causas de pedir[26].
2.5 Funções da coisa julgada
2.5.1 Função negativa
A doutrina especializada aponta que a função negativa da coisa julgada impedi que a questão já decidida em um processo venha a ser novamente objeto de decisão em outro processo diverso.
2.5.2 Função positiva
Por sua vez, a função positiva da coisa julgada seria a vinculação que os juízes teriam de levar em consideração aquilo que já é objeto de coisa julgada. Devendo levar em consideração o conteúdo da decisão anterior que formou a coisa julgada.[27]
2.6 coisa julgada total ou parcial
Verifica-se o que a Doutrina de Dinamarco denomina de capítulos da sentença.
Para esse doutrinador capítulos da sentença são unidades autônoma que estão contidas no que foi objeto da decisão.[28]
Quando uma sentença tem mais de um capítulo, independentes entre si,, poderá haver formação de coisa julgada parcial, quando só um deles seja objeto de recurso e não haja relação de prejudicialidade entre os capítulo.
Caso haja capítulos autônomos e dependentes entre si, não haverá coisa julgada parcial, em função do efeito expansivo objetivo externo do recurso.[29]
Assim, a coisa julgada parcial pressupõe uma decisão com capítulos independentes e que só um deles foi objeto de recurso.
Porém, é relevante destacar que o Superior Tribunal de Justiça não vem adotando essa teoria da coisa julgada parcial. Para o referido Tribunal, a interposição do recuso impede a formação da coisa julgada no todo do decidido, abrangendo até os capítulos independestes não impugnados no recurso.[30]
Argumento o Superior Tribunal de Justiça que o efeito translativo do recurso faz subir questões de ordem pública e que, assim, poderia extinguir o processo, atingindo até os capítulos não impugnados pelo recurso. Isso ocorre somente nas instâncias ordinárias, vez que na extraordinária, não se aplica o efeito translativo, em razão do entendimento do Supremo tribunal Federal exigindo o prequestionamento.
2.7 Eficácia Preclusiva da coisa julgada
A eficácia preclusiva da coisa julgada vem regulado no art. 475 do Código de Processo Civil, nesses termos:
“Art. 475 : Passada em julgado a sentença de mérito, reputar-se-ão deduzidas e repelidas todas as alegações e defesas, que a parte poderia opor assim ao acolhimento como à rejeição do pedido.”
Tal eficácia preclusiva da coisa julgada também é referida pela doutrina especializada como julgamento implícito ou de princípio do deduzido e do deduzível
Vejamos a excelente lição de Sérgio Gilberto Porto dobre o tema:
“Todavia, no Brasil, com o advento do Código de Processo Civil de 1973 e, mais precisamente, com a edição da norma antes referida (art. 474), passou a doutrina a externar preocupação não com a admissão do julgamento tido por implícito, mas, sim, com a natureza do instituto e sua extensão. Com tal propósito, ensina Arruda Alvim Neto que ‘ No que tange à temática da coisa julgada, já aceito pela doutrina, mas pouco claro na antiga lei e na jurisprudência. Isto significa que o art, 474 clarificou o chamado efeito preclusivo da coisa julgada, tendo em vista o princípio do deduzido e do deduzível, ou seja, a autoridade da coisa julgada se estende sobre o que foi deduzido e aquilo que poderia ter sido deduzido, mas não o foi. Então todo e qualquer argumento do autor e réu, que poderia ter-lhes sido útil, respectivamente, mas não foi discutido, ficará coberto pela coisa julgada. Foi interessante essa clareza da lei, porque a única regra expressa mais antiga da coisa julgada é que opera nos limitos das questões decididas. Aliás, que podemos recordar, a respeito do art. 287, parágrafo único, da lei anteriormente vigente. Esta nova lei veio tornar claro que a coisa julgada se faz nos limites das questões decididas, bem como, daquelas questões que poderiam ter sido suscitadas, mas não o foram’”.[31]
Assim, todas as questão deduzidas como também aquelas que poderiam ser deduzidas para o acolhimento ou não do pedido consideram-se reputadas e repelidas, não podendo ser invocadas em um outro processo. Ou seja, mesmos as questões não levantadas serão “ apreciadas”, implicitamente, pelo juiz.
2.8 Coisa julgada nas Ações coletivas
Tema que se relaciona a onda de acesso à justiça referente aos direito difusos e coletivo. Abrange, portanto, a ação popular, ação civil pública, o Código de defesa do consumidor, meio ambiente, entre outros.
A característica do processo coletivo refere-se que a coisa julgada terá efeitos erga mones, salvo se por improcedência por insuficiência de prova.
Eficácia Erga omnes é aquela que atinge a todos, transbordando as partes do processo.
Por sua vez outra característica da coisa julgada no processo coletivo é que ela se forma secundum eventum litis, ou seja a depender do resultado do processo.
Se a sentença for de procedência, produz efeitos erga omnes, e atinge a todos aqueles que são titulares do direito envolvido. Porém, caso seja julgada improcedência, em regra atinge só as partes do processo, e mesmo assim caso não seja o fundamento por ausência de provas.[32]
2.9 Arguição de coisa julgada
O art. 301. VI, do Código de Processo Civil prever que ó réu deverá alegar a exceção de coisa julgada em preliminar da contestação.
Nesse caso, acolhida a preliminar de coisa julgada, o processo extinguisse sem julgamento de mérito, porém com um adendo no que tange a impossibilidade de repropositura da mesma ação.
Vale ressaltar que só haverá formação de coisa julgada se houver o que se denomina de tríplice identidade de ações, nos termo do que rege o art. 301 § 2 do Código de Processo Civil: “Art. 301§ 2º Uma ação é idêntica à outra quando tem as mesmas partes, a mesma causa de pedir e o mesmo pedido”.
Nesse sentido, a doutrina afirma ser a coisa julgada um pressuposto processual negativo.[33]
2.10 Coisa julga e decisão determinativa
As sentenças determinativas são aquelas que resolvem relações jurídicas continuativas.
O exemplo padrão seria a da Ação de alimentos, baseando-se uma situação atual mas que, pelo fato de projetar seus efeitos para o futuro poder haver alteração fática e que enseja uma nova decisão, com base na revisão.
Fala-se na expressão rebus sic stantibus exatamente para delimitar os efeitos da sentença se impõe quando mantidas as condições fáticas que ensejou o decidido. Havendo alteração, como por exemplo, na ação de alimentos, na condição financeira do devedor de alimentos será cabível a parte pleitear a revisão daquilo que foi fixado na sentença, surgindo, para alguns uma nova ação, em face da alteração da causa de pedir.
2.11 Eficácia da sentença e coisa julgada.
A eficácia da sentença representa os efeitos que ela produz, modificando ou não as relações jurídicas.
Vejamos a lição ímpar de botelho de Mesquita sobre a eficácia da sentença:
“São as alterações que a sentença produz sobre as relações jurídicas existentes fora do processo. São alterações que a sentença produz por via direta nas relações entre as partes e, por via reflexa, nas relações entre as partes e terceiros. Nem todas as sentenças produzem alterações. Só as de procedência”[34].
Lembra o iminente doutrinador que a sentença produz efeitos até antes do trânsito em julgado.E continua, afirmando que os efeitos da sentença não se revestem de imutabilidade, além de poder beneficiar ou prejudicar terceiros.[35]
2.12 Indiscutibilidade e a Imutabilidade
Afirma a doutrina que a coisa julgada representa tanto a imutabilidade, no sentido de não ser mas objeto de nova discussão, ligado, assim, ao efeito negativo da coisa julgada. E a indiscutibilidade obriga o juiz de um segundo processo a tomar como premissas aquilo que já foi objeto da coisa julgada, vinculando-o, estando ligado, portanto, ao efeito positivo da coisa julgada.
Vejamos a lição magistral de Antônio de Passo Cabral:
“A imutabilidade é a impossibilidade de alteração do decisum e corresponde à imunização, isto é, sua blindagem de qualquer alteração posterior, seja por órgão do judiciário, pelas partes ou ainda por atos de outros Poderes do Estado. E o indiscutibilidade revela a técnica operativa da coisa julgada: para tornar imunes as decisões estatais, o legislador se vale de um mecanismo preclusivo. Ou seja, a maneira encontrada para assegurar a imunização e inalterabilidade da decisão é a vedação de rediscussão sobre ela. Portanto, a essência da técnica da coisa julgada é preclusiva, e talvez por essa razão os romanos a chamavam de praeclusio máxima, a preclusão última e maior.”[36]
3. RELATIVIZAÇÃO DA COISA JULGADA
3.1 Origem da tese da desconsideração da coisa julgada
A tese foi encabeçada primeiramente pelo Ministro Jose Augusto Delgado e Humberto Theodoro Junior e Cândido Rangel Dinamarco. [37]
3.2 Terminologia:
“A chamada relativização da coisa julgada também vem sendo denominada de desconsideração da coisa julgada, ou coisa julgada inconstitucional.”[38]
Vale ressaltar a crítica da doutrina para com quem usa a expressão “coisa julgada inconstitucional”, já que a coisa julgada está prevista na própria constituição federal como garantia fundamental. Assim, seria uma enorme contradição falar coisa julgada inconstitucional.
Ainda nesse sentido, mesmo a doutrina que apoia a relativização não adota a denominação de coisa julgada inconstitucional, para eles o que seria realmente inconstitucional seria a sentença e não a coisa julgada.[39]
Existe também doutrinador que prefere adotar o termo desconsideração, nesses termos trazidos por Alexandre de Freitas Câmara:
“Terminologia correta seria desconsideração da coisa julgada material, e não relativização da coisa julgada, pois a coisa julgada e a sentença não seram desconstituídas, mas desconsideradas, julgando-se nova causa como se aquela não existisse.”[40]
E ainda complementa outro brilhante doutrinador:
“Não há coisa julgada inconstitucional( é um falso problema como afirmou Botelho de Mesquita) na medida em que inexiste incompatibilidade entre o instituto e o texto constitucional. Ademais, o exame de constitucionalidade, por constituir premissa do julgamento, não faz coisa julgada. Inconstitucional poderá ser a decisão judicial, que considerar constitucional a lei ofensiva a constituição, jamais a coisa julgada (imutabilidade), em si mesmo considerada.”[41]
3.3 Premissas da tese da Relativização da coisa julgada
Segundo a doutrina partidária da teoria da relativização esta se impõe em função de não existir valores jurídicos absolutos.
Invocam também os princípios da proporcionalidade e razoabilidade como critério legitimador da relativização.
Segundo a doutrina que encabeçou a onda da relativização, Humberto Theodoro Júnior e Juliana Cordeiro, a intangibilidade da coisa julgada não teria assento constitucional.[42] Senão vejamos:
“A inferioridade hierárquica do princípio da intangibilidade da coisa julgada, que é uma noção processual e não constitucional, traz como consectário a ideia de sua submissão ao princípio da constitucionalidade,. Isto nos permite a seguinte conclusão: a coisa julgada será intangível enquanto tal apenas quando conforme a Constituição. Se desconforme, estar-se-á diante do que a doutrina vem denominando coisa julgada inconstitucional.”[43]
Porém, vale ressaltar que está posição dos ilustres doutrinadores supramencionados é minoritária, para a maioria doutrinária a coisa julgada tem natureza constitucional, constituindo uma garantia fundamental, nos termos do art 5º.XXXVI, da Constituição federal.
3.4 Hipóteses em que caberia a relativização da coisa julgada
3.4.1 Relativização Típica: Ação Rescisória
A Denominada relativização típica refere-se ao uso da ação rescisória como instrumento constitucionalmente previsto, e regulado pelo Código de processo Civil, para atacar as decisões transitadas em julgado.
A constituição Federal prever a ação rescisória quando da atribuição da competência para o seu julgamento pelos tribunais.
A ação rescisória tem natureza jurídica de ação autônoma de impugnação, estando regulados no art. 485 e seguintes do Código de Processo Civil:
“Art. 485. A sentença de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando:
I – se verificar que foi dada por prevaricação, concussão ou corrupção do juiz;
II – proferida por juiz impedido ou absolutamente incompetente;
III – resultar de dolo da parte vencedora em detrimento da parte vencida, ou de colusão entre as partes, a fim de fraudar a lei;
IV – ofender a coisa julgada;
V – violar literal disposição de lei;
Vl – se fundar em prova, cuja falsidade tenha sido apurada em processo criminal ou seja provada na própria ação rescisória;
Vll – depois da sentença, o autor obtiver documento novo, cuja existência ignorava, ou de que não pôde fazer uso, capaz, por si só, de Ihe assegurar pronunciamento favorável;
VIII – houver fundamento para invalidar confissão, desistência ou transação, em que se baseou a sentença;
IX – fundada em erro de fato, resultante de atos ou de documentos da causa;
§ 1o Há erro, quando a sentença admitir um fato inexistente, ou quando considerar inexistente um fato efetivamente ocorrido.
§ 2o É indispensável, num como noutro caso, que não tenha havido controvérsia, nem pronunciamento judicial sobre o fato.
Art. 486. Os atos judiciais, que não dependem de sentença, ou em que esta for meramente homologatória, podem ser rescindidos, como os atos jurídicos em geral, nos termos da lei civil.
Art. 487. Tem legitimidade para propor a ação:
I – quem foi parte no processo ou o seu sucessor a título universal ou singular;
II – o terceiro juridicamente interessado;
III – o Ministério Público:
a) se não foi ouvido no processo, em que Ihe era obrigatória a intervenção;
b) quando a sentença é o efeito de colusão das partes, a fim de fraudar a lei.
Art. 488. A petição inicial será elaborada com observância dos requisitos essenciais do art. 282, devendo o autor:
I – cumular ao pedido de rescisão, se for o caso, o de novo julgamento da causa;
II – depositar a importância de 5% (cinco por cento) sobre o valor da causa, a título de multa, caso a ação seja, por unanimidade de votos, declarada inadmissível, ou improcedente.
Parágrafo único. Não se aplica o disposto no no II à União, ao Estado, ao Município e ao Ministério Público.
Art. 489. O ajuizamento da ação rescisória não impede o cumprimento da sentença ou acórdão rescindendo, ressalvada a concessão, caso imprescindíveis e sob os pressupostos previstos em lei, de medidas de natureza cautelar ou antecipatória de tutela. (Redação dada pela Lei nº 11.280, de 2006)
Art. 490. Será indeferida a petição inicial:
I – nos casos previstos no art. 295;
II – quando não efetuado o depósito, exigido pelo art. 488, II.
Art. 491. O relator mandará citar o réu, assinando-lhe prazo nunca inferior a 15 (quinze) dias nem superior a 30 (trinta) para responder aos termos da ação. Findo o prazo com ou sem resposta, observar-se-á no que couber o disposto no Livro I, Título VIII, Capítulos IV e V.
Art. 492. Se os fatos alegados pelas partes dependerem de prova, o relator delegará a competência ao juiz de direito da comarca onde deva ser produzida, fixando prazo de 45 (quarenta e cinco) a 90 (noventa) dias para a devolução dos autos.
Art. 493. Concluída a instrução, será aberta vista, sucessivamente, ao autor e ao réu, pelo prazo de 10 (dez) dias, para razões finais. Em seguida, os autos subirão ao relator, procedendo-se ao julgamento:
I – no Supremo Tribunal Federal e no Superior Tribunal de Justiça, na forma dos seus regimentos internos; (Redação dada pela Lei nº 11.382, de 2006).
II – nos Estados, conforme dispuser a norma de Organização Judiciária.
Art. 494. Julgando procedente a ação, o tribunal rescindirá a sentença, proferirá, se for o caso, novo julgamento e determinará a restituição do depósito; declarando inadmissível ou improcedente a ação, a importância do depósito reverterá a favor do réu, sem prejuízo do disposto no art. 20.
Art. 495. O direito de propor ação rescisória se extingue em 2 (dois) anos, contados do trânsito em julgado da decisão.”
Assim, o modelo de coisa julgada adotada pela constituição já é relativo, pois permite a sua desconstituição pela via típica da ação rescisória, regulamentada, por sua vez, pelo Código de processo Civil.
Aquilo que a doutrina vem denominando de relativização, desconsideração e coisa julgada inconstitucional refere-se à tese da relativização atípica da coisa julgada.
3.4.2 Relativização atípica da coisa julgada
O que vem sendo objeto de discussão pela doutrina envolve a possibilidade de atacar a coisa julgada por meios outros, diferentes da ação rescisória.
A Revisão atípica defende a possibilidade de uma nova ação declaratória, querela nullutatis, sobre a questão já objeto de coisa julgada, com o pedido para que o juiz desconsidere, na fundamentação, a coisa julgada formada. [44]
3.4.3 Hipóteses da Revisão atípica
3.4.3.1 Coisa julgada inconstitucional
Sobre o tema vejamos a lição de Alexandre de Freitas câmara:
“A inconstitucionalidade é insanável. Por isso, não pode a sentença inconstitucional transitada em julgada estar imune ao controle de constitucionalidade.Aceitar tal tese implicaria admitir que o juiz tem um poder que ninguém mais possui: o de, por ato seu, modificar a Constituição da República, ou até mesmo o de afastar a incidência de norma constitucional e, um dado caso concreto.”[45]
Vale ressaltar que o legislador previu a possibilidade do executado defender-se de uma execução com base na arguição de que a decisão levou em consideração lei que posteriormente veio a ser declarada inconstitucional pelo Supremo.
Vejamos a previsão legal:
“Art. 475-l § 1o Para efeito do disposto no inciso II do caput deste artigo, considera-se também inexigível o título judicial fundado em lei ou ato normativo declarados inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal, ou fundado em aplicação ou interpretação da lei ou ato normativo tidas pelo Supremo Tribunal Federal como incompatíveis com a Constituição Federal.”
3.4.3.2 Injustiça da decisão
Vem sendo também aventada a possibilidade revisão atípica da coisa julgada pela simples injustiça da decisão.
Sobre o tema adverte a doutrina:
“Fundamentalmente, trata-se da possibilidade de sentenças de mérito transitadas em julgado causar extrema injustiça, com ofensa clara e direta a preceito e valores constitucionais fundamentais. Reconhecendo ser a coisa julgada material instituto processual, responsável pela tutela da segurança jurídica, sendo esse também um importante direito fundamental previsto na Constituição Federal, a um valor absoluto, que a priori e em qualquer situação se mostre mais importantes do que outros valores constitucionais. A proposta é que se realize no caso concreto uma ponderação entre a manutenção da segurança jurídica e a manutenção da ofensa a direito fundamental garantido pela Constituição Federal. Nesse juízo de proporcionalidade entre valores constitucionais, seria legítimo o afastamento da coisa julgada quando se mostrar no caso concreto mais benéfico à proteção do valor constitucional afrontado pela sentença protegida pela coisa julgada material.”[46]
Sobre o tema, não há garantias de que uma segunda decisão seja tida como mais justa do que a primeira, principalmente em si tratando de uma ação declaratória, perante um juiz singular, que venha a desconstituir uma decisão de um tribunal superior.
3.4.3.3 A questão da paternidade e do exame de DNA
Essa é uma hipótese de relativização bastante aceita pela doutrina e já admitida pelo Superior Tribunal de Justiça.
Segundo o magistério de Elpídio Donizzete:
“Defender a imutalibidade do julgado em ação de investigação de paternidade quando não disponibilizado o exame em DNA, quando se sabe que a solução poderia ser diversa caso realizada tal prova, é apegar-se demasiadamente à forma, tolhendo por completo o direito personalíssimo, indisponível e imprescritível de ver reconhecido o estado de filiação.
A relativização da coisa julgado na ação de investigação de paternidade é, portanto, mais que desejável e necessária. A busca incessante da verdade real, e não a imposição de verdades formais ou presumidas, é que garantirá a paz social e a harmonia da vida em sociedade. A ciência jurídica constrói-se a partir dos fatos sociais, econômicos, políticos e tecnológicos, e como tal, deve acompanhar a evolução desses fotas, sob pena de se tornar inónua e despicienda àqueles que dela necessitarem”.[47]
Também vem decidindo o Superior Tribunal de justiça nesse sentido:
“PROCESSO CIVIL. INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE. REPETIÇÃO DE AÇÃO ANTERIORMENTE AJUIZADA, QUE TEVE SEU PEDIDO JULGADO IMPROCEDENTE POR FALTA DE PROVAS. COISA JULGADA. MITIGAÇÃO. DOUTRINA. PRECEDENTES. DIREITO DE FAMÍLIA. EVOLUÇÃO. RECURSO ACOLHIDO.
I – Não excluída expressamente a paternidade do investigado na primitiva ação de investigação de paternidade, diante da precariedade da prova e da ausência de indícios suficientes a caracterizar tanto a paternidade como a sua negativa, e considerando que, quando do ajuizamento da primeira ação, o exame pelo DNA ainda não era disponível e nem havia notoriedade a seu respeito, admite-se o ajuizamento de ação investigatória, ainda que tenha sido aforada uma anterior com sentença julgando improcedente o pedido.
II – Nos termos da orientação da Turma, "sempre recomendável a realização de perícia para investigação genética (HLA e DNA), porque permite ao julgador um juízo de fortíssima probabilidade, senão de certeza" na composição do conflito. Ademais, o progresso da ciência jurídica, em matéria de prova, está na substituição da verdade ficta pela verdade real.
III – A coisa julgada, em se tratando de ações de estado, como no caso de investigação de paternidade, deve ser interpretada modus in rebus. Nas palavras de respeitável e avançada doutrina, quando estudiosos hoje se aprofundam no reestudo do instituto, na busca sobretudo da realização do processo justo, "a coisa julgada existe como criação necessária à segurança prática das relações jurídicas e as dificuldades que se opõem à sua ruptura se explicam pela mesmíssima razão. Não se pode olvidar, todavia, que numa sociedade de homens livres, a Justiça tem de estar acima da segurança, porque sem Justiça não há liberdade".
IV – Este Tribunal tem buscado, em sua jurisprudência, firmar posições que atendam aos fins sociais do processo e às exigências do bem comum.”[48]
3.4.4 Instrumentos da revisão atípica
A doutrina Marcus Vinícios Gonçalves elenca as formas revisão atípica, portanto, fora das hipóteses da ação rescisória:
“a)A impugnação à execução fundada em título judicial, quando o objeto for desconstituir ou declarar inexistente o título;
b)A ação declaratória de inexistência ( Querela nullitatis insanabilis);
c)Embargos à execução para desconstituir ou declarar a inexistência de sentença proferida em face da fazenda pública”.[49]
Sobre a Querela Nullitatis insanabilis, instrumento mais usado para realizar a revisão atípica da coisa julgada, manifesta-se Antônio do Passo Cabral:
“Historicamente, essa sistemática já fora permitida no Brasil, como se observou no formato dos embargos à execução, que antes do Código de Processo Civil de 1939 podiam ser usados com efeito rescisório. Porém, o mais antigo mecanismo atípicos de que se tem notícia é a querela nullitatis, uma demanda autônoma e sem prazo de ajuizamento, destinada a atacar vícios procedimentais graves. Este instrumento desenvolveu-se, ainda no direito romano intermédios e por influência do direito canônico, para impugnar os vícios de procedimento, tendo a apelação se firmado como um remédio apenas para os errores in iudicando”[50].
E ainda continua :
“[…]Outra hipótese atípica aventada para a superação da coisa julgada é o ajuizamento de nova demanda sobre o mesmo objeto, na qual não mais seria aceita a exceção de coisa julgada. Pontes de Miranda foi um dos que sustentara esta possibilidade, assim como a quebra da coisa julgada pela resistência à execução, não necessariamente implementada pelos embargos, mas também por uma simples alegação incidenter tantum, pela via das exceções.”[51]
3.4.4.1 A competência para o julgamento na revisão atípica
Um dos problemas enfrentados pela revisão atípica é que não existe competência fixada na constituição federal para o julgamento de uma ação declaratória de inexistência (Querella nullitatis). Assim o juiz de primeiro grau, nessa linha de raciocínio, poderá desconstituir um título formado por Tribunais Superiores.
4. CRÍTICA A RELATIVIZAÇÃO ATÍPICA DA COISA JULGADA
4.1 Aspectos gerais
O que vem sendo pregado pela doutrina favorável à teoria de desconsideração da coisa julgada acaba por alargar demasiadamente as hipóteses de revisão, extrapolando a forma típica de relativização, qual seja, a ação rescisória.
Vejamos uma ponderada reflexa geral sobre essa revisão atípica pregada pela doutrina:
“A tese da “ relativização “ da coisa julgada é defendida por juristas de escol e tem sido aplicada por diversos órgão do poder judiciário( ainda que sem expressa autorização legal). Por medida provisória, tentou-se criar nova hipótese de rescisão e o Código de Processo Civil foi alterado para autorizar o ataque à decisão transitada em julgado independentemente da propositura da ação rescisória. Como alertou Botelho de Mesquita, está aberta a ‘ estação’ de caça à coisa julgada. Urge defende-la, antes que seja tarde”[52].
Não poderíamos omitir a sempre precisa, pertinente, e ponderada posição do Barbosa Moreira:
“Suponhamos que um juiz esteja convencido da incompatibilidade entre certa sentença e a constituição, ou da existência, naquela, de injustiça intolerável, se considere autorizado a decidir em sentido contrário. Fatalmente sua própria sentença ficará sujeita à crítica da parte agora vencida, a qual não deixará de considera-la, por sua vez, inconstitucional ou intoleravelmente injusta. Pergunta-se: que impedirá esse litigante de imputar em juízo a segunda sentença, e outro juiz achar possível submetê-la ao crivo de seu próprio entendimento? O óbice concebível seria o da causa julgada; mas, se ele pode ser afastado em relação à primeira sentença. Porque não poderá sê-lo em relação à segurança ?”[53]
O perigo,alertada por Barbosa Moreira, é que a revisão atípica, sem qualquer critério legal, venha a perpetuar a demanda ad infinito, já que da segunda decisão pode o parte vencida recorrer por também alegar ser inconstitucional, injusta, ou qualquer outro fundamento.
4.2A coisa julgada como uma garantia constitucional
A constituição Federal de 1988 é exemplar no sentido de estabelecer direitos e assegura-los através de um rol de garantias fundamentais, que atinge a seara processual, fixando a coisa julgada como uma garantia constitucional processual, dentre diversas outras, como o devido processo legal, contraditório, ampla defesa, etc.
Vejamos a análise completa das garantias constitucionais trazidas por Sérgio Gilberto Porto:
“Nessa medida, a Constituição da República assegurou às partes determinadas cláusulas assegurativas, a saber: (a) publicidade dos atos processuais ( art. 5º, lx, e 93, ix), ou seja, a garantia de que, por regra, os atos praticados no processo são absolutamente públicos, constituindo-se, tal circunstância, na possibilidade maior de fiscalização dos atos judiciais transparente e democrática para o cidadão; (b) tratamento isonômico (art. 5º, caput) ou mais precisamente, por meio de tal garantia, em tese, se assegura tratamento paritário às partes, respeitadas suas desigualdades, não podendo haver privilégio a qualquer dos integrantes da relação jurídica controvertida; (c) a motivação das decisões judiciais ( 93, IX), com o fito de evitar o arbítrio judicial se exige do juízo fundamentação de suas decisões, ou seja, o juízo deve declinar as razões pelas quais decidiu desta ou daquela forma ou ainda, dito de outro modo, o juízo não decide como quer, por arbítrio, mas decide nos termos que a prova dos autor lhe autoriza, por meio da competente argumentação;(d) o contraditório judicial( art. 5º, LV e LIV), também conhecido como o princípio da bilateralidade da audiência, ou seja, às partes deve ser assegurado o direito de influenciar a decisão jurisdicional, por meio de seus argumentos e razões; (e) a inafastabilidade de lesão ou ameaça de direito da apreciação do Poder Judiciário (art. 5º, XXXV), vedando a possibilidade de qualquer tentativa de que “ justiça alternativa” venha a promover o acertamento das relações contravertidas; f) o acesso, que a todos deve ser assegurado, à Justiça ( art. 5º, XXXV), facilitando as formas de buscar guarida junto ao Poder Judiciário, através de mecanismos tais como isenção de custas ou acesso independentemente de advogado;(g) proibição de obtenção de prova por maio ilícito( art. 5. LVI), por não ser o processo em instrumento de incentivo a torpeza processual é vedada a possibilidade de que prova meio ilícito venha a ser tida como válida e, portanto, apta a gerar convicção judicial; (h) a atuação do juiz e do promotor natural (art. 5º, LIII), impedindo que juízo de execução ou constituído post factum seja competente para processar e julgar a lide posta à apreciação; (i) o duplo grau de jurisdição, representado pela possibilidade de que toda e qualquer decisão seja, no mínimo, examinada por juízos de graus diferentes, aos efeitos de diminuir a possibilidade de erro judiciário; (j) o devido processo legal (art. 5º, LIV), representado pela soma de todas as garantias, ou seja, o desrespeito a qualquer destas, em ultima ratio, importa também em violação a própria garantia do devido processo. E. por derradeiro, aquela que se amolda aos propósitos do presente ensaio, qual seja, (k) a segurança decorrente da coisa julgada ( art. 5º, XXXVI), que visa oferecer estabilidade às relações jurídico-sociais a partir de determinado ponto, lançando um basta ao conflito, gerando, por decorrência, o acertamento definitivo das relações jurídicas”.[54]
Assim não merece acerto a premissa usada por alguns autores que sustentam a revisão atípica da coisa julgada por ela não ter natureza constitucional.
A tida coisa julgada inconstitucional, nessa linha, é um paradoxo em si. Pelo contrário, a coisa julgada só pode receber o adjetivo de constitucional.
Também é relevante fixar o alcance da norma constitucional referente à coisa julgada.
A coisa julgada está protegida não só contra atos do legislativo como também de decisões judiciais, e do executivo. Assim, não cabe interpretar restritivamente essa garantia fundamental, limitando a oponibilidade em face de atos do legislador.
Nesse diapasão, segue a doutrina Sérgio Gilberto Porto:
“Adequado, neste passo, a referência de que, muito embora a Constituição ressalve expressis verbis apenas a impossibilidade de que lei nova venha a tisnar a autoridade da coisa julgada, esta impossibilidade na realidade, em face dos efeitos positivos e negativos naturais e intrínsecos ao instituto da coisa julgada, impõe-se também às próprias decisões jurisdicionais ou atos do Poder Executivo. Portanto, a autoridade da coisa julgada, vênia deferida de entendimento diverso, não pode ser interpretada de forma restritiva, resultando imune apenas contra atos futuros do Poder Legislativo, vez que seu propósito é outorgar estabilidade às relações jurídicas ( indaga-se) de que valeria ser a relação jurídica estável apenas contra a lei, não o sendo contra atos do Poder Executivo ou do próprio Poder Judiciário?” [55]
4.1.1 Ondas de mitigação das garantias constitucionais
A ideia de que não existem garantias constitucionais absolutas culminou na teoria alemã da ponderação de interesse para resolver os conflitos entre normas constitucionais no caso concreto.[56]
A primeira onda de relativização das garantias constitucionais refere-se, portanto, a utilização do princípio da proporcionalidade para resolver, dentro do campo próprio da constituição, conflitos de normas nos casos concretos.
Sobre essa onda de relativização, leciona Sérgio Gilberto Porto:
“Esta ideia básica, pode-se dizer, encerra a ‘ primeira onda’ de relativização dos direitos fundamentais e porque não dizer das garantias constitucionais. Neste cenário tudo se opera no plano constitucional, vez que se admite a mitigação de certo direito frente a outro ainda mais relevante, pena de, em se mantendo a inflexibilidade, gerar um resultado desproporcional, haja vista que estar-se-ia prestigiando um direito de menor hierarquia, embora também de assinto constitucional”.[57]
A segunda onda de relativização possibilidade que leis infraconstitucionais restrinjam garantias constitucionais. Aqui, diferente da primeira onda, a questão não se resolve no plano constitucional.
Vejamos a explanação do já citado doutrinador:
“Assim, parece, ao que pode observar do comportamento do Poder Legislativo e do Poder Judiciário, que vivemos a ‘ segunda onda’ da relativização, ou seja, a de que é possível relativizar garantia constitucional por lei infraconstitucional. Primeiro por que o legislativo edita leis de tal índole e segundo por que o judiciário dá guarida a tais leis.” [58]
A questão da revisão atípica da coisa julgada pode ser colocada como expressão da terceira onda de relativização das garantias constitucionais. Isso porque por essa onda, a relativização será realizada por meios não tipificados na lei. Ou seja, Para esse movimente nem a tipificação que ressalta da lei seria necessário para relativizar as garantias constitucionais.
Comenta o supramencionado doutrinador:
“[…] a novidade está, portanto, nesta ‘ terceira onda’ que admite a relativização da coisa julgada para além das hipóteses nominadas e, igualmente, para além da forma consagrada pela ordem jurídica processual, ou seja, a proposta por meio de catálogo expresso e técnica determinada, usada para invalidar o pronunciamento jurisdicional transitado em julgado, é superada, nascendo nova e desformalizada conduta processua”l.[59]
Os casos que vem sendo admitida a relativização atípica da coisa julgada são: exame de paternidade e exame de DNA, e justa indenização em demandas de expropriação pelo poder público.[60]
Ou seja, a terceira onda de relativização não impõe que esta se resolva dentro da própria seara da constituição (primeira onda), nem impõe que se dê pela forma tipificada em lei (segunda onda), mas sim que esta ocorre por decisão judicial, sem qualquer parâmetro típico existente na legislação, como é caso da ação rescisória.
4.2 A visão de Marinoni
Para a doutrina de Marinoni, a coisa julgada é pressuposto de existência do próprio discurso jurídico, não sendo uma simples regra processual. [61]
O mesmo doutrinador aponta o problema central do nosso sistema. Fazendo uma comparação como o que se estabelece na Alemanha, onde o juiz não faz analise sobre a constitucionalidade da lei, sendo esta atribuição exclusiva do Tribunal Constitucional. Já no Brasil, aponta o doutrinador, qualquer juiz de primeiro grau não só pode, mas tem o dever de fazer o controle incidental de constitucionalidade das leis, situação essa que causará diversos problemas, uma vez que esse dever do juiz pode entrar em choque com o entendimento posterior do Supremo Tribunal Federal. Nesses termos:
“Admitir que um processo se desenvolva por anos e gere uma sentença proferida por um juiz que tem dever de controlar a constitucionalidade, para posteriormente se dar ao executado o poder de alegar uma declaração de inconstitucionalidade posterior à formação da coisa julgada material, constitui gritante aberração, a violar, de uma vez só, o poder dos juízes e os princípios da segurança jurídica e da proteção da confiança, para não falar nas ilogicidades de menor relevância, como a de impor à administração da justiça o tempo, o trabalho e o custo dos processos individuais que por anos se desenvolveram para se chegar a uma sentença que, muito embora indiscutivelmente legítima, é posteriormente ‘ riscada do mapa’.”[62]
4.3 A ideia de relativização da coisa julgada pela ponderação
Vale a pena ressaltar que como garantia constitucional, a coisa julgada já foi objeto de ponderação pelo legislador, que, por sua vez, prévio, de forma típica, a sua relativização através da ação rescisório de competência fixada no próprio texto constitucional.
Nessa linha também leciona a doutrina de Marinoni:
“Não há cabimento em ponderar um direito que deve ser protegido pela jurisdição e um atributo que objetiva garantir a própria decisão jurisdicional. A coisa julgada não pode ser colocada no mesmo plano do direito que constitui o objeto da decisão à qual adere. Ela é elemento integrante do conceito de decisão jurisdicional, ao passo que o direito é apenas o seu objeto. Não há dúvida que os direitos podem, conforme o caso, ser contrapesados para fazer surgir a decisão jurisdicional adequada, mas a própria decisão não pode ser oposta a um direito, como se ao juiz pudesse ser conferido o poder de destruir a própria estabilidade do seu poder, a qual, antes de tudo, é uma garantia do cidadão.”[63]
4.4 Críticas à teoria defendidas pelo ministro José Augusto Delgado e Humberto Theodoro Jr.
A ideia que sustenta a relativização atípica pregada por esses eminentes doutrinadores parte de uma premissa errada, de que a coisa julgada seria um fenômeno infraconstitucional, previsto no Código de processo civil.
Ora, a coisa julgada não poderia ser um fenômeno que não constitucional, já que previsto como garantia constitucional, e ainda mais, não se restringe somente a vinculação do legislador, mas do judiciário e do executivo.
Vejamos a irreparável critica de Narinoni a tese do ministro José Augusto Delgado e Humberto Theodoro Jr.:
“Mas, além de incorrer nos equívocos antes referidos, a teoria que, com brilho, é defendida por José Augusto Delgado e Humberto Theodoro Jr. Ainda padece do defeito congênito de ver a coisa julgada como mera decorrência de regra contida no Código de Processo Civil. Com efeito, enquanto o Ministro Delgado sustenta ter sido vontade do legislador constituinte apenas configurar o limite posto no art. 5º, XXXVI, da Constituição Federal, impedindo que a lei prejudique a coisa julgada, Theodoro Jr. Ressalta que ‘ a noção de intangibilidade da coisa julgada, no sistema jurídico brasileiro, não tem sede constitucional, mas resulta, antes, de norma contida no Código de Processo Civil, art. 467, pelo que de modo algum pode estar imune ao princípio da constitucionalidade hierarquicamente superior’”.[64]
E continua:
“[…]Ora, a coisa julgada não apenas tem sustentáculo no art. 5º, XXXVI, da Constituição Federal, como constitui elemento estruturante do Estado de Direito. Lembre-se que na Alemanha, onde não há proteção constitucional expressa à coisa julgada, o seu fundamento constitucional está ancorado no princípio do Estado de Direito. O Bundesverfassungsgericht foi o principal responsável por esta elaboração, frisando que o princípio do Estado de Direito tem como componente essencial a garantia da certeza do direito, que exige não apenas o desenvolvimento regular do processo, como também a estabilidade da sua conclusão”.[65]
Assim, não há como negar a natureza constitucional da coisa julgada, prevista no art. 5º, XXXVI, da Constituição Federal.
Encontra-se pertinente e alinhada a crítica feita por Rodrigo klippler as premissas da revisão atípica: “sua tese de relativização segue a premissa de que a imutabilidade dos efeitos da sentença não teria assento na constituição”. E conclui: “apesar de ser um caminha mais fácil para fundamentar a relativização, deve-se entender que a coisa julgada tem assento na Constituição”.[66]
Ainda pelo magistério dos defensores da relativização atípica, uma sentença tida como inconstitucional seria considerada uma não-sentença, passível não de relativização, mas de simples desconsideração. Essa é, talvez, a forma mais agressiva de ataque da coisa julgada, ou seja, nega a própria existência dela.
Vejamos a explanação de Antônio do Passo Cabral :
“Partindo então da necessidade de projeção destes interesses hierárquicos ou axiologicamente superiores,a quebra da coisa julgada viria instrumentalizada por meio de algumas das possíveis técincas. A primeira delas seria a ampliação do conceito de ‘sentença inexistente’ para abranger também a sentença continente de uma inconstitucionalidade e, portanto, permitir a simples desconsideração do que ficou julgado. José Augusto Delgado afirmava que uma decisão desconforme a constituição seria uma ‘não-decisão’, chegando a listar Trinta e quatro tipos de decisão que poderiam ser consideradas como uma ‘não-sentença’. Humberto Theodoro Jr. E Juliana Cordeiro de Faria, p. ex., sustentam que, quando a decisão é desconforme à Constituição, a coisa julgada seria apenas ‘ aparente’.”[67]
4.3 Os problemas advindos da técnica da revisão atípica
Uma das mais significativas críticas se que pode fazer à teoria da revisão atípica da coisa julgada é que ela, pertencente à terceira onda de relativização das garantias constitucionais, supramencionada, não dispõe de qualquer parâmetro constitucional e legal, por isso mesmo se chama “atípica”, ou seja, não prevista em lei.
Ora, a Constituição permite a relativização, mas por meio típico, qual seja, a ação rescisória, prevista na distribuição de competências dos Tribunais, e regulamentada pelo Código de Processo Civil.
Isso tem uma razão lógica de ser, uma vez que quem tem competência para julgar uma ação rescisória é um Tribunal, órgão dotados de magistrados de maior experiência, além da sua formação colegiada, possibilitando o enfrentamento de diversos pensamentos.
Pergunta-se, quem julgará uma ação declaratória com o objetivo de quebrar a coisa julgada? Sabemos que não pode ser nenhum tribunal, pois a competência deles está taxativamente prevista da Constituição Federal.
Também vale ressaltar que a tese da revisão atípica levaria a eternização do processo. Isso porque o juiz de primeiro grau, revisando a coisa julgada, proferiria uma decisão, quem sabe até mais injusta, recorrível pela parte prejudicada, inclusive caberia pronunciamento do Supremo Tribunal Federal por meio do Recuso Extraordinário.
Nesse sentido a lição de Antônio do Passo Cabral:
“Assim, ninguém garante que um segundo julgamento será melhor que o primeiro que se pretende desconsiderar, e se esta pressuposição fosse correta, tampouco que um terceiro julgamento talvez fosse ainda melhor que o segundo. Vale dizer, não se pode assegurar que a nova sentença terá solução mais acertada que a anterior ou afastará o sentimento de injustiça que esta possa ter causado.”[68]
4.4 A solução : uso do meio típico da Ação rescisória como forma de relativizar a coisa julgada
A ação rescisória é o instrumento típico, previsto na constituição federal, na parte de fixação das competências originárias, e regulado pelo Código de Processo Civil.
Mesmo para aqueles que admitem a revisão atípica, reconhece que ela deve se dar nos mesmos termos da ação rescisória, como por exemplo, a questão da competência para julgamento.
Ainda existe uma terceira posição que fala em relativização atípica da coisa julgada por meio da ação rescisória, sendo a nosso sentir interessante,mas para que o legislador venha a contempla-la.
Vejamos essa proposta trazida por Rodrigo Klippel Bastos e Antônio Adonias:
“a ) a alteração do termo inicial do prazo de dois anos da rescisória (Arruda Alvim Wambier e José Miguel Garcia Medina):
aplicável aos incisos I,II,III,IV e VIII do art. 485
b) a desconsideração do prazo de dois anos da rescisória:
c) a interpretação mais ampla das hipóteses de cabimento do art. 485:
ex.: interpretação extensiva do conceito de documento novo
d) o ajuizamento da rescisória fora das hipóteses do art. 485 do CPC.”[69]
Veja que essa proposta não deixa de referir-se a uma revisão típica, pois por meio da ação rescisória, o que pretende é relativizar as hipóteses de cabimento da ação rescisória, como por exemplo: ampliação do prazo, alteração do termo inicial da contagem do prazo, inclusão de outras hipóteses legais. Nos alinhamos a esse pensamento.
O que não se pode conceber é a revisão inominada, atípica, por instrumentos não previstos na constituição, e nem na lei.
Em outras palavras fala-se em uma ação rescisória extraordinária, que é de competência dos Tribunais, evitando a subversão da organicidade do sistema, não permitindo que um juiz de primeiro grau desconstitua uma decisão transitada em julgada de um Tribunal Superior.[70]
O autor aponta os benefícios do uso da ação rescisória em relação a meios atípicos:
“[…]a)Evita alargamento das hipóteses de vício de inexistência jurídica, atacável por simples ação declaratória no primeiro grau
b)Os tribunais, como órgãos colegiados, são mais aptos a realizar a relativização da coisa julgada em função da complexidade do tema
c)Valor econômico maior da ação rescisória, 5 % do valor da causa, evitar aventureiros
d)A rescisória não suspende os efeitos da decisão”[71]
Assim, adotamos esta ideia de relativização típica temperada, que pretende usar a ação rescisória como meio típico de revisão, mas admitindo que alguns aspectos trazidos pela legislação de regência sejam flexibilizadas, tais como a ampliação do prazo para a sua interposição, a ampliação das hipóteses de cabimento, a alteração do termo inicial de contagem da ação rescisória.
Nessa linha de uma espécie de relativização típica temperada, segue Sérgio Gilberto Porto:
“Desta forma, a ampliação das hipóteses de cabimento, a dilação do prazo decadencial e a supressão deste para hipóteses excepcionalíssimas, vez que inconvalidáveis, parece bem temperada fórmula de pacificação jurídica. Portanto, máxima vênia, o desafio não é – simplesmente- relativizar de qualquer modo, a qualquer tempo e por qualquer juiz a coisa julgada, em verdadeiro desprestígio aos óbvios motivos que ensejaram sua criação, mas sim prestigiá-la, com um sistema, dentro da ordem jurídica, compatível com a realidade deste início de século, pena de, na verdade, estar-se incidindo em hipótese de desconsideração, própria do arbítrio e não em relativização.”[72]
Assim, a linha mais agressiva de ataque da coisa julgada, pregando até em “não-sentença”, ou “ sentença aparente”, já acima citadas, não deve prosperar, existindo um meio termo, que possibilita a utilização de um instrumento típico de revisão, mesmo que cabível, em situações excepcionais algum temperamento.
Uma hipótese de relativização que vem sendo admitida pelo Supremo Tribunal Federal, refere-se as ações de indenização pela desapropriação realizada pelo Poder público, quando configurado fraude no cálculo da indenização a ser paga pelos cofres públicos.
Nesse sentido cita Antônio do Passo Cabral:
“Outro grupo de casos em que se tem defendido a possibilidade de relativização da coisa julgada, e que também já ganhou adesão jurisprudencial, é aquela referente a causa de desapropriação, geralmente quando é determinado o pagamento de grandes quantias indenizatórias a indivíduos que não eram os reais proprietários, ou quando outros erros graves das sentenças transitadas em julgado geravam distorções no campo do direito material.”[73]
Também alerta o mesmo doutrinador, sobre a relativização atípica casuística da coisa julgada, partindo de um caso concreto raro, que ocorre de forma excepcional, senão vejamos:
“Outra importante objeção que pode ser feita à tese relativista é que esta trabalha com uma técnica indutiva e hipóteses excepcionais. Seus defensores partem de casos concretos absolutamente incomuns para chegar às conclusões gerais a que se propõem, um casuísmo por vezes até mesmo por eles assumido. Em nossa opinião, não se pode partir de pontos patológicos para construir padrões teóricos para o sistema das estabilidades”.[74]
Um exemplo usado para “provar” a necessidade de revisão atípica da coisa julgada seria, por exemplo, se um juiz determina que alguém trabalhe em regime de escravidão. Ora, qual é a possibilidade de isso ocorrer? Muito pouca?
Nessa linha também podemos ficar imaginando diversas situações em que a sentença seja teratológica, e assim até, para alguns inexistente.
Tal esforço não servirá para nada, pois está fora do mundo dos fatos, ficando só no campo da imaginação criativa de algum “desocupado”.
Nessa linha, continua o eminente doutrinador:
“De fato, a exemplificação é demasiadamente fantasiosa e fora da realidade. Pontes de Miranda, ao sustentar que a coisa julgada fora ‘levada londe demais’, dava exemplo de sentença ininteligível que pusesse alguém em regime de escravidão. Dinamarco menciona uma sentença que declarasse o recesso de um Estado da Federação, ou que condenasse alguém a das determinado peso de sua carne para o pagamento de uma obrigação, como no célebre Mercador de Veneza; ou que condenasse ‘uma mulher a proporcionar préstimos de prostituição ao autor’ em cumprimento a contrato firmado por ambos. Outros exemplos apontados são: sentença que reconheça vitalício um juiz com apenas um ano de exercício no cargo; decisão que permita a brasileiros naturalizados exercerem cargos de Presidente da República, Ministro do STF, dentre outos. São, à toda evidência, hipóteses muitíssimo improváveis.”[75]
Assim, a Ação rescisória deve ser utilizada como instrumento típico de revisão da coisa julgada, pois não agride a hierarquia estabelecida pelos órgões do Poder judiciário.
A Ação rescisória é o meio adequado à revisão da coisa julgada. Ela é uma ação autônomo de impugnação, formando um novo processo. Senão vejamos :
“Considerando-se, assim, o leque da classificação das ações, a partir das cargas de eficácia das sentenças, podemos definir a ação rescisória como ação de eficácia das sentenças, podemos definir a ação rescisória como ação constitutiva-negativa ou, como quer parcela da doutrina, desconstitutiva. Efetivamente, a sentença constitutiva cria, modifica ou extingue uma relação jurídica. Na demanda rescisória, o que mais se quer é, justamente, rescindir, romper a sentença como relação jurídica viciada nascida com a sentença anterior. Assim, parece irrefutável que – efetivamente- a carga de eficácia preponderante na pretensão rescisória é constitutiva-negativa, na medida em que se busca a extinção de relação jurídica preexistente”.[76].
Por fim vale a pena trazer em colação o pensamento de um dos maiores processualistas brasileiros:
“Tornou-se corriqueiro afirmar que a eficácia da coisa julgada cederá passo, independentemente do emprego da ação rescisória ou da observância do prazo previsto no art. 485, em algumas hipóteses. (…) Aberta a janela, sob o pretexto de observar equivalentes princípios da carta política, comprometidos pela indiscutibilidade do provimento judicial, não se releva difícil prever que todas as portas se escancararão às iniciativas do vencido. O vírus do relativismo contaminará, fatalmente, todo o sistema judiciário. (…) A simples possibilidade de êxito do intento revisionista, sem as peias da rescisória, multiplicará os litígios, nos quais o órgão judiciário de primeiro grau decidirá, preliminarmente, se obedece, ou não, ao pronunciamento transitado em julgado do seu tribunal e até, conforme o caso, do Supremo Tribunal Federal. Tudo, naturalmente, justificado pelo respeito obsequioso à Constituição e baseado na volúvel livre convicção do magistrado inferior(…). Parece pouco provável que as vantagens da justiça do caso concreto se sobreponham às desvantagens da insegurança geral.”[77]
A lição é irretocável, e prever as nefastas consequências dessa denominada “ revisão atípica da coisa julgada”.
A ação rescisória, por sua vez, relativiza a coisa julgada de forma não agressiva a toda a ordem jurídica, respeitando desde a questão da segurança jurídica, como também pelo fato de ela ser de competência dos tribunais, órgãos mais preparados para enfrentar o tormentoso tema de revisão de uma decisão já transitada em julgado.
Ainda sobre a ação rescisória, vale a pena assentar a lição do ilustre Pontes de Miranda:“ A pretensão rescisória constitui a res in judicio deducta. Não é o objeto do litígio ou a pretensão de direito material que foi objeto da ação em cujo processo sucedeu o pressuposto de rescindibilidade”[78].
Concluindo, a preocupação de Barbosa Moreira é irretocável ao alertar para o risco da perpetuação do processo, já que após haver a formação da coisa julgada em um primeiro processo, com decisão ultima de um tribunal,sua desconstituição por ação declaratória em primeiro grau levaria a questão, com o descontentamento da parte, a, por recurso extraordinária, bater as portas do Supremo Tribunal Federal, após o esgotamento de todos os recursos ordinários possíveis.
Não há nenhuma razoabilidade nisso, e atenta diretamente contra a razoável duração do processo, e, diga-se de passagem, que o processo precisa, como tudo na vida, ter um fim.
Conclusão
Das reflexões suscitadas neste trabalho, podemos tirar as sequentes conclusões:
A coisa julgada é um fenômeno processual que imprime a ideia de fim do litígio, sendo tratada pela Constituição Federal como uma garantia constitucional( art. 5º XXXVI).
Trata-se pois de um valor constitucional, um bem jurídico que garante segurança jurídica as relações jurídicas.
Ela é dividida em coisa julgada formal e coisa julgada material. A primeira projeta efeitos para dentro do processo, à segunda para fora do processo.
O que faz coisa julgada é exatamente o elemento declaratório contido no dispositivo da decisão, conforme a lição de Botelho de Mesquita.
A coisa julgada não é absoluta, isso porque o modelo que a nossa Constituição Federal adota permite sua relativização através da ação rescisória.
Por sua vez, a ação rescisória é um meio típico de revisão,sendo regulado por lei, tendo eu prazo previamente fixado, tendo elencado as suas hipóteses de cabimento no Código de Processo Civil.
Já a competência para julgamento vem fixada pela própria Constituição federal. Têm competência para o processo e julgamento da ação rescisória: Tribunais de Justiça; Tribunais Regionais Federais; Tribunais Regionais do Trabalho; Tribunais Regionais Eleitoras; Superior Tribunal de justiça e o Supremo Tribunal Federal.
A revisão atípica da coisa julgada, ou seja, pela utilização de outros instrumentos não previsto em lei, não deve prosperar, em face da importância da coisa julgada para a própria ideia de processo.
A revisão atípica, assim, representa a terceira onda de relativização das garantias constitucionais, uma vez que possibilita que um valor constitucional, coisa julgada, seja restringida por forma não prevista em lei, de forma “ atípica” ou “ inominada”.
A revisão atípica é nociva a diversos aspectos do processo e em especial à segurança jurídica e ao tempo razoável do processo.
As hipóteses que a doutrina trás de sentença injustas e inconstitucionais não representa a realidade daquilo que se verifica na prática forense.
Assim, o meio constitucionalmente previsto para a revisão da coisa julgada é a ação rescisória, de competência originária dos próprios tribunais, órgãos colegiado composto por juízes mais experientes para enfrentar um tema complexo no que tange a revisão da decisão.
O que poderia ser relativizado seria as balizas legais da ação rescisória, como exemplo: ampliação do prazo de 2 anos; aumento das hipóteses de cabimento; flexibilização do termo de início do prazo decadência para a interposição da rescisória.
Assim, o instrumento não comporta relativização, será a ação rescisória o meio adequado a desconstituir a coisa julgada.
Caso verifique-se que a sentença é inconstitucional, e já passou o prazo da ação rescisória, é possível, mesmo assim, admitir a via rescisória para a desconstituição do julgado, relativizando o prazo previsto na lei, não o instrumento em si, portanto.
Acadêmico em Direito pela Faculdade de Alagoas ; Pós Graduado em Direito Processual Civil pela Faculdade de Direito Damásio de Jesus. Servidor Público
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