Resumo: O presente estudo utiliza como principal alicerce o Código de Defesa do Consumidor. Aqui é explanado, primeiramente, o que são relações de consumo em seguida alguns dos princípios que são sua base. O conceito de serviço público também é colocado em questão, observando-se, especialmente, as suas condições de adequação, eficiência, essencialidade e continuidade. Dando continuidade ao teor do serviço público, o texto adentra na responsabilidade civil, que é o que definirá quando há obrigação de indenizar e o que é dano moral e mero aborrecimento. Visto as definições e associadas à responsabilidade civil, o terceiro capítulo exibe situações, casos concretos em que será identificado o cabimento de dano moral, diante da ineficiência na prestação de serviço do fornecedor. De forma detalhada, todas as definições que apreciadas, outrora, serão analisadas em cada situação, buscando um posicionamento, fundamentado na jurisprudência, doutrina e legislação. Para finalizar, o trabalho aponta uma ideia, uma sugestão, que almeja funcionar como desestímulo para práticas abusivas pelas empresas prestadoras desse serviço essencial. O escopo principal é apresentar o problema, discutir sua aplicabilidade em casos reais e em seguida assoalhar que existe providencia a ser tomada.
Palavras-chave: Relação de Consumo; Serviços Essenciais; Energia Elétrica; Dano moral; Indenizações.
Abstract: This study uses as its main foundation the Code of Consumer Protection . This is explained , first, what are consumer relations then some of the principles that are its foundation. The concept of public service is also called into question , noting especially the conditions of adequacy, efficiency, and continuity essentiality . Continuing the content of public service , text enters the liability , which is what sets when there is obligation to indemnify and what is moral and mere annoyance damage . Since the definitions and associated liability , the third chapter shows situations , specific cases where the pertinence of moral damages shall be identified , given the inefficiency in service delivery from the supplier . In detail , all the settings you enjoy , once , will be analyzed in each situation , seeking a position , based on case law , doctrine and law. Finally, the paper points out an idea , a suggestion which aims to act as a disincentive for abuse by companies providing this essential service. The main scope is to present the problem , discuss its applicability to real cases and then provides the plank that there be taken .
Keywords: Consumption Ratio ; Essential Services ; Electric Power ; Indemnities ; moral damage .
Sumário: Introdução. 1. Relação de consumo: Enfoque nos serviços essenciais. 1.1. Definição de relação de consumo. 1.2. Princípios de proteção ao consumidor. 1.2.1. Dignidade da pessoa humana. 1.2.2. Eficiência. 1.2.3. Proibição de práticas abusivas. 1.2.4. Vulnerabilidade e hipossuficiência. 1.3. Conceito de serviço público. 1.3.1. Adequada e eficaz prestação de serviço público. 1.3.2. Serviços essenciais a luz do Código de Defesa do consumidor. 1.3.3. Natureza essencial e contínua do fornecimento de energia elétrica. 1.3.4. Inadimplência do consumidor. 2. Responsabilidade do prestador de serviço de energia elétrica. 2.1. Responsabilidade civil do prestador de serviço público. 2.2. Obrigação de indenizar. 2.3. Conceito de dano moral. 2.4. Identificação de situações entendidas como mero aborrecimento. 2.5. Arbitramento do valor das indenizações. 3. Análise de casos concretos: cabimento de reparação civil em função da ineficiência da prestação do serviço. 3.1. Suspensão do fornecimento de energia pela inadimplência de faturas de regularidade. 3.2. Inclusão indevida em órgãos de proteção ao crédito. 3.3. Suspensão indevida: mediante contas pagas. Conclusão. Referências.
Introdução
No Brasil, o consumidor tem seus direitos reduzidos à norma através da Lei do Código de Defesa do Consumidor, de forma especial esse dispositivo preocupa-se com a prestação de serviço e serviços essenciais. As práticas abusivas, nesse âmbito, tomam uma proporção maior, pois, se tratam de serviços classificados como necessário para a vida. Energia elétrica, como ora será discutido, é um serviço enquadrado nesse contexto. O número significativo de ações e reclamações contra as prestadoras desse serviço chama atenção sobre a eficiência com que são oferecidos.
São costumeiras ações que envolvam concessionárias de serviço público de energia elétrica. Ainda mais habituais são os pedidos de indenização por danos morais, indiretamente, relacionados à prestação ineficiente do serviço. Essas situações chamam atenção em alguns aspectos: quais circunstâncias são caracterizadoras de danos morais? Até onde as concessionárias podem agir sem desrespeitar o consumidor? O que diz a legislação sobre o tema? Qual a posição da jurisprudência acerca das situações específicas?
O presente estudo traz as respostas para essas perguntas. Inicialmente, define o que é relação de consumo, consumidor e fornecedor para que se possa entender alguns dos princípios que protegem o consumidor. O conceito de serviço público também é aprofundado para que se perceba sua característica de essencialidade e continuidade.
Em seguida é feita uma ampliação do tema, abrangendo a questão da responsabilidade civil, pois a partir desse âmbito do direito civil passaremos a entender quando haverá obrigação de indenizar, o que será dano moral e como deve ser a fixação do valor da indenização nessas situações.
Para finalizar a análise do tema partindo de todo arcabouço oferecido pelos capítulos anteriores, estudaremos minuciosamente casos concretos específicos, associando os entendimentos fixados por jurisprudência, pela doutrina com as disposições legais relativas ao assunto.
A relevância da exposição e deliberação do tema em tela está na possibilidade de oferecer, depois de definir assuntos que impliquem no entendimento de todo o contexto, não só um estudo aprofundado de casos reais, mas abonar uma ideia para que a demanda de ações contra concessionárias seja diminuída, ou, quem sabe, esclarecer melhor a aplicação de indenizações como medidas educativas. Visando, sempre, o consumidor como principal beneficiado.
1.Relação de consumo: enfoque nos serviços essenciais e sua eficiência
1.1.Definição de relação de consumo
O Código de Defesa do Consumidor (CDC) é cabível em toda relação que puder ser caracterizada como de consumo. Haverá relação jurídica de consumo sempre que se puder identificar num dos pólos da relação o consumidor, no outro, o fornecedor, ambos transacionando produtos e serviços (NUNES; Rizzato. 2009, p. 71).
Consumidor é toda pessoa que figura em uma relação consumista como aquela para quem o serviço é prestado ou o produto é direcionado. Consoante o caput do Art. 2° do Código de Defesa do Consumidor: “Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final” (CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR, 1990).
Para entender a definição do artigo mencionado é preciso estudar o conceito de destinatário final, que nada mais é do que quem retira um produto do mercado ao adquirir ou simplesmente utilizá-lo, aquele que finaliza a cadeia de produção e não aquele que utiliza o bem para continuar a produzir ou na cadeia de serviço (MARQUES; BENJAMIM, 2006, p. 83).
A definição é melhor delineada da seguinte forma:
“destinatário final é aquela pessoa, física ou jurídica que adquire ou se utiliza de produtos ou serviços em benefício próprio, ou seja, é aquele que busca a satisfação de suas necessidades através de um produto ou serviço, sem ter o interesse de repassar este serviço ou esse produto a terceiros” (MANUCCI, 2013).
É possível concluir que a relação de consumo exige a presença do consumidor e do fornecedor o que nos leva também a almejar sua caracterização. Nesse sentido um conceito plausível é este:
“entende-se todo comerciante ou estabelecimento que abastece ou fornece habitualmente uma casa ou um outro estabelecimento dos gêneros e mercadorias necessárias a seu consumo. E, nesse sentido, por certo, que são compreendidos todos quanto propiciem a oferta de bens e serviços do mercado de consumo, de molde a entender às suas necessidades, pouco importando a que titulo, tendo relevância a distinção” (FILOMENO, 2005. p. 34).
O artigo 3° do Código de Defesa do Consumidor (1990) versa também sobre produto e serviço, o primeiro: “é qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial”, o segundo: “é qualquer atividade fornecida do mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista”.
O produto seria, portanto, o objeto da relação de consumo, independendo de sua forma e o serviço consistiria na prestação, que, por artefato principal tem a ação fornecida, i.e, o serviço prestado (CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR, 1990).
Quanto ao fornecedor, Flavio Tartuce (2012, p. 61), salienta que “…a palavra fornecedor está em sentido amplo, a englobar o fornecedor de produtos – em sentido estrito- e o prestador de serviços”.
No que concerne à prestação de serviço de energia elétrica a relação de consumo se enquadrar nos moldes das definições acima elencadas, mas vale especificar quem é o consumidor e quem é o fornecedor nessa relação especifica. A resolução 456/2000 da Agencia Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) define e classifica as unidades consumidoras e as classificações dos grupos dessas unidades, que são especificados pela intensidade de tensão, mas essa definição abrange um caráter técnico, não facilitando muito a caracterização de consumidor de energia elétrica(FADEL, 2009, p. 60-61).
Conforme cita Marcelo Costa Fadel (2009, p. 61-63): “Maria D’Assunção C. Menezello considera que sinônimo de consumidor é o usuário dos serviços públicos de energia elétrica”, em contrapartida o autor afirma que o direito de energia elétrica utiliza as duas palavras como sinônimas, embora não o sejam, isso porque, usuário é o beneficiário de um serviço público, etimologicamente falando. Os adeptos a teoria finalista em contraposição a teoria maximalista reconhecem que o Código de Defesa do Consumidor apresenta em seus artigos 2°, caput, 3°, e 4°, inciso I, características do consumidor propriamente dito, dentre elas: ser pessoa física ou jurídica, ser destinatário final fático e econômico, apresentar vulnerabilidade etc. É certo que nem sempre os grupos e classes de unidades usuárias, estabelecidos pela ANEEL, são consumidores propriamente ditos, tendo em vista que consumidor de energia elétrica é espécie de usuário. Dessa forma: “Consumidor de energia elétrica é o usuário que adquire ou utiliza este produto como destinatário final fático e econômico, apresentando vulnerabilidade técnica, cientifica ou fática, frente ao fornecedor” (FADEL, 2009, p. 61-63).
É importante entender, conforme Vilela Souto (2003, p. 338), que “Usuário não é consumidor, mas foi a ele equiparado para fins de proteção”. Porém, em apenas três hipóteses o usuário é equiparado ao consumidor, é protegido pelas normas do CDC quando cabíveis as disposições dos artigos 2°, parágrafo único, 17 e 29 desse diploma legal (FADEL, 2009, p.63).
Quanto à definição de fornecedor aplicada ao serviço público de energia elétrica, se pode afirmar que: “Os entes de direito público que prestam serviços essenciais à sociedade como serviços de fornecimento de água, luz e esgoto também se enquadram na figura de fornecedores com base no artigo 3º da lei 8078/90”( MANUCCI, 2010). Dessa forma identifica-se, de fato, uma relação de consumo, onde figura o consumidor, fornecedor e a prestação do serviço.
1.1. Princípios de proteção ao consumidor
Os princípios funcionam, no direito, como alicerces que norteiam a aplicação das normas como ferramentas a mais para auxiliar os aplicadores do direito.
O escritor Flávio Tartuce (2012, p. 23), lembra que:
“O estudo dos princípios consagrados pelo Código de Defesa do Consumidor é um dos pontos de partida para compreensão do sistema adotado pela Lei Consumerista como norma protetiva dos vulneráveis negociais. Como é notório, a Lei 8.078/1990 adotou um sistema aberto de proteção, baseado em conceitos legais indeterminados e construções vagas, que possibilitam uma melhor adequação dos preceitos às circunstâncias do caso concreto”.
Dada à importância do estudo principiológico, passamos a discorrer sobre aqueles mais aplicáveis ao tema ora abordado.
1.1.1. Dignidade da pessoa Humana
A dignidade da pessoa humana nada mais é do que o respeito aos direitos de um ser, dirigido a sua qualidade de humano. É um termo que específica e ao mesmo tempo generaliza, pois, é direcionado ao ser humano. Em contrapartida a expressão universaliza o sentido de humano, dando a entender que deve existir igualdade, i.e, toda pessoa terá dignidade em razão de ser humana.
O princípio da dignidade está previsto na Constituição Federal de 1988, sua previsão é apontada não como um princípio, mas, como um fundamento para a República Federativa do Brasil, o que enriquece seu significado tornando-se um alicerce à organização do país (CONSTITUIÇÃO FEDERAL, 1988). Segundo Rizatto Nunes (2009, p. 24): “a dignidade, o último arcabouço da guarida dos direitos individuais e o primeiro fundamento de todo o sistema constitucional”. Com tal definição o autor deseja dizer que é o princípio-base, pois, é a primeira coisa que deve ser respeitada, somente depois da observação desse princípio é que virão preocupações com diversos direitos a serem protegidos.
Para que haja o exercício pleno da dignidade é preciso dar condições para isso, pois, por si só todos tem esse direito, simplesmente por ser pessoa, no entanto, exercê-lo exige o preenchimento de uma série de aspectos. A dignidade da pessoa humana abrange os direitos sociais, isso porque, não há como falar em dignidade se não estiver garantido o mínimo vital (NUNES, 2009, p. 25).
No que concerne aos direitos do consumidor à dignidade da pessoa humana funciona também como primeiro passo, já que acima de tudo é o inicio da defesa dos direitos de uma pessoa. O Código de Defesa do Consumidor, hierarquicamente inferior a Constituição Federal, honra os princípios e fundamentos nela estabelecidas, respeitando-as fielmente.
1.2.2. Eficiência
O artigo 37 da Constituição Federal (1988) versa que:
“a administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência”.
Dessa disposição para a ótica do Direito do Consumidor é importante observar o requisito da eficiência. Rizatto Nunes (2009, p. 60) foi feliz em afirmar que: “O sentido de eficiência remete ao resultado: é eficiente aquilo que funciona”. Em poucas palavras o autor caracteriza o esperado, o objetivo final em relação à prestação de um serviço.
Direcionando o entendimento aos serviços públicos o Código de Defesa do Consumidor (1990) torna a eficiência um direito básico em seu artigo 6°: “a adequada e eficaz prestação dos serviços públicos em geral”. Unindo a Constituição Federal (1988) e o Código de Defesa do Consumidor, é óbvia a preocupação do legislador em exigir do Poder Público serviços bem elaborados, considerando, provavelmente, a importância dos setores dos quais o Estado é responsável, já que, a prestação ineficiente é uma forma de causar dano ao consumidor, ainda que seja pela omissão em sua prestação.
1.2.3. Proibição de práticas abusivas
Práticas capazes de lesar o consumidor caracterizando indícios de má-fé, de demasia, podem ser entendidas como práticas abusivas. Dessa forma:
“pode-se definir o abuso do direito como o resultado do excesso de exercício de um direito, capaz de causar dano a outrem, i.e, o abuso do direito se caracteriza pelo uso irregular e desviante do direito em seu exercício, por parte do titular” (NUNES, 2009, P. 139).
O código de Defesa do Consumidor se preocupa em coibir ações que abusem do consumidor em sua condição de fragilidade e respeita o Código Civil quanto à definição de atos ilícitos, qual seja: “Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito ou causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito” (CÓDIGO CIVIL BRASILEIRO, 2002).
Ainda no Código Civil, o art. 187 dispõe que: “também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestadamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes” (CÓDIGO CIVIL BRASILEIRO, 2002).
O código, é claro, estabelece situações que isentam a necessidade de reparação, deixando de ser ilícitos atos justificados e devidamente previstos em lei, do contrário, aquele que abusa de um direito terá que arcar com os prejuízos assumidos por este em razão de tal prática.
1.2.4. Vulnerabilidade e hipossuficiência
O artigo 4°, inciso I, do Código de Defesa do Consumidor, prevê: “reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor no mercado de consumo”(CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR, 1990). Esse reconhecimento: “significa que o consumidor é a parte fraca da relação jurídica de consumo. Essa fraqueza, fragilidade, é real, concreta, e decorre de dois aspectos: um de ordem técnica e outro de cunho econômico”(NUNES, 2009, p. 129).
Alguns autores entendem que a divisão da vulnerabilidade abrange mais aspectos que os mencionados no parágrafo anterior incluindo além deles o aspecto jurídico, e, ainda, denomina a vulnerabilidade econômica como fática, mas mantém o seu significado (MARQUES; BENJAMIM, 2006, p. 144-145).
Vulnerabilidade técnica pode ser caracterizada como a ignorância do consumidor relativa ao conhecimento técnico do produto ou da prestação de serviço.
“e quando está ligado aos meios de produção, cujo conhecimento é monopólio do fornecedor. E quando se fala em meios de produção não se está referindo aos aspectos técnicos e administrativos para a fabricação de produtos e prestação de serviços que o fornecedor detém, mas também ao elemento fundamental da decisão” (NUNES, 2009, p.130).
Vulnerabilidade fática ou econômica é a vantagem de maior capacidade econômica que o fornecedor tem sob o consumidor (NUNES, 2009, p. 130), em outras palavras é a desproporção fática de forças, intelectuais e econômicas que caracteriza as relações de consumo (MARQUES; BENJAMIM, 2006, p.145). O fornecedor é sem sombra de dúvidas, mais forte que o consumidor, ainda que esse seja detentor de boas condições financeiras, o fornecedor figura de forma avantajada.
Quanto à vulnerabilidade jurídica, conforme Claudia Lima Marques:
“é a falta de conhecimentos jurídicos específicos, de conhecimento, de contabilidade ou de economia. Esta vulnerabilidade, no sistema do CDC, é presumida para o consumidor não-profissional e para o consumidor pessoa física” (MARQUES; BENJAMIM, 2006, p.145).
A vulnerabilidade é o ponto de partida para entender a hipossuficiência do consumidor, isso porque, sua terminologia quer dizer: “pessoa de escassos recursos econômicos, de pobreza constatada, que deve ser auxiliada pelo Estado, incluindo-se assistência jurídica” (GUIMARÃES, 2006, p. 345).
O significado de hipossuficiência é praticamente idêntico a vulnerabilidade, mas a diferença essencial é exatamente a ausência de informações a respeito do produto e serviços que adquire. Um bom exemplo é a assinatura de um contrato por prestação de serviço pelo consumidor, esse, não tem conhecimento para entender o conteúdo das cláusulas, é, portanto, hipossuficiente (NUNES, 2009, p. 610). Destarte, a ignorância do consumidor quanto ao serviço ou produto deve ser respeitada e revertida ao seu favor para que o fornecedor não se utilize dessa desigualdade para pratica de atos ilícitos.
Ainda assim, Flávio Tartuce ( 2012, p. 30), através de sua ótica, aponta a discreta diferença dos conceitos. Vejamos:
“…O conceito de vulnerabilidade é diverso da hipossuficiencia. Todo consumidor é sempre vulnerável, característica intrínseca à própria condição de destinatário final do produto ou servço, mas nem sempre será hipossuficiente, como se verá a seguir. Assim, enquadrando-se a pessoa cmo consumidora, fará jus ao benefícios previstos nesse importante estatuto jurídico protetivo. Assim, pode-se dizer que a vulnerabilidade é elemento posto da relação de consumo e não um elemento pressuposto, em regra. O elemento pressuposto é a condição de consumidor”.
1.3. Conceito de serviço Público
Em conformidade com o Código de Defesa do Consumidor em seu artigo 3°, § 2°: “Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista”. O artigo 22 dispõe sobre serviços públicos, dessa forma:
“Art. 22 Os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos.
Parágrafo único. Nos casos de descumprimento, total ou parcial, das obrigações referidas neste artigo, serão as pessoas jurídicas compelidas a cumpri-las e a reparar os danos causados, na forma prevista neste código”.(CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR, 1990)
Duas definições, conduzidas pelo direito administrativo, mencionam o que é serviço público de forma, demasiadamente, clara, a primeira de Hely Lopes (2001, p. 311): “É todo aquele prestado pela Administração ou por seus delegados, sob normas e controles estatais, para satisfazer necessidades essenciais ou secundárias da coletividade ou simples conveniências do Estado”, e a segunda estabelecida por Maria Sylvia Zanella de Pietro (2001, p. 311), segue:
“toda atividade material que a lei atribui ao Estado para que a exerça diretamente ou por meio de seus delegados, com o objetivo de satisfazer concretamente às necessidades coletivas, sob regime jurídico total ou parcialmente público”.
Alguns princípios guiam os serviços públicos, funcionando como linha-base para o desempenho da atividade, esses princípios completam o sentido da administração pública, pois, trabalham no curso de designar a forma como as atividades serão prestadas de forma universal.
Marcelo Costa Fadel (2009, p. 38-41) enumera os princípios que entende como norteadores dos serviços públicos e os define da seguinte forma: “1-regularidade: exige do prestador de serviço público tão somente o respeito às regras, normas e condições preestabelecidas para esse fim, ou que lhe sejam aplicáveis, por exemplo: as unidades consumidoras devem receber energia elétrica dentro dos padrões da ANEEL; 2- princípio da continuidade: o prestador de serviço público deve executá-lo de maneira permanente, deixando-o ininterruptamente à disposição do usuário; 3- princípio da eficiência: é a organização racional dos meios e recursos para prestação de serviços públicos de qualidade em condição econômica de igualdade dos consumidores; 4- principio da segurança: resguarda a integridade física e moral de todos os indivíduos; 5- princípio da atualidade: a prestação do serviço público deve incluir a modernidade das técnicas, dos equipamentos, além de promover sua melhoria e expansão; 6- principio da generalidade: o prestador de serviço público deve expandi-lo ao máximo, atendendo a todos que tenha condições de recebê-lo; 7- princípio da cortesia: o usuário deve ser tratado com civilidade, de forma zelosa e cordial; 8- principio da modicidade tarifaria: sua fixação em preço justo, que possibilita a operação dos serviços dentro de padrões aceitáveis e acessíveis ao usuário”.
De tal modo os serviços públicos têm seus próprios princípios. Lembrando que são serviços prestados ao público em geral, entendemos que são precisos na sociedade, de forma que necessitam ser regulados para que a população não seja vitima de uma prestação defeituosa e para que haja igualdade para todos.
1.3.1. Adequada e eficaz prestação de serviço público
A exigência de prestação de serviço público adequado e eficaz está prevista no art. 6° do Código de Defesa do Consumidor. Eficiência como já discutido[1] é a idéia de que o serviço deve ser prestado de forma que atinja a finalidade para qual é destinado, no entanto, não basta ser adequado, nem está à disposição das pessoas, é preciso que seja realmente eficiente (NUNES, 2009, p. 150). “Nos termos do art. 6°, da Lei de concessões e permissão, serviço público adequado é aquele prestado com regularidade, continuidade, eficiência, segurança, atualidade, generalidade, cortesia e modicidade tarifária” (FADEL, 2009, p. 38).
Quanto às concessionárias, que são as prestadoras do fornecimento de energia elétrica, essas aderem também às normas do Código de Defesa do Consumidor. Segundo o art. 95 da resolução 456/2000 da ANEEL:
“A concessionária é responsável pela prestação de serviço público adequado a todos os consumidores, satisfazendo as condições de regularidade, generalidade, continuidade, eficiência, segurança, atualidade, modicidade das tarifas e cortesia no atendimento, assim como prestando informações para a defesa de interesses individuais e coletivos”. (AGÊNCIA NACIONAL DE ENERGIA ELÉTRICA, 2000).
O Código de Defesa do Consumidor (1990) é ainda mais específico quanto às concessionárias, no seu artigo 22:
“Art. 22. Os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos.
Parágrafo único. Nos casos de descumprimento, total ou parcial, das obrigações referidas neste artigo, serão as pessoas jurídicas compelidas a cumpri-las e a reparar os danos causados, na forma prevista neste código”.
Logo, de forma geral a conclusão é que: “o serviço público só é eficiente se for adequado” (NUNES, 2009, p. 105), respeitando as condições acima apontadas. A eficiência relativa a serviço público é exigida pelo Código de Defesa do Consumidor e sua observação atende a outros princípios que decorrem dele. Segundo Hely Lopes Meirelles: “é o mais moderno princípio da função administrativa, que já não se contenta em ser desempenhada apenas com legalidade, exigindo resultados positivos para o serviço público” (NUNES, 2009, p. 104). Isso significa dar aos consumidores não apenas a prestação do serviço, mas dar o direito de que estes tenham a satisfação de recebê-lo sem vícios, transtornos ou imperfeições.
1.3.2. Serviços essenciais à luz do Código de Defesa do Consumidor
Consoante o ilustre doutrinador Rizzato Nunes (2009, p. 107) os serviços essenciais são assim definidos:
“Em medida amplíssima todo serviço público, exatamente pelo fato de sê-lo (público), somente pode ser essencial. Não poderia a sociedade funcionar sem um mínimo de segurança publica, sem a existência dos serviços do Poder Judiciário, sem algum serviço público etc. Nesse sentido então é que se diz que todo serviço público é essencial. Assim, também o são os serviços de fornecimentos de energia elétrica, de água e esgoto, de coleta de lixo, de telefonia etc”.
Para a Lei 7.783, de 28 de junho de 1989 (1989) (Lei de Greve), a definição de tal questão está assim disposta: “Os serviços ou atividades essenciais, são aqueles serviços indispensáveis ao atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade, ou seja, das necessidades que coloquem em perigo iminente a sobrevivência, a saúde ou a segurança da população”. O mesmo diploma legal ainda enumera os serviços considerados como essenciais, em suas palavras:
“Art. 10 São considerados serviços ou atividades essenciais:
I – tratamento e abastecimento de água; produção e distribuição de energia elétrica, gás e combustíveis;
II – assistência médica e hospitalar;
III – distribuição e comercialização de medicamentos e alimentos;
IV – funerários;
V – transporte coletivo;
VI – captação e tratamento de esgoto e lixo;
VII – telecomunicações;
VIII – guarda, uso e controle de substâncias radioativas, equipamentos e materiais nucleares;
IX – processamento de dados ligados a serviços essenciais;
X – controle de tráfego aéreo;
XI – compensação bancária”.
A respeito da mencionada Lei, afirma Rizzato Nunes que: “nenhum desses serviços pode ser interrompido. O Código de Defesa do Consumidor é claro, taxativo e não abre exceção: os serviços essenciais são contínuos. E diga-se sem esforço essa garantia decorre do texto constitucional” (NUNES, 2009, p. 108).
Como desfecho para o entendimento a respeito da essencialidade, em seu contexto geral, há que se considerar o seguinte pensamento:
“…os serviços essenciais estão para a coletividade e para o Ordenamento Jurídico como serviços indispensáveis à manutenção da vida e dos direitos, conceito que vivifica a impossibilidade de sua interrupção. Além do mais, por serem indispensáveis à normalidade das relações sociais ocupam natureza pública, onde não se evidencia proprietários destes serviços, mas apenas gestores que devem atuar para a preservação de sua utilização pelo homem.” (VIDONHO JUNIOR, 2013).
É certo que existe a possibilidade de interrupção do serviço. A ideia de essencialidade encontra limites, visto que, outros critérios hão de ser observados, como o principio da continuidade. Mas, a essencialidade deve ser preservada, por se tratar da preservação de um bem necessário e dela decorrerá o respeito a outros princípios constitucionais, como a dignidade da pessoa humana, por exemplo.
1.3.3. Natureza essencial e contínua do fornecimento de energia elétrica
Quanto aos serviços essenciais em espécie, necessariamente, falando daquele que nos é objeto de estudo: energia elétrica, podemos entender que: “é unânime o entendimento de que o fornecimento de energia elétrica ao consumidor é serviço público essencial, assim como atualmente reconhecido pelo item n° 3 da Portaria n° 3 de 1999” (FADEL, 2009, p. 101), ainda sobre o tema:
“de competência para exploração direta ou indiretamente ou mediante autorização, concessão ou permissão da União conforme o artigo 21, XII, alínea b da Constituição Federal de 1988 o serviço de prestação de energia elétrica está previsto como essencial no artigo 10, I da Lei 7.783/89 e item 3 da Portaria nº 03 de 19 de Março de 1999 da Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça, sendo que permanece ratificada pelo recente Acórdão do STJ, que teve como Relator o Ministro José Delgado, 1ª Turma (ROMS 8915/MA. DJ 17.08.98. Unânime) que pelo brilhantismo copiamos a ementa: "ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. ENERGIA ELÉTRICA. AUSÊNCIA DE PAGAMENTO DE TARIFA. CORTE. IMPOSSIBILIDADE. 1. É condenável o ato praticado pelo usuário que desvia energia elétrica, sujeitando-se até a responder penalmente. 2. Essa violação, contudo, não resulta em reconhecer como legítimo ato administrativo praticado pela empresa concessionária fornecedora de energia e consistente na interrupção do fornecimento da mesma. 3. A energia é, na atualidade, um bem essencial à população, constituindo-se serviço público indispensável subordinado ao princípio da continuidade de sua prestação, pelo que se torna impossível a sua interrupção. 4. Os arts. 22 e 42, do Código de Defesa do Consumidor, aplicam-se às empresas concessionárias de serviço público. 5. O corte de energia, como forma de compelir o usuário ao pagamento de tarifa ou multa, extrapola os limites da legalidade. 6. Não há de se prestigiar atuação da Justiça privada no Brasil, especialmente, quando exercida por credor econômica e financeiramente mais forte, em largas proporções, do que o devedor. Afronta, se assim fosse admitido, aos princípios constitucionais da inocência presumida e da ampla defesa. 7. O direito do cidadão de se utilizar dos serviços públicos essenciais para a sua vida em sociedade deve ser interpretado com vistas a beneficiar a quem deles se utiliza. 8. Recurso improvido”. (1 turma Min. José Delgado. ROMS 8915/MA. DJ 17.08.98. Unanime). (VIDONHOO JUNIOR, 2013).
A jurisprudência acerca do tema sustenta o aspecto essencial do serviço de energia elétrica, pois, existem inúmeras decisões que não deixam lacunas para que se duvide da necessidade do serviço e do seu reconhecimento perante os magistrados.
O art. 22 do Código de Defesa do Consumidor além de tratar da essencialidade dos serviços públicos, indica também a necessidade de sua prestação em caráter continuo. É esse princípio que garante ao consumidor de serviço essencial que este não seja interrompido. Considerando seu aspecto de urgência, o CDC é taxativo, exigindo que os serviços essenciais sejam contínuos (NUNES, 2009, p. 108).
O Código de Defesa do Consumidor acolhe os serviços públicos como contínuos, pois, como supracitado somente o fato de ser público já dá ao serviço uma ideia de necessário. Mas, considerando que nem todo serviço público é essencial, o diploma legal tem uma preocupação maior protegendo os serviços, de fato, essenciais de forma mais efetiva, atribuindo-lhe um sentido especifico, próprio de serviços público essencial objeto de relação de consumo. O texto produzido pelo legislador almejou disciplinar que todo serviço público é contínuo, mas, quando for considerado essencial, carregue consigo a especialidade de ser urgente, precisando, portanto, ser defendido de forma particular, recebendo, assim, uma proteção adicional (FADEL, 2009, p. 38).
1.2.4. Inadimplência do consumidor
A regra quanto aos serviços públicos essenciais é que sejam prestados sem interrupção. Essa prestação ininterrupta, porém, não é absoluta. A Lei n° 8.987/95, dispõe sobre a possibilidade de interrupção do serviço em situações de emergência, por razão de ordem técnica ou de segurança nas instalações e pela inadimplência do consumidor (NUNES, 2009, p. 108).
Em situações entendidas como de força maior ou caso fortuito também pode ser feita a interrupção do serviço, mas nesse caso será da prestadora a responsabilidade sobre os danos causados (MOTA, 2013).
Há uma divergência da doutrina quanto à aceitação ou não do corte do serviço. A grande desarmonia começou com a mencionada lei que trouxe em seu teor a liberação para as concessionárias suspenderem o serviço diante do não pagamento pelo consumidor.
Parte da doutrina entende que o consumidor inadimplente não pode ser beneficiado com a continuidade na prestação do serviço público, nessa linha encontramos: Fernando Costa de Azevedo, Edison Tetsuzo Namba, Maria Antonieta Zanardo Donado, Eduardo Lima de Matos, entre outros (MOTA, 2013).
O ilustre doutrinador Rizzato Nunes (2009, p. 110) posiciona-se claramente contra o corte por inadimplemento, em suas palavras:
“Admitir-se-á o corte do fornecimento do serviço apenas após autorização judicial, se demonstrado no feito que o consumidor inadimplente, podendo pagar a conta, isto é, tendo condições econômico-financeiras para isso, não o faz. Afora essa hipótese e dentro dessa condição (autorização judicial), o serviço não pode ser interrompido”.
O ponto de vista do mencionado autor parte da defesa a aplicabilidade da Lei n° 8.987/95 (1995), que dispõe sobre o regime de concessão e permissão da prestação de serviços públicos. Outros autores seguem a mesma linha de raciocínio, o entendimento segundo essa lei é que ao interromper o serviço, no caso de inadimplência do usuário, seriam violados princípios constitucionais e também contrariaria o Código de Defesa do Consumidor (TEIXEIRA, 2013).
Nesse sentido, o mais sensato parece ser utilizar o princípio da proporcionalidade, priorizando a ideia de essencialidade, levando em consideração as condições para a continuidade do serviço. Assim, mediante a possibilidade de suspensão de um serviço essencial há que se cobrar na justiça, através da ação competente. O aplicador do direito considerando a possibilidade financeira do consumidor decidiria, então, sobre a efetivação ou não do corte do serviço.
Uma ação judicial é uma medida que traria ainda mais ações para o Poder Judiciário, porém combateria o perigo de as empresas por si só tomarem decisões que acabem causando um dano irreparável ao consumidor. Vale salientar que a solução da questão mediante o judiciário não seria prejuízo a continuidade do serviço, visto que, aqueles que tivessem condições de pagar seriam compelidos, mediante a suspensão. Enquanto quem não tem meios para tanto não seria tão prejudicado, pois sofreria igual procedimento de cobrança sem perder um direito que lhe é necessário, essencial.
2. Responsabilidade do prestador de serviço de energia elétrica
2.1. Responsabilidade civil do prestador de serviço público
A Constituição Federal e o Código de defesa do consumidor no que se refere à responsabilidade de prestadores de serviço público, afirmam claramente que o prestador do serviço é responsável pelo vicio do seu serviço e pelos danos que seus agentes causarem a terceiros. As mencionadas leis repetem o mesmo tema porque o legislador se preocupou em impedir brechas para que fornecedores afirmem não estarem enquadrados na Lei 8.078/98, de forma que o prestador de serviço público está submetido exatamente a todas as normas que recaem sobre o prestador do serviço público (NUNES, 2009, p. 120). Vale salientar que a responsabilidade civil dos fornecedores de serviço público pode derivar de outras leis, mas apenas a mais favorável para o consumidor (DI PIETRO, 2001, P. 390).
A responsabilidade civil do prestador de serviço é objetiva, isso quer dizer que o vício independe da existência de culpa de seu agente, basta que a vítima prove o dano e demonstre o nexo de causalidade com a atividade para que tenha o encargo de reparar o dano. Cabe ao fornecedor apresentar excludentes do nexo causal (FADEL, 2009, p.69). O entendimento quanto à responsabilidade ser objetiva já é predominante nas jurisprudências, segundo o Supremo Tribunal Federal (Recurso Extraordinário n° 262651-SP, 2004):
“A responsabilidade civil das pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviço publico é objetiva relativamente aos usuários do serviço, não se estendendo a pessoas outras que não ostentem a condição do usuário. Exegese do art. 37, parágrafo 6, da C.FR”.
Se houver vício de qualidade e/ou quantidade do serviço nos termos dos artigos 19 e 20 do Código de Defesa do Consumidor, o consumidor tem a seu favor algumas providencias que objetivam reparar o dano causado, quanto à qualidade é o que o consumidor pode exigir, e, a quantidade são os direitos que lhe assiste pleitear, quais sejam: a) a restituição total ou parcial da quantia paga; b) a reexecução total ou parcial do serviço; c) o abatimento proporcional no preço (NUNES, 2009, p. 121). Diante desse dispositivo legal o consumidor tem a faculdade de escolha no momento em que será ressarcido. É mais uma preocupação da lei, em deixar aquele a quem protege satisfeito.
2.2. Obrigação de indenizar
Como já fora explanado anteriormente, o fornecedor de serviço público tem alguns princípios aos quais deve respeitar e que o fazem ser responsável por danos causados aos consumidores, seja por defeitos atinentes a prestação de serviço, ou pelas informações insuficientes e/ou inadequadas, nos termos do artigo 14, do Código de Defesa do Consumidor (1990).
Consoante o entendimento de Maria Helena Diniz, a responsabilidade civil gera a obrigação de indenizar, em suas palavras: “a responsabilidade civil tem, essencialmente, uma função reparadora ou indenizatória. Indenizar é ressarcir o dano causado, cobrindo todo o prejuízo experimentado pelo lesado” (DINIZ, 2005, p. 131), significa dizer que apontar a responsabilidade civil em determinada situação é identificar quem responderá pela reparação do dano que resultar dessa, isso porque se houve lesão nasce a encargo de indenizar.
A forma de reparação parte do conteúdo do dano, segundo Maria Helena Diniz ( 2005, p. 32). Assim:
“Quando o CDC estabelece o dever de indenizar, quer que tal indenização seja ampla na medida de suas conseqüências. Os danos indenizáveis são, assim, como ditos, os de ordem material e os de natureza moral, os estéticos e os relativos à imagem” ( NUNES, 2009, p. 177).
Conforme Guimarães (2006, p. 233) indenização por danos materiais acontece “quando afeta fisicamente a pessoa, seus bens corpóreos ou interesses econômicos.” Rizzato Nunes (2009, p. 177) entende que é composta pelos danos emergentes e os lucros cessantes, Guimarães (2006, p. 234) por sua vez, diz que “é o efeito, direto e imediato, de ato ilícito, prejuízo que alguém sofre por deterioração, diminuição atual do patrimônio ou pelo que razoavelmente deixou de ganhar. Enseja reparação de perdas e danos”.
No dano patrimonial seriam duas as formas de reparação, são elas: a específica e a equivalente. No primeiro caso, a intenção é que se recupere o bem para que volte a forma inicial antes de sofrer o dano. No segundo caso, busca-se um remédio que compense o dano sofrido, que seria a indenização, tal reparação se traduz por pagamento do equivalente em dinheiro (DINIZ, 2005, p. 133).
Razoável destacar que a palavra indenizar vem do latim: in dene, que significa devolver no seu estado anterior. Quanto ao dano moral podemos dizer que quem sofre esse tipo de dano deve ter direito a uma satisfação de cunho pecuniário. É notório que não há como devolver ao seu estado precedente um bem extrapatrimonial, de maneira que se percebe o dano moral como compensável (MORAES, 2009, p. 145).
No Código de Defesa do consumidor o dano moral entendido, principalmente, em seu caráter satisfativo-punitivo e a indenização gerada por ele é fixada segundo critérios que aqui ainda serão discutidos com maior ênfase (NUNES, 2009, p. 178). A ideia de satisfazer a pessoa lesada significa reparar o sofrimento, o dano que lhe foi causado e a ideia de punir é no sentido de educar o agente causador do dano, afim de que não sejam reincidentes circunstâncias como a que causou a avaria.
2.3. Conceito de Dano moral
Dano moral é um termo jurídico muito conhecido e acessível até mesmo às pessoas que tem baixo grau de instrução. Altas indenizações e seus motivos atípicos são normalmente assunto de interesse da imprensa, assim o tema é facilmente discutido entre os brasileiros.
Por ser um termo jurídico de domínio público, presume-se que é de fácil definição, no entanto, comete grande equivoco quem se arrisca a defini-lo sem um estudo aprofundado.
Neste contexto, é comum que as pessoas apontem o dano moral como um constrangimento sofrido e, às vezes, nem sabem decerto o que seria esse tal sentimento. Ainda que seja um tema demasiadamente debatido não deixa de ser interessante pela dificuldade de sua conceituação nos casos concretos. É sabido que os aplicadores do direito passam por situações causadoras de duvidas quanto ao cabimento ou não de reparação e se essa se enquadra dentro das características de dano moral.
Dano é uma palavra que vem do latim damnum e quer dizer prejuízo, perda. Dano moral, por sua vez, é uma lesão do patrimônio imaterial da pessoa, como a honra, o crédito, a liberdade, a dignidade pessoal (GUIMARÃES, 2006, p. 234). Essa definição é direta, objetiva, mas, existem outros pontos de vista que podem enriquecer ainda mais o tema em comento e podem ser capazes de fundamentar o motivo pelo qual o dano moral é causador de tamanha polêmica. Rizzato Nunes (2009, p. 321), por exemplo, dá a palavra dano o mesmo significado de estrago e diz que “moral” é aquilo que está fora da esfera material, patrimonial do individuo.
Nesse âmbito “dano moral é aquele que afeta a paz interior da pessoa lesada; atinge seu sentimento, decoro, o ego, a honra, enfim, tudo aquilo que não tem valor econômico mas causa dor e sofrimento. E, pois, a dor física e/ou psicológica sofrida pelo individuo” (NUNES, 2009, p.178). Em sentido amplo é uma ofensa a personalidade (MIRAGEM, 2008, 38).
O dano moral vem a ser a lesão de interesses patrimoniais de pessoa física ou jurídica, provocada pelo fato lesivo. O critério da distinção não poderá ater-se a natureza ou índole do direito subjetivo atingido, mas ao interesse, que é pressuposto desse direito (DINIZ, 2005, p. 91).
Considera-se dano moral a consequência de um dano responsável por acarretar dor subjetiva, dor interior que, fugindo à normalidade do dia a dia, venha a causar ruptura em seu equilíbrio emocional interferindo intensamente em seu bem estar (MARINS, 2013).
Maria Helena Diniz (2005, p. 92) esclarece melhor o assunto lembrando que, o dano moral não está ligado ao sentimento da pessoa lesada ou envolvida na lesão, mas ao dano em si e suas consequências. O dano moral, conforme a ilustre doutrinadora:
“não é a dor, a angustia, o desgosto, a aflição espiritual, a humilhação, o complexo que sofre a vitima do evento danoso, pois estes estados de espírito constituem o conteúdo, ou melhor, a consequência do dano. A dor que experimentam os pais pela morte violenta do filho, o padecimento ou complexo de quem suporta um dano estético, a humilhação de quem foi publicamente injuriado são estados de espírito contingentes e variáveis em cada caso, pois cada pessoa sente a seu modo. O direito não repara qualquer padecimento, dor ou aflição, mas aqueles que forem decorrentes da privação de um bem jurídico sobre o qual a vitima teria interesse reconhecido juridicamente”.
Relevante ponderar que, o dano moral ainda pode ser classificado em direto e indireto. O primeiro visa a satisfação de um bem jurídico extra patrimonial contido nos direitos da personalidade ou nos atributos da pessoa (como o nome, a capacidade, o estado de família). E o segundo é aquele que provoca avaria em qualquer interesse não patrimonial, devido a uma lesão de um bem patrimonial da vitima (DINIZ, 2005, p. 93).
No tocante a polêmica mencionada nos primeiros parágrafos quanto à identificação do dano moral, os doutrinadores enumeram diversos motivos. Rizzato Nunes, por exemplo, afirma que o problema do dano moral era e sempre foi devido à falta de objetividade e materialidade (NUNES, 2009, p. 321).
Destarte, Maria Helena Diniz (2005, p. 92) dá como sugestão para o problema o enfoque a desvinculação da definição de dano moral com os sentimentos humanos. Em sentido contrário, Maria Celina Bondin de Morais ( 2007, p. 157-158) considera que:
“o dano é ainda considerado moral quando os efeitos da ação, embora não repercutam na órbita de seu patrimônio material, originam angustia, dor, sofrimento, tristeza ou humilhação à vitima, trazendo-lhe sensações e emoções negativas. Nesse ultimo caso, diz-se necessário, outrossim, que o constrangimento, a tristeza, a humilhação, sejam intensos a ponto de poderem facilmente distinguir-se dos aborrecimentos e dissabores do dia-a-dia”.
É possível, ainda, enumerar as mais importantes contradições que criam a problemática da reparação do dano moral, são elas: efemeridade do dano moral; escândalo da discussão, sentimentos de afeição e decoro; incerteza, nos danos morais, de um verdadeiro direito violado e de um dano real; dificuldade de descobrir-se a existência do dano; impossibilidade de uma rigorosa avaliação pecuniária do dano moral; indeterminação do número de lesados; imoralidade da compensação da dor com o dinheiro; perigo de inevitabilidade da interferência do arbítrio judicial conferindo ao magistrado poder ilimitado na apreciação dos danos morais, ao avaliar o montante compensador do prejuízo; enriquecimento sem causa; impossibilidade jurídica de se admitir tal reparação (DINIZ, 2005, p. 94).
Insta ressaltar, que existe uma falta de critérios objetivos para fixação do dano moral e para que não se estimule uma banalização, industrialização do dano moral é preciso que os aplicadores do direito se utilizem de prudência, bom-senso prático, justa medida das coisas, proporcionalidade (CAVALIERI FILHO, 2008, p. 83). Assim, diz Sergio Cavalieri Filho (2008, p. 83) que: “Tenho, entendido que, na solução dessa questão, cumpre ao juiz seguir a trilha da lógica do razoável, em busca da concepção ético-jurídica dominante na sociedade”.
Destarte, no meu entendimento dano moral é caracterizado quando a ação por si só indique a frustração de um direito ao qual a vitima foi privada ou o desrespeito a sua personalidade, observando assim seu caráter extra patrimonial. Há, ainda, que ser considerado, a consequência desse dano moral, que é o que indicará sua gravidade. Essa consequência deve ser ponderada como um transtorno atípico, um dano que causou um desarranjo tamanho capaz de provocar mudanças significativas na vida da vítima. Nesse contexto, caberá analise do sentimento da vítima, considerando, é claro, que varia de pessoa para pessoa, o que deve ser analisado cautelosamente no caso concreto.
2.4. Identificação de situações entendidas como mero aborrecimento
Em razão da subjetividade na definição do dano moral, faz-se necessário a identificação do que não é dano moral para que sua fixação seja cada vez menos passível de lacunas. A definição na doutrina do que é mero aborrecimento é escassa porque não há muito que se falar, visto que é analisável apenas no caso concreto.
Como ponto inicial tem-se a seguinte disposição:
“Mero dissabor, aborrecimento, mágoa, irritação ou sensibilidade exacerbada estão fora da orbita do dano moral, porquanto, além de fazerem parte da normalidade do nosso dia-a-dia, no trabalho no transito, entre os amigos e até no ambiente familiar, tais situações não são intensas e duradouras, a ponto de romper o equilíbrio psicológico do individuo. Se assim não se entender, acabaremos por banalizar o dano moral, ensejando ações judiciais em busca de indenizações pelos mais triviais aborrecimentos” (CAVALIERI FILHO, 2008, p. 83-84).
Atualmente, com o crescimento gradual do consumismo e com a tecnologia cada vez mais presente no cotidiano é normal que se criem novos conflitos em razão desses avanços. A energia elétrica enquanto não era tão acessível quanto hoje, os consumidores tanto eram privados do serviço como eram isentos das obrigações geradas pelo mesmo. Dessa maneira, alguns anos atrás não era comum que o consumidor precisasse se deslocar de sua residência buscando solução para determinado vício em aparelhos que não tinham anteriormente
O aplicador do direito ao se deparar com essas modificações da sociedade contemporânea precisa se adaptar as novas necessidades e suas consequências, passando a aplicar a tutela jurisdicional a partir de uma visão ampla. Não obstante há de serem restritas as situações condenáveis a dano moral para que não se banalize, vulgarize esse direito constitucional, condenando-se qualquer aborrecimento cotidiano. O perigo de se estimular o pagamento de indenizações é incentivar um comércio que não deve existir.
Como visto no conceito mencionado, mero aborrecimento do cotidiano seria um aborrecimento que faz parte do dia-a-dia, que não é causador de maiores consequência. É difícil, porém, a identificação dessas situações. O melhor caminho para enumerar tais situações é buscando jurisprudências que apontem a pacificação de entendimentos. Vejamos algumas:
“Embora a inobservância das cláusulas contratuais por uma das partes possa trazer desconforto ao outro contratante (e normalmente o faz) trata-se, em principio, de desconforto a que todos podem estar sujeitos, pela própria vida em sociedade. A dificuldade financeira ou a quebra de expectativa de receber valores contratados não toma a dimensão de constranger a honra ou a intimidade, ressalvadas situações excepcionais” (Supremo Tribunal de Justiça. Recurso Especial n° 202.564, 2010).
“DIREITO DO CONSUMIDOR – APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO – FRAUDE NO MEDIDOR DE ENERGIA ELÉTRICA – NÃO COMPROVAÇÃO – DANOS MORAIS – INEXISTÊNCIA DE CORTE DE ENERGIA, AMEAÇA OU INSCRIÇÃO EM SERVIÇO DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO – INDENIZAÇÃO INCABÍVEL – RECURSO IMPROVIDO – Não houve corte de energia, inscrição do nome da Apelante em serviço de restrição ao crédito ou qualquer procedimento vexatório na cobrança a ferir as normas consumeiristas. – O fato da Concessionária não ter logrado provar a fraude e assim perdido a demanda quanto à exigibilidade do débito faturado, por si só, não indica violação ao patrimônio moral da Apelante, seja de ordem interna (comprometimento da tranquilidade psíquica além do mero aborrecimento), ou de ordem externa (honra objetiva). – Recurso improvido” (Poder Judiciário de Pernambuco. Apelação Cível n. 168241-3, 2008).
“CIVIL – APELAÇÃO- AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – ENVIO DE CARTA DE COBRANÇA – DÍVIDA PAGA – CANCELAMENTO MANTIDO – DANO MORAL – INEXISTÊNCIA – MERO ABORRECIMENTO – INDENIZAÇÃO INDEVIDA – SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA – REDISTRIBUIÇÃO DOS ÔNUS DE SUCUMBÊNCIA – APELAÇÃO PROVIDA EM PARTE –Não cabe indenização por danos morais pelos dissabores de receber simples carta de cobrança de dívida já paga. -Havendo sucumbência recíproca, cabe a distribuição proporcional dos ônus do processo. -Recurso conhecido e provido em parte” (Tribunal de Justiça de Minas Gerais. Apelação cível, 2010).
Como se pode perceber, a partir das jurisprudências citadas, situações tidas como comuns e causadoras apenas de zanga não podem ser fundamento para o direito de reparação, porque não houve dano. O aumento do consumismo, da tecnologia faz com que os consumidores estejam passíveis, também, aos seus aspectos negativos.
É importante que o dano moral não seja vulgarizado, que não se torne tão acessível que perca seu objetivo principal, qual seja: reparar o dano e ao mesmo tempo punir o causador dele a fim de educá-lo.
2.5. Arbitramento do valor das indenizações
Após a caracterização do dano moral há que ser fixado o valor da condenação, o valor que reparará o dano. Qual seria o parâmetro para que o aplicador do direito fixe esse valor, o quantum indenizatório? A lei não dispõe a respeito do tema, dessa forma há que se considerar a Lei de Introdução ao Código Civil (1942), que versa: “Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito”.
Segundo Maria Helena Diniz (2005, p. 129) :
“Grande é o papel do magistrado na reparação do dano moral, competindo, a seu prudente arbítrio, examinar cada caso, ponderando os elementos probatórios e medindo as circunstâncias, preferindo o desagravo direto ou compensação não econômica à pecuniária, sempre que possível, ou se não houver risco de novos danos”.
Acerca do tema, Rizzato (2009, p. 324) criou alguns critérios para fixação da indenização por danos morais, vejamos alguns: a natureza especifica da ofensa sofrida; a intensidade real, concreta, efetiva do sofrimento do consumidor ofendido; a repercussão da ofensa no meio social em que vive o consumidor ofendido; a existência do dolo (má-fé) por parte do ofensor na prática do ato danoso e o grau de sua culpa; a situação econômica do ofensor; a capacidade e a possibilidade real e efetiva do ofensor voltar a praticar e/ou vir a ser responsabilizado pelo mesmo fato danoso; a prática anterior do ofensor relativa ao mesmo fato danoso, ou seja, se ele já cometeu a mesma falta; as praticas atenuantes realizadas pelo ofensor visando diminuir a dor do ofendido; necessidade de punição.
Rizzato Nunes aponta circunstâncias a serem observadas, mas elas não apresentam um caráter absoluto, são apenas pontos norteadores que podem ser observados a fim de contribuir para identificação do grau da ofensa, o que, consequentemente, dimensionará a medida da reparação.
Nesse sentido, pode-se perceber que o mais coerente no momento da fixação do quantum indenizatório é a decisão ser de acordo com o entendimento do juiz, isso porque ele poderá, dentro das conjunturas concretas, identificar o grau dos danos sofridos utilizando critérios como os apontados por Rizzato Nunes, sem deixar de considerar a especialidade de cada caso que é o que determinará a extensão da ofensa sofrida.
Criando a hipótese onde o juiz observa a intensidade real, concreta, efetiva do sofrimento do consumidor ofendido, a existência do dolo; a situação econômica do ofensor; a possibilidade de reincidência de determinada prática pelo ofensor, em um caso em que o consumidor é, visivelmente, lesado por um prestador de serviço terá condições mais concretas, dentro dos fatos ocorridos, para estabelecer um valor capaz de reparar o dano sofrido (NUNES, 2009, p. 324). Dessa maneira, há uma conexão entre o dano sofrido e a condenação.
3. Análise de casos concretos: cabimento de reparação cívil em função da ineficiência da prestação do serviço.
3.1 Suspensão do fornecimento de energia pela inadimplência de faturas de regularidade
A resolução número 456 da ANEEL dispõe, dentre outros temas, a respeito das possibilidades de suspensão do serviço de energia elétrica (AGÊNCIA NACIONAL DE ENERGIA ELÉTRICA, 2000). Nessa perspectiva, e, após tomar conhecimento das definições capazes de respaldar nosso entendimento, analisemos numa situação concreta o cabimento do dano moral mediante a suspensão do serviço de energia elétrica motivada pela inadimplência de faturas de regularidade.
Faturas de regularidade são faturas que almejam a recuperação do valor correspondente ao consumo por parte da prestadora do serviço de energia elétrica. A mencionada resolução trata a situação como uma compensação do faturamento, que ocorre normalmente quando há impedimento de leitura do aparelho de medição, irregularidade de consumo, etc.(AGÊNCIA NACIONAL DE ENERGIA ELÉTRICA, 2000).
Ainda que haja permissão da agencia reguladora de energia elétrica de suspender o fornecimento de energia quando houver “atrasos no pagamento da fatura relativa à prestação do serviço público de energia elétrica” (AGÊNCIA NACIONAL DE ENERGIA ELÉTRICA, 2000), surge o questionamento a respeito de sua possibilidade, visto que é um serviço essencial e contínuo.
Dessa maneira, aplicando os princípios estudados é possível analisar além da essencialidade e continuidade, a hipossuficiência e a vulnerabilidade do consumidor na relação de consumo. Ainda que sejam princípios, nesse caso, um tanto antônimos ao principio da continuidade do serviço têm um peso relevante, visto que o consumidor em sua situação frágil será sempre à parte que, diante de um dano, sofrerá mais e terá maior dificuldade de reparação material.
O Supremo Tribunal Judiciário defende a possibilidade de suspensão do fornecimento de energia em razão de atraso no pagamento:
“ADMINISTRATIVO – ENERGIA ELÉTRICA -SUSPENSÃO FORNECIMENTO – AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE AVISO PRÉVIO -IMPOSSIBILIDADE.1. É pacífico o entendimento desta Corte no sentido de que é lícito à concessionária interromper o fornecimento de energia elétrica, se, após aviso prévio, o consumidor permanecer inadimplente no pagamento da respectiva conta. 2. Hipótese em que o Tribunal de origem consignou não ter sido comprovada a prévia notificação do usuário. 3. Agravo regimental não provido” (Tribunal Superior de Justiça. Agravo Regimental no Agravo de Instrumento n. 2009/0073031-6, 2009).
Porém, sobre o tema o Tribunal de Justiça de Pernambuco decidiu o que segue:
“PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO – AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÍVIDA C/C INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL – ENERGIA ELÉTRICA – IRREGULARIDADE NO MEDIDOR – SUPOSTO REGISTRO DE CONSUMO INFERIOR AO REAL – INSPEÇÃO E PROCEDIMENTO UNILATERAIS NA APURAÇÃO DO QUANTUM DEVIDO – ILEGALIDADE – CORTE NO FORNECIMENTO – MEDIDA COERCITIVA ILÍCITA – DANO MORAL CONFIGURADO – ALTERAÇÃO DA VERDADE DOS FATOS – CONDENAÇÃO POR LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ – RECURSO IMPROVIDO. 1-Quando de possível constatação de faturamento inferior ao atribuído como correto, carece de legitimidade a inspeção unilateral realizada pela própria companhia. 2-Acaso deseje a ré – porque entende devidos os valores – a cobrança destes, há de propor ação judicial, integrando o consumidor no contraditório e dando-lhe a possibilidade da ampla defesa. Aí, garantido o devido processo legal, a perícia técnica verificará a existência ou não daqueles e o seu montante. 3-Não tem a Celpe a faculdade de suspender o fornecimento de energia elétrica como coerção ao pagamento de aparente débito. 4-A suspensão do fornecimento de energia – considerada esta bem indispensável na atualidade – com todos os inconvenientes que daí advêm, constrangendo o autor ao pagamento de valor que este não entende devido, decerto repercutiu em seu íntimo e no de sua família. Dano moral caracterizado. 5-Afigurando-se não verdadeiro o argumento suscitado pela ré/apelante de que haveria confissão de dívida pelo autor e, desse modo, alterada a verdade dos fatos, impõe-se a condenação por litigância de má-fé.” (Poder Judiciário de Pernambuco. Apelação Cível n. 168241-3, 2008).
Essa jurisprudência afirma que a empresa Celpe (Companhia Energética de Pernambuco), deve cobrar do reclamante através da ação competente e não da suspensão do fornecimento do serviço. O entendimento do egrégio Tribunal é plausível ao respeitar de maneira prioritária a essencialidade do serviço, que em suas palavras é: “bem indispensável na atualidade” (Poder Judiciário de Pernambuco. Apelação Cível n. 168241-3, 2008). Há que se observar que se existem meios que a concessionárias possa assegurar a continuidade do seu serviço sem que prejudique o consumidor a ponto de privá-lo de algo que lhe é imperioso, é muito mais interessante, para a coletividade, que a empresa se utilize desses meios.
Ademais, a reparação de um dano não seria um perigo a continuidade da prestação do serviço da empresa isso porque seu poder econômico a torna, significativamente, superior ao consumidor. Considerando a Companhia Energética de Pernambuco (Celpe), por exemplo, que no ano de 2008 teve um lucro liquido de R$ 466,3 milhões (FALCÃO, 2013). Assim débitos a serem recebidos não teriam um caráter de urgência para a empresa de forma que precise usar de meios coercitivos como o corte da energia elétrica para receber. Os lucros da empresa são significativos e não põe em perigo sua existência.
É sabido que, o Poder Judiciário está abarrotado de ações judiciais, o que exige o estímulo a meios extrajudiciais, como a conciliação, por exemplo. É também sabido, que o posicionamento acima descrito aumentaria a demanda para esse Poder, tão atarefado. Porém, o que deve ser pensado como dano maior? O judiciário aumentar sua demandada? Ou consumidores estarem passíveis de suspensões desnecessárias? Há que se analisar que não se pode estimular uma política de diminuição de ajuizamentos se isso põe em risco direitos constitucionais de consumidores.
Trabalhando com esse posicionamento, alicerçado em uma linha jurisprudencial, consideremos a hipótese da fornecedora do serviço suspender a energia elétrica pela inadimplência de uma fatura de regularidade. A postura da empresa priva o consumidor de um serviço essencial, consequentemente fere alguns princípios como a dignidade da pessoa humana.
Nessa situação, como existem diplomas que permitem o corte do serviço não há como definir a atitude da empresa como ineficiente, nem inadequada, visto que não há um entendimento pacificado. Porém, o dano ao consumidor não deixou de ser caracterizado e sua dimensão atinge um bem extrapatrimonial. Sendo, facilmente diferenciado de um mero aborrecimento do cotidiano, por ser uma situação atípica e por causar dor e sofrimento que atingem a honra do consumidor, dando causa a necessidade de reparação.
Como visto, na jurisprudência do Tribunal de Justiça de Pernambuco, o dano moral pode ser caracterizado e sua reparação através de indenização deve ser feita. Assim: “com todos os inconvenientes que daí advém, constrangendo o autor ao pagamento de valor que este não entende devido, decerto repercutiu em seu íntimo e no de sua família. Dano moral caracterizado” (Poder Judiciário de Pernambuco. Apelação Cível n. 168241-3, 2008).
3.2. Inclusão indevida em órgãos de proteção ao crédito
Consideremos a situação em que a concessionária de energia elétrica inclui o nome do consumidor em algum dos cadastros que restringem seu nome para concessão de crédito sem notificação prévia nem motivos plausíveis e justificáveis. Nessa situação ocorreria dano moral e a necessidade de sua reparação pela ineficiência da empresa na prestação de seu serviço?
Bem, os órgãos de proteção ao crédito, como a Centralizadora dos Serviços dos Bancos S.A. (SERASA) e o Serviço de Proteção ao crédito (SPC), exercem importante função social e econômica, em benefício de todo o mercado, na medida em que funcionam como obstáculos da possibilidade de contratar, principalmente a prazo, para pessoas já em falta com suas obrigações (SILVA, 2013). Rizzato Nunes aponta um aspecto negativo desse tipo de inclusão, afirmando que se trata de um cadastro negativo, pois se dá pelo fato da pessoa estar inadimplente em relação ao pagamento de uma dívida (NUNES, 2009, 585).
Para que haja a inclusão em algum desses órgãos, é preciso que se identifiquem pelo menos alguns requisitos, como a existência de uma dívida, que a data prevista para pagamento tenha vencido e que o valor seja líquido e certo. Assim, a negativação deve ser feita de maneira criteriosa e estritamete dentro dos limites legais (NUNES, 2009, p. 586).
Vale salientar que a definição retrotranscrita aponta consumidores que estão em falta com suas obrigações, o que torna, então, os órgãos de proteção ao crédito injustificaveis para consumidores adimplentes, esse tipo de cadastro não pode servir como uma arma contra o consumidor, afim de puni-lo ou constrangê-lo. Se não há inadimplência não existe motivo para que o consumidor tenha seu nome restrito e se o tiver terá direitos individuais como a dignidade da pessoa humana feridos.
Dessa maneira,
“ocorrerá um dano à pessoa física ou jurídica, afetando seu bom nome, sua reputação, sua moral, posto que com o protesto há comunicação ao SERASA, ficando o protestado impedido de realizar transações de natureza comercial e bancária. Realizando o protesto, tal ato traz consequências negativas ao crédito e à idoneidade da pessoa que fica impedida de contrair empréstimo bancários, financeiros habitacionais etc” (GONÇALVES, 2013).
O artigo 43 do Código de Desefa do Consumidor (1990) disciplina a respeito do tema, explicando no segundo paragráfo que o consumidor deve ser comunicado por escrito da abertura do cadastro. Essa notificação serve para que os direitos constitucionais de garantia a dignidade e imagem do consumidor sejam respeitados, para que o consumidor tenha prazo para tomar medidas cabíveis para se opor a negativação quando ilegal e para que tenha chance de efetuar o pagamento evitando a negativação (NUNES, 2009, 585).
O entendimento de Flávio Tartuce (2012, p. 405) acerca desse tema é interessante e vale ser citado, vejamos:
“Apesar de sua notória caracterização como ilicito puro, o presente autor entende que o melhor enquadramento da hipotese é como abuso de direito, por quebra da boa-fé objetiva e da função social. Serve como luva, portanto, o art. 187 do Código Civil de 2002.”
Acerca da reparação civil, o Autor, mencionado no parágrafo anterior, leciona que:
“Em todos os casos, como os cadastros de consumidores lidam com o nome, direito da personalidade com proteção fundamental, é correto entender que os danos imateriais presentes são presumidos ou in re ipsa. A presunção é relativa, cabendo prova em contrário, por parte do fornecedor ou prestador (inversão do ônus da prova automática). Em relação aos danos materiais sofridos, devem eles ser provados, nos termos do art. 402 do Código Civil/2002, salvo os casos em que há pedido de inversão do ônus da prova por parte do consumidor, nos termos do artigo 6°, inciso VIII, do CDC”.( TARTUCE, 2012, p. 406)
A jurisprudência se direciona no sentido de que, inclusões indevidas nos órgãos de proteção ao crédito dão causa a presunção do dano moral, conforme se verifica no julgado que segue:
“RESPONSABILIDADE CIVIL. INCLUSÃO INDEVIDA DO NOME DA CLIENTE NOS ÓRGÃOS DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO. DANO MORAL PRESUMIDO. VALOR DA REPARAÇÃO. CRITÉRIOS PARA FIXAÇÃO. CONTROLE PELO STJ. POSSIBILIDADE. REDUÇÃO DO QUANTUM.
I – O dano moral decorrente da inscrição indevida em cadastro de inadimplente é considerado in re ipsa, isto é, não se faz necessária
a prova do prejuízo, que é presumido e decorre do próprio fato.
III – Inexistindo critérios determinados e fixos para a quantificação do dano moral, recomendável que o arbitramento seja feito com moderação, atendendo às peculiaridades do caso concreto, o que, na espécie, não ocorreu, distanciando-se o quantum arbitrado da razoabilidade. Recurso Especial provido.” (Supremo Tribunal de Justiça. Recurso Especial n° 1105974, 2010).
Recordando os pontos inicialmente apreciados nesse estudo, percebemos que uma inclusão em um órgão de proteção ao crédito quando a obrigação está devidamente adimplida atinge primeiramente a dignidade da pessoa humana, pois a agressão ao consumidor quando passa a desrespeitar sua condição de pessoa, atingindo em seguida todos os outros direitos que ela abraça.
Esse tipo de equívoco também desrespeita o princípio em que são proibidas práticas abusivas, pois, há indícios de negligência, falta de cuidado com o consumidor e abuso de direito, que o Código de Defesa do Consumidor repudia, de forma explícita. A caracterização de prática abusiva dá causa ao ato ilícito.
Ainda vale mencionar que o consumidor é vulnerável e hipossuficiente e as empresas é que detém o controle desses órgãos, pois são elas que fornecem os dados dos consumidores e os restringem, não tendo o consumidor força para evitar que haja a inclusão em cadastros negativos.
No que concerne à postura da concessionária de energia elétrica pensemos se a prestação do serviço público atende a eficiência e adequação que definimos anteriormente, no primeiro capítulo. Se a empresa utiliza os dados de um consumidor que paga suas contas fielmente está agindo eficientemente? A eficiência abrange apenas o fornecimento de energia elétrica ou o serviço como um todo? O mais sensato parece ser enquadrar todos os atos que envolvam a prestação do serviço na relação de consumo, dessa forma quando a empresa restringe um nome através do SPC ou SERASA, indevidamente, deixa de prestar o serviço de forma eficiente, pois, peca na qualidade da relação, deixa de oferecer segurança ao consumidor.
Quanto à responsabilidade civil rememoremos que a Constituição Federal (1989) esclarece que o prestador de serviço é responsável pelo vicio do seu serviço e pelos danos que seus agentes causarem a terceiros. Associando ao caso concreto se houve dano provocado pela prestadora de serviço a mesma deve repará-lo, pois, a Constituição Federal é clara em afirmar que há a responsabilidade civil, de sorte que surge a necessidade de indenização.
Meditemos sobre um consumidor que tem seu nome acessível a todo e qualquer crédito. Ele pode retirar empréstimos, realizar transações bancárias, adquirir cartões de crédito, fazer compras etc. Ponderemos a possibilidade em que ele é impedido de tais ações por seu nome estar incluso no SPC e/ou SERASA. O consumidor ao ser incluso em cadastros de proteção ao crédito e passa a ser visto como devedor o que causa não só uma privação de direitos como um dano capaz de atingir o âmbito moral, pois, extrapola fastios do dia a dia.
Como visto na jurisprudência, objeto de estudo desse tópico, o dano moral no caso de negativação por título pago é presumido só pelo fato da inclusão nos órgãos de proteção ao crédito. No momento em que o aplicador do direito toma conhecimento do fato passa a calcular todas as consequências que daí advém.
Assim sendo, nesse caso hipotético houve ineficiência na prestação de serviço por parte da concessionária de energia elétrica, de forma que inúmeros direitos do consumidor foram desrespeitados, princípios deixaram de ser observados. Causando, portanto, dano moral e dando causa a sua reparação através de indenização que deve ser arbitrada pelo magistrado após a analise detalhada do caso concreto.
3.3. Suspensão indevida: mediante contas pagas
Aprofundemos o assunto do presente tópico a partir da seguinte jurisprudência:
“DANO MORAL – SUSPENSÃO DO FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA – CONTA DE CONSUMO ADIMPLIDA – Sentença de procedência da ação – Indenização fixada em R$ 10.500,00 (dez mil e quinhentos reais) – Apelo da ré – Sentença mantida – Dano moral configurado – Ato ilícito consistente na suspensão de fornecimento de energia elétrica sem justo motivo – Conta paga meses antes do corte – Defeito na prestação de serviço Inteligência do artigo 14, caput, do CDC Valor que atende a teoria do desestimulo e não implica em enriquecimento ilícito – Recurso improvido” (Tribunal de Justiça de São Paulo. Apelação cível n. 7150826800, 2008).
Essa decisão torna óbvia a situação que agora será analisada, em outras palavras a decisão afirma que fora cabível indenização pelos danos morais sofridos, em razão da necessidade da reparação civil de um ato considerado ilícito, pois, é caracterizador de prática abusiva contra o consumidor.
Esse caso concreto mescla as duas situações anteriormente estudadas, pois, abrange a suspensão de serviço essencial e ao mesmo tempo a prática abusiva, por ser indevida. Então sigamos a mesma linha de raciocínio.
Primeiramente, conjecturemos que, energia elétrica é serviço essencial, indispensável à vida do ser humano. De forma que, a suspensão do serviço só deve ser feita em casos específicos e não pode ser estimulada. A resolução 456 da ANEEL, como supramencionado, permite a suspensão. Os artigos 90 e 91 dessa norma enumeram as situações em que a energia elétrica pode ser suspensa imediatamente ou após notificação prévia, ambas em razão do principio da continuidade (AGÊNCIA NACIONAL DE ENERGIA ELÉTRICA, 2000). São casos, portanto, que padecem de guarida para que haja execução do corte do serviço.
Em seguida, elucubremos que a suspensão do serviço sem que haja inadimplência fere a todos os direitos que foram aludidos no tópico anterior, pois, o consumidor é atingido na sua dignidade em razão da prática abusiva e vê sua vulnerabilidade ainda mais evidente, visto que não tem meios imediatos, capazes de evitar a suspensão.
O consumidor paga fielmente suas obrigações para com a concessionária, mas ainda assim é surpreendido com a suspensão do serviço por uma cobrança equivocada. Essa atitude da empresa ainda é agravada por se tratar de um serviço essencial, pois como viver sem algo que lhe é imprescindível?
Que existe dano moral isso já temos conhecimento, mas e quanto à eficiência na prestação do serviço? Ela pode ser motivadora do dano moral? Sim, percebemos novamente um dano causado ao consumidor que atinge os alicerces da prestação do serviço, que é justamente a eficiência e adequação, pois é um dos princípios norteadores dos serviços públicos. Quando a empresa comete um erro capaz de privar uma pessoa de um serviço publico deixa a desejar na sua competência, falhando na segurança que deve oferecer ao consumidor.
Dessa maneira, a ineficiência pode ser usada também como o ponto de partida para caracterização do dano, levando em consideração todos os outros resultados que dela virão. Nesse caso o ato ilícito foi gerado a partir da ineficiência da empresa e dele um dano moral, provavelmente, também material ao consumidor, que terá de ser reparado a fim de satisfazê-lo na concretização daquilo que lhe é direito.
Conclusão.
O Código de Defesa do Consumidor completa vinte anos no presente ano e os conflitos que envolvem consumidores são regidos por uma norma que cada dia mais tem se mostrado eficiente e adequada. É obvio que a criação da lei não põe fim a práticas abusivas, mas oferece mecanismos aos consumidores para que possam defender-se.
Partindo da ideia de que o Código de Defesa do Consumidor cuida de todo aquele que é consumidor, entendamos que relação de consumo é aquela relação que tem por objeto produtos ou serviços e que envolve, necessariamente, o consumidor e o fornecedor.
Havendo essa relação haverá a incidência de alguns princípios que funcionam como instrumentos de proteção ao consumidor, dentre eles encontramos o principio da dignidade da pessoa humana, da eficiência, da proibição de praticas abusivas, da vulnerabilidade e hipossuficiência. Quando o aplicador do direito utiliza-se da norma especifica deve interpreta-la de forma sistemática, assim a observação aos princípios mencionados cria um leque de opções para fundamentação das decisões.
O presente estudo traz um enfoque especial nos serviços públicos, salientando que esses serviços devem atender ao principio da eficiência e adequação, e na sua condição de essencialidade. Dessa forma apresenta a concepção de que um serviço público já se torna essencial somente por ser público, mas em contrapartida específica alguns serviços como essenciais a vida, sem os quais não se pode ter uma vida digna. Nesse sentido o Código de Defesa do Consumidor é rígido em proibir a suspensão desses serviços, se posicionando a favor da sua característica de continuidade.
Tratando, especificamente, do fornecimento de energia elétrica, que é um serviço público e atende ao caráter de essencialidade e continuidade, visto que, na atualidade é imprescindível na vida das pessoas. Logo, na prestação desse serviço seu âmbito essencial tem que ser ponderado, sobretudo em situações causadoras de danos ao consumidor, pois agravam ainda mais as consequências, por se tratar de um bem indispensável à vida.
O campo do direito que protege o consumidor no caso de danos é a responsabilidade civil, pois é quem vai apontar o responsável pelo dano e como ele pode ser reparado. No caso do serviço público, a prestadora é responsável por qualquer dano causado por seus representantes e pelo defeito que seu serviço apresentar. Essa responsabilidade é objetiva, pois não há verificação de existência de culpa, basta que o reclamante comprove aquilo que fora alegado. E caso haja a ratificação do dano surge a obrigação de indenizar, isto é, reparar aquela pessoa que sofreu a lesão.
No que concerne a identificação do tipo de dano sofrido, temos uma polêmica na conceituação de dano moral e mero aborrecimento do cotidiano, porque no caso concreto é difícil diferenciá-los. Mero aborrecimento do cotidiano nada mais é do que transtornos que podem ocorrer diante da grande modernidade da vida contemporânea. Parece mais simples reunir indícios do que não é dano moral e defini-lo.
Já o dano moral que facilmente é confundido com sentimentos pessoais tem um conceito complexo, abrange o direito de personalidade e sua frustração perante a privação de algum direito. Toma um cunho extrapatrimonial, mas não necessariamente sentimental já que os sentimentos das pessoas variam de uma para outra e de situação para situação. O dano moral vem a depender das consequências da atitude do ofensor na vida do lesado, se essa for capaz de provocar uma mudança negativa, que altere de maneira a causar abalo na vida rotineira, dessa forma, visualiza-se existência do dano moral.
Após a identificação do dano, cabe ao magistrado fixar o valor que reparará, de forma satisfatória, à pessoa lesada. Não existe disposição legal que guie o juiz no momento dessa decisão, sendo assim, um ato passível de analogia. Nesse momento o aplicador do direito deve fazer uso rígido de sensatez e proporcionalidade para obter uma decisão justa, pode ainda utilizar-se de critérios criados pela doutrina que facilitem a análise da extensão do dano sofrido.
A fim de identificar o cabimento de dano moral ou mero aborrecimento do cotidiano, situações como: suspensão do fornecimento de energia elétrica por inadimplência de fatura de regularidade ou por fatura paga e inclusão indevida no SPC e/ou SERASA corroboram que a característica de essencialidade deve ser preservada de forma que a suspensão só deve ocorrer em último caso. Na condição em que se tenha motivação para cobrança de recuperação de consumo, a empresa deve procurar formas legais de cobrar e não utilizar meios coercitivos. Caso a suspensão do serviço se der mediante conta paga, a empresa então deu causa a um ato ilícito, ferindo a diversos princípios que protegem o consumidor. Na última situação supracitada, há presunção da existência de dano moral no momento que houver a inclusão do nome do consumidor em cadastros de restrição ao crédito.
As duas situações, quais sejam: suspensão do serviço e inclusão em cadastros de proteção ao crédito, ambas perante contas pagas padecem de ineficiência na prestação do serviço, visto que a postura da empresa equivale a uma incompetência capaz de lesar o consumidor, privando-o da segurança; ferindo sua dignidade; rompendo com o serviço e sua continuidade, ainda que seja essencial.
Quanto à suspensão em razão do não pagamento de faturas de regularidade, normalmente as empresas encontram fundamento nas resoluções de sua agencia reguladora. Ocorre que existem decisões que priorizam o sentido essencial do serviço sendo contrárias à permissão de suspensão. É esse o posicionamento mais sensato, porquanto defendem de forma cabal a continuidade e essencialidade do serviço e trazem a ideia de que as empresas busquem maneiras não lesivas ao consumidor para serem ressarcidas.
Em meio a várias sugestões dadas pelos doutrinadores que estudam esse tema, apresentamos a majoração do valor das condenações como um canal de desestimulo a práticas abusivas contra o consumidor. Essa concepção ganha mais respeito se analisarmos o caráter punitivo-educativo das indenizações.
Os aumentos dos valores das condenações causam um dano material à concessionária que será obrigada a melhorar sua prestação de serviço em razão da continuidade do mesmo, caso contrário não poderá manter-se diante dos altos valores que pagará a título de indenização.
A majoração das condenações poderia ser gradual, respeitando, especialmente, a quantidade de ações autuadas contra a prestadora de serviço. Assim, tanto maiores as reclamações quanto maiores os valores das condenações pelos magistrados, que arbitrariam de acordo com o numero de ações em sua jurisdição, ou trabalhariam baseados em algum controle geral de dados.
Em contrapartida, o enriquecimento ilícito não pode ser estimulado, porém o aplicador do direito só caracterizará o dano moral em situações que realmente seja cabível reparação, do contrário pode usar o instituto da litigância de má-fé, podendo punir aqueles que tenham interesse em enriquecer ilicitamente.
Por fim, o próprio ordenamento já dispõe dos preceitos que podem ser solução para a presente discussão, só precisam ser observadas com maior atenção e rigidez, assim a proporção da repetição de lesões causadas aos consumidores diminuiria, visto que as empresas se sentiriam lesadas materialmente sempre que praticassem atos ilícitos. Se essa sugestão fosse adaptada a realidade, os casos hipotéticos ora estudados poderiam ser extintos. Dessa maneira, os consumidores teriam seus direitos efetivamente respeitados.
Advogada pós-graduada em direito do consumidor pela Universidade Mauricio de Nassau graduada na Faculdade de Direito de Caruaru/PE.
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