Resumo: A transferência de presos é uma forma de cooperação entre os Estados com cunho essencialmente humanitário, fazendo com que o condenado possa cumprir a pena no seu Estado de origem na perspectiva de que tenha uma reabilitação para a sociedade facilitada. Com isso, esse artigo objetiva descrever o instituto de cooperação jurídica internacional chamado transferência de condenados, já que é perceptível um crescente número de condenados que na qualidade de estrangeiro solicitam o cumprimento de sua pena em seu país de origem.
Palavras Chave: Transferência de presos. Cooperação jurídica internacional. Humanitário.
Abstract: The transfer of prisoners is a way of cooperation between states that has humanitarian objectives, making that the penalty service in your origin state has an easier social rehabilitation. With this, the present article aims to describe the international legal cooperation institute called transfer of prisoners, since it is noticeable a growth in the numbers of sentenced foreign who asks for the serving sentence in your origin country.
Keywords: Transfer of prisoners. International legal cooperation. Humanitarian.
Sumário: Introdução. 1. Transferência de presos estrangeiros. 1.1. Conceito. 1.2. Extradição versus transferência de presos. 2. Processo de transferência de pessoas condenadas. 2.1. Regime jurídico. 2.2. Trâmite dos processos. 3. Presos estrangeiros no Brasil. 4. Presos brasileiros no exterior. 5. Tratados de transferência de condenados feitos pelo Brasil. Conclusão. Referências Bibliográficas.
Introdução
Até o século XX, a cooperação entre Estados ao se tratar de matéria penal consistia na extradição, porém nos últimos 50 anos começaram a aparecer novos instrumentos e formas de cooperação.
Entre as formas de cooperação penal entre os Estados pode-se citar a extradição, assistência jurídica, execução de sentença penal estrangeira, homologação de sentença penal estrangeira, troca de informações de inteligência, entre outros.
A forma menos utilizada até então era a transferência de pessoas condenadas em um país para cumprir pena em outra, tal como uma espécie de execução de sentença penal estrangeira.
Com a globalização, ficou mais fácil a entrada de estrangeiros em outros países, ou seja, o transito entre as pessoas no mundo fez com que houvesse uma maior possibilidade de cometimento de crimes em um país por um estrangeiro. Assim, o número de presos (homens e mulheres) estrangeiros no Brasil e de brasileiros (ambos os sexos) no exterior vêm aumentando.
Assim, com esse trabalho poderá apresentar os tratados que estão em vigor sobre a transferência de pessoas condenadas, objetivando um melhor entendimento sobre como se dá essa modalidade de cooperação bem como quais os requisitos para a sua concessão.
Todos os tratados que são firmados pelo Brasil contém cláusula na qual as autoridades competentes das Partes informarão a todo preso nacional da outra Parte sobre a possibilidade de aplicação do tratado e as consequências jurídicas derivadas de sua transferência.
Enfim, é uma modalidade recente da cooperação internacional, onde abrange situações fáticas diversas, como a transmissão da execução penal a outro país onde o condenado se encontra ou a transferência da execução penal a outro país onde o condenado é entregue. Este trabalho se restringe à analisar a execução relativa a pessoa condenada em um país para cumprir pena em outro.
1 Transferência de presos estrangeiros
1.1 Conceito
A transferência de pessoas condenadas é um novo instituto que visa o cumprimento de pena no país de origem do condenado, onde o mesmo tem uma maior proximidade com a sua família e seu ambiente social e cultural, tendo assim um cunho humanitário onde é perceptível que o mesmo poderá ter um melhor apoio psicológico e emocional que possibilite a sua ressocialização após o cumprimento da pena.
O Ministério da Justiça diz que a Organização das Nações Unidas tem insistido quanto à imprescindibilidade desse tipo de cooperação, fazendo com que seja difundida a proposta de transferência de presos como método moderno de reeducação para fortalecer o alicerce de reconstrução pessoal do preso diante da perspectiva de futura vida livre no convívio social[1].
Como o nome diz por si próprio, a transferência de presos é a modificação do local de cumprimento da pena de um país para outro, sendo o último o seu país de origem. Esse instituto não se confunde com a remoção ou transferência interna de preso, pois estes tratam de direito interno, já a transferência de presos estrangeiros trata-se de uma cooperação jurídica internacional entre Estados, sendo assim afeto ao Direito Internacional.
É um ato que depende da vontade do preso, onde o mesmo deverá solicitar a autoridade competente a sua transferência.
Existem dois tipos de transferência de presos, sendo estas a ativa e a passiva. A transferência ativa acontece quando um brasileiro, que esteja cumprindo pena, imposta por sentença estrangeira já transitada em julgado, em outro país, solicite ser transferido para estabelecimento carcerário no Brasil. E a transferência passiva ocorre quando um estrangeiro, que esteja preso no Brasil, solicite o translado para o seu país de origem para cumprir o restante da pena imposta pela justiça brasileira.
1.2 Extradição versus transferência de presos
Quando se trata de extradição e transferência de presos é perceptível que há uma linha tênue que diferencia esses institutos. Onde, na extradição, o que acontecerá é a entrega de uma pessoa acusada ou condenada por um ou mais crimes praticados no território do país que a reclama. A extradição pode acontecer quando o Brasil requer a extradição de um foragido da justiça brasileira a outro país (extradição ativa) ou quando um país solicita ao Brasil a extradição de um indivíduo foragido que se encontra em território brasileiro.
Já a transferência de condenados é um instituto que tem como objetivo beneficiar os presos estrangeiros que estão sob a custódia da justiça brasileira, fazendo com que seja possível o cumprimento do restante da pena no seu país de origem, junto de seus familiares e amigos, assim facilitando a sua ressocialização. A transferência de presos se efetivará com a respectiva expulsão do indivíduo do país.
Para acontecer a transferência de pessoas condenadas é necessário que haja um tratado entre o Brasil e o país que irá receber o preso. Esse tratamento também se aplica aos brasileiros que cumprem pena no exterior, pois uma vez que existe um tratado entre os Estados, estes exigem reciprocidade.
2 Processo de transferência de pessoas condenadas
2.1 Regime Jurídico
O ordenamento jurídico brasileiro não prevê o instrumento de transferência de condenados, assim não havendo lei que regule a cooperação internacional nesses casos. Porém, para que essa transferência seja possível é necessário acordos bilaterais ou multilaterais entre os Estados para realizá-la.
Convém mencionar que o Código Penal em seu artigo 9º discorre sobre a homologação de sentença estrangeira nos casos em que obriga o condenado à reparação do dano, restituições e outros efeitos cíveis e a sujeitá-lo a medida de segurança. Contudo, não menciona o caso de homologação de sentença estrangeira para cumprimento de pena no brasil.
A sentença penal é vista como uma forma de manifestação da soberania estatal, onde outros países se tornam relutantes ao admitir a eficácia de uma sentença penal estrangeira em seu território.
Para contornar o rege o artigo 9º do Código Penal, alguns autores desenvolveram a teoria de que a execução de uma sentença penal estrangeira tem natureza administrativa, onde não necessita que haja o reconhecimento do juízo penal desta. Havendo assim uma diferenciação do pensamento quanto ao que separa a execução da sentença do reconhecimento do julgamento penal que deu causa a sentença.
É mais fácil para o país que está transferindo o preso (remetente) aceitar a natureza administrativa do que o país que recebe o preso (recebedor). Quanto a isso alguns países já aceitam essa característica, tais como alguns países europeus e os Estados Unidos.
O próprio Superior Tribunal de Justiça, já se manifestou, em sede de decisões monocráticas pela dispensabilidade de homologação de sentenças estrangeiras, conforme julgamento da SE 5.269-PT, onde menciona que “havendo procedimento específico previsto em tratado ou convenção internacional, o processo de homologação torna-se dispensável”.
Ao se tratar da constitucionalidade dos tratados que regem a transferência de condenados, pode-se salientar que os mesmos por se tratarem de caráter humanitário se encaixam na proteção aos Direitos Humanos, onde após a aprovação da Emenda Constitucional 45, alterando o texto do artigo 5º, §3º da Constituição Federal, os tratados de Direitos Humanos que passarem pela aprovação em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros de cada Casa do Congresso Nacional, serão equivalentes a emenda constitucional. Porém, se forem aprovados pelo rito padrão de incorporação terão status de norma supralegal, onde estará acima da legislação ordinária e abaixo da Constituição.
Assim, pode-se dizer que para que haja a transferência de presos é necessário que haja um tratado que contemple essa hipótese entre os Estados, onde deverá estar estabelecido quais as autoridades centrais de cada país que será responsável pelo andamento e concordância dos pedidos de transferência[2]. No brasil a autoridade responsável é a Secretaria Nacional de Justiça.
No Brasil, a homologação da sentença estrangeira é dispensada pois, ao contrário da extradição, a transferência só se consuma se houver a concordância do condenado. É tradado como uma questão administrativa da execução.
2.2 Trâmite dos processos
O órgão responsável pelo trâmite de todos os processos administrativos de transferência de condenados é o Departamento de Estrangeiros do Ministério da Justiça, o qual irá analisar a admissibilidade do pedido.
Na transferência de condenados ativa (brasileiro sendo transferido para cumprir pena no Brasil), para que os pedidos sejam agilizados a Divisão de Medidas Compulsória do Departamento de Estrangeiros atua juntamente com diversos órgão envolvidos, tais como o Ministério das Relações Exteriores, Polícia Federal, Interpol e os Juízes das Varas de Execuções Criminais.
Se os documentos estiverem de acordo com o tratado que será aplicado ao caso, serão encaminhados ao Juiz da vara de Execuções Penais onde residam os familiares do brasileiro que foi condenado no exterior, e o providenciará vaga em estabelecimento carcerário brasileiro.
Com o processo administrativo devidamente instruído, conforme previsto no tratado, as autoridades centrais dos Estados (remetente e recebedor), deverão proferir decisão final aprovando a transferência. Isto feito, os funcionários do governo brasileiro responsáveis pela escolta do condenado se dirige até o país remetente a fim de trazê-lo para o Brasil, onde ficará recolhido em estabelecimento prisional cumprindo o restante da pena imposta pela justiça estrangeira.
Já quando se trata de transferência de presos passiva (estrangeiro requer translado pro seu país de origem), o condenado deverá enviar um pedido expresso para o Departamento de Estrangeiros, da Secretaria Nacional de Justiça, requerendo sua transferência para o seu país de origem. Quando do recebimento do pedido, caberá a Divisão de Medidas Compulsórias providenciar junto ao Poder Judiciário os documentos destinados à instrução do processo. Depois de instruído, deverá ser providenciada a tradução dos documentos para a língua oficial do país de origem do preso estrangeiro que foi condenado pela justiça brasileira.
Partindo deste ponto, o processo será submetido à Secretaria Nacional de Justiça para apreciação, onde expressará sua anuência como o translado. Os documentos serão encaminhados ao país de origem do preso por via diplomática, onde o recebedor poderá ou não concordar com o translado. Se for aceito, o país de origem do condenado providenciará a retirada do preso do território brasileiro em local e dia acordados pelas partes.
Os Estados tem o direito soberano de aprovar ou não a transferência, porém os acordos celebrados pelo Brasil tem a cláusula de não aceitação, na qual se o país de origem não aprove o translado este deverá fundamentar sua decisão.
A transferência do preso ocorro concomitantemente à efetivação de sua expulsão quando da sua entrega aos policiais do seu país de origem. E o processo administrativo tramita paralelamente ao processo de transferência.
Quanto as despesas relacionadas a transferência de pessoas condenadas será do Estado remetente até a entrega do condenado ao Estado receber. As despesas que venham a ocorrer da transferência da pessoa condenada e da execução da condenação são de responsabilidade do recebedor e este poderá tentar cobrar da pessoa condenada parcial ou integralmente o montante das despesas.
3 Presos estrangeiros no Brasil
De acordo com os dados consolidados pelo Ministério da Justiça dos anos de 2008/2009, o número de estrangeiros presos no Brasil eram significativos, onde em dezembro de 2008 haviam o total de 2.704 presos estrangeiros, sendo a maioria da Bolívia, Paraguai e Peru.
Em dezembro de 2009 o número apresentado em 2008 já havia sofrido um aumento significativo, onde no total haviam 3.155 presos estrangeiros em território brasileiro. A maioria ainda continua sendo de estrangeiros advindos da Bolívia, Paraguai e Peru, mas com um aumento perceptível de condenados da Nigéria e Espanha.
De acordo com a revista Veja[3], no ano de 2013 o Brasil baterá recordo de expulsão de estrangeiros, onde a maioria foi preso em aeroportos devido a tráfico de drogas.
4 Presos brasileiros no exterior
Conforme notícia publicada no site Agência Brasil[4] estão presos no exterior no mínimo 3.078 brasileiros. O site recebeu a informação pelo Ministério das Relações Exteriores, que informou que a maioria foi presa na Europa e os crimes atribuídos aos brasileiros são de tráfico de drogas, fraude, agressão sexual e furtos.
Dentre os 3.078 brasileiros presos no exterior, 2.260 são homens e 452 mulheres, os outros 366 não tiveram o sexo divulgado. Quando há casos de detenção fora do Brasil, estes são acompanhados pelos serviços consulares que dão orientações e instruções específicas.
Um dos casos mais recentes que vêm sendo noticiado é o caso de Bruna Frasson que foi condenada na Espanha no dia 27 de setembro de 2013 por tráfico internacional de drogas, onde a mesma e seus familiares vem buscando a sua transferência para cumprir pena no Brasil.[5]
5 Tratados de transferência de condenados feitos pelo Brasil
Dentre os tratados firmados pelo Brasil, convém primeiramente mencionar que no ano de 2013 foram promulgados dois tratados de transferência de pessoas condenadas, sendo estes:
Decreto nº 8.0450, de 11/7/2013 — Promulga o Tratado sobre Transferência de Pessoas Condenadas ou Sujeitas a Regimes Especiais, entre a República Federativa do Brasil e a República do Panamá, firmado na Cidade do Panamá, em 10 de agosto de 2007.
Decreto nº 8.049, de 11/7/2013 — Promulga a Convenção sobre a Transferência de Pessoas Condenadas entre os Estados Membros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, firmada em Praia, em 23 de novembro de 2005.
Quanto aos tratados já existentes, estes são com:
Argentina: Celebrado em 11.09.1998 e promulgado pelo Decreto nº 3.875, de 23.07.2001.
Bolívia: Celebrado em 26.07.2007 e promulgado pelo Decreto nº 6.128, de 20.06.2007.
Canadá: Celebrado em 15.07.1992 e promulgado pelo Decreto nº 2.547, de 14.04.1998.
Chile: Celebrado em 29.04.1998 e promulgado pelo Decreto nº 3.002, de 26.03.1999.
Convenção Interamericana sobre o Cumprimento de Sentenças Penais no Exterior: Celebrado em 26.07.2007 e promulgado pelo Decreto nº 6.128, de 20.06.2007. Países signatários: Arábia Saudita, Belize, Brasil, Canadá, Chile, Costa Rica, El salvador, Equador, Estados Unidos, Guatemala, México, Nicarágua, Panamá, Paraguai, República Tcheca, Uruguai e Venezuela.
Espanha: Celebrado em 04.05.1998 e promulgado pelo Decreto nº 2.576, de 30.04.1998.
Paraguai: Celebrado em 29.10.2002 e promulgado pelo Decreto nº 4.443, de 28.10.2002.
Peru: Celebrado em 25.08.2003 e promulgado pelo Decreto nº 5.931, de 13.10.2006.
Portugal: Celebrado em 25.08.2007 e promulgado pelo Decreto nº 5.767, de 02.05.2006.
Reino dos Países Baixos: Celebrado em 23.01.2009 e promulgado pelo Decreto nº 7.906 de 04.02.2013.
Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte: Celebrado em 29.01.2002 e promulgado pelo Decreto nº 4.107, de 28.01.2002.
No Congresso Nacional ainda tramitam projetos de Tratados de Transferência de Pessoas Condenadas com Itália, Reino da Bélgica, Turquia, Síria.
O Brasil tem pendentes de promulgação tratados bilaterais com Suriname, Angola, Moçambique, Venezuela, Ucrânia e multilaterais: Transferência de Pessoas Condenadas dos Estados Parte do Mercosul; Transferência de Pessoas Condenadas dos Estados Parte do Mercosul com a República da Bolívia e com a República do Chile.
Conclusão
Diante de todo o desenvolvimento deste trabalho é perceptível que o instituto de transferência de condenados é um instrumento de suma importância para a cooperação jurídica internacional. Onde, com a sua existência há uma proteção e preocupação com indivíduo estrangeiro no território de outro país. É uma espécie de execução da sentença penal estrangeira.
Este instituto foi introduzido no Brasil por meio de tratados e vem sendo visto como de natureza administrativa, quando não se vê necessário passar pelo procedimento de homologação da sentença estrangeira pelo STJ.
Este instrumento facilita a cooperação internacional entre Estados, fazendo com que a proteção internacional aos direitos humanos seja desenvolvida e que o caráter humanitário da transferência de condenados prevaleça quanto ao seu local de cumprimento de pena para que o preso possa ter a oportunidade de uma melhor ressocialização.
Enfim, a prática da transferência de pessoas condenadas há de ser efetivada por meio de tratado e a mesma possibilita a solução das dificuldades concernentes aos estrangeiros quanto ao cumprimento de pena em estabelecimento prisionais, onde muitas vezes pode ocorrer discriminações entre os estrangeiros e os nacionais. Assim, pode-se dizer que a transferência de condenados não só vê o lado punitivo como também a possibilidade de uma melhor reintegração do condenado na sociedade e na família.
Advogada Especialista em Direito Internacional pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte Mestranda em Direito Internacional Público e Europeu na Universidade de Coimbra
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