A suposta inobservância do art. 48 da Lei Complementar n. 101/2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal), que trata da divulgação, inclusive em meio eletrônico, da gestão fiscal do Poder Público.
“Não basta julgar a administração, denunciar o excesso cometido, colher a exorbitância ou a prevaricação para punir. Circunscrita a estes limites, essa função tutelar de dinheiro público será, muitas vezes inútil por omissa, tardia ou impotente”. (Rui Barbosa)
O presente artigo nasceu de um e-mail recebido por uma colega de trabalho. Na mensagem, o remetente afirma que o art. 48 da Lei Complementar 101/2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal) não estaria sendo respeitado por diversos prefeitos baianos.
O citado dispositivo assinala o seguinte:
“Art. 48. São instrumentos de transparência da gestão fiscal, aos quais será dada ampla divulgação, inclusive em meios eletrônicos de acesso público: os planos, orçamentos e leis de diretrizes orçamentárias; as prestações de contas e o respectivo parecer prévio; o Relatório Resumido da Execução Orçamentária e o Relatório de Gestão Fiscal; e as versões simplificadas desses documentos.
Parágrafo único. A transparência será assegurada também mediante incentivo à participação popular e realização de audiências públicas, durante os processos de elaboração e de discussão dos planos, lei de diretrizes orçamentárias e orçamentos” (houve grifos).
Ocorre que, conforme a missiva virtual, estaria havendo dificuldades em se ter acesso às contas municipais, por inobservância ao quanto disposto na LRF, informando, outrossim, que alguns municípios estariam disponibilizando os relatórios estabelecidos pelo diploma legal aludido por intermédio de outros sites, que não os oficiais. É neste ponto que será centralizada a análise.
Itaberaba, por exemplo, cidade situada na Bahia, possui endereço eletrônico (www.sendnet.com.br/itaberaba), muito embora não seja no padrão oficial, isto é, com a terminação .ba.gov.br. Nesse site, há um link denominado “contas públicas” que daria acesso aos relatórios daquela municipalidade, porém, ao clicar nele, obtém-se como resposta “the page cannot be found”, informando que a página não foi encontrada.
Em um primeiro momento, não se tem acesso eletrônico às contas daquele município. Porém, para surpresa de muitos, há um outro site em que as despesas e receitas de Itaberaba podem ser visualizadas (somente sei disso porque no e-mail havia referência!). Não se trata de nenhum órgão governamental que mantém a página na Internet, mas sim de uma entidade privada (uma empresa de assessoria contábil, jurídica e outros segmentos) que disponibiliza as contas de alguns de seus clientes, vez que são 21 (vinte e um) municípios baianos incluídos nesse rol, sendo que 15 (quinze) são links, ou pelo menos têm essa intenção, pois deveriam direcionar a uma outra página, malgrado não levam a lugar algum.
Assim sendo, a imposição legal de que deverá ser dada ampla divulgação aos planos, orçamentos, leis de diretrizes orçamentárias e outros instrumentos de transparência da gestão fiscal, está sendo ferida, no tocante à sua publicização por meios eletrônicos. A não ser que, eventualmente, inexista página eletrônica oficial da municipalidade e haja ampla divulgação do endereço virtual em que se encontram os relatórios exigidos pela LRF.
Se a prefeitura municipal não possui site, não vislumbro problema algum quanto aos dados exigidos pela Lei de Responsabilidade Fiscal serem divulgados em outra página, salvo se tal endereço não for divulgado com amplitude. Aí sim, seria uma afronta ao mandamento legal, uma ofensa ao princípio da transparência. Cumpre ressaltar, ainda, que essa possibilidade, no meu sentir, somente teria amparo caso o ente público não possuísse página na Internet, pois do contrário, seria ilógico. Não haveria razão de ser um site que disponibilizasse determinadas informações intrínsecas às suas atividades noutro endereço virtual (nas circunstâncias sob comento). Tratar-se-ia, efetivamente, de burla à lei.
Objetivando dirimir qualquer dubiedade que venha a recair sobre o parágrafo anterior, não se deve olvidar o quanto explicitado pelo art. 49 da LC 101/2000, que determina que as contas apresentadas pelos chefes do Poder Executivo deverão permanecer disponíveis no Legislativo e nos setores contábeis e de planejamento.
Portanto, a ampla divulgação deve ocorrer, inclusive em meios eletrônicos, seja em site próprio ou não (neste último caso, desde que divulgado devidamente o respectivo endereço), consoante preceitua o art. 48 da LRF e os princípios norteadores da Administração Pública, sem prejuízo do disposto no art. 49 da mesma lei. Não ocorrendo a ampla divulgação, certamente deverá atuar o Ministério Público, a fim de fazer cumprir o comando normativo, adotando as medidas pertinentes.
Professor de Direito Penal e Processo Penal do Curso Ordem Mais. Mestre em Direito (PUC/PR). Especialista em Direito Criminal (UniCuritiba). Assessor jurídico do Ministério Público Federal
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