Inédita, pioneira e corajosa a decisão do Tribunal Superior Eleitoral que reconhece à união homoafetiva a inelegibilidade consagrada no art. 14, § 7º, da Constituição Federal. Aí se proíbe aos cônjuges de Presidente da República, Governadores e Prefeitos concorrerem nas eleições ao mesmo cargo. Necessário, o afastamento do titular até seis meses antes do pleito.
O fundamento dessa vedação é salutar: não perpetuar no poder um mesmo grupo familiar, evitar a constituição de oligarquias que dão ensejo ao que se chama continuísmo. Com essa preocupação, a jurisprudência passou a reconhecer que não só o casamento, mas também o concubinato e a união estável, em face da presença de forte vínculo afetivo, impõem a mesma limitação.
As uniões homossexuais ao baterem nas portas do Judiciário, sempre as encontraram fechadas, principalmente a das Varas de Família. A justiça gaúcha foi a primeira a reconhecer as uniões entre pessoas do mesmo sexo como entidade familiar. Na ausência de lei que as regulamente, invoca-se a legislação que rege a união estável. Com isso os parceiros passaram a ter até direito à herança.
Em outros Estados a forma encontrada para solver conflitos envolvendo uniões homossexuais é identificá-las como sociedade de fato. Com isso, além de ser negada a existência da afetividade na origem da relação, também se afasta seu caráter familiar. Tratada a união como sociedade comercial com fins lucrativos, os parceiros são considerados como se fossem sócios e, na dissolução da tal sociedade, tudo termina em mera divisão de lucros, assim considerados os bens amealhados durante o convívio, devendo cada sócio provar o quanto contribuiu para a formação do acervo social.
Mas agora, a partir do momento que o Tribunal que tem o dever de interpretar a Constituição decide que as uniões homoafetivas repercutem na esfera eleitoral, a ponto de gerar a presunção de que pode haver interesses políticos comuns, não há como deixar de reconhecer que essas relações são entidade familiar.
Ainda que não tenha sido reconhecido o direito da parte de concorrer na eleição, o ganho social foi grande, pois a relação homossexual foi aceita como entidade familiar que, como as demais, merece a especial proteção do Estado.
Inegável que foi um importante passo que deu visibilidade a um segmento que, por puro preconceito, é alvo de discriminação e de severa exclusão social.
Como o Judiciário aceitou assim a relação estável homossexual, impondo limitações ao exercício de um direito, não há como continuar sustentando a falta de lei para negar direitos outros.
Não se pode falar em liberdade, em igualdade, em respeito à dignidade humana, caso se excluam da proteção jurídica os que se afastam do modelo tido como normal para fazerem uso do direito humano à felicidade.
Advogada, Ex-Desembargadora do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Vice-Presidente Nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM
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