Resumo: O presente esboço tem por objetivo discorrer acerca da possibilidade de um brasileiro nato, integrante do Poder Público, praticando crime de competência própria do Tribunal Penal Internacional, ter garantidas as prerrogativas da sua função em julgamento no território nacional. Serão abordadas a questão da manutenção ou não das imunidades dos agentes públicos delas detentores e as reflexões daí pertinentes.
Sumário: 1. Considerações Introdutórias; 2. Esboço do problema: Tribunal Penal Internacional e a manutenção de prerrogativas funcionais em crimes de sua competência; 3. Considerações Conclusivas; 4. Referências
1. Considerações Introdutórias
De início, impende destacar que foi o Estatuto de Roma que estabeleceu o Tribunal Penal Internacional – TPI, em 17 de julho de 1998, em Roma, na Itália. Saliente-se, ainda, que o cometimento de gravíssimos crimes durante as Grandes Guerras Mundiais (essencialmente com a Segunda Guerra Mundial), em particular, era crucial o surgimento de um órgão internacional que se pusesse ante todos os Estados como um instrumento de respeito à dignidade das pessoas e à proteção da humanidade.
Conforme Cassesse (2005, p. 12), tem-se que:
“Em termos da instalação do TPI, a idéia de que se deveria estabelecer um Tribunal Internacional para julgar os responsáveis por crimes de guerra e crimes contra a humanidade cometidos na ex-Iugoslávia foi espontaneamente questionada em vários lugares: na Europa, especialmente sob instigação da Alemanha e da França, e nos Estados Unidos. A proposta de instalação de Tribunais ad hoc foi precedida de uma série de declarações da ONU proclamando o princípio de que os autores de graves infrações às Convenções de Genebra e outros crimes eram ‘individualmente responsáveis’ e seriam chamados a responder por elas.”
O Direito Internacional Penal é um ramo das ciências jurídicas que trata dos assuntos criminais na ordem mundial, jurisdição e competência para julgamento e aplicação de sanções por órgãos vinculados à justiça internacional devidamente reconhecida, como, por exemplo, o próprio Tribunal Penal Internacional (TPI).
2. Esboço do problema: Tribunal Penal Internacional e a manutenção de prerrogativas funcionais em crimes de sua competência
Ante as afirmações supra, questiona-se: “Considerando que um brasileiro nato, integrante do Poder Público, de forma a lhe garantir prerrogativas em julgamento interno, pratique crime de competência própria do Tribunal Penal Internacional, no território nacional, no ano de 2006. Nessas condições, é possível que tal pessoa seja julgada pelo TPI?”
Diante do questionamento proposto, ao se analisar o aspecto temporal do cometimento da infração internacional, vale ressaltar que no Brasil, o governo brasileiro assinou o Tratado Internacional, em 07 de fevereiro de 2000, havendo, portanto a possibilidade da punição do agente público que possui garantias de prerrogativa ser julgado pela Corte Internacional, quando se analisa a temática sob este prisma, tendo em vista que o tribunal deve julgar aqueles atos cometido antes a sua adesão e formação, portanto, não há óbice a sua jurisdição diante de um ato cometido no ano de 2006.
Nunca é demais lembrar que, conforme Fauzi Hassan Choukr (2005, p. 62), a adesão formal inicial do Brasil foi tardia, tendo se dado somente em 07 de abril de 2000 quando foi assinado o Estatuto de Roma; comparado com a Argentina, que o assinou em 08 de janeiro de 1999 e o ratificou em 08 de fevereiro de 2001, fica o Brasil atrás no cenário sul-americano, bem como de fora do grupo dos sessenta países que ratificaram inicialmente o Estatuto possibilitando, assim, que ele entrasse em vigor.
Sob um outro prisma, tendo em vista o aspecto subjetivo, cabe ressaltar que a “entrega” de nacionais do Estado brasileiro, sejam ou não sujeitos que gozem de prerrogativas funcionais, ao Tribunal Penal Internacional, não fere o direito individual da não-extradição de nacionais, estabelecido no art. 5º, inciso LI, da Constituição Federal de 1988, bem como o direito de não-extradição de estrangeiros por motivos de crime político ou de opinião, constante do inciso LII do referido artigo.
Tal se depreende porque a extradição envolve sempre dois Estados soberanos, e o ato de cooperação entre ambos na repressão internacional de crimes, diferentemente do que é denominado “entrega” pelo Estatuto, entendida como aquela relação de cooperação que se opera entre um Estado e o próprio Tribunal, com o fim de que sejam aplicadas sanções que protejam e infirmem segurança aos direitos humanos. Portanto, não há óbice a que o Estado brasileiro entregue um nacional a Corte para que seja por ela julgado, sendo entendido como nacional o que a Constituição Federal de 1988 explicita no art. 12.
Quanto às imunidades diplomáticas, cada Estado é soberano e tem a possibilidade de elencar em suas leis elementos que proporcionem independência aos seus agentes políticos, não os tornando super-cidadãos, mas transmitindo a eles segurança de uma atuação política e comprometida com os anseios sociais do seu povo, o que garante a soberania do princípio universal da igualdade.
Entretanto, os crimes de competência do TPI são quase sempre perpetrados por indivíduos que se escondem atrás dos privilégios e imunidades que lhes conferem os seus ordenamentos jurídicos internos.
Como bem se sabe a competência do Tribunal restringir-se aos crimes mais graves que afetam a comunidade internacional no seu conjunto. Nos termos deste Estatuto, o Tribunal terá competência para julgar os crimes de genocídio, crimes contra a humanidade, crimes de guerra e crime de agressão.
Assim, cabe reafirmar que para o Estatuto de Roma no art. 27, há irrelevância da qualidade oficial daqueles que cometem os crimes por ele definidos, segundo o qual:
“Artigo 27
Irrelevância da Qualidade Oficial
1. O presente Estatuto será aplicável de forma igual a todas as pessoas sem distinção alguma baseada na qualidade oficial. Em particular, a qualidade oficial de Chefe de Estado ou de Governo, de membro de Governo ou do Parlamento, de representante eleito ou de funcionário público, em caso algum eximirá a pessoa em causa de responsabilidade criminal nos termos do presente Estatuto, nem constituirá de per se motivo de redução da pena.
2. As imunidades ou normas de procedimento especiais decorrentes da qualidade oficial de uma pessoa; nos termos do direito interno ou do direito internacional, não deverão obstar a que o Tribunal exerça a sua jurisdição sobre essa pessoa.” (grifo nosso)
Desta feita, as imunidades especiais conferidas aos indivíduos em função de sua condição como ocupantes de cargos ou funções estatais, seja segundo o seu direito interno, seja segundo o Direito Internacional, não constituem motivos que impeçam o Tribunal de exercer a sua jurisdição em relação aos temas elencados no seu corpo como de proteção primordial na ordem internacional.O Estatuto afasta qualquer possibilidade de invocação da imunidade de jurisdição por parte daqueles que cometeram crimes aqueles crimes a que ele se propõe a combater.
3. Considerações Conclusivas
Vale reafirmar que o TPI tem importante papel no sentido de punir os responsáveis pelas práticas dos mais graves crimes de repercussão global, em relação aos quais não se pode admitir a impunidade, não permitindo que a questão das imunidades ou foro por prerrogativa de função sejam alçados a escudos protetores de criminosos.
Sendo aplicável de forma igual a todas as pessoas sem distinção alguma baseada na qualidade oficial em caso algum o TPI eximirá a pessoa em causa de responsabilidade criminal nos termos do Estatuto de Roma, nem constituirá de per se motivo de redução da pena. Portanto, as imunidades ou normas de procedimento especiais decorrentes da qualidade oficial de uma pessoa; nos termos do direito interno ou do direito internacional, não deverão obstar a que o Tribunal exerça a sua jurisdição sobre essa pessoa.
Mestre em Ciências Jurídicas área de concentração Direito Econmico pela Universidade Federal da Paraíba 2011 aprovado “com distinção”. Especialista em Direito Processual pela Universidade Anhanguera – UNIDERP 2010. Graduado em Direito pela Universidade Federal de Campina Grande 2007. Professor da Universidade Federal de Campina Grande. Advogado – Ordem dos Advogados do Brasil. Associado ao CONPEDI – Conselho Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Direito e à SBPC – Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência. Tem experiência na área de Direito Público com ênfase em Direito Administrativo atuando principalmente nos seguintes temas: políticas públicas Constituição dignidade da pessoa humana direitos sociais e desenvolvimento socioeconmico.
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