Resumo: O presente artigo pretende verificar a questão da crise do Poder Judiciário, de forma a procurar novas alternativas de resolução de conflitos. Abordará sobre o acesso à justiça, pois este está intimamente ligado aos desafios da sociedade atual, uma vez que deságuam nas portas do Judiciário, e esse por sua vez encontra-se em crise, devido à avalanche de questões complexas que exigem o seu posicionamento. Dessa forma, evidencia-se que o Estado não tem conseguido colocar em prática o seu dever constitucional de chamar para si as questões controvertidas e solucioná-las de forma efetiva, buscando outros meios de resolução de conflitos. A mediação surge como uma alternativa de solução do litígio, pois visa restaurar a comunicação entre as partes, de modo que estas percebam por si mesmas qual é a melhor solução para ambas.
Palavras-chave: Acesso à Justiça. Crise da jurisdição. Conflito. Mediação.
Abstract: This article intends to investigate the issue of crisis in the judiciary, in order to seek new alternatives for conflict resolution. Address on access to justice because this is closely related to the challenges of modern society, since flow into the doors of the judiciary, and this in turn is in crisis due to the avalanche of complex issues that require your positioning. Thus, it is evident that the State has failed to put into practice his constitutional duty to draw to itself the controversial issues and address them effectively, seeking other means of conflict resolution. Mediation is an alternative solution to the dispute, it aims to restore communication between the parties, so that they understand for themselves what is the best solution for both.
KEYWORDS: Access to Justice. Crisis of Jurisdiction. Conflict. Mediation.
“(…) Sem um fortalecimento expressivo dos mecanismos alternativos de resolução de conflitos, o Judiciário continuará sofrendo a situação absurda de uma quantidade não absorvível de pretensões e, ao mesmo tempo, de uma demanda reprimida de milhões de pessoas sem acesso à justiça. Os meios alternativos podem contribuir nas duas pontas do problema, tirando alguns conflitos da estrutura clássica do Judiciário e resolvendo aqueles que nunca chegariam a ela.”[1].
1. Considerações iniciais
O presente artigo tem como objetivo analisar a questão da crise que vem enfrentando a Jurisdição, através da lentidão e morosidade processual, o que dificulta resolver a lide de forma mais rápida e célere. É partindo dessa ideia que se pretende fazer uma abordagem ao acesso à justiça, pois de nada adiantará exercer o direito de ação se a solução reclamada vier a destempo ou for uma decisão injusta, resolvendo de forma insatisfatória o conflito.
Abordar-se-á quanto à importância da questão relativa aos conflitos e as formas de resolução dos mesmos, bem como a negociação, conciliação, arbitragem, trazendo destaque ao instrumento da mediação, que visa tratar o litígio de forma pacífica e consensual entre as partes, baseando-se em princípios de respeito, escutando as ideias dos outros, e comunicação entre as partes.
2. A Crise da jurisdição e o acesso à justiça
Atualmente o Poder Judiciário vem enfrentando dificuldades de comportar todas as demandas existentes, uma vez que o modelo tradicional de jurisdição carrega consigo a conflituosidade, ou seja, há quem ganha e há quem perde a demanda e o Poder Judiciário com sua atual estrutura, trata o conflito apenas superficialmente, dirimindo controvérsias. Nem sempre resolve o verdadeiro conflito.[2] Ademais, é costume da sociedade brasileira tratar das controvérsias como uma disputa entre as partes em busca de uma decisão, mesmo que esta gere prejuízos aos laços afetivos existentes entre elas.
O Poder Judiciário é um dos três poderes do Poder Judiciário, um dos três poderes clássicos do Estado, vem assumindo uma função fundamental na efetivação do Estado Democrático de Direito. É o guardião da Constituição, repousando na preservação dos valores e princípios que a fundamentam – cidadania, dignidade da pessoa humana, valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, além do pluralismo político (Art. 1º, CF/88).
Em tempos modernos, o Poder Judiciário é assolado por uma crise, na qual o mesmo tenta reagir e neutralizá-la. Entretanto, o Estado tem o dever de prestar a jurisdição a todos e de instituir mecanismos judiciários equipados e suficientes ao atendimento dos conflitos sociais. Com o surgimento de inúmeras demandas, e diante da crise já instaurada na jurisdição, através da morosidade, lentidão processual, a incapacidade dos operadores jurídicos tradicionais ao trabalharem com as novas realidades tanto legais como para resolução de conflitos contemporâneos[3].
Com relação à reforma processual e a morosidade, Boaventura Santos[4] refere dois tipos de morosidade na prestação da tutela jurisdicional, o que vislumbra, mais uma vez a necessidade de mudança na concretização de formas de alcance da efetividade e da eficácia da tutela jurisdicional:
“A morosidade sistemática é aquela que decorre da burocracia, do positivismo e do legalismo. Muitas das medidas processuais adotadas recentemente no Brasil são importantes para o combate à morosidade sistêmica. Será necessário monitorar o sistema e ver se essas medidas estão a ter realmente a eficácia, mas há morosidade ativa, pois consiste na interposição, por parte de operadores concretos do sistema judicial (magistrados, funcionários ou partes), de obstáculos para impedir que a sequência normal dos procedimentos desfechem o caso.”
Morais e Spengler[5] apontam quatro crises da jurisdição, ou seja, a crise estrutural, a crise objetiva ou pragmática, a crise subjetiva ou tecnológica e a crise paradigmática[6]. Ocorre a pluralidade de instâncias, a deficiência de controles e número insuficiente de juízes e servidores como decorrência direta da situação econômica dos Estados. A crise objetiva ou pragmática refere-se a aspectos pragmáticos da atividade jurídica, englobando questões à linguagem técnico-formal utilizada nos rituais e trabalhos forenses, a burocratização e lentidão dos procedimentos, acúmulo das demandas. A crise estrutural é aquela que diz respeito ao seu financiamento, ou seja, infra-estrutura de instalações, pessoal, equipamentos, custos.
A crise subjetiva ou tecnológica é a que se vincula À incapacidade tecnológica dos operadores jurídicos tradicionais lidarem com novas realidades fáticas que exigem não apenas a construção de novos instrumentos legais, mas também a (re) formulação das mentalidades a um fato ocorrido na realidade. A crise paradigmática é aquela que trata sobre os métodos e conteúdos utilizados pelo direito para a busca de um tratamento pacífico para os conflitos a partir da atuação prática do direito aplicável ao caso sub judice[7]. Já a crise funcional apresenta-se como a inadequação das leis publicadas, a intrincada processualística e a deficiência do sistema de provocação do Judiciário[8].
As crises pelas quais o Poder Judiciário passa está centrada na crise de identidade e na crise de eficiência, sendo todos os reflexos a elas correlatos, principalmente o fato de que está vinculada a um positivismo jurídico inflexível, o qual traz como conseqüência o esmagamento da justiça e a descrença do cidadão comum[9].
Ainda, é marcante proliferação dos conflitos de interesses nos grandes centros urbanos, diretamente relacionados com o aumento populacional e a ampliação do acesso à Justiça, vem impondo ao Poder Judiciário a busca de soluções alternativas para a resolução dessas disputas[10].
O modelo tradicional de composição de conflitos, que tem como marca determinante a conflituosidade, mantém sempre um grau de inconformidade com a proposta conciliatória apresentada – e geralmente imposta – pelo juiz. A partir daí a conclusão de que, uma vez homologada, uma parte ganha menos do que esperava e a outra, consequentemente, perde[11].
Diante essa situação, existem várias normas jurídicas, mas estas devem possuir mecanismos aptos para atuarem em caso de sua violação. É aí que entra o acesso à justiça, pois precisa-se de instrumentos que garantam que em caso de violação ou de simples ameaça de violação a nossos direitos, tem a quem socorrer, podendo exigir o cumprimento forçado da norma violada ou a atuação da sanção por descumprimento[12].
É inevitável reconhecer que os mecanismos institucionais tradicionalmente disponíveis para a resolução de conflitos não têm dado conta desses desafios, seja no aspecto quantitativo, quando se pensa no direito à razoável duração do processo, seja no aspecto qualitativo, quando se pensa na pacificação social que deve ser atingida com a resolução de um conflito, seja ainda no que diz respeito às necessidades de tornar o sistema acessível para todos os titulares de direitos, superando os diferentes obstáculos de ordem econômica e cultural, que impedem a realização do acesso à justiça.[13]
Segundo o entendimento de Cappelletti e Garth:
“(…) o direito ao acesso efetivo tem sido progressivamente reconhecido como sendo de importância capital entre os novos direitos individuais e sociais, uma vez que a titularidade de direitos é destituída de sentido na ausência de mecanismos para sua efetiva reivindicação”[14].
Assim, de nada adianta exercer o direito de ação, se a decisão vier tarde demais ou não resolver de forma satisfatória o litígio. Dessa forma, é importante outros meios alternativos de resolução de controvérsias, que visam acelerar o funcionalismo da justiça, descongestionar os tribunais, reduzir gastos e a demora dos procedimentos[15].
3. As novas formas de tratamentos dos conflitos
Primeiramente, é importante conceituar o que é conflito, sendo este a parte da condição humana, que não é sempre bom ou sempre ruim, entretanto, todo o conflito traz consigo a possibilidade de mudança e transformação, seja para duas pessoas, uma comunidade ou vários países.
Ocorre que cada pessoa analisa o conflito da sua maneira, através da educação que obteve de seus pais, do que está a sua volta, de acordo com o seu ponto de vista. Por isso, é importante preocupar-se com o modo de agir das pessoas, no intuito de mediar conflitos, fazendo com que as pessoas envolvidas experimentem colocar-se no lugar do outro.
Segundo Folger e Bush[16], “o conflito em si só é potencialmente transformativo: ou seja, a argúcia oferece aos indivíduos a oportunidade de desenvolver e integrar suas capacidades de força individual e empatia pelos outros”.
É inerente ao ser humano o conflito, sendo considerado fisiológico, o qual pode trazer união ao grupo, dependendo de como saber tratá-lo, analisando a posição e o interesse das partes.
O conflito trás consigo aspectos negativos e positivos[17]. Aqueles ocorrem diante ao não enfrentamento dos problemas sociais, enquanto estes, aguardam o momento para o diálogo, evitando violências que colocam em risco a vida das pessoas envolvidas.
Nesse sentido, o conflito é inevitável e salutar, especialmente ao chamar a sociedade na qual se insere de democrática, o importante é encontrar meios autônomos de manejá-lo fugindo da ideia de que seja um fenômeno patológico e encarando-o como um fato, um evento fisiológico importante, positivo ou negativo conforme os valores inseridos no contexto social analisado. Uma sociedade sem conflitos é estática[18].
Dessa forma, percebe-se que na busca da vitória a todo custo, a lógica é que sempre existirá um ganhador e um perdedor. Assim, para enfrentar um conflito, não basta uma atitude de colaboração ou de evitação, uma vez que as pessoas envolvidas não conseguem resolver seus conflitos sem ajuda, sendo necessário a presença seja de um juiz, mediador, árbitro para auxilá-los.
Desde a infância aprende-se a lógica da competição, a qual sempre tem que ter um ganhador e um perdedor, objetivando vencer o seu adversário, fazendo valer de tudo para conquistar a vitória na batalha cotidiana, o que acaba dificultando a resolução do conflito, sendo que uma das partes sairá insatisfeita com a decisão.
Nesse sentido, Schnitman afirma que:
“Nossa cultura privilegiou o paradigma ganhar-perder, que funciona como uma lógica determinista binária, na qual a disjunção e a simplificação limitam as opções possíveis. A discussão e o litígio – como métodos para resolver diferenças – dão origem a disputas nas quais usualmente uma parte termina ‘ganhadora’, e outra, ‘perdedora’. Essa forma de colocar as diferenças empobrece o espectro de soluções possíveis, dificulta a relação entre as pessoas envolvidas e gera custos econômicos, afetivos e relacionais.”[19]
Após analisar a questão referente ao conflito e como enfrentá-lo, é importante tecer algumas alternativas possíveis para a solução dos conflitos, tais como: negociação, arbitragem, conciliação e mediação.
No que se refere à negociação, esta é procedimento comum e natural para resolução de conflitos, não existindo intervenção de um terceiro neutro, as pessoas envolvidas procuram a solução dos problemas por elas mesmas. Segundo Bolzan e Spengler[20], os envolvidos entabulam no sentido de encontrar meios de satisfazer os seus interesses, ou através de seus representantes.
Colaiácovo define negociação como “um poderoso instrumento na solução de duas atividades sociais fundamentais por sua frequência e importância, que são os conflitos e as transações[21]”.
A arbitragem é uma outra estratégia de tratamento de controvérsias tomando-se como referências o processo estatal, meio heterocompositivo por certo mais empregado para dirimir conflitos. É possível afirmar que se trata de um mecanismo extrajudicial de tratamento de conflitos de tal sorte que a intervenção do Judiciário ou não existirá, ou será invocada quando houver necessidade de utilizar a força diante de resistência de uma das partes ou de terceiros[22]. Na arbitragem, existe a escolha de um árbitro entre as partes para resolver o problema. Sua decisão tem o mesmo valor de uma sentença judicial.
Já na conciliação, o conciliador propõe possíveis soluções para o conflito e as partes aceitam ou não. Existe a figura de um terceiro interlocutor, que proporcionará p debate entre as partes, limitando-se a receber as propostas de uma e de outra das partes, tentando conciliar os envolvidos na relação de atrito[23]. Para Wolkmer[24], a conciliação possui a grande vantagem de poder resolver conflitos por demandas e necessidades de forma rápida e imediata, sem entrar nos trâmites burocráticos e onerosos da justiça estatal que, ou não reconhece, ou inviabiliza p acesso popular. Trata-se de um procedimento mais simplificado, distinto da atividade jurisdicional clássica, pois os conciliadores não são necessariamente juízes e advogados, mas sim agentes que exercem funções diversas na comunidade.
Na mediação, o mediador não decide nada, não podendo manifestar sua opinião e apontar soluções para o conflito. O mediador apenas tenta ajudar as pessoas a chegarem em uma decisão conjunta, facilitando a comunicação, sem induzir as partes em um acordo.
Segundo Bolzan de Morais e Fabiana Spengler[25]:
“A mediação é um método alternativo que não há adversários, apenas consiste na intermediação de uma pessoa distinta das partes, que atuará na condição de mediador, favorecendo o diálogo direto e pessoal. O mediador facilita a comunicação sem induzir as partes ao acordo, e quando este existe, apresenta-se total satisfação dos mediados.”
Assim, mostra-se necessário dar maior destaque a mediação, uma vez que esta busca o diálogo, o ganho mútuo entre as partes, de maneira que as mesmas saiam satisfeitas através de um acordo, resolução de forma consensual qualquer adversidade ainda existente.
4. A mediação como alternativa para o tratamento de conflitos
Diante ao caos ao qual se apresenta o cenário de acesso à justiça e da crise do Judiciário Brasileiro, em que a morosidade e a complexidade do ordenamento jurídico geram insatisfação aos jurisdicionados, pelo tempo que aguardam uma decisão judicial, é que se originou o Projeto de Lei da Mediação[26], com o objetivo de trazer uma alternativa para a pacificação dos conflitos e acesso à justiça.
No Brasil, até o presente momento a mediação, enquanto instrumento alternativo de solução de controvérsias, ainda não é fruto de uma lei. Todavia, existem anteprojetos como o da Deputada Zulaie Cobra sendo discutidos no congresso, pretendendo torná-la obrigação prévia às contendas judiciais.
A mediação surge como uma alternativa para a resolução de conflitos em que as pessoas envolvidas buscam seus interesses e suas necessidades. Representa um meio consensual de solução de conflitos, no qual as partes com auxílio de um terceiro imparcial (mediador) escolhido ou aceito pelas partes para facilitar o diálogo e decidirem o litígio, de modo, a explorar o sentido positivo do conflito, buscando a compreensão exata do problema, evitando sua superdimensão[27].
Conforme ensina o doutrinador Jasson Torres:
“É indiscutível a importância da mediação como modelo que se expande mo seio da sociedade, como mecanismo válido na solução dos conflitos. Por isso, a confiança gradativamente vem aumentando nos instrumentos menos formais, diretos e rápidos no atendimento do direito reclamado pelo cidadão. Dessa forma, acreditamos num programa que pode ser desenvolvido e colocado em prática junto à organização do Poder Judiciário, como importante auxiliar dos órgãos encarregados da solução dos conflitos e preocupados com o mais amplo acesso à justiça. (…) Em que pese não esteja inserido como texto legal, é um instrumento jurídico colocado à disposição da sociedade e do Poder Judiciário para viabilizar um paradigma de justiça”.[28]
Nesse sentido, o autor acima referido aduz que “não há dúvida que a mediação não só vai influir decisivamente para diminuir o número de processos nas instâncias ordinárias e nos tribunais, como se constituirá num campo fértil de solução alternativa de conflitos[29]”. Ainda, a mediação auxilia quando os sujeitos estão em conflito e não conseguem chegar a um acordo satisfatório, colocando em risco os vínculos entre os litigantes.
Ainda, a mediação procura valorizar os laços fundamentais de relacionamento, incentivando, com o auxílio de um terceiro mediador, “o respeito à vontade dos interessados, ressaltando os pontos positivos de cada um dos envolvidos na solução da lide, para ao final extrair, como conseqüência natural do processo, os verdadeiros interesses em conflito.”[30] A proposta orientadora para a mediação considera que o conflito é também uma oportunidade de crescimento e desenvolvimento, havendo superação da lógica determinista binária.
O instrumento da mediação tem surtido bons efeitos, podendo ser iniciado em momento anterior à proposição formal de qualquer ação em juízo, no de correr do andamento do processo, ou em qualquer fase em que haja discordância sobre algum ponto que seja considerado essencial e não esteja sendo devidamente cumprido.[31] As práticas de mediação interessam-se pelas possibilidades criativas, que brindam as diferenças, a diversidade e a complexidade.
Apoiando-se em noções de construção social da realidade, as estratégias de mediação fornecem perspectivas para a participação dos atores sociais, que podem incrementar sua capacidade para iniciar ações novas, atuar como protagonistas ao enfrentar e resolver conflitos e dilemas em suas vidas, assim como narrar novas e melhores histórias sobre os sistemas dos quais são parte e de seu lugar nos mesmos.[32]
Destaca-se que o mediador deve ser um terceiro neutro, que conheça o processo de mediação, sem emitir juízo de valor, auxiliando as partes a dialogar no intuito de restabelecer o relacionamento e potencializar o positivo do conflito[33].
Na medida em que o processo de mediação transcorre, possibilita-se as partes a oportunidade de se comunicarem, mudando a postura de litigantes para colaboradores, e reduzindo as situações de conflito.
Alguns conflitos arrastam-se durante de anos, demorando tanto a ser encerrados que chegam a perder todo o sentido, sendo dificilmente recuperados após tantos anos de litígio, tornando as decisões cada vez mais burocráticas.
Dessa forma, a mediação faculta lidar com tudo aquilo que está subjacente à disputa. Permite que as pessoas criem um sentido de aceitação, sentindo que a decisão a que chegarem foi sua própria e não imposta de fora para dentro. Tem, portanto, uma tendência de mitigar e eliminar as tensões, criando compreensão e confiança entre os litigantes, evitando a amargura que se segue a uma decisão judicial, para o vencido e muitas vezes também para o vencedor. Pode prover uma base para que as partes possam, no futuro, renegociar as suas questões e é, na maioria das vezes, menos custosa[34].
Nesse sentido, a mediação é uma das melhores fórmulas de superar o imaginário do normativismo jurídico. Fala-se nela como uma das possíveis soluções para os problemas de acesso à justiça. As práticas sociais de mediação configuram-se em um instrumento de exercício da cidadania na medida em que educam, facilitam e ajudam a produzir diferenças e a realizar tomadas de decisões, sem a intervenção de terceiros, e sim, com a ajuda deste:
“O mediador tem como função tentar recolocar o conflito no terreno das pulsões de vida. O mediador tem que retirar o conflito do espaço negro das pulsões destrutivas (um território do qual não escapa o Direito, suas normas e procedimentos de coerção e vingança). O mediador tem que tentar erotizar o conflito inscrevendo o amor entre as pulsões destrutivas e no conflito; o amor no meio do poder.”[35]
Destarte, tem-se que a mediação funciona como um processo democrático, pois, rompe/dissolve os marcos de conflitos, acolhendo a desordem e buscando a sua resolução pelo diálogo e compreensão entre as partes no intuito de garantir a democracia e a cidadania, principalmente na fundamentação da relação um com o outro.[36]
Para Spengler, a mediação é “como espaço de reencontro, utiliza a arte do compartir para tratar conflitos e oferecer uma proposta inovadora de pensar o lugar do Direito na cultura complexa, multifacetada e emergente do terceiro milênio.[37]”
Na mediação, o mediador nada decide, apenas estimula e viabiliza a comunicação entre os mediados na busca por melhores e mais criativas soluções, de modo a facilitar a celebração de um acordo mutuamente satisfatório.[38]
“El mediador no actua como juez, pues no puede imponer una dicisión, sino que ayuda a los contrários a identificar los puntos de la controvérsia, a explorar las posibles bases de un pacto y las via de solución, puntualizando las consecuencias de no arribar a un acuerdo. Por esos médios, facilita la discusión e insta a las partes a conciliar sus intereses. Plantea la relación en términos de cooperación, con enfoque de futuro y con un resultado em el cual todos ganan, cambiando la actitud que adoptan en el litígio en que la postura es antagônica, por lo que una parte gana y outra pierde. En la mediacíon todas las partes resultan ganadoras puesto que se arriba a uma solución consensuada y no existe el resentimiento de sentirse “perdedor” al tener que cumplir lo decidido por juez. En definitiva, puede decirse que realomente ‘la mejor justicia es aquella a la que arriban las partes por si mismas’, em tanto el haber participado en la solución torna más aceptable el cumplimiento […].”[39]
Trata-se, portanto, de uma nova e eficaz alternativa que, ao viabilizar o acesso a soluções rápidas e criativas, responde às aspirações democráticas dos cidadãos, reservando- se ao Poder Judiciário, sempre que necessário for, o exame sobre a legalidade do processo de mediação[40].
Assim, os meios alternativos de solução de conflitos acabam servindo como opção para a superação da crise da justiça.
5. Considerações finais
É cediço que o Poder Judiciário, face ao volume de causas que lhe são submetidas, não mais consegue solucioná-las de forma célere e eficaz, conforme espera a sociedade. Diante disso, faz-se necessária a busca por alternativas de acesso à justiça, das quais se destaca a mediação, cuja prática vem tomando relevo.
O acesso à justiça, sendo um direito dos cidadãos e um dever do Estado procura efetivar a resolução dos conflitos sociais de forma plena, colocando fim a crise que enfrenta a Jurisdição. Dessa forma, apresentou-se novas de solução dos conflitos, dando destaque à mediação, pois esta tem sido uma grande aliada no conjunto da resolução dos conflitos, da facilitação da comunicação entre os sujeitos envolvidos, do demandismo exacerbado, do desafogamento do Poder Judiciário, entre outros.
Com o presente artigo buscou-se tratar da questão dos conflitos, abordando as formas alternativas de resolução dos conflitos, em especial a mediação, a qual é um modo célere e criativo de se fazer justiça, através de acordos voluntários para que as partes possam sair vencedoras.
Além do desenvolvimento da democracia, a mediação também contribui para uma maior celeridade na solução das controvérsias, com o aumento da eficácia dos resultados, dentro de um procedimento com diminuição do desgaste emocional e dos dispêndios financeiros, marcado, em regra, pelo sigilo, resultando na criação de ambientes sociais cooperativos e harmônicos, com a manutenção ou restauração da “paz social”[41].
Por fim, é importante ressaltar que as formas alternativas de resolução de conflitos deve ser a primeira porta a ser utilizada pelas partes, deixando o Judiciário como última posição alternativa para solução do litígio, contribuindo desta forma, para a concretização da garantia fundamental de acesso à justiça, bem como da participação da cidadania.
Mestre em Direito Público na Universidade de Santa Cruz do Sul -UNISC, pós-graduada em direito empresarial pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul – PUCRS, Pós-graduada pelo Escola da Magistratura do Rio Grande do Sul – AJURIS, e advogada. Integrante do Grupo de Pesquisas “Políticas Públicas no tratamento dos conflitos”, e integrante do grupo de Pesquisas “Políticas Públicas para a Inovação, Proteção Jurídica da Tecnologia e Desenvolvimento”, vinculados ao Programa de Pós-Graduação em Direito, Mestrado e Doutorado, da UNISC e certificado pelo CNPQ
Advogado. Mestre em Direito pela Universidade de Santa Cruz do Sul – UNISC Pós-graduado em Direito Processual Civil pela Universidade do Sul de Santa Catarina – UNISUL e Pós-graduado em Direito Tributário pela Universidade Anhanguera – UNIDERP. Professor no curso de Pós-graduaçãoo em Direito Civil na Universidade Luterana do Brasil ULBRA. Participou como integrante do Grupo de Pesquisas Políticas Públicas no tratamento dos conflitos coordenado pela Prof. Pós-Dra. Fabiana Marion Spengler e do Grupo de estudos de Políticas Públicas para a Inovação e a Proteção Jurídica da Tecnologia coordenado pela Prof. Pós-Dr. Salete Oro Boff vinculados ao Programa de Pós-Graduação em Direito Mestrado e Doutorado da UNISC e certificado pelo CNPQ
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