1.1. Função Social da Propriedade Privada
A expressão função social é vaga, imprecisa e de difícil intelecção.[1]
Hoje, o conceito de função social está conhecido por todos com relação à previsão constitucional, como nos diz o art. 5º, XXIII e art. 170, III da Constituição Federal.
Para José Diniz de Moraes[2], “função é a satisfação de uma necessidade”, que pressupõe sempre uma relação com um bem apto a satisfazê-la (interesse), na esfera jurídica de um sujeito.
Segundo José Afonso[3], a função social da propriedade não se confunde com os sistemas de limitação da propriedade, pois estes dizem respeito ao exercício do direito do proprietário. A função social da propriedade privada surge em razão da utilização produtiva dos bens de produção, proporcionando crescimento econômico e produção de riquezas na forma de um bem estar coletivo.
Celso Ribeiro Bastos[4], todavia, afirma que função social da propriedade é o conjunto de normas da Constituição que visa, por vezes até com medidas de grande gravidade jurídica recolocar a propriedade na sua trilha normal.
Na verdade, a função social da propriedade é uma forma de compatibilizar a fruição individual do bem e o atendimento da sua função social visando que o titular da propriedade não abuse do seu direito.
Advirta-se, porém, que Francisco Loureiro[5] faz uma importante indagação: “a Constituição Federal, ao dispor que” a propriedade atenderá a sua função social, “consagra um princípio ou uma cláusula geral?”.
A doutrina se divide:
Para Judith Martins Costa[6], a proposição normativa consubstancia cláusula geral que, porém, contém o princípio da função social. Entretanto, na lição de Suzana de Toledo Barros[7], os direitos fundamentais, mesmo quando expressados sob a forma de regras, são princípios, tendo em vista o valor do bem jurídico que se visa proteger.
A doutrina de José Afonso[8] vê os incisos da Constituição, que prevêem a função social da propriedade, como normas que contém um princípio, o da função social e norma com aplicabilidade imediata, como o são todos os princípios constitucionais, reconhecida até pela jurisprudência.
Na verdade, a função social é um poder-dever do proprietário de dar ao objeto da propriedade determinado destino, de vinculá-lo a certo objetivo de interesse coletivo.[9]
É por isso que a função social é incompatível com a noção de direito absoluto, oponível a todos, em que se admite apenas a limitação externa, negativa. Ao contrário da função social que importa também uma limitação interna, positiva, condicionando o exercício e o próprio direito. Assim, lícito é o interesse individual quando realiza, igualmente, o interesse social e o exercício do direito individual da propriedade deve ser feito no sentido de utilidade, não somente para si, mas para todos.[10]
Nesse sentido, a propriedade produtiva ganha uma função social, seja pela pressão dos terceiros interessados, seja pela obra e graça dos seus titulares. Como já dito no capítulo anterior, a propriedade agora é vista e conceituada numa visão global, incluindo a propriedade produtiva.
Eros Roberto Grau[11] acrescenta que o princípio da função social é pressuposto necessário da propriedade privada e, segundo ele, sua idéia é de vínculo que atribui à propriedade um conteúdo específico que a conduz a um novo conceito.
Na Carta Magna, em seu art. 5º, a propriedade é tratada como direito individual e os incisos II e III do art. 170 enunciam como princípios da ordem econômica: a propriedade privada e a função social da propriedade privada.
Enfim, encarando a função social de forma ativa, seria um poder-dever, trazendo ao direito privado, algo típico do direito público: o condicionamento do poder a uma finalidade.
Nestes termos, o princípio da função social legitima e justifica a propriedade e este princípio se tornou indispensável à realização do fim da ordem econômica, quanto demonstra a modernização do capitalismo nacional.
Em suma, a propriedade na Carta de 1988 consiste num direito que se destina a um dever, o de cumprir uma função social.
1.2. Função Social da Empresa
A tendência constitucional é pela função social dos institutos jurídicos, do que se precisa incluir a empresa como operadora de um mercado socialmente socializado[12].
A função social da empresa assegura a função social dos bens de produção, o poder-dever do proprietário de dar uma destinação compatível com o interesse da coletividade. Entretanto, a função social não significa uma condição limitativa para o exercício da atividade empresarial, visa proteger a empresa contra a verocidade patrimonialista do mercado.
Nesse contexto, a função social da empresa deve ser entendida como o respeito aos direitos e interesses dos que se situam em torno das empresas.
O objeto da propriedade, que no Direito Civil está limitado aos bens materiais tangíveis, ganha outra dimensão no art. 5º da Constituição Federal, podendo na expressão de Pontes de Miranda, ser reduzido à seguinte fórmula: “propriedade é toda patrimonialidade”.
A função social não pode ser encarada como algo exterior à propriedade, mas sim, como elemento integrante de sua própria estrutura. Fala-se não mais em atividade limitativa, mas sim conformativa do legislador. Abrange todos os bens de natureza patrimonial, inclusive os de consumo e pessoais.
Quanto, a saber, se a função social da propriedade se aplica à empresa, pode-se dizer que Pontes de Miranda afirma que o termo propriedade, tem sentido lato, significando “qualquer direito patrimonial”[13], razão pela qual pode-se dizer que abrange a empresa.
Percebe-se que todas as sociedades nascem por contrato e o novo Código Civil prevê a função social dos contratos no art. 421 e essa função se estende ao contrato de sociedade e deve incidir sobre a própria causa do negócio.[14]
Percebe-se que todas as sociedades nascem por contrato e o novo Código Civil prevê a função social dos contratos no art. 421 e essa função se estende ao contrato de sociedade e deve incidir sobre a própria causa do negócio.[15]
Outrossim, continua-se a entender que a empresa deve cumprir uma função social independentemente da sua forma jurídica.
Consorte, a função da empresa, ou seja, a função social dos meios de produção implica na mudança de concepção do direito de propriedade: o princípio da função social incide no conteúdo do direito de propriedade, impondo-lhe novo conceito. Isso implica que as normas de direito privado sobre a propriedade estão conformadas pela disciplina que a Constituição lhes impõe.[16]
Nesse sentido, não se pode, hoje, deixar de impor limites à empresa, conforme valores sociais e interesses que ultrapassam os interesses de lucros dos empresários.
A função social da empresa é abraçada ampliando-se o conceito constitucional da propriedade. Fábio Konder Comparato[17] afirma que o conceito constitucional da propriedade é bem mais amplo do que o tradicional do Direito Civil.
O poder de controle empresarial há de ser incluído na abrangência do conceito constitucional de propriedade.
Na verdade, a função social da empresa dará maior ênfase à sua própria sobrevivência, mas não se esquecerá do lucro, porque uma posição não exclui a outra. O lucro é importante, mas a sobrevivência do social da empresa é mais importante.
Falar-se de função social da empresa é falar-se de reservas. O interesse social não quer significar o interesse da maioria, mas da própria empresa, órgão estabilizador de emprego e de circulação de bens e serviços. Ademais, uma empresa geradora de riqueza e de emprego atende à sua função social, acima de distribuir dividendo para os acionistas.
A geração de empregos pode ser considerada como função social da empresa à luz do preceito constitucional econômico que promulga a busca pelo pleno emprego.
Com efeito, se toda propriedade no Brasil necessita cumprir uma função social, a empresa também necessita e seria encarada como função social dos bens de produção. Em regra, os bens de produção são postos em dinamismo, no capitalismo, em regime de empresa, daí falar-se em função social da empresa.[18]
O princípio da função social da propriedade impõe ao proprietário, ou quem detenha o controle da empresa, o dever de exercê-lo em benefício de outrem, e não apenas de não o exercer em prejuízo de outrem.[19] Este princípio da função social da empresa impõe um comportamento positivo, prestação de fazer e não meramente de não fazer aos detentos do poder que deflui a propriedade.
A grande empresa, como organização econômica, transcende a própria pessoa do empresário, de modo a impor-se a ordenação de suas relações com a sociedade e das relações que no seu interior, entre investidores, empresários e trabalhadores são travadas. O poder de controle sobre os bens de produção não pertence ao capitalismo e sim ao empresário.
Em suma, à propriedade produtiva, como a empresa, tem sido reconhecida uma função social, o capital e o trabalho têm que se completar e não gerar conflito, além do mais, a propriedade dotada de função social é justificada pelos seus fins, seus serviços, sua função.
Advogada OAB/BA; Especialista em Direito do Estado e Responsabilidade Fiscal; Professora de Direito Civil do curso de Direito do IBES.
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