A (in) constitucionalidade da Lei 12.654/2012

Resumo: O presente estudo buscou, averiguar a (In) constitucionalidade da Lei nº 12.654/2012, analisando possíveis afrontas ao ordenamento jurídico pátrio já que a referida norma alterou as leis nº 12.037/2009 (Lei de identificação Criminal) e a nº 7.210/1984 (Lei de Execução Penal) Inicialmente, foi necessário uma explanação sobre o jus puniendi assim como sua evolução histórica. Em seguida foram abordados os princípios constitucionais interligados ao direito penal brasileiro. Por fim, analisou-se a identificação genética e também o direito a segurança pública em detrimento da normatização da Lei nº 12.654/2012 e sua aplicabilidade no ordenamento jurídico brasileiro. Conquanto, constatou-se que a Lei nº 12.654/2012 funciona como um grande avanço na ordem jurídica brasileira, já que não viola as normas individuais. [1]

Palavras-chaves: (In) Constitucionalidade; Lei nº 12.654/2012; Jus Puniendi; Identificação Genética.

Abstract: The present study sought to investigate the (In) constitutionality of Law 12,654 / 2012, analyzing possible violations of the legal order of the country, since the aforementioned norm amended Laws 12,037 / 2009 (Criminal Identification Law) and No. 7.210 / 1984 ( Criminal Execution Law) Initially, an explanation was needed on jus puniendi as well as its historical evolution. The constitutional principles interconnected with Brazilian criminal law were then discussed. Finally, we analyzed the genetic identification and also the right to public safety in detriment of the regulation of Law 12,654 / 2012 and its applicability in the Brazilian legal system. However, it was found that Law No. 12,654 / 2012 acts as a major advance in the Brazilian legal order, since it does not violate individual standards.

Key-words: (In) Constitutionality; Law nº 12,654 / 2012; Jus Puniendi; Genetic Identification.

Sumário: Introdução. 1. Delineamento Histórico Conceitual do Jus Puniendi do Estado 2. Princípios Norteadores do Direito Penal.  2.1. Princípio da Dignidade da Pessoa Humana. 2.2 Princípio da Legalidade. 23. Princípio da Não Autoincriminação. 2.4. Princípio da Inviolabilidade da Intimidade e da Vida Privada. 2.5. Contraditório e Ampla Defesa. 3. Análise da Identificação Genética e Direito  a Segurança Pública em Face da Aplicação da Lei Nº12.654/12. Conclusão. Referências.

INTRODUÇÃO

O presente estudo teve como temática a análise da (in) constitucionalidade da Lei nº 12.654/2012, em decorrência das recentes inovações no ramo do direito processual penal brasileiro, incidindo consequências no âmbito prático e teórico.

Infere-se que a lei em comento alterou o conteúdo de outras duas leis, quais sejam: a Lei nº 12.037/2009 conhecida como a Lei de Identificação Criminal e a Lei nº 7.210/1984 considerada a Lei de Execução Penal.

A Lei nº 12.654/2012 alterou a Lei de Identificação Criminal, assim como a Lei de Execução Penal e instituiu a possibilidade de utilização da coleta de DNA de condenados por crimes violentos ou hediondos, visando à manutenção de banco de dados estatal com material genético, bem como a utilização da amostra genética coletada para a descoberta da autoria delitiva no curso de investigações criminais.

Embora esteja reconhecida a aplicabilidade da lei em comento (Lei nº 12.654/2012), ainda existem divergências quanto à constitucionalidade da mesma. Por isso, a pesquisa visou fornecer análise geral acerca do assunto abordado, que servirá como explicitador da (in) constitucionalidade da Lei nº 12.654/2012, com base nos relatos históricos, institutos, princípios, identificação genética e aplicação da referida lei no caso concreto.  

Buscou-se compreender os pressupostos da identificação criminal, analisar a constitucionalidade da referida lei ante a suposta violação dos direitos e garantias individuais, bem como examinar e esclarecer os reflexos e alterações no sistema jurídico, apontando o ônus e bônus, e análise da efetividade e eficácia a partir dos princípios constitucionais.

É inquestionável a importância do tema analisado, sendo este considerado uma visão hodierna do direito penal, considerando a constante mudança da sociedade em face do avanço tecnológico.

Como se sabe o progresso tecnológico é decorrente das transformações que acontecem ao longo do tempo na sociedade. Existem controvérsias doutrinárias e jurisprudenciais em torno do assunto.

Para alcançar os objetivos propostos foi utilizado o método dedutivo e premissas para a partir delas, chegar a uma conclusão lógica. Quanto a técnica de obtenção de dados foi utilizada a pesquisa bibliográfica elaborada a partir de material publicado, constituído principalmente de livros, jurisprudências, artigos de periódicos e material disponibilizado na internet.

Inicialmente foi realizado um delineamento histórico conceitual do jus puniendi do Estado. Posteriormente, abordou-se os princípios norteadores do direito penal. E por fim a identificação genética, direito a segurança pública e consequente análise da aplicabilidade da Lei nº 12.654/2012.

1 DELINEAMENTO HISTÓRICO CONCEITUAL DO JUS PUNIENDI DO ESTADO

O jus puniendi ocorre em decorrência de uma infração criminal, em outras palavras surge o direito de punir do Estado em função do infrator das normas de direito penal que deveriam ser respeitadas

Poder ser definido esse instituto como o dever-poder do Estado em aplicar a pena ao infrator que foi causador do dano ou lesão jurídica. O Estado deve aplicar a pena em conformidade com o preceito constitucional.

O Estado possui um escopo de exercer seu poder punitivo por intermédio do jus puniendi sendo necessário analisar todos os pressupostos inerentes a esse direito de punir que é garantido ao Estado.

O jus puniendi possui relação intrínseca com os princípios constitucionais que viabilizam a concretização do direito de punir do Estado conforme proposto pelo legislador, devendo portanto ser visualizados todos os obstáculos decorrentes do controle social.

O Movimento Iluminista do século XVIII trouxe princípios que passaram a nortear o Direito Penal, desenvolvendo assim uma segurança quanto ao jus puniendi (direito de punir), exercício punitivo do estado.

Reconhecendo-se com isso a real existência de direitos inerentes à condição de ser humano. Sem dúvidas, um grande avanço para a sociedade que passava a ter seus direitos efetivados de fato. O Brasil trouxe no texto da Constituição Federal de 1988, elementos com base iluminista e regras que garantem a aplicabilidade da referida norma, ficando assim estado e cidadão abrangidos pelo que dispõe a Lei Maior nesse sentido.

Dentre esses princípios podemos citar o da dignidade da pessoa humana, que afastou o excesso do poder punitivo do estado, sendo reconhecidas assim as garantias individuais e fundamentais no Estado democrático de Direito.

A Constitucionalização do direito de punir é exigência fundamental da democracia que se demonstra através do respeito dos princípios constitucionais ligados ao direito penal, dessa maneira é necessário a aplicação de sanções penais como forma de aplicação das normas quando praticadas infrações.

Dessa forma, desde o movimento iluminista quando começaram a surgir elementos do direito penal, até a regulamentação da norma penal na Constituição Federal de 1988 e o Código Penal Brasileiro foram instituídos deveres e direitos inerentes a dignidade da pessoa humana.

2 PRINCÍPIOS NORTEADORES DO DIREITO PENAL

O vocábulo princípio, derivado do latim principium, remete a origem, entendimento que deve nortear vários outros. Por conseguinte, possui força normativa, pois conforme o Decreto Lei nº 4.657/1942, Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro os princípios são fontes do direito.

Os princípios norteadores do direito penal devem ser respeitados pois foram instituídos no ordenamento jurídico brasileiro e devem ser cumpridos, de forma a evitar que o infrator das normas penais sofra penalidades por burlar a legislação.

O composto dos princípios constitucionalmente garantidos possui um sistema exclusivo com própria autorregulamentação. Dessa forma, torna-se imprescindível destacar que ocorre ligação entre os princípios constitucionais e penais que englobam normas de direitos fundamentais.

É necessário a explanação dos princípios interligados ao direito penal, que serão abordados a seguir, especificamente seus conceitos, características e preceitos no âmbito do direito penal brasileiro.

Princípio da Dignidade da Pessoa Humana

Após o termino da Segunda Guerra Mundial o Estado passou a ser administrador da sociedade, emanando então a Declaração Universal de Direitos Humanos de 1948 e a Declaração Americana dos Direitos do Homem de 1969, visando à aplicação universal do dos direitos humanos. A dignidade humana é um dos fundamentos do Brasil enquanto Estado Democrático de direito, previsto na Constituição Federal da República Federativa do Brasil de 1988, em seu artigo 1º, inciso III, bem como no artigo 5º, incisos III e XLIX.

O artigo 1º inciso III da Constituição Federal de 1988 estabelece como fundamento em nosso Estado Democrático de Direito, a dignidade da pessoa humana, sendo assim esse princípio comporta-se como princípio supremo ou ainda o princípio dos princípios, pois o indivíduo deve ter seus direitos efetivados.

Ressalta-se que conforme o artigo 5º, §3º da Constituição Federal de 1988 os tratados de direitos humanos e convenções sobre direitos humanos aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos são equivalentes às emendas constitucionais tendo como base a reforma feita pela Emenda Constitucional nº 45/2004.

Em síntese sua definição e delimitação é muita ampla justamente por abarcar vários ramos do direito, seu sentido foi se modificando ao longo do tempo resultando em diversas concepções.

Diante disso, não podemos afirmar que nunca existiu um tempo em que o homem vivesse separado de sua dignidade, mesmo que ainda não soubesse defini-la, ou reconhecer seu valor.

A dignidade é um pressuposto do ser humano criado pelo próprio homem, que o desenvolveu ao longo dos anos, desde os primórdios da humanidade, mas somente na atualidade percebido plenamente.

Pode-se afirmar que esse princípio torna o ser humano centro do ordenamento jurídico. Silva (1999, p. 106) afirma que “a dignidade da pessoa humana é um valor supremo que atrai o conteúdo de todos os direitos fundamentais do homem, desde o direito à vida”.

O referido autor, ainda, afirma que “a dignidade da pessoa humana é um valor supremo que atrai o conteúdo de todos os direitos fundamentais do homem, desde o direito à vida”. 

O respeito a dignidade da pessoa humana que se remete a ideologia democrática funcionando como um dos fundamentos do Estado de Direito Democrático, funciona como elemento essencial para efetivação das normas jurídicas.

Entretanto, para alguns doutrinadores essa perspectiva hermenêutica é tida como subprincípio, vez que não há valor maior que a dignidade da pessoa humana. Segundo Gomes (2016, p. 840):

Acham-se ancorados no princípio-síntese do Estado Constitucional e Democrático de Direito, que é o da dignidade humana. A força imperativa do princípio da dignidade humana (CF, art. 1º, III) é incontestável. Nenhuma ordem jurídica pode contrariá-lo. A dignidade humana, sem sombra de dúvida, é a base ou o alicerce de todos os demais princípios constitucionais penais. Qualquer violação a outro princípio afeta igualmente o da dignidade da pessoa humana. O homem (o ser humano) não é coisa, não é só cidadão, é antes de tudo, pessoa (dotada de direitos, sobretudo perante o poder punitivo do Estado).

Toda pessoa é digna, pois a dignidade decorre da natureza humana e não de variáveis externas. Sob essa perspectiva ao processo penal é vedado expor os indivíduos a situações desumanas, de tortura ou degradantes, consequentemente todos têm direito à celeridade processual, integridade física e moral.

Destarte que o processo penal priva o homem tão somente da sua liberdade e em hipótese alguma, da dignidade. Consagrado como princípio vetor, o princípio da dignidade da pessoa humana visa assegurar o mínimo existencial e respeito à liberdade individual.

O princípio em comento não implica em impedimento ou mesmo afronta a identificação criminal genética, vez que essa corrobora com a redução dos erros quanto à autoria criminal e permite a colheita de DNA por procedimento que não seja invasivo.

Tem-se que o supracitado princípio é considerado um macroprincípio, pois é o mais fundamental de todos existentes, de onde emergem os demais, funcionando como princípio que norteia os demais, é exemplo a cidadania, a liberdade, solidariedade, dentre outros que formam a organização jurídica.

Assim, a dignidade da pessoa humana é requisito indispensável para todo e qualquer indivíduo devendo ser preservado e garantido no direito penal e processual penal já que o desfazimento de um implicaria na extinção de outro.

2.2 Princípio da Legalidade

O princípio da legalidade é equivalente à fórmula latina nullum crimen, nulla poena sine lege, previsto na Declaração dos Direitos do Homem de 1789, também conhecido como princípio da reserva legal. Constitui-se como um dos sustentáculos do Estado Democrático de Direito, previsto nos incisos II e XXXIX, artigo 5º da Carta Magna de 1988, respectivamente in verbis, “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei” e “não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal”. Por oportuno destaque-se que no processo penal, a lei deve ser produzida pelo ente competente, qual seja, a União, conforme previsto no inciso I, artigo 22 da CF/1988.

Entende Queiroz (2001, p. 22-26) que:

Semelhante princípio atende, pois, a uma necessidade de segurança jurídica e de controle do exercício do jus puniendi, de modo a coibir possíveis abusos à liberdade individual por parte do titular desse poder (o Estado). Consiste, portanto, constitucionalmente, uma poderosa garantia política para o cidadão, expressiva do imperium da lei, da supremacia do Poder Legislativo e da soberania popular sobre os outros poderes do Estado, de legalidade da atuação administrativa e da escrupulosa salvaguardados direito e liberdade individuais. Constitui, portanto, constitucionalmente, uma poderosa garantia política para o cidadão, expressiva do imperium da lei, da supremacia do Poder Legislativo e da soberania popular, sobre os outros poderes de Estado, de legalidade da atuação administrativa e da escrupulosa salvaguarda dos direitos e liberdade individuais.

Somente a lei liga o fato a pena, isto é, após descrição legal dos fatos típicos o Estado poderá punir o cidadão. No entendimento do renomado autor Lima (2005, p. 50) no texto intitulado “A exclusão da tipicidade penal: princípios da adequação social e da insignificância” explica que:

Para uma ação humana ser um crime, é necessária a presença de todos os elementos constitutivos deste. Em primeiro lugar, a existência de seu ajuste perfeito a uma descrição delituosa contida na lei penal, a tipicidade. Deve haver previsão legal do delito. Não obstante, para ocorrer efetiva tipicidade, a conduta humana deve, também, ser materialmente ofensiva ou perigosa ao bem jurídico tutelado, ou ética e socialmente reprovável. Não basta a subsunção do comportamento a uma norma incriminadora. Ações toleradas pela coletividade ou causadoras de danos desprezíveis ao bem protegido não se abrangem pelo tipo legal do crime.

No entanto, somente a lei anterior ao fato pode estabelecer que esse constitui crime, portanto será considerado lícito tudo que não for expressamente proibido.

O devido processo legal guarda suas raízes no princípio da legalidade, garantindo ao indivíduo que somente seja processado e punido se houver lei penal anterior definindo determinada conduta como crime, cominando-lhe pena. Além disso, modernamente, representa a união de todos os princípios penais e processuais penais, indicativo ímpar do processo penal. (NUCCI, 2014).

Todas as pessoas possuem o direito de se defender em juízo, o devido processo legal possibilita ao acusado o acesso à justiça diretamente. Assim, a legalidade viabiliza tanto a defesa quanto a acusação da pessoa, jamais, alguém deve ser inocentado ou acusado sem antes ter julgamento realizado por magistrado competente. Devem ser observadas as formalidades do processo penal, a falta de solenidade implica na nulidade dos autos.

2.3 Princípio da Não Autoincriminação

A popular primeira parte do “Aviso de Miranda” menciona que “Você tem o direito de ficar calado. Tudo o que disser pode e será usado contra você no tribunal”, embora seja característica norte-americana, são aceitáveis no Brasil, haja vista a previsão do inciso LXIII, do artigo 5º da Carta Magna de 1988, no mesmo sentido a Convenção Americana de Direitos Humanos e o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, da ONU – Organização das Nações Unidas. Consiste no princípio da não autoincriminação, isto é, nemo tenetur se detegere.

Censurar o Estado de produzir provas não é o modo de impedir a punição de inocentes, mas corrobora com que os culpados sejam impunes. Para Haddad (2005, p. 84) “A produção de prova é ato eminentemente comissivo, do que decorre a inaplicabilidade do princípio contra a autoincriminação às condutas omissivas que consistam em mero tolerar do acusado”.

Recorde-se que o princípio em tela foi originado como método de amenizar os abusos cometidos nos interrogatórios. Albuquerque (2008, p. 91) entende que “Quanto aos demais meios de prova que porventura dependam de alguma contribuição do acusado, parece-nos que a garantia de não autoincriminação não poderá ser invocada, porque não cumpre, nesses casos, as finalidades para as quis foi instituída”.

Importante mencionar que a reinterpretação da garantia de não autoincriminação guia a não gerar impunidade, devendo ser observado esse nexo, em decorrência disso a correta aplicação desse privilégio não será utilizado como proteção para quem cometer ato típico, antijurídico e culpável.

Este direito deve ser invocado somente quando o Estado tiver pretensão de apurar o fato, vez que sem delimitação há estímulo para perpetuação de crimes.

 O Código de Processo Penal, em seu artigo 186 dispõe que é vedada a interpretação do silêncio em prejuízo do réu, todavia, no artigo 198 do mesmo diploma legal, o silêncio pode constituir elemento para a formação do convencimento do juiz.

Destarte que o princípio em tela, não obsta que o procedimento probatório específico do exame do ácido desoxirribonucleico (DNA) seja regulado por lei a fim de evitar abusos e garantir a validade da prova. Afinal, o direito de não produzir provas contra si mesmo não pode ser utilizado como álibi para prática de novos delitos, ademais não pode-se falar em produção de provas contra si antes do fato criminoso acontecer.

2.4. Princípio da Inviolabilidade da Intimidade e da Vida Privada

A Constituição Federal da República Federativa do Brasil de 1988 preceitua, em seu artigo 5º, inciso X, que “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;”. O direito à privacidade compreende a intimidade, vida privada, honra e imagem das pessoas.

O direito a intimidade é aquele que resguarda ao ser humano em sua vida privada, seus pensamentos mais secretos do conhecimento de qualquer pessoa e até mesmo do Estado, protege a própria pessoa.

Segundo Dotti (1980, p. 117), a intimidade se representa “a esfera secreta da vida do indivíduo na qual este tem o poder legal de evitar os demais”. Enquanto a vida privada é a que “integra a esfera íntima da pessoa, porque é repositório de segredos e particularidades do foro moral e íntimo do indivíduo”.

A intimidade liga-se nas relações subjetivas íntimas das pessoas, desde suas relações familiares e de amizade. Não existe nenhuma dúvida sobre a divulgação de fotos ou imagens poder acarretar em assuntos injuriosos que configuram dano a dignidade da pessoa humana, viabilizando o direito de resposta. É evidente que a prova está relacionada intimamente a verdade dos fatos, ligada ao desenvolvimento do direito de ação e de defesa tendo uma vertente totalmente constitucional.

Segundo Silva (2015, p. 210) o legislador ao se referir à vida privada “Deu destaque ao conceito, para que seja mais abrangente, como conjunto de modo de ser e viver, como direito de o indivíduo viver sua própria vida”.

A intimidade está no núcleo da privacidade, pois a intimidade trata do psicológico individual, sentimentos, relacionados à sociedade, enquanto a esfera privada alberga os hábitos e opiniões da pessoa, que envolvem diversos fatores no âmbito da própria intimidade.

Silva (2015, p. 30) entende que a vida pessoal engloba dois distintos âmbitos, quais sejam, a vida exterior, voltada para atividades públicas com participação de terceiros e a vida interior, abarcando as relações sociais íntimas da pessoa. Assim divulgações devem ser tratadas com prudência para não afetar a moral física ou psicológica das pessoas.

A intimidade pode ser vista como de enorme importância em relação aos indivíduos no convívio em sociedade. Em síntese, trata-se a verdade de um direito essencial e indelegável, possui característica individualista e exclusiva, ou seja, é uma liberdade indisponível do indivíduo. A anuência do fundamento de provas desencadeado ilicitamente está ligada ao fato de obtenção provocar ofensa aos direitos e garantias fundamentais da pessoa.

Alexandrino (2011, p. 135) compreende que:

No entendimento da Corte Suprema, a mera publicação não consentida de fotografias gera o direito à indenização por dano moral, independentemente da ocorrência de ofensa à reputação da pessoa, porquanto o uso indevido da imagem, de regra, causa desconforto, aborrecimento ou constrangimento ao fotografado, que deve ser reparado.

Dessa forma, a vida privada é mais ampla que a intimidade, pois perfaz no interesse da pessoa em revelar informações sobre si ou terceiro para o público. Hodiernamente a vida privada está estreitando, em face da globalização das tecnologias, circulação instantânea de informações.

Tempestivamente, urge salientar o romance 1984 de George Orwell, que retrata um mundo onde aparelhos, chamados de teletelas, controlam os habitantes, o mecanismo de controle chamado Grande Irmão, declarando “está de olho em você”.

Nesse sentido, é admissível a relativização do direito à inviolabilidade de privacidade e vida privada em alguns casos, como no sigilo bancário ou de dados, em razão do princípio da proporcionalidade, no mesmo sentido é plenamente admissível o exame de DNA para manutenção do banco de perfis genéticos.

Verifica-se que o princípio em questão resguarda o direito inerente à própria pessoa que possui indisponibilidade em sua privacidade, qualquer indivíduo tem a necessidade opiniões individualistas. É certo que na atualidade a persecução penal, vem se utilizando de mecanismos inadequados na obtenção de prova, adentrando na intimidade do indivíduo.

2.5 Contraditório e Ampla Defesa

O Princípio do Contraditório presente no artigo 5º, inciso LV da Constituição Federal de 1988, é primordial para o esclarecimento dos fatos, pois, garante aos litigantes á presença em todo o andamento processual, contribuindo com informações cruciais para desenrolar o conflito, colaborando também, com o convencimento do magistrado.

Sobre o tema resume Lima (2013, p. 15) que:

A prova só pode ser usada para se referir aos elementos de convicção produzida, em regra, no curso do processo judicial, e, por conseguinte, com a necessária participação dialética das partes, sob o manto do contraditório e ampla defesa. Essa estrutura dialética da produção da prova, que se caracteriza pela possibilidade de indagar e de verificar os contrários, funciona como eficiente mecanismo para verdade. De fato, as opiniões contrapostas das partes adversas ampliam os limites da cognição do magistrado sobre os fatos relevantes para a decisão da demanda e diminuem a possibilidade de erros.

Portanto, toda vez que um dos agentes envolvidos em uma demanda, apresentar novos fatos, será oportunizado a parte adversa, direito de impugnar toda e qualquer alegação contraria ao seu respeito. Dessa forma, fica nítido que, a participação das partes em todas as etapas do processo tem maior perspectiva de uma decisão judicial mais justa.

Sintetiza Oliveira (2015, p. 43) que o princípio do contraditório é um dos mais valiosos do processo penal que:

Constitui requisito de validade do processo, na medida em que a sua não observância é passiva de até nulidade absoluta, quando em prejuízo do acusado. Quando se tratar de violação do contraditório em relação á acusação, será necessária a arguição expressa irregularidade do recurso, sob pena de preclusão, ainda que se cuide nulidade absoluta. Nessa hipótese, excepcional, por certo, levam em consideração outras questões, ora ligadas ao controle do bom desempenho das funções públicas (o Ministério Público deve zelar, sempre, pela regularidade do processo, em todas as suas fases), ora ligadas á vedação da não surpresa (no fundo, o próprio contraditório) para a defesa; esta, diante da ausência de impugnação da irregularidade no recurso da acusação, não teria como se manifesta sobre a mesma.

Desta maneira, percebe-se que devem ser oportunizadas as partes informações sobre persecução penal, e também, na participação efetiva na produção de provas. Com isso, se consagra como uma proteção, em regra, absoluta, e essencial para igualar os envolvido na lide.

Nucci (2014, p. 37) entende que é toda alegação fática ou apresentação da prova:

Feita no processo por uma das partes, tem adversário o direito de se manifestar, havendo um perfeito equilíbrio na relação estabelecida entre a pretensão punitiva do Estado e o direito à liberdade e à manutenção do estado de inocência do acusado. Cuida-se de princípio ligado, essencialmente, à relação processual, servindo tanto á acusação quanto à defesa.

O contraditório é uma garantia constitucional que visa uma estabilidade processual, onde os litigantes podem produzir qualquer modalidade de provas, desde que, não esteja proibida em lei. Desse modo, o benefício se estende a todos os envolvidos no litígio.

A ampla defesa é prescrito no artigo 5º, inciso LV, da Constituição Federal de 1988, essa garantia constitucional visa uma defesa mais extensiva às partes, assegurando toda uma igualdade entre os agentes envolvidos na demanda. A Ampla Defesa refere-se ao direito do acusado de rebater de todas as formas, qualquer tipo de acusação em seu desfavor.

Assim, o Estado deve garantir ao réu, toda matéria de defesa possível, seja técnica ou pessoal. Pois, em tese, a parte hipossuficiente é o acusado, em relação à força estatal, utilizada na apuração da responsabilidade criminal.

Embora alguns doutrinadores consideram que a ampla defesa, seja outra vertente do contraditório, são garantias que não se confundem, devido ao fato de possuírem autonomia e preceitos específicos em seus contextos.

Para Lima (2013, p. 16), defende que:

O direito de defesa está ligado diretamente ao princípio do contraditório. A defesa garante o contraditório e por ele se manifesta. Afinal, o exercício da ampla defesa só é possível em virtude de um dos elementos que compõem o contraditório, o direito à informação. Além disso, a ampla defesa se exprime por intermédio de seu segundo elemento a reação.

Enfim, apesar da influência recíproca entre o direito de defesa e o contraditório são antagônicos, uma delas em posição defesa, acontecendo a necessidade de que cada pessoa tem a garantia de se contrapor aos atos da parte diversa. Em síntese, esses elementos não são derivados.

A ampla defesa engloba a autodefesa ou defesa. Não pode ocorrer supressão infundada, ou seja, o juiz não pode denegar os argumentos do defensor sem ter uma fundamentação concreta, podendo o processo ser anulado acontecer sendo a defesa ineficiente.

Conforme o artigo 5º, inciso LV da Constituição Federal de 1988 é garantido “aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”.

No ensinamento de Capez (2015, p. 62) a ampla defesa implica:

O dever de o Estado proporcionar a todo acusado a mais completa defesa, seja pessoal (autodefesa), seja técnica (efetuada por defensor) (CF, artigo 5º, LV), e o de prestar assistência jurídica integral e gratuita aos necessitados (CF, artigo 5º LXXIV). Desse princípio também decorre a obrigatoriedade de se observar a ordem natural do processo, de modo que a defesa se manifeste sempre em último lugar.

Sob a vertente que privilegia o interesse do acusado a ampla defesa pode ser considerada como um direito, entretanto, o enfoque desse princípio é ter um processo justo livre de qualquer contaminação é o que proporciona o direito efetivado de fato no processo penal.

Portanto, a ampla defesa garante diversos direitos exclusivos ao réu. São admitidos todos os meios de defesa, não vedados em lei. Toda pessoa deve ter um profissional capacitado (advogado) para resguardar interesses processuais, especialmente contrários as suas indagações.

3 ANÁLISE DA IDENTIFICAÇÃO GENÉTICA E DIREITO A SEGURANÇA PÚBLICA EM FACE DA APLICAÇÃO DA LEI Nº 12.654/2012

Desde os primórdios contemporâneos vários indivíduos foram arbitrariamente submetidos a penas, mesmo com a presença da incerteza quanto a real identidade da pessoa. Com fito de garantir a responsabilização da pessoa correta foram criados os bancos de dados, objetivando obter a maior quantidade de características individuais.

Todavia, não basta apenas identificar, é necessário também tornar o indivíduo único em relação aos demais. A identificação civil, no Brasil, é por meio da certidão de nascimento e carteira de identidade, sendo obrigatória.

O marco inicial da utilização de técnicas para a referida identificação foi em 1822, com o método antropométrico, que considerava determinadas características morfológicas e cromáticas, como o formato do queixo, lóbulo da orelha, posição das sobrancelhas, cor da íris, da pele e dos cabelos. Com o decorrer do tempo diversos métodos foram utilizados para estabelecer a identidade dos indivíduos.

O termo gene surgiu como referência à unidade fundamental, física e funcional da hereditariedade, constituída por ácidos nucléicos, portadores de informações genéticas que proporcionam a diversidade entre os indivíduos.

Após determinado período descobriu-se o ácido desoxirribonucleico (DNA), o ácido ribonucleico (RNA) e as proteínas. Nesse contexto Carvalho (2007, p. 29) “implícito nesses avanços estava o conceito de gene como informação determinante das características e comportamento dos seres vivos e mecanismos transmissor dessas características através das gerações”.

O surgimento, em 1985, da técnica da reação em cadeia da polimerase impulsionou a aplicação dos testes de DNA na identificação humana. As técnicas de investigação e prova criminal, como a coleta e análise de dados genéticos no local do crime tem sido meio eficaz de prova.

Identificação criminal pode ser conceituada como o conjunto de informações que visa individualizar determinado indivíduo sujeito a processo criminal ou mesmo a inquérito policial, cujo objetivo é auxiliar o sistema penal.

Para Nucci (2010, p. 691) identificar consiste em “determinar a identidade de algo ou alguém. No âmbito jurídico, quer dizer apontar individualmente e com exclusividade uma pessoa humana […]. No campo criminal individualiza-se a pessoa para apontar o autor, certo e determinado, sem qualquer duplicidade, da infração penal”.

O artigo 5º, inciso LVIII da Constituição Federal de 1988 e o artigo 1º do Código Penal dispõem que o civilmente identificado não será submetido à identificação criminal, salvo nos casos expressos em lei. Dispositivo que foi inserido em detrimento do contexto social e do momento histórico, vez que pós ditadura militar buscou-se afastar dos órgãos de repressão a identificação criminal, tanto que a Súmula 568 do Supremo Tribunal Federal foi editada no sentido que a identificação criminal do indiciado pelo procedimento datiloscópico não constitui constrangimento.

Conforme entendimento de Nucci (2013, p. 173):

Trata-se de norma de indevida inserção na Carta Magna, que, à época da sua elaboração, teve por finalidade corrigir a publicidade que se costumava dar ao fato de determinada pessoa especialmente as conhecidas do grande público ser criminalmente identificada, como se isso fosse inconveniente e humilhante. A norma tem contorno de direito individual, unicamente porque o constituinte assim o desejou (formalmente constitucional), mas não é matéria para constar em uma Constituição Federal. É certo que muitos policiais exorbitaram seus poderes e, ao invés de garantir ao indiciado uma colheita corriqueira do material datiloscópico, transformaram delegacias em lugares de acesso da imprensa, com direito à filmagem e fotos daquele que seria publicamente indiciado, surpreendido na famosa situação de ‘tocar piano’. Ora, por conta da má utilização do processo de identificação criminal, terminou-se inserindo na Constituição uma cláusula pétrea que somente problemas trouxe, especialmente ao deixar de dar garantia ao processo penal de que se está acusando a pessoa certa. Bastaria, se esse era o desejo, que uma lei fosse editada, punindo severamente aqueles que abusassem do poder de indiciamento, especialmente dando publicidade indevida ao ato, para a resolução do problema.

Dessa maneira, a identificação criminal pode ser feita em casos excepcionais. Minahim (2012, p. 90) entende que:

A identificação criminal do civilmente identificado só deve ocorrer em face das exceções abertas pela Lei 12.037, ou seja, para afastar incertezas diante dos documentos. Pode-se então, recorrer também ao processo datiloscópico e ao fotográfico, conforme a mesma lei e, atualmente, à coleta de ADN. Ocorre, todavia que o suspeito ou o indiciado já estariam, por ocasião do recurso à nova técnica, suficientemente identificados, como pessoas, com os dados colhidos uma vez que a impressão digital é única e mantém-se inalterada durante toda a vida. Sua capacidade de singularizar uma pessoa é tão precisa que, mesmo nos gêmeos, tem características diversas. A coleta de ADN tem, portanto, outra inequívoca finalidade, a de servir de meio de prova, que se dissimula, fazendo-se crer que se trata de mais uma informação para a identificação.

Com o advento da Lei nº 12.654/2012, originada no projeto de Lei nº 2.458/2011, que trata da identificação criminal por meio de material genético, bem como do banco de perfis criminais do Brasil, como meio de colaboração para as investigações criminais, foram alteradas as Leis nº 12.037/09 (Lei de Identificação Criminal) e 7.210/84 (Lei de Execuções Penais).

A identificação criminal foi permitida quando essencial à investigação policial, por meio do estabelecimento do perfil genético. A novidade legislativa, qual seja, a lei em comento, vigente no Brasil, tem o propósito de tornar mais eficaz a identificação de criminosos, reduzir possibilidades de erros judiciários e trocas de identidades nos processos criminais.

Os bancos de perfis genéticos contém armazenamento de amostras de vestígios do local do crime ou doadas pelos suspeitos, sendo gerenciado por unidade oficial de perícia criminal. A coleta do perfil genético pode ser efetuada de múltiplos modos, dentre eles por meio de fios de cabelo com raiz, pedaços de unhas, sêmen, sangue e saliva. Possibilitando a comparação dos vestígios do crime com as informações constantes no banco de dados genéticos.

Assim, há devida proteção às informações colhidas, pois tem caráter sigiloso, devendo conter tão somente a determinação genética de gênero, são gerenciadas por unidades oficiais de perícia criminal e já previsão legal de responsabilização civil, penal e administrativa aos que promoverem ou permitirem uso das informações para fins diversos.

No caso do Banco Nacional de Perfis Genéticos pode ser administrado por perito criminal federal habilitado e com experiência comprovada em genética, designado pelo Ministro de Estado da Justiça. O controle desse banco compete ao Poder Executivo. Os perfis genéticos seguirão normas internacionais de direitos humanos. Os referidos bancos são utilizados em outros países.

Segundo dados a maior parte dos países membros do Conselho da Europa autoriza a coleta compulsória de dados genéticos dentro do processo penal, permitindo que a coleta e o armazenamento seja mantido por período limitado de tempo.

Cordeiro (2001, p. 321) cita o banco de dados genéticos da Alemanha que armazena informações dos condenados por alguns crimes, considerados graves e o banco de dados genéticos da Inglaterra, onde consta dados de pessoas suspeitas da prática de crimes, pois a legislação é mais abrangente. Nesse último mais de 60% (sessenta por cento) dos vestígios encontrados nos locais de crimes são facilmente identificados, nos Estados Unidos já auxiliou no esclarecimento de mais de 190.000 investigações.

De acordo com a Lei de Crimes Hediondos os condenados por crime praticados dolosamente, com violência de natureza grave contra pessoa ou por qualquer dos crimes previsto no artigo 1º deste diploma legal, serão sujeitos, indispensavelmente, à identificação do perfil genético por meio da extração de DNA, com técnica adequada. Extrai-se que o objetivo dos bancos de dados genéticos é conferir segurança pública em face de criminosos perigosos.

Segundo o Ministério da Justiça, até maio de 2016, dezoito Estados mantêm bancos de DNA, além da polícia federal, são eles: Amazonas, Amapá, Bahia, Ceará, Distrito Federal, Espírito Santo, Goiás, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Pará, Paraíba, Pernambuco, Paraná, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, São Paulo.

O governo está encontrando dificuldades para implantar o banco em comento em alguns Estados, como o Tocantins, pois os juízes e promotores ainda estão sendo conscientizados da relevância do referido bando de DNA, por sua vez é mais eficaz, autoridades precisam provocar a perícia estadual, pois ela não pode agir de ofício, também há a necessidade de implantar os laboratórios, que têm alto custo para manutenção.

Ressalte-se que após a identificação do DNA em laboratório a polícia do estado passa a informação para o cadastro nacional e o programa que interliga ao banco nacional de perfis genéticos é gratuito.

A Lei nº 12.654/2012 oportuniza ao juiz competente ordenar a investigação criminal por iniciativa própria ou a requerimento da autoridade policial competente, do representante do Ministério Público ou da defesa do acusado, visando equiparar com os vestígios encontrados no local do crime. As informações dos bancos de dados são sigilosas, logo tão somente agentes públicos credenciados podem acessá-las, garantindo o direito à intimidade genética dos indivíduos.

Destaque-se que, a obrigação de fornecer o material genético, nos termos da Lei nº 12. 654/2012, incide após a condenação. Sabe-se que a há probabilidade de implantação do DNA na cena do crime, todavia a mera compatibilidade não poderá ser considerada isoladamente presunção absoluta de autoria do crime, a depender do caso concreto pode ser prova da inocência.

A previsão do artigo 6 da Lei de Contravenções Penais menciona que é contravenção punível com multa “quem recusar à autoridade, quando por esta, justificadamente solicitados ou exigidos, dados ou indicações concernentes à própria identidade, estado, profissão, domicílio e residência” afasta a possibilidade de inconstitucionalidade da Lei nº 12. 654/2012.

O Superior Tribunal de Justiça admitiu a coleta de material genético para identificação criminal, no julgamento do Habeas Corpus nº 407.627 – MG (2017/0167688-6):

AGRAVO EM EXECUÇÃO PENAL – COLETA DE MATERIAL BIOLÓGICO PARA IDENTIFICAÇÃO DE PERFIL GENÉTICO – ART. 9º-A DA LEI DE EXECUÇÃO PENAL – CONSTITUCIONALIDADE RECONHECIDA PELO ÓRGÃO ESPECIAL – VINCULAÇÃO – VIOLAÇÃO A PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA E A NÃO AUTOINCRIMINAÇÃO – INOCORRÊNCIA. 1. No termos do art , 300 do Regimento Interno deste Eg. Tribunal, a decisão que acolhe ou rejeita Incidente de inconstitucionalidade, se proferida por maioria de dois terços, é de aplicação obrigatória em casos análogos. 2. A coleta de material biológico nos termos do art , 9º-A da Lei de Execução Penal não viola o Princípio da Presunção de Inocência ou o de não autoincriminação, porquanto já reconhecida a culpabilidade do agente, em decisão transitada em Julgado. Brasília (DF), 17 de julho de 2017. MINISTRA LAURITA VAZ Relatora.

O entendimento da presidente do Superior Tribunal de Justiça, Laurita Vaz, é pelo indeferimento da liminar requerida em favor de homem que argumentava ser inconstitucional a obrigatoriedade de fornecer material genético para registro em banco de dados do poder público.

No caso em tela, o fornecimento do material foi requerido pelo representante do Ministério Público após condenação por crime de homicídio qualificado, que foi indeferido pelo magistrado da Vara de Execuções Penais de Belo Horizonte, porém o Tribunal de Justiça de Minas Gerais reformou a decisão e determinou a coleta do DNA.

Ademais, o relator do Projeto de Lei que resultou na promulgação da referida Lei, Senador Demóstenes Torres, em seu parecer afirma que: “Não há vícios de constitucionalidade porquanto a matéria trata de ciência, cuja competência para proporcionar os meios de acesso pode ser da União, por iniciativa de qualquer membro do Congresso Nacional, tendo em vista o disposto nos artigos 23, V, e 48, ambos da Constituição Federal de 1988”.

 Indubitavelmente, a busca de segurança jurídica no âmbito jurídico é um dos objetivos mais buscados do processo. A verdade real, mesmo que no plano do idealismo, deve ser uma meta faticamente perseguida, principalmente na seara penal, tendo em vista o preciosismo dos bens jurídicos que são tutelados nesse campo.

O princípio da verdade real visa à veracidade dos fatos, não ficando estrito ao teor anexado aos autos, com objetivo de buscar a verdadeira realidade da demanda. O entendimento acerca da verdade é sua relatividade, até que se termine a persecução criminal e possamos extrair a realidade dos fatos ocorridos no crime.

No entendimento de Machado (2010, p. 42) o princípio da verdade real significa que:

O processo-crime deve buscar sempre a verdade substantiva dos fatos e não se satisfazer simplesmente com a verdade formal, ou com presunções de verdade, como acontece às vezes no processo civil em caso de ausência de contestação. É que os bens em jogo, no processo penal, são de enorme relevância para a sociedade e para os indivíduos.

Em síntese, a verdade é somente uma noção da realidade, tendo em vista que é relativa, pode ser o fato pra uns, não para outros. O magistrado deve atuar como participe no processo em busca de um bem maior. O valor de uma prova é inestimável, pois pode decidir a condenação ou absolvição do réu. A sociedade precisa de informações precisas quanto à identidade dos cidadãos que violam o pacto social. Por todo o exposto, resta evidenciada a necessidade de um banco de dados criminal.

As inovações decorrentes dessa lei são modernas, pois auxiliam na eficaz resolução de diversos problemas, com a extração e análise do material biológico, instituição de banco de dados, incomplexidade para a identificação de autores de crimes, redução na quantidade de erros judiciários, por conseguinte impulsionando a efetividade do Poder Judiciário.

Por todo o exposto, a identificação criminal é procedimento que individualiza as pessoas, evitando o erro judiciário, além de consistir em direito do Estado. Por ser díspar da aceitação de culpa não viola direitos de defesa, sendo, de fato, uma extensão desse direito e em nenhum momento pode ser vista como mecanismo de punição. Afinal, a ciência deve ser utilizada em prol do direito.

CONCLUSÃO

O objetivo do estudo foi discorrer sobre a Identificação Criminal Genética, através da Lei 12.654 publicada em 29 de maio de 2012, que modificou outras duas leis a Lei 12.037/2009 (Identificação Criminal) e a 7.210/1984 (Lei de Execução Penal), a qual instituiu a possibilidade da utilização da coleta de DNA de condenados por crimes violentos ou hediondos a fim de manter um banco de dados estatal com material genético, bem como a utilização de material genético para a descoberta da autoria delitiva no curso de investigações criminais. A Lei nº 12. 654/2012 é um grande avanço científico no processo penal, não deixando de ser contestável em alguns pontos, mas o que parece ser prejudicial ao réu, por vezes poderá ser instrumento de sua defesa. Logo, enquanto mera identificação, não vislumbra qualquer inconstitucionalidade do diploma legal em comento.

A finalidade da lei é o armazenamento temporário de dados durante o tempo necessário para se obter o esclarecimento do crime e identificação da autoria. Trata-se de uma técnica de investigação genética, que adveio de uma grande revolução e desenvolvimento na ciência, utilizada em vários países, tornando-se um meio eficaz no mundo jurídico. O uso da tecnologia avança em ritmo alvoroçado em todos os âmbitos da sociedade, e tem impulsionado às instituições Estatais a se adequarem a inovação tecnológica que foi considerada uma enorme evolução na sociedade.

O direito não pode deixar de utilizar as modernas técnicas de investigação criminal, principalmente a por meio do DNA do investigado, pois é utensílio que permite ao Estado fornecer à sociedade resposta mais célere e eficiente, pois é instrumento de grande valia para elucidação de crimes e identificação dos autores. Não é afronta aos princípios da legalidade, dignidade da pessoa humana, não autoincriminação e inviolabilidade da intimidade e da vida privada, ao passo em que não é direito relativizado pelos princípios da proporcionalidade e razoabilidade. A alteração legislativa contribui para a redução das possibilidades de erros do judiciário, evitando assim a punição de inocentes e implicando na resolução de crimes insolúveis, como nos crimes de autoria desconhecida.

Destarte que a Lei nº 12.654/2012 é constitucional e simboliza avanço expressivo para o processo penal brasileiro, posto que possibilita identificação mais precisa da autoria delituosa, não viola direitos e garantias individuais, comporta mais bônus que ônus, além disso é efetiva e eficaz.

 

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Notas
[1]Artigo orientado pelo Prof. Wellington Gomes Miranda Graduado em Direito pelo Centro Universitário de Desenvolvimento do Centro Oeste, Pós graduado em direito do trabalho pelo Instituo Processus-DF, Mestre em Prestação Jurisdicional e Direitos Humanos pela UFT, professor na Universidade Católica do Tocantins, Analista Ministerial em Ciências Jurídicas na Procuradoria Geral de Justiça do Estado do Tocantins;

Informações Sobre o Autor

Maria Bethania Teodoro Rodrigues

Acadêmica do Curso de Direito da Faculdade Católica do Tocantins FACTO


Equipe Âmbito Jurídico

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