Estarrecidos, os órgãos de defesa do consumidor, na data de 13/10/04 se depararam com a publicação no Diário Oficial da União da Lei n. 10.964/04, que permite aos empresários, o direito de afixarem o preço dos produtos nas gôndolas, contendo código de barras naqueles, não necessitando mais de individualização de preços em cada produto exposto. O representante da Associação Brasileira dos Supermercados-ABRAS disse em rede nacional que, com a aposentadoria da máquina de precificar, os preços dos produtos seriam reduzidos. Oh! Descobrimos o grande vilão do aumento de preços: a máquina de precificar.
Petrificados com tamanha insensatez, ignóbil descaso aos consumidores, nos reportamos ao ano de 2002 quando aconteceu em Goiânia-GO o encontro dos Procon’s nacionais. Oportunidade em que o representante da ABRAS tentou persuadir os presentes a endossarem a falceta, o que foi veementemente rechaçado por todos.
Hoje, 02 anos depois, constatamos que o lobby venceu o trabalho, a luta, o comprometimento, a fé por um país melhor, por um povo mais protegido, por mais dignidade. A autorização da retirada do preço dos produtos expostos ao público consumidor por afixação de código de barras, golpeou, feriu um número incalculável de consumidores. Representa um enfraquecimento nas bases de proteção ao consumidor, e nos faz pensar: Que País é esse? (plagiando Cazuza). Decerto é o país do esperto, de respeitar quem trapaceou melhor, quem deu o golpe perfeito, onde o ladrão de galinhas é vagabundo e o ladrão de milhões é excelência. É onde interesses de determinados grupos sobrepõe o trabalho sério, honesto.
Então, nos vem à mente a imagem de um idoso retirando determinado produto da gôndola e este dá diferença no terminal (caixa). Quando reclamada, a pessoa que foi verificar o preço diz que ele se enganou e que retirou outro produto. O idoso ficará constrangido, todos da fila o olharão, e ele, se sentindo senil levará o produto. E um consumidor de baixo poder aquisitivo que irá com o dinheiro contado, como fará na mesma situação? Certamente deixará o produto causando transtornos na fila.
No mundo moderno em que vivemos, é lamentável vivenciar a legalização do inconcebível.
A legislação Federal – Lei n. 8078/90 (Código de Defesa do Consumidor), ao disciplinar as relações de consumo, dispôs expressamente em seu art. 6º que dentre os direitos básicos do consumidor estão a “ a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade e preço, bem como os riscos que apresentem..” (g.n.). Também em seu art. 31 preconiza que “A oferta e a apresentação de produtos ou serviços devem assegurar informações corretas, claras precisas, ostensivas e em língua portuguesa sobre suas características, qualidade, quantidade, composição, preço, garantia…” (g.n.).
Avanços tecnológicos devem trazer benefícios a todos os interessados, ou pelo menos, à maioria deles. E, quando empregados nas relações de consumo, os benefícios e vantagens devem ser para ambas as partes, até para que, mantido seja o equilíbrio nas relações de consumo. Não há dúvidas de que, a identificação dos preços dos produtos pelo sistema do código de barras, traz facilidades correlatas ao controle de estoque e circulação das mercadorias, não só para os estabelecimentos industriais e comerciais, mas também para os órgãos de fiscalização. Mas sob o aspecto prático, tal sistema, por si só, não tem sido adequado o suficiente para cumprir o dever de informar o consumidor nos moldes preconizados pelo Código de Defesa do Consumidor, pois, proporcionalmente, causará muito mais prejuízo aos consumidores que ao estabelecimento. Há falhas detectadas no uso de tal mecanismo comprovado pela fiscalização dos Procon’s de todo o Brasil, pois há divergência de preços expostos na gôndola e o preço no código de barras quando passado no terminal.
No atual sistema empregado pelas grandes redes de supermercados já há uma certa dificuldade, quando da escolha de determinado produto, em identificar o respectivo preço, afixado nas placas, junto às gôndolas. Muitas vezes o preço afixado nas placas, não está devidamente embaixo do produto, não mostrando uma imediata correspondência. A descrição do produto, feita de forma abreviada, também é causa de transtornos, principalmente quando há similares próximos ou algum dos produtos esteja fora do lugar. A Lei 10.962/04 dá aos supermercados a opção de impor ao consumidor o ônus em dirigir-se até um leitor ótico para verificar o preço do produto. É sabido não existirem aparelhos de leitura ótica em número suficiente e em lugares acessíveis ao uso concomitante de vários consumidores.
Os prejuízos havidos aos consumidores são evidentes. E qual seria o real prejuízo a ser suportado pelos estabelecimentos na adoção de tal procedimento?
Professor de Direito da UNIP e FASAM
Advogada do Procon/GO.
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