A Lei 8112/90 e a garantia constitucional do devido processo legal

Sumário: 1. Introdução; 2. O Devido Processo Legal no Direito Administrativo. 3. O Processo Administrativo. 4. Comentários a Lei nº 8112/90. 5. O artigo 145 da Lei nº 8112/90. 6. Comentários sobre o artigo 145 da Lei nº 8112/90. 7. Jurisprudência. 8. Conclusão. Bibliografia.


1. Introdução


Esse artigo traz em seu bojo o questionamento sobre o conteúdo do artigo 145 da Lei 8112/90 e a Garantia do Devido Processo Legal, previsto em nossa Constituição Federal de 1988 em seu artigo art.5º, inciso LV.


Pretendemos nesse estudo, analisar se a legislação infraconstitucional muitas vezes dificulta o exercício da ampla defesa em face do Direito Administrativo e para isso trazemos um tópico sobre o Devido Processo Legal no Direito Administrativo, como é feito um Processo Administrativo, apresentamos a Lei nº 8112/90, comentamos o artigo 145 da referida Lei, e, para podermos fechar o questionamento de nosso trabalho apresentamos a divergência entre o artigo 145 da Lei nº 8112/90 e a Constituição Federal de 1988, demonstrando nosso embasamento através de jurisprudência e doutrina para ao final, podermos expor nossas conclusões.


2. O Devido Processo Legal no Direito Administrativo


O devido processo legal tem sua origem remota na Inglaterra do século XIII e expansão incontestável pelas legislações ocidentais.


A constituição de 1988 inovou ao trazer, de forma explícita, através do artigo 5º, LIV: “ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”.


Esta disposição constitucional foi inspirada na cláusula do due process of law do Direito Inglês e Norte-Americano.


A cláusula do due process of law tem importância fundamental neste país, como em todos que possuem o sistema jurídico baseado na common law, porque a fonte primária desse sistema reside na jurisprudência e a concepção jurídica de “Direito” está intrinsecamente ligada à idéia de “processo”.


Nada mais natural num regime em que as regras processuais antecedem e contém o direito material que haja uma intensa preocupação com o devido processo como forma de garantir a existência do próprio sistema.


Observa Leyla Viga Yurtsever:


“Ao estipular a ampla defesa através desse artigo na Constituição de 1988, deve-se propiciar os meios para fazê-la. É preciso que o acusado tenha acesso a todas as informações daquilo que, precisamente pese sobre ele. Já o contraditório reside da possibilidade de diálogo entre as partes, ou seja, é preciso alternância das manifestações das partes interessadas.


Não basta que a Administração Pública, por sua iniciativa e por seus meios, colha os argumentos ou provas que lhe pareçam significativos. É essencial que ao acusado seja dada a possibilidade de produzir suas próprias razões e provas, dando-lhe a possibilidade de examinar e contestar os argumentos, fundamentos e elementos probantes que lhe sejam favoráveis”.[1]


A jurista Ada Pellegrini Grinover desenvolveu seu estudo sobre o devido processo legal com um enfoque de natureza constitucional, colocando o due process of law como uma das garantias essenciais do indivíduo, postas para assegurar-lhe a justiça que a Constituição lhe promete. Num primeiro momento ela citou:


“a tutela constitucional do processo ou a constitucionalização do direito cívico de ação não bastam para configurar o ‘devido processo legal’ tendo em vista que o objeto da garantia constitucional deve ser a possibilidade concreta e efetiva de obter a tutela, e não a simples reafirmação do direito à sentença”.[2]


Posteriormente, num segundo momento, em trabalho conjunto com Antonio Carlos de Araújo Cintra e Cândido Rangel Dinamarco, Grinover define:


“o devido processo legal como uma fórmula do conjunto de garantias constitucionais que, de um lado, asseguram às partes o exercício de suas faculdades e poderes processuais e, de outro, são indispensáveis ao correto exercício da jurisdição”[3]. [3]


Nessa linha de raciocínio, definem em sua obra, que o devido processo legal moderno abarca:


“o direito a um “procedimento adequado: não só deve o procedimento ser conduzido sob o pálio do contraditório (…), como também há de ser aderente à realidade social e consentâneo com a relação de direito material controvertida”.[4]


 Ressaltamos a óbvia primazia da Constituição Federal, nossa Lei Maior, em todos os comentários e observações de nossos juristas e mais, a indignação de todos quando a mesma não é respeitada. Como observa o jurista Celso Antonio Bandeira de Mello:


a Lei Maior exige um processo formal regular para que sejam atingidas a liberdade e a propriedade de quem quer seja e a necessidade de que a Administração Pública, antes de tomar as decisões gravosas a um dado sujeito, ofereça-lhe a possibilidade de contraditório e ampla defesa, no que se inclui o direito a recorrer das decisões tomadas”.[5]


Como demonstrado pelas opiniões acima, o devido processo legal pode ser explorado em várias vertentes, podendo ser compreendido como exteriorização do princípio da isonomia até a sua expressão máxima, como um dos instrumentos do Estado Democrático de Direito.


3. Processo Administrativo


Para a instauração de um Processo Administrativo, a Administração Pública, tem as suas atividades, discricionárias ou vinculadas, subordinadas a nossa Lei Maior, no Capítulo VII. (CF/88).


 Observa Leyla Viga Yurtsever:


“O processo administrativo disciplinar consiste no conjunto ordenado de atos coordenados para a obtenção de decisão sobre uma controvérsia no âmbito da administração pública cometida por servidor. O processo administrativo disciplinar deve garantir a ampla defesa e o contraditório, pois irá impor sanção a funcionário ou administrado, que dirá respeito a determinado fato. A administração pública pode impor modelos de comportamento a seus agentes, com o fim de manter a regularidade, em sua estrutura interna, na execução e prestação dos serviços públicos.


A Administração Pública ao exercer controle de suas atividades ou servidores se utiliza de instrumentos visando confirmá-las ou desfazê-las.


Dentre estes instrumentos têm-se o processo administrativo disciplinar e a sindicância no âmbito federal, disciplinados nos artigos 143 a 182 da Lei 8.112/90.


A sindicância é uma fase preliminar à instauração do processo administrativo. Sua instauração pode dar-se sem indiciado, objetivamente, para se verificar a existência de irregularidades. Apurada a veracidade dos fatos, deve a sindicância apontar seus prováveis autores ou responsáveis. Nessa fase preliminar, não há necessariamente defesa, porque não conclui por uma decisão contra ou em favor de pessoas, mas pela instauração do processo administrativo ou pelo arquivamento da sindicância.”[6]


Seguindo essa linha de raciocínio, o processo administrativo disciplinar é o instrumento legalmente previsto para o exercício controlado deste poder outorgado a Administração Pública, podendo, ao final, redundar em sanção administrativa, que funciona para prevenir ostensivamente a ocorrência do ilícito e, acaso configurada, para reprimir a conduta irregular do administrado. Sempre respeitando como em todo processo os direitos dos acusados.


Como salienta Hely Lopes Meirelles:


“Por todo o processo se estende a garantia constitucional a todo e qualquer procedimento acusatório – judicial ou administrativo – e se consubstancia no DEVIDO PROCESSO LEGAL, de prática universal nos Estados de Direito. É a moderna tendência da jurisdicionalização do poder disciplinar, que impõe condutas formais e obrigatórias para garantia dos acusados contra arbítrios da Administração, assegurando-lhes não só a oportunidade de defesa como a observância do rito legalmente estabelecido para o processo”.[7]


4. Comentários a Lei nº 8112/90


A Lei 8112/90 se aplica somente aos servidores públicos estatutários federais (os funcionários públicos federais), ou seja, são os servidores públicos que prestam seus serviços para União, autarquias e fundações federais e que são regidos pelo regime estatutário.


Essa Lei teve a pretensão de constituir um regime jurídico único para todos os servidores públicos federais, só que desde sua criação, inúmeras emendas constitucionais, alterações legislativas e interpretações jurisprudenciais as mais variadas tornaram árdua a tarefa de comentar e até de aplicar a legislação.


Essas normas, sempre suscitaram debates calorosos entre os doutrinadores, as autoridades, os poderes constituídos e os próprios interessados – os servidores públicos.


Como ensina Ivan Barbosa Rigolin:


“As razões de tamanha polêmica são as mais variadas, a iniciar pela questão da unicidade de legislação acerca do regime jurídico dos servidores, que foi introduzida pela Constituição em 1988, mas nunca obteve entendimento unânime ou pacífico em nosso país.


O fato é que as normas integrantes do regime jurídico único afetam direitos e garantias previstos na Constituição em capitulo exclusivamente destinado aos servidores públicos, o que sempre desperta uma imediata “corrida” por direitos e pela definição de situações individuais que se perpetua no tempo, graças a ações que parecem nunca terminar, de modo que o problema permanece sempre vivo. Soma-se a isso o fato de não raro o governo promover reformas administrativas que atingem equivocadamente tais direitos, visando tão só reduzir déficits orçamentários”.[8]


5. O artigo 145 da Lei nº 8112/90


“Art. 145. Da sindicância poderá resultar:


I – arquivamento do processo;


II – aplicação de penalidade de advertência ou suspensão de até 30 (trinta) dias;


III – instauração de processo disciplinar.


Parágrafo único. O prazo para conclusão da sindicância não excederá 30 (trinta) dias, podendo ser prorrogado por igual período, a critério da autoridade superior”.[9]


6. Comentários ao artigo 145 da Lei 8112/90


Comenta a Lei Ivan Barbosa Rigolin:


“Da sindicância poderá resultar o arquivamento do processo de sindicância – só pode ser esse o efeito pretendido pelo legislador. É de má técnica misturar conceitos como sindicância e processo, tratando a lei de “processo” ora como um sentido, ora como outro.No caso do inciso I desse artigo, do procedimento de sindicância poderá, como primeiro resultado, ocorrer seu arquivamento, evidentemente por falta de indicio suficiente para instauração do processo disciplinar que poderia ser cabível. Só assim faz sentido o inciso.O inciso II, de outra parte, só pode ser tido como outra infeliz brincadeira do legislador federal. Há oportunidades em que a inconseqüência do autor dessa Lei faria envergonhar alunos de primeiro ano do curso de Direito.No momento em que alguma sindicância for suficiente para aplicar penalidade a alguém, ter-se-á nesse mesmo átimo, revogado a garantia constitucional Penal, os princípios de processo e as mais comezinhas garantias, ao cidadão e ao servidor, do devido processo legal”.[10]


Sindicância jamais condena alguém à coisa alguma. Trata-se de um procedimento facultativo, inquisitório, prévio a qualquer procedimento para pretensão punitiva, que por tudo isso nunca pode ensejar penalização a quem quer que seja.


Segundo Maria Sylvia Zanella Di Pietro, citando José Cretella Júnior, sindicância significa em português, à letra:


“a operação cuja finalidade é trazer à tona, fazer ver, relar ou mostrar algo, que se acha oculto”.[11]


Ninguém pode ser condenado num inquérito policial, como ninguém pode ser condenado numa sindicância administrativa, nem mesmo a pena de advertência, muito menos a de suspensão.


Ressalva Ivan Barbosa Rigolin:


É seguro e pacífico que tantas penalidades quantas a União aplicar em função do inciso II desse artigo 145 serão revogadas, com execração para a desavisada autoridade que as aplicar, em mandado de segurança. Se pode ser escusada alguma ignorância por parte de autoridades administrativas, é absolutamente inaceitável a crassa ignorância jurídica demonstrada pelo legislador ao editar este grotesco e aberrante inciso.Mais um momento desastroso dessa Lei. O inciso seguinte, III, fixa que da sindicância pode resultar a instauração de processo disciplinar, e isso somente ocorrerá quando daquele procedimento prévio e inquisitorial ressaltarem indícios de efetiva culpabilidade do agente ali acusado, suficientes para ensejar sua regular apuração num amplo e contraditório processo administrativo disciplinar.Não pode ultrapassar trinta dias a realização de qualquer sindicância, salvo se autorizada prorrogação por outros trinta pela autoridade superior à sindicante. A razão de ser dessa limitação é coibir a evidente angústia que qualquer sindicância provoca, enquanto realizada no ambiente respectivo de trabalho. A prorrogação somente será deferida, por evidente, se demonstrada cabalmente sua necessidade, não podendo jamais abusar, o sindicante, desse pedido”.[12]


Nesse processo, se formado, inverter-se-á o ônus da prova, passando ele para a Administração, que deverá provar a culpa do acusado, e não este a sua inocência, como na sindicância.


Importante ressaltar que a autoridade instaura o processo com base em dois requisitos: fato determinado e autoria conhecida. Portanto o processo administrativo disciplinar não deve ser substituto da sindicância; não deve ser instaurado com o objetivo de promover investigações.


O processo deve nascer com todos os elementos já identificados.


7. Jurisprudência


APELAÇÃO CÍVEL – PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR – SINDICÂNCIA – INQUÉRITO ADMINISTRATIVO – PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DA AMPLA DEFESA E DO CONTRADITÓRIO – INOBSERVÂNCIA – APLICAÇÃO DE PENA – NULIDADE – FALTA DISCIPLINAR – APURAÇÃO – OBSERVÂNCIA DAS NORMAS LEGAIS – IMPRESCINDIBILIDADE – Com o advento da Constituição Federal de 1988, os princípios do contraditório e da ampla defesa devem ser observados, também, no processo administrativo-disciplinar, e não apenas nos processos judiciais. – Na apuração de falta disciplinar, é imprescindível que sejam observadas as normas legais para caracterizar a legalidade da punição aplicada. – A sindicância é um verdadeiro inquérito administrativo que precede o processo administrativo-disciplinar. Entretanto, é comum a sua utilização para apurar pequenas faltas dos servidores, o que não afasta a aplicação dos princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório, sob pena de nulidade da punição imposta. (TJMG, Apelação Cível nº 248.267-7/00, Rel. Des. Alvim Soares, DOE 05.10.2002)


MANDADO DE SEGURANÇA – ATO DEMISSIONÁRIO – PORTARIA DE INSTAURAÇÃO DO PROCESSO DISCIPLINAR QUE NÃO TRAZ DESCRIÇÃO DOS FATOS – ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO PARA OS ATOS DO PROCESSO – NULIDADE PROCESSUAL CARACTERIZADA – OFENSA AOS PRINCÍPIOS DO CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA INDEPENDÊNCIA DAS INSTÂNCIAS PENAL E ADMINISTRATIVA – ORDEM PARCIALMENTE CONCEDIDA. MAIORIA. Embora admita-se que a peça de instauração de processo administrativo contra servidor possa ser genérica em relação a fatos que ainda serão objeto de apuração, é indispensável que elementos mínimos relativos aos fatos a ele imputado sejam descritos, a fim de propiciar a sua defesa, mínima que seja nessa fase. Instaurado o procedimento administrativo, deve o servidor ser intimado para a prática de todos os atos do processo, principalmente a oitiva de testemunhas, não tendo a posterior comunicação ao servidor o condão de tornar válido o ato praticado à sorrelfa pela autoridade impetrante, o que nulifica de forma absoluta o ato assim praticado. Pena imposta pelo Sr. Governador com fulcro em conclusões havidas em processo de tal jaez, é absolutamente nula, devendo o servidor ser reintegrado no cargo, com todos direitos e vantagens a partir da data de prática do ato. Impossível o sobrestamento do feito administrativo até que se decida o processo criminal, pois as instâncias penal e administrativa são independentes e a punição disciplinar aplicada à esta não se sujeita ao julgamento do processo criminal respectivo. Ordem parcialmente concedida. Maioria. (TJDFT, MSG 20010020059014, Conselho Especial, Rel. Des. P. A. Rosa de Farias, DJU 08.01.2003, p. 2.)


RECURSO ORDINÁRIO EM MS N° 10.264 – PE (1998/0075668-0)


RMS – ADMINISTRATIVO – POLICIAL CIVIL DO ESTADO DE PERNAMBUCO – SINDICÂNCIA E PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR – PORTARIA – IRREGULARIDADES – PENA DE DEMISSÃO – ANULAÇÃO – CERCEAMENTO DE DEFESA – OFENSA AOS PRINCÍPIOS DOCONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA – CARACTERIZAÇÃO. I – A sindicância segue um rito peculiar, cujo escopo é a investigação das pretensas irregularidades funcionais cometidas, sendo desnecessária a observância de alguns princípios basilares e específicos do processo administrativo disciplinar. Afinal, procedimento não se confunde com processo. Precedentes: RMS’s 281-SP e 8.990-RS. II – Instaurado o processo administrativo, mediante a publicação de portaria elucidativa quanto aos fatos sobre os quais o servidor estava sendo indiciado, inclusive fornecendo a capitulação legal na qual o mesmo se encontrava denunciado, descabida se toma a tese de irregularidade no ato de instauração, sob o argumento de que a aludida portaria não especificou o inciso do dispositivo legal. III – Conforme dispõe a uníssona jurisprudência deste Tribunal, o indiciado se defende dos fatos que lhe são imputados e não da capitulação legal na qual restou incursionado. Precedentes: MS’s 7.351 e 7.069. IV – A Constituição da República (art. 5o, LIV e LV) consagrou os princípios do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, também, no âmbito administrativo. A interpretação do princípio da ampla defesa visa a propiciar ao servidor oportunidade de produzir conjunto probatório servível para a defesa. No caso dos autos, a defensora dativa constituída no processo administrativo disciplinar tinha impedimento de atuar contra o Poder Público, ficando, assim, mitigado o aludido princípio constitucional. V – Recurso conhecido e parcialmente provido.


RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA: RMS 281 SP 1990/0001435-2


DIREITO ADMINISTRATIVO. APLICAÇÃO DE PENA DISCIPLINAR EM PROCESSO ADMINISTRATIVO REGULAR. IRREGULARIDADES APONTADAS NA SINDICANCIA SEM OFENSA AO PRINCIPIO DA AMPLA DEFESA. O PROCESSO DA SINDICANCIA NÃO TEM FORMA E NEM FIGURA DE JUIZO, NÃO OBEDECE A PROCEDIMENTO ESPECIFICO, NEM AO PRINCIPIO DO CONTRADITORIO AO INDICIADO NÃO CABE ALEGAR DEFEITOS OU IRREGULARIDADES NA SINDICANCIA (OU VICIOS DE INTIMAÇÃO), PORQUANTO A SUA DEFESA SERA SEMPRE FEITA, DE FORMA EXAUSTIVA E EFICIENTE, NA FASE DO INQUERITO ADMINISTRATIVO, COMO OCORREU, NA HIPOTESE. OS DEFEITOS DE INTIMAÇÃO, NA FASE DA SINDICANCIA, NÃO SE PODEM REFLETIR PARA EFEITO DE ANULAÇÃO DE PUNIÇÃO IRROGADA, AO SINDICADO, COM BASE EM PROCESSO ADMINISTRATIVO REGULAR, MEDIANTE O ASSEGURAMENTO DA MAIS AMPLA DEFESA. O DEVER DO FUNCIONARIO DE COMUNICAR IRREGULARIDADES, PORVENTURA EXISTENTES, NO SERVIÇO PUBLICO DE QUE E AGENTE, NÃO EXCLUI AQUELE PERTINENTE AO RESPEITO, A DIGNIDADE, A HONRA E AO DECORO DEVIDOS, PELO SERVIDOR, AOS SUPERIORES HIERARQUICOS. NÃO SE ANULA PENA DE ADVERTENCIA, QUANDO APLICADA COM BASE EM LEI E PROCEDIMENTO ADEQUADO. RECURSO A QUE SE NEGA PROVIMENTO. DECISÃO POR MAIORIA DE VOTOS.


8. Conclusão:


Em âmbito de ordenamento jurídico brasileiro verificou-se que não existe ainda uma concepção definitiva de devido processo legal e que a aplicação deste tem como principais objetivos a atuação da Administração Pública de acordo com padrões de comportamento notoriamente conhecidos, aplicados com imparcialidade através dos procedimentos.


 Muitos dos conflitos entre particulares e Administração emergem do direito a ser tratado condignamente e um processo só terá atingido suas finalidades substanciais tanto quanto tenha sido conduzido da forma mais acurada possível.


Após termos conhecimento das diversas jurisprudências aqui apresentadas, verificamos que a administração pública não tem embasamento para continuar aplicando penalidade, em fase de apuração de falta cometida pelo administrado (SINDICÂNCIA), ou seja, utilizando o inciso II do artigo 145 da lei 8112/90 de forma isolada, não respeitando o conteúdo constitucional quanto ao devido processo legal.


Assim, pelo nosso estudo aqui apresentado, verificamos que trata-se de um inciso em que o legislador não atentou para a questão da penalidade onde não há o respeito à defesa prévia e deveria haver.


Não está havendo “igualdade de armas” para os administrados, pois, a ciência dos comportamentos permite aos administrados conhecer quais são as expectativas do Poder Público em face de si e limita a atuação dos agentes, que têm suas alternativas circunscritas a princípios preestabelecidos, que a nosso ver, não estão sendo respeitados.


Um questionamento nos remete a pensar que, talvez, pela questão da celeridade dos atos públicos, quis o legislador não demandar um extenso processo administrativo nas questões de menor relevância, onde nos remeteria também a adentrar ao campo da subjetividade em definir o que é relevante ou não.


Não podemos deixar de mencionar que sendo relevante ou não, o fato é que o já mencionado inciso II do artigo 145 da lei 8112/90 tem causado discussões doutrinárias constantes e as decisões tem se socorrido na Constituição Federal consagrando o devido processo legal.


Em nosso entendimento não é viável que a autoridade administrativa inaugure a ordem jurídica através de determinação de regras que restrinjam o universo de direitos constitucionais assegurados aos administrados. Nem tampouco é viável a edição de regulamento que pretenda suprimir direitos processuais assegurados em lei.Também busca o devido processo legal a segurança nas relações com o Poder Público, pois, o particular tem o direito à salvaguarda da segurança de seus direitos em face da Administração, devendo garantir a segurança como direito autônomo e minimizar o risco de atuações administrativas viciadas e, sobretudo, de suma importância assegurar ao administrado a dignidade, que faz parte dos pilares que sustentam nosso país, como brada nossa Constituição Federal de 1988.




Bibliografia

GRINOVER, Ada Pellegrini. Teoria Geral do Processo, 19ª Edição; São Paulo, Malheiros, 2001.

CINTRA, GRINOVER e DINAMARCO, Teoria Geral do Processo, 19ª Edição; São Paulo, Malheiros Editores, 2005.

BANDEIRA DE MELLO, Celso Antonio. Curso de Direito Administrativo, 15ª Edição; São Paulo, Malheiros, 2002.

BANDEIRA DE MELLO, Celso Antonio (coord.). Procedimento Administrativo in Direito Administrativo na Constituição de 1988, 1ª Edição, São Paulo, Malheiros, 1989.

MEIRELLES, Hely Lopes, Direito Administrativo Brasileiro, 30ª Edição, São Paulo, Malheiros, 2005.

RIGOLIN, Ivan Barbosa, Comentários ao Regime Único dos Servidores Públicos Civis, 5ª Edição, São Paulo, Saraiva, 2007.

DI PIETRO, Maria Zanella – Direito Administrativo, 22ª Edição São Paulo, Editora Atlas, 2009.

Sítios



Publicações Consultadas

Revista Prática Jurídica – Ano VII – nº 85 – abril/2009.

YURTSEVER, Leyla Viga – Processos e Procedimentos – Revista Prática Jurídica – Ano VII – nº 85 – abril/2009.


Notas:

[1] YURTSEVER, Leyla Viga – Processos e Procedimentos – Revista Prática Jurídica – Ano VII – nº 85 – pág. 47 e 48 – abril/2009.

[2] GRINOVER, Ada Pellegrini – Teoria Geral do Processo, 19ª Edição – pág. 12.

[3] CINTRA, GRINOVER e DINAMARCO, Teoria Geral do Processo, 19ª Edição pág. 82.

[4] CINTRA, GRINOVER e DINAMARCO, Teoria Geral do Processo, 19ª Edição pág. 82.

[5] BANDEIRA DE MELLO, Celso Antonio (coord.), Procedimento Administrativo in Direito Administrativo na Constituição de 1988, pág. 32.

[6] YURTSEVER, Leyla Viga – Processos e Procedimentos – Revista Prática Jurídica – Ano VII – nº 85 – pág. 46 – abril/2009.

[7] MEIRELLES, Hely Lopes – Direito Administrativo Brasileiro – 30ª edição – 2005 – Malheiros Editores – pág. 676

[8] RIGOLIN, Ivan Barbosa – Comentários ao Regime Único dos Servidores Públicos Civis – 5ª edição –2007 – Saraivajur – contracapa.

[9] http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8112cons.htm

[10] RIGOLIN, Ivan Barbosa – Comentários ao Regime Único dos Servidores Públicos Civis, págs: 299 e 300.

[11] DI PIETRO, Maria Zanella – Direito Administrativo – 22ª Edição – pág.636.

[12] RIGOLIN, Ivan Barbosa – Comentários ao Regime Único dos Servidores Públicos Civis, págs: 299 e 300.

Informações Sobre os Autores

Maria Jose Coppola

Acadêmica de de Direito da Universidade Do Vale Do Paraíba – UNIVAP – São José dos Campos – SP

Edson Tadeu de Andrade

Acadêmico de Direito da Universidade Do Vale Do Paraíba – UNIVAP – São José dos Campos – SP

Felipe Luca de Mello

Acadêmico de Direito da Universidade Do Vale Do Paraíba – UNIVAP – São José dos Campos – SP


Equipe Âmbito Jurídico

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