O pleno exercício da empresa desde muito tempo deixou de ser apenas um meio de auferir lucros, de enriquecer o empresário ou comerciante. Efetivamente o exercício de atividades profissionais utilizando-se dos instrumentos para o alcance dos objetivos empresariais – capital, mão de obra, tecnologia, insumos – é permeado por princípios ligados à função social da atividade mercantil.
De fato, pois breve análise do sistema legal para a atividade empresarial já evidencia o necessário cumprimento a inúmeras regras legais criadas para garantir e efetivar proteção aos trabalhadores, resguardo do meio ambiente, financiamento da atividade estatal – leia-se tributação. Trata-se da nova realidade social, fundada em um dos seus pilares pelo exercício empresarial como meio de prestação de serviços, produção de bens e suas comercializações, atuando as empresas como figuras essenciais para o corpo social, ganhando importância para o efetivo alcance das necessidades dos cidadãos. Exemplo latente são os serviços de telefonia, prestados no Brasil por empresas. Ninguém afirmaria a possibilidade de organização social atual sem serviços de telecomunicações.
Nessa linha, a própria Constituição Federal Brasileira de 1988 marcou como um dos seus princípios de ordem econômica a atividade empresarial. Mas como garantir efetivamente e fomentar as atividades empresariais tão importantes à sociedade? Creio que a resposta passa necessariamente pela proteção à figura do empreendedor, de modo a limitar sua responsabilização em casos de insucesso. Disso já surge forte impasse, pois então teremos credores de empresários mal-sucedidos perante situação de inadimplência nos casos de quebra de empresas? Sim, possivelmente. E nada de errado existe nisso. Em verdade, é salutar que assim ocorra, pois ninguém em sã consciência colocaria todo o seu patrimônio, fonte de sustento familiar, para o exercício de atividades empreendedoras com alto risco. É preciso ponderação entre os extremos, para se chegar num ponto de proteção ao empreendedor, mas também para evitar prejuízos infundados aos seus credores em casos de bancarrota comercial.
Exatamente nessa linha andaram legisladores de todo o mundo, inicialmente na Alemanha, ainda no século XIX, e posteriormente inclusive no Brasil, já no século XX, lá pelos idos de 1919. Falo da criação da sociedade de responsabilidade limitada, na qual os sócios alocam determinado capital à sociedade, sendo este, após devidamente integralizado, isto é, pago à sociedade, que responderá por eventuais débitos empresariais. É a famosa LTDA, altamente utilizada em nossos dias.
Mas essa figura não basta, explico. Por vezes a empresa será exercida somente por um empreendedor, sem qualquer sócio, o que seria fundamental para termos uma sociedade, ou seja, é preciso mais de um empreendedor para a criação de uma sociedade LTDA. Sozinho o que o empreendedor poderia fazer é se registrar nos órgãos competentes como Empresário Individual, mas vejam, sem qualquer proteção patrimonial, colocando todo o seu patrimônio a responder por eventual insucesso nos negócios. Essa realidade forçou a criação de inúmeras sociedades fictícias, com a inclusão pelo empreendedor de parentes ou interpostas pessoas, vulgo “laranjas”, para permitir a criação de sociedades limitadas, unicamente com a finalidade de proteção patrimonial. Evidente que era necessário criar a responsabilização limitada também para os casos de exercício empresarial de forma individual, para efetivar o princípio da atividade empresarial, fortalecendo-o principalmente em favor dos pequenos empresários, os quais empreendem de forma individual por muitas vezes.
Aliás, não pensem que essa discussão é recente, pois não é. Já no início do século XX o assunto da limitação da responsabilidade do empresário individual está em cartaz, em vários países do mundo, incluindo o continente Europeu e a América. No entanto em raros casos a questão chegou a ser efetivada legislativamente, não passando das discussões acadêmicas e inúmeras teses doutrinárias na grande maioria dos países. Na América do Sul, por exemplo, se tem relatos de discussões sobre o assunto desde a década de 1920, na Argentina, no Brasil e também no Equador. Inclusive em vários projetos legislativos a figura chegou a ser planejada e discutida, não ganhando corpo legal efetivamente até o mês de Julho de 2011, quando o sistema legislativo brasileiro finalmente adotou a figura da EIRELI – Empresa Individual de Responsabilidade Limitada, através da Lei Federal nº 12.441.
Trata-se de salutar medida legislativa, criando em nosso sistema a figura da empresa individual com responsabilização limitada do sujeito empreendedor, permitindo maior proteção aos negócios tocados de forma solo, inclusive contribuindo com a regra constitucional de proteção às micro e pequenas empresas, conforme artigo 170, IX, da CF, porque exatamente estas que normalmente possuem organizações empresariais mais singelas, muitas vezes com apenas uma pessoa empreendedora a aplicar os demais fatores de empresa.
Inobstante, como não poderia deixar de ser, a criação da nova figura já veio arraigada de discussões doutrinárias, como, por exemplo: Trata-se de nova espécie de pessoa jurídica ou estamos diante de sociedade unipessoal? Ou ainda de nova figura jurídica sem precedentes? Deixemos esta longa discussão em aberto, para estudos mais aprofundados, conforme o tema exige.
Por ora é necessário comemorar essa importante criação legislativa, que irá contribuir imensamente para as atividades comerciais dos empreendedores individuais.
Advogado corporativo, Especialista em direito tributário pelo instituto brasileiro de estudos tributários, Estudante regular do doutorado em direito da universidad de buenos aires – UBA, Professor de direito empresarial na Faculdade Anhanguera de Pelotas/RS
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