Nos dias atuais, o que mais vemos é o Governo Federal pressionando a sociedade, na busca de receitas, dentre as quais a principal fonte é a tributária.
O número de demandas judiciais tem aumentado vertiginosamente, influenciado por múltiplos fatores, inclusive pela própria feição da Constituição Federal e dos novos direitos consagrados na busca da cidadania plena. Isso conduziu a uma denominada crise de jurisdição, cuja face mais saliente se manifesta na demora do trâmite dos processos.
Este fator acaba por gerar um ciclo vicioso, pois a Fazenda, que é a faceta patrimonial do Estado, depende da celeridade processual para obter receitas. Quando mais carente de recursos o Estado, menos eficazes são suas políticas, e, por conseguinte há menos desenvolvimento econômico e humano, o que redunda em mais demandas sociais e em mais demandas judiciais que lhe são correlatas.
Neste contexto de morosidade da prestação jurisdicional, insere-se o instituto da prescrição intercorrente, fato mais comum do que seria o desejável nos executivos fiscais.
Também é fato notório que boa parte dos executivos fiscais acaba por não encontrar uma solução satisfatória em vista da inexistência de bens passíveis de ensejar a realização da responsabilidade patrimonial. É significativa a quantidade de casos onde a execução inicialmente dirigida contra a pessoa jurídica acaba por desembocar na responsabilização dos sócios.
A temática desta abordagem trata exatamente de um dos aspectos deste processo, e a questão que se coloca é saber como se comporta o instituto da prescrição intercorrente diante da responsabilização dos sócios na medida em que esta responsabilidade é superveniente e pode haver uma nova citação.
Há que se perpassar, porém, por premissas como saber se a citação da pessoa jurídica interrompe a prescrição para o responsabilizado, pessoa física, ou ainda, analisar a questão da necessidade de contraditório prévio a esta responsabilização, inclusive com reabertura da instância administrativa.
Prescrição.
A prescrição é um instituto universal dentro do Direito, já que presente em várias de suas ramificações. Apesar de sua magnitude, a lei não definiu o que é a prescrição, papel que coube à doutrina e que gerou infindáveis controvérsias.
Hoje, à luz da disciplina do novo Código Civil, a definição se faz em vista da pretensão de direito material a ser exercida, seja ela condenatória, executiva ou mandamental, declaratória ou constitutiva.
No caso do direito tributário, a situação sempre foi mais simples. Desde o fato gerador até a constituição do crédito tributário, ocorreria decadência. A partir da constituição do crédito, surgindo pretensão de cobrança, tinha-se a prescrição. Aliás, a fórmula empregada pelo CTN refere à extinção do direito de constituir o crédito tributário (artigo 173).
Já o artigo 174 era específico ao tratar da prescrição da ação de cobrança no prazo de cinco anos. A lei tributária, mesmo assim, deu margem a que se criasse um paradoxo no que diz respeito ao prazo de decadência. O artigo 151, inciso III, do CTN, previa como causa de suspensão da exigibilidade a interposição de recurso. Porém, se ainda cabível recurso, na interpretação corrente da lei, então não havia crédito definitivamente constituído, e, portanto, o prazo seria de decadência, que a rigor, não poderia ser suspenso ou interrompido.
Qualquer que seja a solução adotada, o certo é que uma vez constituído o crédito tributário de forma definitiva, flui prescrição, a qual é interrompida na forma do artigo 174, parágrafo 2º, do CTN. Uma vez interrompido, principalmente pela citação, o prazo recomeça a fluir, podendo dar margem à denominada prescrição intercorrente. Este prazo de prescrição poderia ser, no entanto, suspenso nas hipóteses do artigo 151 do CTN e artigo 40 da LEF.
Responsabilidade do Sócio.
A responsabilidade pela obrigação tributária existe na medida em que e para aqueles em que a norma tributária associar um fato gerador e sua respectiva obrigação.
Na verdade, o CTN estabelece uma clara dicotomia entre os dois gêneros de sujeitos passivos da obrigação tributária. A relação pessoal e direta com o fato gerador enseja a condição de contribuinte. Responsável é aquele que, sem ser contribuinte, tem constituída, por força de lei, uma obrigação na qual figura como sujeito passivo. A responsabilidade tributária advém, portanto, de uma norma de extensão.
A responsabilidade tributária tem seu alicerce no artigo 128 do CTN, segundo o qual “a lei pode atribuir de modo expresso a responsabilidade pelo crédito tributário a terceira pessoa, vinculada ao fato gerador da respectiva obrigação, excluindo a responsabilidade do contribuinte ou atribuindo-a a este em caráter supletivo do cumprimento total ou parcial da referida obrigação.”
Esta responsabilidade é pessoal nos casos elencados no artigo 131, 132, 133, 135 e 137 do CTN, mas subsidiária no caso do artigo 134. Dentre as hipóteses de responsabilidade subsidiária, encontra-se a dos “sócios, no caso de liquidação de sociedade de pessoa“.
Prescrição Intercorrente e Citação do Responsável.
A hipótese que se põe em apreciação na seqüência consiste na aplicação conjunta da prescrição intercorrente com a actio nata quando houve citação da pessoa jurídica. É que observamos julgados no âmbito do STJ onde se assentou que “a jurisprudência da 1ª e 2ª Turmas desta Corte vem proclamando o entendimento no sentido de que o redirecionamento da execução contra o sócio deve dar-se no prazo de cinco anos da citação da pessoa jurídica, sendo inaplicável o disposto no art. 40 da Lei nº 6.830/80 que deve harmonizar-se com as hipóteses de suspensão previstas no art. 174 do CTN, de modo a não tornar imprescritível a dívida fiscal.”
Outro ponto que merece destaque no que tange à responsabilização é que uma vez pedida e concedida nos autos do processo de execução, ocorre preclusão pro judicato se não for afastada a decisão pelo pertinente agravo de instrumento, ou se citado, não interpuser o devedor tempestivos embargos à execução, pois não poderá contestar a execução. Poderá considerar a decisão interlocutória e agravar na condição de prejudicado, ou aguardar a citação e interpor embargos, alegando, dentre outras defesas, a ilegitimidade, impugnando os fundamentos da responsabilização.
Conclusão.
A responsabilização de terceiros no âmbito do direito tributário, como de resto, em qualquer ramo do Direito, deveria ser uma situação excepcional. O que vemos nos dias atuais é uma “desconsideração automática”, sem qualquer motivação nos autos do processo, com determinação, inclusive, de penhoras on-line. Tal instituto tem sido usado largamente, em grande escala, pela Justiça Trabalhista e pala Cível.
A rigor, há desconsideração da personalidade jurídica, e a separação é um dos fundamentos da teoria da personalidade jurídica dos entes abstratos. Porém, sua aplicação é absolutamente imprescindível, a fim de se fazer valer o princípio da responsabilidade patrimonial, pois a rígida separação que deveria existir da pessoa jurídica em relação às pessoas físicas que a compõe, deixa margem para um sem fim de fraudes.
Na interpretação dos dispositivos legais pertinentes há que preponderar o bom senso e a mensuração dos resultados práticos. A carga tributaria avassaladora que pesa sobre o contribuinte já conduziu a mitigações interpretativas, sendo lugar comum na jurisprudência, por exemplo, a afirmação de que mera ausência de recolhimento de tributo não caracteriza violação apta a ensejar a responsabilização de terceiros.
08/2007
Advogado, especializado na área do Direito Público, pós graduando em Direito Tributário, sócio do escritório Soubhia Netto Advogados Associados, membro da Associação dos Advogados de São Paulo.
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