Sumário: Introdução. 1. A formação da pessoa. 2. A proteção do interesse da criança. 2.1. Apontamentos sobre a guarda compartilhada. 3. A valoração do afeto na ciência jurídica. 3.1. O afeto nos Tribunais. 4. Responsabilidade civil pelo desamor? Considerações finais. Referências.
Introdução
Está havendo maior preocupação com o afeto nas relações do direito de família, tanto que existem casos batendo às portas do Judiciário para o estabelecimento de indenizações, tendo como fundamento a ausência de amor de um dos pais, no desenvolvimento dos filhos.
No presente estudo, sem o intuito de esgotar a matéria, mas com a preocupação de se estabelecer debate sobre a relevância do amor nos contatos familiares, são traçadas algumas orientações acerca do amor na constituição da pessoa, em especial na seara da família.
Neste objetivo, são traçadas considerações sobre o instituto da guarda, em especial da guarda compartilhada, para a estruturação da criança na moderna formação familiar, que não corresponde à família patriarcal. Assim, faz-se uma análise do afeto na ciência jurídica e como está sendo tratado nos Tribunais, com a citação de alguns julgados fundamentados no elemento afetivo.
Por derradeiro, procede-se a uma crítica da inserção da matéria no ramo da responsabilidade civil, argumentando que o direito de família e conseqüentemente o juízo da família tem mais aptidão para o julgamento de tais casos, chamando atenção ainda, para o perigo em se valorar o amor como simples moeda, sem a preocupação com as causas do desamor, pois para a constituição da pessoa o amor é tão importante, como a vida.
1. A formação da pessoa
O ser humano, ao longo de sua existência, conseguiu várias e memoráveis façanhas, algumas abomináveis, embasadas apenas no egoísmo e no desejo individual de ganho, outras tantas, dignas de entes superiores, como exemplo, as facilidades de transporte e comunicação, a cura de doenças endêmicas, a descoberta da origem genética. Entretanto, nessa busca incessante pelo aperfeiçoamento, parece ter esquecido de se conhecer, compreender sua real finalidade como existência humana, pois, saiu à procura de algo melhor e talvez tenha perdido de se conhecer e se formar como pessoa, um organismo vivo que sente e racionaliza, diferentemente de outros tantos seres que têm vivência singela e irracional.
Apesar disso, para Ernst Cassirer, “o homem é criatura que está em constante busca de si mesmo – uma criatura que, em todos os momentos de sua existência, deve examinar e escrutinar as condições de sua existência”, sendo que esta análise, “consiste o real valor da vida humana”, pois somente o ser humano “pode dar uma resposta racional” de tal forma que “seu conhecimento” e “a sua moralidade estão compreendidos nesse círculo”, “por essa faculdade de dar uma resposta a si mesmo e aos outros, que o homem se torna um ser ‘responsável’, um sujeito moral” (CASSIRER, 2005, p. 17).
A despeito de todos os esforços do irracionalismo moderno, essa definição de homem como um animal rationale não perdeu sua força. A racionalidade é de fato um traço inerente a todas as atividades humanas. A própria mitologia não é uma massa grosseira de superstições ou ilusões crassas. Não é meramente caótica, pois possui uma forma sistemática ou conceitual. Mas, por outro lado, seria impossível caracterizar a estrutura do mito como racional. A linguagem foi com freqüência identificada à razão, ou à própria fonte da razão. Mas é fácil perceber que essa definição não consegue cobrir todo o campo. É uma pars pro toto; oferece-nos uma parte pelo todo. Isso porque, lado a lado com a linguagem conceitual, existe uma linguagem emocional; lado a lado com a linguagem científica ou lógica, existe uma linguagem da imaginação poética. Primariamente, a linguagem não exprime pensamentos ou idéias, mas sentimentos e afetos. E até mesmo uma religião “nos limites da razão pura”, tal como concebida e elaborada por Kant, não passa de mera abstração (CASSIRER, 2005, p. 49).
Dessa forma, como afirma Rollo May, “o homem difere completamente da natureza, uma vez que possui consciência de si mesmo; seu senso de individualidade o distingue do restante dos seres animados e inanimados”, inclusive da própria natureza, por isso “a necessidade de autoconsciência”, ou seja, de
(…) um self vigoroso – isto é, um forte senso de identidade pessoal – para relacionar-se plenamente com a natureza sem ser por ela absorvido. Pois sentir verdadeiramente seu silêncio e o caráter inorgânico acarreta considerável ameaça. Se alguém se encontrar num alto promotório, por exemplo, contemplando o mar em violenta agitação e compreender, de maneira plena e realista, que o oceano jamais “tem uma lágrima pela dor alheia, nem se importa com o que os outros pensem”, e que sua vida poderia ser engolida com uma alteração infinitesimal para aquele tremendo movimento químico da criação, a pessoa se sentiria ameaçada. Ou se alguém se entregar à sensação das distâncias no pico de uma montanha e entrar em empatia com as altitudes e os abismos, compreendendo ao mesmo tempo que a montanha “nunca foi amiga de ninguém”, “nem prometeu o que não poderia dar”, e que ele poderia despedaçar-se no sopé rochoso sem que sua extinção como pessoa humana trouxesse a menor alteração às paredes de granito, então sobrevirá o medo. Esta é a profunda ameaça do “não ser”, do “nada”, que se experimenta em plena confrontação com o ser inorgânico. E recordar que “tu és pó e em pó te hás de tornar” não constitui grande conforto (MAY, 2004, p. 61-62).
Com essa descoberta, surge um grande conflito interno, pois ao mesmo tempo em que se constitui um organismo complexo, pleno de existência, tem no plano racional a sua finitude como certeza, gerando uma agitação de forças internas, que segundo Erich Fromm, devem ser “entendidas como base da ‘natureza’ do homem” (FROMM, 1992, p. 43). Mas esta descoberta da consciência, por mais que se defenda, seja um processo fácil, para a grande maioria das pessoas é extremamente penoso, sendo que para determinadas pessoas parece ser inatingível, permanecendo num estado infantil de desenvolvimento, padecendo de doenças variadas e sem causa aparente, num verdadeiro subdesenvolvimento interior.
Frente a tantas adversidades, o medo se torna companheiro fiel e persistente, e tem como causa, “a ansiedade de perder a consciência de si mesmo”, de ter a sensação de estar perdido, sem rumo e sem “nada para orientá-lo”, consumido sem saber diferenciar o seu mundo subjetivo e “o mundo objetivo que o rodeia” (MAY, 2004, p. 28), brotando desta situação um vazio profundo, fruto “da convicção pessoal de ser incapaz de agir como uma entidade, dirigir a própria vida, modificar a atitude das pessoas em relação a si mesmo, ou exercer influência sobre o mundo que nos rodeia” o que culmina com a renúncia da pessoa em “sentir e a querer” (MAY, 2004, p. 22).
Então, se converte num ser mecanicista, suprimindo sua vontade e desejo, condicionado, ainda que de forma inconsciente, seja internamente pelo medo, seja externamente pelas convenções e apelos da sociedade, que pouco a pouco também se transformam num verdadeiro fosso, aumentando ainda mais aquela sensação de debilidade e de solidão.
O ser humano não tem aptidão para viver isolado, portanto, carece da aprovação social para pertencer a um determinado grupo, necessita “ser estimado” para superar a “sensação de isolamento”, pois somente “imersa no grupo, é reabsorvida, como se voltasse ao ventre materno”, esquecendo assim, “a solidão, embora ao preço da renúncia à sua própria existência como personalidade independente.” Não consegue estabelecer os recursos internos capazes de vencer a solidão no correr dos anos, “isto é, o desenvolvimento de seus recursos interiores, da força e do senso de direção, para usá-los como base de um relacionamento significativo com os outros seres humanos.” Nesta desestrutura, a solidão passa a ser a única companheira, ainda em presença dos outros, “pois gente vazia não possui base necessária para aprender a amar” (MAY, 2005, p. 29).
É na infância que “surge no ser humano a mais importante e radical ocorrência no processo evolutivo, isto é, a autoconsciência” é a primeira oportunidade em que se encontra com o “eu”, justamente porque quando “no ventre materno, fazia parte do ‘nós original’ com sua mãe” e, próximo aos três anos de idade, a criança “toma consciência de sua liberdade”, sentindo-se no “relacionamento com os pais”, e “a si mesma como um indivíduo independente, capaz de opor-se a eles, se necessário. Esta notável ocorrência constitui o nascimento da pessoa no animal humano” (MAY, 2004, p. 69-70).
Esta mobilização é muito simples, porém, muito profunda, algo novo na frágil vida humana. Diante da dificuldade ocasionada pela profundidade, intenta o ser humano uma fuga colérica para retornar ao único lugar de segurança que conhece, pois ao nascer “é tirado de uma situação que até então era definida, tão definida quanto os instintos, e jogado numa situação indefinida, incerta e aberta. Só há certeza com relação ao passado; com relação ao futuro, a única certeza que existe é a morte” (FROMM, 2000, p. 10).
Este fluxo de expansão da vida, que se inicia nos primeiros anos e se prolonga durante toda a vida, é “diferente para cada um – acarretando crises que podem causar profunda ansiedade. Não é para admirar”, como afirma Rollo May, “que muita gente recalque o conflito e procure durante toda a vida fugir da ansiedade”, isso porque, prossegue o autor, a experimentação “de nossa própria personalidade é a convicção de que todos começamos como seres psicológicos”, apesar da impossibilidade de se provar isso de “maneira lógica”,
pois a autoconsciência era pressuposição de qualquer discussão a respeito. Haverá sempre um elemento de mistério na percepção do próprio ser-mistério significando aqui um problema cujos dados o envolvem inteiramente. Pois esta percepção é pressuposição de auto-indagação. Isto é, o simples meditar sobre a própria identidade significa que já se está empenhado na autoconsciência (MAY, 2004, p. 74).
Nos dias atuais, o ser humano está a viver uma fase de imenso vazio e esta sensação deriva “da idéia de incapacidade para fazer algo de eficaz a respeito da própria vida e do mundo em que vivemos”, tornando extremamente preocupante, pois poderá sofrer estagnação, se não evoluir em direção ao seu autoconhecimento, exatamente porque “as potencialidades transformam-se em morbidez e desespero e eventualmente em atividades destrutivas” (MAY, 2004, p. 22).
Decorre daí que muitas doenças físicas têm nascedouro também nas suas fugas em não se re-conhecer como pessoa. Assim, recorrendo-se à metáfora da folha de papel, o ser humano é como tal, de um lado o plano físico-orgânico, de outro lado, o plano psicológico. Dois lados de uma mesma pessoa, duas óticas conexas de um mesmo ente. Tanto que, se houver a perfuração de um lado do papel, entenda-se perturbação psicológica do ser humano, prontamente o outro também será afetado, pois conexos, compõem-se em partes de um todo. Com isso, é possível demonstrar que a vida da pessoa é composta de uma díade, e que, não pode ser compartimentalizada sob pena de se perder o humano em sua integração pessoal.
Sendo assim, a sua vida é marcada por constante incerteza e, ao conhecer a natureza humana, visualizar os conflitos interiores é possível obter “novas bases para a crença nos aspectos trágicos da existência humana”, de tal modo, o psicoterapeuta, ao observar todos estes embates concebidos interna e externamente em cada pessoa, acaba por adquirir “uma nova compreensão do potencial da dignidade do ser humano”, obtendo provas “de que, quando o homem finalmente aceita o fato de não poder mentir com êxito para si mesmo e resolve levar-se a sério, descobre no íntimo uma capacidade de recuperação anteriormente desconhecida e às vezes mesmo notável” (MAY, 2004, p. 65).
Qual, então, a tarefa com que nos defrontamos? As implicações são nítidas na análise acima: precisamos redescobrir no nosso íntimo novas fontes de vigor e integridade. Isto, naturalmente, será feito de acordo com a descoberta e a afirmação de valores pessoais e da sociedade onde vivemos, e que constituirão o âmago da unidade. Mas valor algum será eficaz, tanto para a pessoa como para a sociedade, quando não existe a capacidade anterior para avaliá-los, isto é, para optar e afirmar de maneira atuante os princípios segundo os quais se deseja viver. Este é um dever do indivíduo, que assim contribuirá para o lançamento das bases de uma sociedade construtiva, que eventualmente emergirá desta época agitada, como a Renascença surgiu da desintegração da Idade Média (MAY, 2004, p. 66).
O autor ainda reforça sua posição, citando observação de William James, a respeito da preocupação daqueles que pretendem um mundo mais sadio, e que “deveriam começar por si mesmos”, podendo “ir mais longe”,
observando que descobrir o centro de força em nosso íntimo é, afinal, a melhor contribuição que podemos prestar aos homens nossos irmãos. Diz-se que, na Noruega, quando um pescador vê seu barco arrastado para um redemoinho tenta lançar um remo ao abismo borbulhante. Se o conseguir, o maelstrom se acalma e ele e seu barco conseguem atravessar em segurança. Do mesmo modo, quem possui força íntima inata exerce um efeito calmante sobre as pessoas em pânico que a rodeiam. É disto que precisa a nossa sociedade – não de novas idéias e invenções, por mais importantes que sejam, não de gênios e super-homens, mas de pessoas que sejam, isto é, que possuam no íntimo uma fonte de vigor (MAY, 2004, p. 66).
Este processo de autoconhecimento ou de conhecimento interior é profundamente doloroso, pois exige do ser humano o confronto consigo, a ciência de seus limites e recursos, enfim, o encontro com suas incapacidades, seus medos e sua impotência. Tal agitação, em busca de solucionar suas contradições, próprias do ser humano, “é vital para o homem encontrar uma solução para si mesmo, elas são carregadas de toda a energia inerente a uma pessoa”, como afirma Fromm, “são no sentido amplo da palavra, ‘espirituais’, os caminhos de fuga da sobrevivência-transcendendo a experiência do nada e do caos” na tentativa de “encontrar alguma forma de união e de estrutura/orientação”, servindo “à sobrevivência mental mais do que à sobrevivência física” (FROMM, 1992, p. 44).
Neste processo, um elemento extremamente relevante para o enriquecimento pessoal, é, sem sombra de dúvida, o amor. O amor próprio, ou, para usar a expressão de Rollo May, “o amor de si mesmo”, que “é não só necessário, como um bem, além de ser indispensável ao amor ao próximo”. O autor, faz um parêntese, observando com Erich Fromm, para não se confundir este sentimento, com o egoísmo, pois a “excessiva preocupação com sua pessoa brotam, na verdade, do ódio por si mesmo”. E mais,
que amor-próprio não é a mesma coisa que egoísmo e, sim, o oposto; isto é, a pessoa que se sente intimamente indigna precisa valorizar-se pelo egoísmo, e aquela que tem uma compreensão sadia do próprio valor e que ama a si mesma possui as bases para agir com generosidade em relação ao próximo. Felizmente torna-se também claro, de uma perspectiva religiosa mais distante, que muito da autocondenação e desprezo pessoal contemporâneos são produto de problemas específicos do nosso tempo. O desprezo de Calvino pelo self estava intimamente ligado ao fato de que os indivíduos se sentiam insignificantes nos círculos industriais dos tempos modernos. E o autodesprezo do século XX resulta não só do calvinismo, mas também do nosso vazio doentio. Assim, a atual ênfase no desprezo pessoal não é representativa da tradição hebraico-cristã (MAY, 2004, p. 83).
O amor é o sentimento que preenche aquele vazio referido, aquela angústia gerada no íntimo da pessoa que está em processo de re-conhecimento como ser racional, pertencente à Humanidade. É condição essencial para este processo de formação e estruturação deste organismo vivo, tanto que, “quando uma pessoa é incapaz de sentir os próprios sentimentos, precisa muitas vezes aprende-lo respondendo dia após dia, à pergunta: ‘Como estou me sentindo neste momento?’” sendo o mais relevante o “sentir que o ‘eu’ ativo é que está sentindo, o que torna direto e imediato o sentimento”, experimentando o “afeto em todos os níveis do próprio ser” (MAY, 2004, p. 87).
Para tanto, o avanço da pessoa em se descobrir como tal, carece do desenvolvimento de diversos sentimentos, propendendo para sua formação cada um, como fator decisivo para a conquista final do ‘eu pessoa’. Assim, “para os adultos, ocupados em se redescobrir, a luta está centralizada no seu íntimo”.
‘A luta para tornar-se uma pessoa ocorre no íntimo da própria pessoa.’ Ninguém pode evitar colocar-se contra pais exploradores, ou as forças externas do ambiente, mas a luta psicológica crucial que devemos empreender é contra as nossas dependências, a ansiedade e os sentimentos de culpa que surgem à medida que evoluímos para a liberdade. O conflito básico, em suma, dá-se entre aquela parte da pessoa que procura evoluir, expandir-se e ser sadia, e a outra que anseia por permanecer em nível imaturo, atada ao cordão umbilical psicológico e recebendo a pseudoproteção e os mimos dos pais, em troca da independência (MAY, 2004, p. 113).
Faz pleno sentido a afirmação de que, nesta batalha travada internamente, algumas poucas pessoas são vencedoras e acabam por se conhecer efetivamente, aceitando seus limites e sua incapacidade, próprias da imperfeição humana. Outras tantas, diante da guerra interna, preferem o refúgio confortável da ignorância pessoal, mantendo sua inabilidade, permanecendo como pessoa subdesenvolvida, quando não pontilhada de transtornos e desvios psicológicos, eivados de angústia e rancor.
Por isso, a pessoa precisa enfrentar toda sorte contrária e fazer opção ‘por si mesma’. Esta expressão de Kierkegaard, segundo Rollo May, “afirma a responsabilidade de cada um pelo próprio self e a própria existência”, correspondendo a uma “atitude oposta ao impulso cego ou à existência rotineira; é uma atitude de vivacidade e decisão”, em que “a pessoa reconhece existir naquele determinado ponto do universo e aceita a responsabilidade de sua existência”, corresponde a uma “decisão de aceitar o fato de que a pessoa é ela mesma, com a responsabilidade de cumprir o próprio destino, o que, por sua vez, implica em aceitar o fato de que cada qual deve fazer suas próprias opções fundamentais” (MAY, 2004, p. 140).
Na medida em que esta opção de viver é feita de forma consciente, “a responsabilidade para consigo mesmo assume novo significado”, aceitando a própria vida, “não como algo a que está preso, uma carga que lhe foi imposta, mas como um valor por ela escolhido”, ocorre uma união entre a “liberdade e responsabilidade”, tornando-se “mais do que uma idéia agradável”, consciente de que a opção “por si mesma” lhe dá certeza da escolha conjunta da “liberdade pessoal” e da “responsabilidade”; além disso, “a disciplina exterior transforma-se em ‘autodisciplina’”.
A pessoa a aceita não porque recebe ordens – pois quem poderia mandar em alguém que estava livre para acabar com a própria vida? – mas porque decidiu com maior liberdade o que pretende fazer da vida, e a disciplina é necessária em vista dos valores que deseja alcançar. Esta autodisciplina pode ter nomes complicados – Nietzsche a chamava de “amor ao próprio destino”, e Spinoza falava de “obediência às leis da vida”. Mas, ornada ou não de nomes fantasiosos, é, julgo eu, uma lição que todos progressivamente aprendem na luta pela conquista da maturidade (MAY, 2004, p. 144).
Para essa conquista, há também a necessidade de coragem. Coragem para romper com a situação original, de dependência da mãe, num primeiro momento, dos pais ou de si mesmo, para encarar o combate em busca de sua identificação como pessoa livre de qualquer amarra ou submissão. Há necessidade também, dentro do contexto, do incentivo dos pais e mães para que a criança supere este estado de completa dependência como pessoa em desenvolvimento, por isso, também a preocupação legal em preservar e garantir à criança a possibilidade de atingir este objetivo.
2. A proteção do interesse da criança
Para a transformação do estado infantil em estado adulto, imperioso o respeito à infância, aos primeiros passos da longa jornada representada pela vida. Somente possibilitando o aprendizado sadio das experiências da vida, o processo de formação humana poderá atingir seu ápice final: a conquista da dignidade da pessoa e seu auto-reconhecimento como pessoa com plena dignidade.
Não bastasse o amparo integral representado pelo princípio da dignidade da pessoa humana, fundamento do Estado brasileiro, o legislador constituinte mostrou-se ainda mais preocupado com tema. Tanto, que no art. 227 da Constituição Federal de 1988 fez constar expressamente o “dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão”.
É preciso atenção, em relação ao dispositivo em comento, especialmente quanto aos direitos à vida e à saúde. Quanto ao primeiro, dispensa-se maiores comentários, uma vez que sem ela não seria possível discriminar os demais direitos, mas ainda assim, merece relevo porque não se poderá falar em vida, se esta não for digna, garantindo-se também à criança e ao adolescente o direito à ampla e irrestrita dignidade, na formação de pessoa como fim em si.
No tocante ao direito à saúde, talvez por questões culturais ou metodológicas, há certa propensão em restringi-la apenas na vertente física, olvidando da grande relevância representada pela saúde mental, psicológica. Neste aspecto, a expansão pessoal e seu auto-conhecimento está intimamente relacionado com o ambiente em que se encontra a criança ou adolescente, ou seja, o ambiente familiar, surgindo assim, a distinta responsabilidade do pai e da mãe, na família tradicional, ou de quem desempenhe este papel nas contemporâneas estruturas familiares, para a capacitação daquela criança ou adolescente na sua formação como pessoa humana com dignidade.
No plano infraconstitucional, o Estatuto da Criança e do Adolescente, busca regulamentar integralmente a proteção à criança dispondo no art. 3º que ambos “gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade.”
Dessa forma, há que se ter certa preocupação em relação aos traumas que a criança possa ser exposta, desde os primeiros anos de vida, evitando ao máximo sua exposição às condições adversas para sua constituição.
Importante parêntese, nesta oportunidade, para aqueles casos, de certa maneira comuns, que batem às portas do judiciário, onde o interesse e a proteção da criança não são considerados. Muitas vezes a criança é usada, em processos de separação, como moeda. É dispensado qualquer respeito à sua vida e aos seus sentimentos, para se conquistar posição mais cômoda em termos patrimoniais, senão ainda, por motivação desprezível, privando a outra pessoa do convívio e da participação da vida do filho.
Neste aspecto, cabe aos agentes de direito, em contato com tais situações, frear os ânimos impulsivos e até mesmo irracionais, para preservação e garantia do desenvolvimento psicológico, sem traumas ou abalos, que possam influenciar na formação deste ser humano, envolvido em questões judiciais que não lhe dizem respeito.
A oportunidade acende interrogações, será que a atual sistemática de estabelecimento de guarda, em processos de separação dos pais, está em consonância com a proteção constitucional destinada à criança e ao adolescente? Será que o ‘direito de visita’ concedido à outra pessoa não lhe retira direitos fundamentais?
Neste aspecto, importante a lição de Gustavo Tepedino, para quem, relativamente “à guarda”,
(…) a própria expressão semântica parece ambivalente, indicando um sentido de guarda como ato de vigilância, sentinela que mais se afeiçoa ao olho unilateral do dono de uma coisa guardada, noção inadequada a uma perspectiva bilateral de diálogo e de troca, na educação e formação da personalidade do filho.
Tradicionalmente, a guarda era tratada como um direito subjetivo a ser atribuído a um dos genitores na separação, em contrapartida ao direito de visita deferido a quem não fosse outorgado esta posição de vantagem, que teria o dever de a ela submeter-se. Dessa forma, acaba-se por desvirtuar o instituto da guarda, retirando-lhe a função primordial de salvaguardar o melhor interesse da criança ou do adolescente (TEPEDINO, 2004, p. 309).
Apesar de algum progresso na seara do direito de família, especialmente nas questões relativas à separação judicial e em relação aos filhos, não é incomum ainda hoje, encontrar situações em que se pretende o estabelecimento e a manutenção da criança como simples objeto a ostentar o melhor direito do guardião, o “que acaba por reduzir o papel dos pais na educação dos filhos, uma vez extinta a sociedade conjugal, a um feixe de prerrogativas e poderes a serem ostentados, exigidos e confrontados, a cada controvérsia envolvendo o destino da prole – verdadeiro duelo entre proprietários ciosos de seus confins” (TEPEDINO, 2004, p. 309).
Surge, para enfrentamento dessa situação, o instituto da guarda compartilhada e da guarda alternada, excluindo o ‘domínio’ individual e o privilégio de exclusividade até então reinante no ordenamento jurídico pátrio, como alternativa a ser considerada.
2.1. Apontamentos sobre a guarda compartilhada
Com a ruptura da vida comum, a primeira grande questão a ser levantada diz respeito aos filhos, quem ficará em sua companhia e auxiliará de mais perto o seu desenvolvimento. Excetuadas as situações do estabelecimento da guarda em família substituta, do Estatuto da Criança e do Adolescente, a análise aqui será circunscrita aos casos de vida comum, dentro de uma entidade familiar constituída e que se desfaz, gerando direitos e deveres aos pais e também à criança em referida condição.
Pois não somente na “infância, dentro da família, mas também no decorrer da vida, com a ajuda das instituições, que a distinção entre fantasia e realidade, entre culpa e responsabilidade é estabelecida, desenvolvida e fomentada”, como afirma Giselle Câmara Groeninga, primeiramente “dentro da família, e no seio das instituições, aprendemos a interpretar os afetos, a realidade e a lei”, assim também se aprende a “balizar a agressividade e desenvolvemos formas de dar e receber amor, as quais vão se transformar em solidariedade – um capital essencial para o exercício da cidadania”, conclui a autora (GROENINGA, 2003, p. 102), de onde se extrai a importância do tema da guarda compartilhada, quando extinta a sociedade familiar.
O estudo da guarda compartilhada faz-se relevante e deve ser intensificado, à medida que contribui para a recuperação de uma apreciação ética das relações de filiação, de modo absolutamente necessário e complementar ao exercício conjunto da autoridade parental. A utilização teórica de ambas as categorias, como instrumentos integrados de atuação dos princípios constitucionais, destinadas à tutela das situações existenciais na formação e no desenvolvimento da personalidade do filho, mostra-se provavelmente como o desafio hermenêutico mais árduo para a concreção da dignidade humana em matéria de filiação (TEPEDINO, 2004, p. 321-322).
A atribuição da guarda dividida ou exclusiva a um dos ascendentes, gerando ao outro o direito de visitas, não condiz mais com a realidade atual da sociedade, além disso, não garante à criança o pleno desenvolvimento de sua personalidade, contrariando o princípio da dignidade humana. Apesar disso, na legislação pátria não há disposição expressa a respeito do estabelecimento da guarda compartilhada, fundamentando a doutrina a possibilidade de sua instituição com base no texto do art. 1.583, quando há consentimento dos pais, ou mesmo, a critério do juiz, em casos litigiosos, sempre pautando a decisão no melhor interesse da criança.
Na tentativa de suprir esta ausência de lei, há alguns projetos tramitando na Câmara dos Deputados, em especial o Projeto de lei nº 6.350 de 2002 que prevê alterações no Código Civil estabelecendo as situações em que poderá ser instituída a guarda compartilhada, delineando seu conceito inclusive[1].
Importante estudo consta da Justificativa do projeto que situa a guarda compartilhada como
(…) um tipo de guarda onde os pais e mães dividem a responsabilidade legal sobre os filhos ao mesmo tempo e compartilham as obrigações pelas decisões importantes relativas à criança. É um conceito que deveria ser a regra de todas as guardas, respeitando-se evidentemente os casos especiais. Trata-se de um cuidado dos filhos concedidos aos pais comprometidos com respeito e igualdade.
Na guarda compartilhada, um dos pais pode deter a guarda material ou física do filho, ressalvando sempre o fato de dividirem os direitos e deveres emergentes do poder familiar. O pai ou a mãe que não tem a guarda física não se limita a supervisionar a educação dos filhos, mas sim participará efetivamente dela como detentor de poder e autoridade para decidir diretamente na educação, religião, cuidados com a saúde, lazer, estudos, enfim, na vida do filho (BRASIL, 2002, p. 14.793).
Como se pode constatar, diversamente da previsão legal, estatuída no art. 1.584 que define a guarda “a quem revelar melhores condições para exercê-la”, na guarda compartilhada ambos pais participam, efetivamente das decisões importantes referentes à vida do filho, o que poderá ser a solução para a família, justamente porque a separação ou o divórcio cessam o casamento ou seus efeitos, porém não aniquila a família, devendo haver ajustes para propiciar o desenvolvimento dos menores envolvidos em tais circunstâncias.
A guarda dividida ou exclusiva não garante o desenvolvimento da criança e não defere aos pais tratamento de igualdade, pois, como a própria redação do art. 1.589 define, àquele privado da guarda dos filhos “poderá visitá-los e tê-los em sua companhia, segundo o que acordar com o outro cônjuge, ou for fixado pelo juiz, bem como fiscalizar sua manutenção e educação”, conferindo-lhe, portanto, um tratamento de coadjuvante no processo de desenvolvimento dos filhos.
É certo que esta disposição além de ferir o direito à igualdade estabelecido na Constituição Federal, atribui a quem foi privado da guarda, apenas o direito de visita, devendo inclusive submeter-se muitas vezes, às regras e determinações traçadas pelo detentor da guarda, e isto com um grau de maior prejuízo porque àquele tem o respaldo legal, podendo submeter o outro aos seus caprichos e quando não, ao distanciamento dos filhos.
Este tipo de comportamento acarreta severos traumas na família desconstituída, o afastamento das pessoas configura, neste contexto, o primeiro passo para a extinção dos vínculos sentimentais até então existentes, transformando o afeto positivo, em negativo, o amor em ódio e no centro desse tormento crianças em formação devem merecer o zelo necessário para que as desventuras não lhes impossibilitem o crescimento e a conquista da dignidade.
3. A valoração do afeto na ciência jurídica
Neste momento se pode observar que o amor, o sentimento de união deve estar presente, especialmente o amor que une pais e mães aos seus filhos e filhas, olvidando os problemas enfrentados pelos adultos, com a preocupação voltada às crianças e adolescente. Deve se levar em conta que o amor, tanto para o ser humano, como para a sociedade organizada é muito importante. É, sem sombra de dúvida, o mais alto sentimento despertado na vivência em comunidade. Na expressão de Guilherme Assis de Almeida, “o amor deve ser a mais estimada de todas as coisas existentes. Esclareça-se que o amor, assim como os outros valores, é uma coisa, mas não algo concreto, palpável. Por sua própria natureza é inexaurível, jamais se esgota, sempre podemos amar mais e melhor” (ALMEIDA, 2005, p. 01).
Apesar da importância que o amor representa para a pessoa e para a sociedade, não se discutia, até pouco tempo atrás, sua relevância na seara jurídica. O fato é que de uma forma ou de outra, o patrimônio sempre ocupou lugar de destaque na legislação codificada, desde o advento do código de Napoleão.
A defesa da relevância do afeto, do valor do amor, torna-se muito importante não somente para a vida social. Mas a compreensão desse valor, nas relações do Direito de Família, leva à conclusão de que o envolvimento familiar, não pode ser pautado e observado apenas do ponto de vista patrimonial-individualista. Há necessidade da ruptura dos paradigmas até então existentes, para se poder proclamar, sob a égide jurídica, que o afeto representa elemento de relevo e deve ser considerado para a concretização do princípio da dignidade da pessoa humana.
Veja-se que a alteração na estrutura do modelo familiar relativizou a função que cada membro da família ocupa, pois não se prende mais, naquela disposição tradicional: pai, mãe e filho; ao primeiro cabendo o comando e a gestão do lar. Outras e variadas configurações familiares rompem as correntes da família matrimonializada, que já não corresponde mais às relações de fato em que se envolvem as pessoas no tempo contemporâneo.
O amor está desfazendo o círculo neurótico, instituído por aquela formação familiar, como escreveu Giselle Câmara Groeninga, e passa a ocupar outra posição nesta nova estrutura, unindo pessoas por laços abstratos e num fim fraterno comum: o desenvolvimento pessoal, através do núcleo familiar.
Neste passo, o direito não acompanhou as alterações sociais, não se atribuiu, no ordenamento, pelo menos expressamente, valor ao afeto. Está a doutrina laborando intensamente para implantar esta nova visão independente e desvinculada do valor econômico apenas. Este trabalho é árduo e está no início, pois de um ponto de vista extremamente legalista, defender sua irrelevância, prevalecendo o elemento biológico, como ponto fundamental a sustentar a relação entre pai e filho é ainda comum nos litígios que batem às portas do judiciário brasileiro, tendo em vista o apego ao paradigma até então existente, para citar o exemplo da relevância deste aspecto em detrimento do amor.
Exemplos dessa afirmação são citados por Fernanda Otoni de Barros, em seu livro “Do direito do Pai”, quando confronta a paternidade biológica com a paternidade, por ela chamada, ‘social’, em casos práticos e reais, ocorridos no judiciário mineiro. No primeiro deles, ela relata um processo de investigação de paternidade de filha, proposto pela mãe, que até aquele momento tinha como pai o companheiro da mãe. A completar a trama, o pai biológico não tem qualquer relação com a filha e não quer assumir a paternidade, enquanto o “pai-social” não abre mão de seu direito de pai, mesmo sabendo que a filha é adulterina. Indaga a autora: “Quem é o pai?” (BARROS, 2001, p. 74-79).
No caso citado, prontamente se observa o elemento biológico em contraposição ao elemento afetivo, ou seja, a paternidade biológica, como um valor, fazendo frente à paternidade social, afetiva, num verdadeiro conflito valorativo. Além disso, imperioso anotar que neste exemplo, julgado o processo, o pai biológico tornou-se pai de direito da criança, com toda conseqüência decorrente do dever de paternidade, inclusive, com a troca do nome da criança e conseqüente exclusão do nome do ‘pai social’, apesar da insistência e insatisfação deste com o processo e com a justiça. Tal decisão acarretou incômodo na autora que observou no encerramento do processo, a possibilidade da psicanálise contribuir para a ciência do direito, especialmente na seara da filiação (BARROS, 2001, p. 78).
Cabe um parêntese para lembrar a lição de Gustavo Tepedino que entende que “as relações de Direito Civil, são postas, ainda, a partir de relações de afeto, amor e solidariedade” e prossegue defendendo que a figura do pai e da mãe
(…) parecem insubstituíveis nessas relações de vida inseridas na família. Ao contrário de desenvolvermos técnicas que possam parecer destinadas a superar a realidade cultural, em que vivemos, na verdade, temos técnicas terapêuticas para suprir deficiências humanas, para atender à pessoa para, excepcionalmente, prolongar e gerar vida, e não para suprir, pura e simplesmente, a falta de afeto e de amor que se dá no seio da família.
Esta é a realidade em que vivemos: uma ordem jurídica constitucional que avocou para as relações de Direito Privado, em particular para as relações de família, a dignidade da pessoa humana como valor central, superando todos os outros interesses patrimoniais, institucionais, matrimoniais ou ideológicos que pudessem, por assim dizer, se sobrepor na escolha de princípios ou nas novas técnicas legislativas (TEPEDINO, 2002, p. 52).
Não resta dúvida que o desenvolvimento da pessoa, de forma a alcançar a dignidade como e enquanto pessoa, será possível desde que haja respeito pelo ser humano que representa a criança em desenvolvimento, com seus medos, anseios e frustrações, e acima de tudo, com seus vínculos afetivos estabelecidos desde o nascimento, na coletividade familiar.
Noutro exemplo, ainda a autora, confronta o direito do pai biológico que pretende a manutenção do vínculo com a filha, após a separação do casal, e ingressa em juízo para a regulamentação de visitas, pela proibição da mãe em lhe conceder este direito. Observa, quando da procedência do seu pleito, que a filha foi adotada pelo atual companheiro da mãe, rompendo assim, qualquer vínculo com ele; novamente a indagação que não cala e permeia, na obra a presença do valor do afeto: “Quem é o pai?”
A esta altura, importante o testemunho narrado, com a alteração imposta ao rumo trilhado no início da pesquisa, quando, relata:
(…) eu tinha uma suposta resposta à questão inicial, ou seja, o pai é aquele que cria, que simbolicamente empresta seu nome e seu corpo na constituição da criança e no seu laço social, o campo jurídico devendo legitimar sua função simbólica e reconhecê-lo, agora eu tinha várias outras questões: e o pai biológico, qual deverá ser a sua função e qual legitimidade lhe é possível? E o desejo da mãe? Quem pode dizer o nome do pai? Só a mãe pode declarar o pai ao filho? O pai que ela desejar, quando o desejar? (BARROS, 2001, p. 86).
Neste caso concreto, facilmente se observa o conflito estabelecido entre a paternidade biológica, pretendendo ser também social, em contrapartida à paternidade adotiva, estabelecida através de uma suposta relação social, com flagrante fraude aos direitos do primeiro. Outra oportunidade de se observar o valor que o afeto representa para a constituição das relações familiares, bem como, o engessamento das normas do direito de família, diante da dificuldade em reconhecê-lo.
Finalmente, porém não menos importante, o derradeiro exemplo da autora, trazido sob o título “paternidade plural”, demonstra a existência do conflito entre a paternidade afetiva e a biológica, desnudando, mais uma vez a relevância do afeto, como um valor. Neste, o relato de um processo de separação judicial litigiosa, onde a mãe confessa ao pai da criança a possibilidade de ser outro o seu pai biológico. Tal suspeita é confirmada na instrução do processo e o pai biológico se dispõe a reconhecer a paternidade, encontrando óbice porque o “pai social” não quer sucumbir em seus direitos paternos, diante da existência do vínculo de afeto entre ele e a criança.
Causa surpresa o desfecho da história, quando o pai biológico pretende o reconhecimento da paternidade, dada a separação, onde o “pai social” declarou em acordo a inexistência de filhos e de bens, apesar de ter lutado para a manutenção do vínculo e o Ministério Público manifesta contrariamente, afirmando que a filiação não tem caráter privado. “Os pais de uma criança não podem decidir, quando querem, do jeito que querem, quem é o pai e quem não é. Filiação é um registro público, um direito indisponível e personalíssimo do filho e que não pode ser regulado por acordos e contratos particulares” (BARROS, 2001, p. 91).
Os filhos são realmente conquistados pelo coração, obra de uma relação de afeto construída a cada dia, em ambiente de sólida e transparente demonstração de amor a pessoa gerada por indiferente origem genética, pois importa ter vindo ao mundo para ser acolhida como filho de adoção por afeição. Afeto para conferir tráfego de duas vias a realização e a felicidade da pessoa. Representa dividir conversas, repartir carinho, conquistas, esperanças e preocupações; mostrar caminhos, aprender, receber e fornecer informação. Significa iluminar com a chama do afeto que sempre aqueceu o coração de pais e filhos sócioafetivos, o espaço reservado por Deus na alma e nos desígnios de cada mortal, de acolher como filho aquele que foi gerado dentro do seu coração (MADALENO, 2004, p. 08).
Sob tal argumento é possível se encher de esperanças para estabelecer no mundo jurídico mais uma vez, que o afeto é um valor, inerente à formação da dignidade humana, tal como o direito à herança genética, guardadas as proporções. Não pode, por isso, ser esquecido ou simplesmente rejeitado das lides forenses, em especial no direito de família, onde a formação individual, para o convívio social encontra sua primeira base de desenvolvimento.
Assim, nas quedas patrimoniais, tão comuns no direito, ao afeto deve ser aberto debate sobre o seu valor. Não um valor pecuniário, revertido no aspecto financeiro, em moeda corrente, como mero capital ou elemento de troca, mas um valor inerente à formação da pessoa humana, implícito na sua dignidade para sua formação pessoal.
Sob o manto do princípio da dignidade humana, os tribunais passam a reconhecer o valor do afeto, conforme se depreende da decisão do Tribunal de Justiça do Paraná, prestigiando a filiação socioafetiva, com o seguinte aresto:
Negatória de paternidade. Adoção à brasileira. Confronto entre a verdade biológica e a socioafetiva. Tutela da dignidade da pessoa humana. Procedência. Decisão reformada. 1. A ação negatória de paternidade é imprescritível, na esteira do entendimento consagrado na Súmula 149/STF, já que a demanda versa sobre o estado da pessoa, que é emanação do direito da personalidade. 2. No confronto entre a verdade biológica, atestada em exame de DNA, e a verdade socioafetiva, decorrente da denominada ‘adoção à brasileira’ (isto é, da situação de um casal ter registrado, com outro nome, menor, como se deles filho fosse) e que perdura por quase quarenta anos, há de prevalecer a solução que melhor tutele a dignidade da pessoa humana. 3. A paternidade socioafetiva, estando baseada na tendência de personificação do direito civil, vê a família como instrumento da realização do ser humano; aniquilar a pessoa do apelante, apagando-lhe todo o histórico de vida e condição social, em razão de aspectos formais inerentes à irregular ‘adoção à brasileira’, não tutelaria a dignidade humana, nem faria justiça ao caso concreto, mas, ao contrário, por critérios meramente formais, proteger-se-iam as artimanhas, os ilícitos e as negligências utilizadas em benefício do próprio apelado. (Tribunal de Justiça do Paraná, Apelação Cível nº 108.417-9, 2ª Câm. Civ., Rel. Des. Accácio Cambi, v.u., j. 12.12.2001)
Outra questão inquietante, que nega qualquer valor ao vínculo amoroso formado entre cônjuges diz respeito à perquirição de culpa para a dissolução do matrimônio. Ora, como se o fato de constituir advogado para um processo de separação, fazer todas as provas, enfrentar o judiciário moroso, exercer o direito de ação, já não constituísse prova suficiente para concluir pela necessária dissolução do enlace, pela conclusão do fim do sentimento que mantinha unido o casal.
Com o advento do Código Civil de 2002 já há entendimento de não haver, necessariamente, a obrigação de produção e indicação da culpa do cônjuge na separação, como se observa do aresto do Tribunal de Justiça de Sergipe, com a seguinte ementa:
SEPARAÇÃO JUDICIAL –Ação litigiosa – Magistrado que decreta a separação sem buscar e imputar a qualquer das partes a causa e o culpado pela ruptura do casamento – Admissibilidade, se manifestado pelos cônjuges, de forma inconteste, o firme propósito de pôr fim ao vínculo conjugal.
Ementa Oficial: Manifestado pelos cônjuges, através da inaugural e contestação, o propósito firme de se separarem, deve o magistrado decretar a separação, independentemente de buscar e imputar a qualquer das partes a causa e o culpado pela ruptura do casamento.
(Ap 0718/2003 – Segredo de Justiça – 1ª Câm. – j. 08.03.2004 – rel. Des. Fernando R. Franco) RT 826/363
Como fundamento desta decisão, há referência expressa à jurisprudência já dominante do Superior Tribunal de Justiça, no mesmo sentido, negando a necessidade de se comprovar a culpa, o que pode ser permitido supor que cessou, dentro daquele enlace, qualquer vínculo de amor entre as pessoas, pois pretendem a extinção da vida comum:
Direito Civil. Direito de Família. Separação por conduta desonrosa do marido. Prova não realizada. Irrelevância. Insuportabilidade da vida em comum manifestada por ambos os cônjuges. Possibilidade da decretação da separação. Nova orientação. Código Civil de 2002 (art. 1.573). Recurso desacolhido.
Na linha de entendimento mais recente e em atenção às diretrizes do novo Código Civil, evidenciado o desejo de ambos os cônjuges em extinguir a sociedade conjugal, a separação deve ser decretada, mesmo que a pretensão posta em juízo tenha como causa de pedir a existência da conduta desonrosa. (REsp. 433206 – Quarta Turma – j. 07.04.2003 – Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira)
Por “insuportabilidade da vida em comum” pode ser entendida ausência de amor, pois onde há afeto, amor, há comunhão e desejo de crescimento a dois, o que não pode ser encontrado, por certo, quando esta vontade já não se corresponde entre os cônjuges. Assim, não se falar em culpa ou causa da separação, imputando um responsável pelo fracasso do casamento, pode ser considerado avanço para o reconhecimento da dignidade da pessoa, e mais, para o reconhecimento do afeto como elemento importante para esta realização.
Nas linhas de Sérgio Resende de Barros, em “A ideologia do afeto” é possível concluir que a culpa não é fator para a decretação da extinção do vínculo conjugal, haja vista a existência de outro elemento importante pois em verdade,
(…), o que identifica a família é um afeto especial, com o qual se constitui a diferença específica que define a entidade familiar. É o sentimento entre duas ou mais pessoas que se afeiçoam pelo convívio diuturno, em virtude de uma origem comum ou em razão de um destino comum, que conjuga suas vidas tão intimamente, que as torna cônjuges quanto aos meios e aos fins de sua afeição, até mesmo gerando efeitos patrimoniais, seja de patrimônio moral, seja de patrimônio econômico. Este é o afeto que define a família: é o afeto conjugal. Mais conveniente seria chamá-lo afeto familiar, uma vez que está arraigada nas línguas neolatinas a significação que, desde o latim, restringe o termo cônjuge ao binômio marido e mulher, impedindo ou desaconselhando estendê-lo para além disso (BARROS, 2002, p. 8).
Dessa maneira, quando não existe afeto, não há amor, uma sanção já foi imposta à sociedade conjugal; sua falência, pois a vida a dois não pode ser concebida inexistindo o laço de união afetiva entre os cônjuges. Obrigar seja provada a culpa pelo término da relação, sob o ponto de vista da relevância do afeto, seria o mesmo que implantar um sistema de “bis in idem” condenatório para aqueles que já sofreram com o fracasso na constituição da família a qual se dispuseram.
O autor vai ainda mais longe, defendendo a relevância do afeto e a alteração do texto constitucional, pois a família se conjuga com o amor, muito embora o pensamento da família parental, embasada no patriarcalismo defender de forma diversa,
(…) o fato é que não é requisito indispensável para haver família que haja homem e mulher, nem pai e mãe. Há famílias só de homens ou só de mulheres, como também sem pai e mãe. Ideologicamente, a atual Constituição brasileira, mesmo superando o patriarcalismo, ainda exige o parentalismo: o biparentalismo ou o monoparentalismo. Porém, no mundo dos fatos, uma entidade familiar forma-se por um afeto tal – tão forte e estreito, tão nítido e persistente – que hoje independe do sexo e até das relações sexuais, ainda que na origem histórica não tenha sido assim. Ao mundo atual, tão absurdo é negar que, mortos os pais, continua existindo entre os irmãos o afeto que define a família, quão absurdo seria exigir a prática de relações sexuais como condição sine qua non para existir a família. Portanto, é preciso corrigir ou, dizendo com eufemismo, atualizar o texto da Constituição brasileira vigente, começando por excluir do conceito de entidade familiar o parentalismo: a exigência de existir um dos pais (BARROS, 2002, p. 9).
Com isso, fica patente o destaque do afeto nas uniões familiares e o valor que lhe deve ser atribuído pelo direito, para cumprir o seu papel na formação e acabamento da pessoa humana, de forma a cumprir o princípio da dignidade da pessoa humana.
4. Responsabilidade civil pelo desamor?
Este valor, ao qual se fez referência, foi considerado em contraposição a outro ou a outros valores. Houve, neste estudo até aqui, a preocupação especial em contrapor o afeto aos valores como a culpa (nos casos de ruptura do casamento) e ao valor biológico (em conflitos entre paternidade biológica e paternidade social), por exemplo, sem considerar o valor do afeto no aspecto pecuniário.
Conforme afirma Nicola Abbagnano, o uso da expressão ‘valor’ pela filosofia “só começa quando, seu significado é generalizado para indicar qualquer objeto de preferência ou de escolha, o que acontece pela primeira vez com os estóicos”, eles foram os primeiros “que introduziram o termo no domínio da ética e chamaram de valores os objetos de escolha moral” (ABBAGNANO, 2003, p. 989).
É também a partir da mesma época que tende a reproduzir-se, no campo da teoria dos valores, uma divisão análoga à que caracterizara a teoria do bem: entre um conceito metafísico ou absolutista e um conceito empirista ou subjetivista do valor. O primeiro atribui ao valor um status metafísico, que independe completamente das suas relações com o homem. O segundo considera o modo de ser do valor em estreita relação com o homem ou com as atividades humanas. A primeira concepção é motivada pela intenção de subtrair o valor, ou melhor, determinados valores e modos de vida neles fundados, à dúvida, à crítica e à negação: essa intenção parece pueril, se pensarmos que o valor mais solidamente ancorado na consciência dos homens e que mais paixões provoca também é o valor mais mutável e relativo, a tal ponto que às vezes os filósofos se recusam pudicamente a considerá-lo autêntico: o valor-dinheiro (ABBAGNANO, 2003, p. 990).
É sob este prisma, do “valor-dinheiro” que se passará a analisar o afeto ou sua ausência de agora em diante, motivado especialmente por algumas decisões do Judiciário brasileiro, ora atribuindo, ora negando valor pecuniário, a título de reparação de danos, resolvendo a deficiência do enlace afetivo através de indenização em moeda.
Tem-se observado, nestes casos, que o fundamento para amparar a pretensão está circunscrito no âmbito da responsabilidade civil, afastando-se a competência do juízo da família e os princípios deste ramo do direito para a fundamentação do dever de reparar, ou então, da não obrigatoriedade de reparação.
Sem ingressar profundamente no mérito desta questão, na pretensão exclusiva de se abrir o debate, parece que a controvérsia não ficará bem situada unicamente na esfera da responsabilidade civil, uma vez que as relações de família são especiais, incidindo sobre elas princípios e circunstâncias peculiares do direito de família. Dessa forma, é possível defender o direito de família, como sendo o mais apto a enfrentar tais casos, com uma análise mais acurada, própria desse ramo, dentro da ótica da ‘repersonalização do direito civil’, eis que a pessoa humana deve ser o centro da atenção e não a existência ou inexistência da relação de afeto porventura existente, claro sem se olvidar da relevância que o amor representa para a formação da pessoa.
Lafayette Pozzoli já atentou para o que escreveu Jacques Maritain, no livro “Humanismo Integral”, ensinando “que o ser humano deve realizar uma obra comum na terra: o amor”, segundo ele, “o verdadeiro fim da humanidade está em realizar uma vida comum terrena, um regime temporal de acordo com a dignidade humana e o amor”, sendo este, sem dúvida, “um trabalho árduo e heróico e que exige força de vontade, paciência e, sobretudo, fé de cada pessoa” (POZZOLI, 2003, p. 108-109).
Não se trata de atribuir, simplesmente, valor pecuniário para o desamor, nem mesmo responsabilizar a pessoa pela ausência deste sentimento nas relações de família. Se a discussão ficar restrita a este prisma não se atingirá o seu ponto fundamental, ou seja, a sua grande importância para a própria formação da pessoa.
As questões sem respostas, pelas quais atravessa a sociedade atual, encontram reflexo na família moderna, pois todo “abandono sofrido pelas crianças mimadas de hoje – qualquer que seja a composição familiar a que pertençam – é o abando moral”, como afirma Maria Rita Kehl, e conclui que não é o fato de
(…) a mãe, separada do pai, passa muitas horas por dia trabalhando; não é porque um pai decidiu criar sozinho os filhos que a mãe rejeitou; ou porque um casal jovem só tenha tempo para conviver com a criança no fim da semana. O abandono, e a conseqüente falta de educação das crianças, ocorre quando o adulto responsável não banca sua diferença diante delas.
Fora isso, sabemos que todos os “papéis” dos agentes familiares são substituíveis – por isso é que os chamamos de papéis. O que é insubstituível é um olhar de adulto sobre a criança, a um só tempo amoroso e responsável, desejante de que esta criança exista e seja feliz na medida do possível – mas não a qualquer preço. Insubstituível é o desejo do adulto que confere um lugar a este pequeno ser, concomitante com a responsabilidade que impõe os limites deste lugar. Isto é que é necessário para que a família contemporânea, com todos os seus tentáculos esquisitos, possa transmitir parâmetros éticos para as novas gerações (KEHL, 2003, p. 176).
Por isso, se admite que não será atacada a causa do problema, restando apenas o contentamento superficial e abrandado apego ao efeito. Deve ser anotado que a alteridade, o respeito pela pessoa do Outro há de ser levada em primeira discussão, até que ponto está existindo, na aplicação do direito, a consideração do Outro e para o Outro? O debate, tratado apenas sob o prisma da responsabilidade civil, permanece cingido sobre a valoração do amor ou a resolução em perdas e danos ocasionada diante do desamor, não se vislumbrando da sua imperiosa necessidade na formação da dignidade da pessoa humana.
Não se observa nos relacionamentos de hoje, o diálogo a que se referiu Montoro, entre a “pessoa-sociedade”, o que torna tenso e preocupante o ambiente, pois como ele próprio anunciou, “é através do diálogo que a pessoa toma consciência de sua situação e de seus problemas e é, também, através do diálogo que o grupo social se constitui como realidade sociocultural”, devendo estar, “assim, na origem e na continuidade dinâmica da ‘pessoa’ e da ‘sociedade’. Da pessoa humana real e da sociedade historicamente atuante” (MONTORO, 1995, p. 213).
Diante dessa realidade, surge a necessidade de se resgatar valor para o amor, não apenas em processos de indenização, propostos por filhos contra pais relapsos que lhes negaram o direito ao pleno desenvolvimento[2], sob a égide do abandono moral, mas um valor inerente à família e porque não, à dignidade da pessoa humana, dada sua importância na construção da pessoa, como fim em si mesma.
Considerações Finais
Diante destas ponderações é possível concluir, sem entretanto, ter a pretensão de suplantar outras conclusões e outros fundamentos para o assunto, que o amor representa elemento indispensável e imprescindível para a formação, desenvolvimento e o aperfeiçoamento do princípio da dignidade humana.
Para alcançar o pleno desenvolvimento, que tem início na infância, não resta dúvida que esta fase da vida deve ser protegida e amparada, em especial pelos agentes do direito, para se permitir o avanço de etapas e a conquista da pessoa como fim em si mesma e como ser independente.
O debate sobre a guarda, em especial da guarda compartilhada, deve permear a preocupação dos juristas afeitos ao direito de família, sobretudo nesta época em que a família não mais corresponde ao modelo patriarcal instituído e embasado apenas pelo casamento, devendo ainda, ser observado que o modelo de guarda exclusiva já não corresponde mais o caminho para a conquista da auto-afirmação da pessoa.
Isso, levando em conta, a relevância do afeto nas relações de família, o que começa a ser reconhecido pelos Tribunais superiores, possibilitando assim, discussão acerca dos arestos já estabelecidos. Vê-se por outro lado, com certa preocupação, a resolução do afeto ou melhor, da sua falta, em perdas e danos, haja vista que esta controvérsia deixa ao abandono a pessoa, especialmente a pessoa do Outro, a quem se deve dirigir o afeto na sua formação.
Além disso, cada caso concreto deve ser analisado com a prudência devida, especialmente tendo em vista o ordenamento jurídico que estabelece a guarda exclusiva, como o brasileiro, restando àquele que não a tem, apenas o ‘direito de visitas’, bem como, a submissão, muitas vezes ao capricho e manobras de quem efetivamente detém a guarda da criança.
A vida, não se discute mais, é grande o seu valor. O amor, imprescindível para o aperfeiçoamento da vida também deve ter o seu valor reconhecido.
Notas
Especialista em Direito Empresarial,
Mestrando em Direito na Fundação Eurípides Soares da Rocha – Marília/SP,
Advogado.
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