É direito fundamental assegurado
pela Constituição da República Federativa do Brasil a inviolabilidade do sigilo
de comunicação como regra e, apenas excepcionalmente, a interceptação para fins
de investigação criminal e instrução processual penal.
Conforme prevê explicitamente o art.
5o, XII da CFRB. A grande indagação refere-se ao real significado da
expressão “último caso”, se esta é aplicável somente aos casos de comunicação
telefônica ou engloba também os dados. E quais os dados da comunicação
telefônica ou outros estão fora desta proteção?
Sem maiores pesares
interpretatórios, podemos em face do mesmo dispositivo constitucional
compreende-lo divido em dois grupos: o primeiro grupo relativo ao sigilo das
correspondências escritas e telegráficas; e o segundo grupo relativo aos dados
e comunicações telefônicas.
É bastante comum e frugal o
entendimento de que a interpretação literal de qualquer norma é sempre menos
aconselhável e a pior possível e, quanto a isto bem assevera Carlos Maximiliano:
“O processo gramatical, sobre ser o menos compatível com o progresso, é o mais
antigo (único outrora) (…)” O apego às palavras é um desses fenômenos que, no
Direito como em tudo o mais, caracterizavam a falta de maturidade ao
desenvolvimento intelectual (…) O primitivo hermeneuta fica adstrito aos
domínios dos lexicógrafos e dos gramáticos “. (in Hermenêutica e aplicação do
direito, 10a, edição, Editora Forense, páginas 121/122)”.
Seja qual for o meio de comunicação
de dados, informática, via satélite, fibra ótica, infravermelho está protegido
o sigilo como regra e só excepcionalmente a quebra com acesso ao conteúdo das
comunicações.
O fim originário e especial da norma
é condicionado pelo objetivo geral do Direito e, portanto, mutável com a vida
e, que o Direito deve regular. Por isto, a interpretação literal é inadequada,
pois não atualiza o conteúdo normativo.
Assim, é completamente protegido o
direito à vida, a segurança social, a paz e a tranqüilidade das pessoas
respeitando a dignidade humana, a cidadania e, ainda, a liberdade lato sensu.
O direito fundamental assegurado
particularmente pelo inciso XII do art. 5o, da CFRB assim como os
demais direitos não possuem caráter absoluto a ponto de restringir o alcance da
expressão “último caso” somente as comunicações telefônicas.
É óbvio que é ultrapassado o
conceito de telefonia estatuído pelo Código Brasileiro de Telecomunicações (a
Lei 4.117/62).
Diz o art. 4o, no
Capítulo II da Lei 4.117, de 27/08/1962(Código Brasileiro de Telecomunicações)
in verbis:
“Para efeitos desta lei, constituem serviços
de telecomunicações a transmissão, emissão ou receptação de símbolos,
caracteres, sinais, escritos, imagens, sons ou informações de qualquer natureza
por fio, rádio, eletricidade, meios óticos ou qualquer outro processo eletromagnético”.
Telegrafia é processo de
telecomunicações destinado à transmissão de escritos pelo uso de um código de
sinais. Telefonia é o processo de telecomunicação destinado à transmissão da
palavra falada e de sons.
Conceitos esses que eram adequados em
1962, porém, hoje, perde a sua devida adequação à realidade. A intenção do
legislador pátrio a foi a de restringir à esfera criminal os casos de
interceptação telefônica. Não há que se cogitar em interceptação telefônica no
cível.
Outro aspecto intrigante é quanto se
a interceptação poderia se erigir como prova emprestada? Cumpre logo
defini-la:
Segundo Nelson Nery Junior e Rosa
Maria de Andrade Nery em seu Código de Processo Civil Comentado e
legislação processual extravagante em vigor, 6a revista e atualizada,
2001, Editora Revista dos Tribunais, página 693.
É comentário ao art. 332 do CPC: a
prova emprestada é aquela, embora produzida em outro processo, se pretende
produza efeitos no processo em questão. Sua validade como documento e meio de
prova, desde que reconhecida sua existência por sentença transitada em julgado
(Bentham, Traité dês preuves judiciaires, in “Ouvres”, tit. II,
p.367; Amaral Santos, Prova, v. I, n.208, p.352).
A condição mais importante para que
se dê validade e eficácia à prova emprestada é sua sujeição às pessoas dos
litigantes, cuja conseqüência primordial é a obediência ao contraditório.
Vê-se, portanto, que a prova emprestada do processo realizado entre terceiros é
res inter alios e não produz nenhum efeito senão para aquelas partes
(Nery, Princ, 25, 151/152).
Para a validade da prova emprestada
Luiz Rodrigues Wambier, Flávio Renato C. de Almeida e Eduardo Talamini em obra
intitulada “Curso Avançado de Processo Civil” volume 1, 5 ªedição, 2002,
páginas 444 e 445, é necessário que a prova tenha sido validamente produzida,
no processo de origem, e seja submetida ao crivo do contraditório, no processo
onde se busca surtam os efeitos da prova.
Assim, não pode a sentença se fundar
unicamente em prova emprestada sobre a qual as partes não tenham tido a
oportunidade de se manifestar.
Adiante, os doutrinadores
acrescentam: “A utilização de depoimentos prestados em inquérito policial é
prova inadmissível para fins cíveis, pois é sabido que o inquérito policial é
peça meramente informativa, inquisitorial e sem a garantia do contraditório.
Por mais que se vislumbre o princípio da economia processual, é necessário
cercar a prova de garantias mínimas, entre as quais o contraditório”.
Aliás, a prova emprestada sempre
deverá receber do julgador a carga valorativa compatível com a situação
concreta.
De fato, permanece a questão da
prova emprestada como polêmica e assaz controvertida. Assim se admitirmos in
casu a interceptação telefônica como prova emprestada estaríamos por via
oblíqua burlando a regra constitucional que é expressa de forma taxativo quanto
aos seus fins: de investigação criminal e instrução processual penal.
Assim a vigente regra proclama
definitivamente o sigilo e, só admite excepcionalmente e de acordo com os fins
específicos admitir a ruptura deste. È neste mesmo sentido que se inclinam
também outros doutrinadores como Luiz Flávio Gomes e Vicente Greco
Filho.
Alega o primeiro doutrinador: (…)
“A prova colhida por interceptação telefônica no âmbito penal não pode ser”
emprestada “(ou utilizada) para qualquer outro processo vinculado a outros
ramos do direito (…) essa prova criminal deve permanecer em” segredo de
justiça “. É inconciliável com empréstimo de prova com o segredo de justiça
assegurado no art. 1o”.(Da lei 9.296/96) in Interceptação
telefônica, Ed. RT, páginas 118/119.
O mestre Vicente Greco Filho
justifica seu entendimento alegando que os parâmetros constitucionais são
limitativos e, ainda assevera que a interceptação como finalidade de prova é
somente na sede criminal pode ser utilizada.
Diferentemente Ada Pellegrini
Grinover admite a prova emprestada colhida por meio de interceptação
telefônica desde que o processo penal tenha se desenvolvido entre as mesmas
partes.
Eis suas palavras: “O valor
constitucionalmente protegido pela vedação é a intimidade. Uma vez rompida
esta, licitamente, em face do permissivo constitucional, nada mais resta a
preservar”.
Por fim, conclui a balizada colega
de magistério superior que seria um exagero negar-se a recepção da prova assim
obtida, sob a alegação de que estaria obliquamente vulnerado o comando
constitucional. E proclama que deve prevalecer a lógica do razoável.(in
“As nulidades no processo penal”, 6a. Edição, Editora RT, página
194).
Outra voz autorizada é a do
Professor Paulo Rangel (em
artigo Breves considerações sobre a Lei 9296/96. Jus
Navigandi, Teresina, a .4,n.41, mai200. disponível em http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=195.>.
Acesso em 12.ago.2003.) que apóia a primeira corrente asseverando: “Não podemos
criar situações de legitimidade de uma prova que expressamente é vedada pela
Constituição Federativa da República do Brasil.”
É patente a vontade do legislador em
só admitir excepcionalmente a quebra do sigilo da comunicação visando à
colheita de prova com o fim de se atingir a verdade real no processo (e já que
não há outro meio de fazê-lo).
Não podemos confundir interceptação
telefônica com escuta telefônica. Esta é a captação feita por terceira pessoa
da comunicação entre dois ou mais interlocutores sem o conhecimento de
qualquer deles (grifo nosso).
Aquela é a mesma captação feita por
terceiro entre dois ou mais interlocutores, porém com o conhecimento de
um deles ou de alguns deles.(grifo nosso) e denomina-se escuta telefônica.
É bom frisar que apesar de ser
estranho a comunicação telefônica entre três ou mais pessoas, porém, atualmente
já existe um serviço telefônico oferecido chamado “reunião” e que possibilita
que onze ou mais pessoas possam em determinada ocasião conversarem entre si,
como se estivessem juntas no mesmo local em reunião ou conferência. É possível
que tal ligação telefônica seja interceptada para fins espúrios, como por
exemplo, espionagem industrial, seqüestros, concorrência desleal e, etc…
Assim, só para melhor exemplificar,
se ocorrer interceptação da comunicação por pessoa não participante da reunião
e, sem o conhecimento das demais haverá interceptação telefônica. Porém,
havendo conhecimento de algum participante da reunião, haverá escuta
telefônica.
A escuta ambiental não está
disciplinada na Lei 9.296/96 bem como a gravação telefônica clandestina (aquela
realizada por um dos interlocutores da conversação). Mas podem estar englobadas
pelo inciso X do art. 5o, em confronto com inciso LVI do mesmo art.
5o, da CFRB.
O art. 2o, da Lei
9.296/96 inverteu as condições necessárias para a interceptação telefônica,
olvidando de enumerar em quais casos seriam admissíveis, mas infelizmente não o
fez.
A exigência de indícios razoáveis de
autoria ou participação em infração penal deixa clara a presença do fumus
boni iuris cumulada com a inexistência de outros meios de prova
disponíveis, correspondendo assim ao periculum in mora. Diante tais
pressupostos evidencia-se tanto a necessidade como a urgência da medida cuja
natureza jurídica é cautelar.
Quando a Lei 9.296/96 se refere a
fato investigado claro está a interceptação telefônica somente poderá ser
realizada para apurar fato pretérito e não futuro.
Não poderá ou não deverá ser concedida
a medida cautelar de interceptação telefônica para se investigar a vida de
determinada pessoa, se a mesma vai ou não cometer um ilícito penal mesmo
tratando-se de pessoa com antecedentes criminais.
O dispositivo legal refere-se à
infração penal punida no máximo com pena de detenção exclui todas as
contravenções penais por força do art.5o, da Lei das Contravenções
Penais.
Admitindo-se, portanto somente nos
crimes punidos com reclusão e, portanto, considerados graves. Atualmente em
face da Lei 9.099/95 temos infrações penais de menor as infrações penais de
menor potencial ofensivo com facilitada transação penal visando a
despenalização.
O que significa dizer que não há
crime punido com a pena máxima de reclusão igual ou inferior a um ano.
É inovadora a espécie de infração
penal criada pela Lei dos Juizados Especiais Criminais: a de médio potencial
ofensivo cujo mínimo cominado em abstrato for igual ou inferior a um ano
admitindo, assim, a suspensão condicional do processo.
Há de se cogitar então da real praticidade
em se admitir a interceptação telefônica (mesmo que excepcionalmente) numa
infração penal que, uma vez apurada, será oferecida denúncia com o pedido de
suspensão condicional de processo.
De certo que o legislador não
pretendeu permitir a interceptação a fim de apurar um furto simples que
admitirá uma possível suspensão condicional do processo conforme os termos do
art. 89 da Lei de Juizados Especiais.
No entanto se durante a
interceptação descobrir-se à prática de um roubo praticado pelo investigado. A
prova seria lícita.
Como será lícita toda interceptação
realizada nos estritos limites da lei, tudo que dela advier deve ser
considerado como prova lícita em conseqüência do respeito à ordem jurídica.
E, mesmo se o delito descoberto seja
apenado tão-somente com detenção ter-se-á ainda prova lícita. Impõe a lei, em
seu § 2o, do art. 6o, da Lei de interceptação telefônica
impõe que haja a lavratura de um auto circunstanciado contendo breve resumo das
operações realizadas e informações colhidas e encaminhar ao juiz para que adote
as providências do art. 8o, do mesmo diploma legal.
Se houver conexão entre o fato
descoberto fortuitamente e o investigado aplicar-se-ão as regras atinentes à
conexão prevista nos arts. 76 e seguintes do CPP. Caso contrário, aplica-se à
regra do art. 40 da Lei Processual Penal, ou seja, o juiz remete ao Ministério
Público desde que se trate de crime de ação penal pública.
O legislador da Lei 9.296/96
conferiu legitimidade a autoridade policial e ao MP para requererem a medida
cautelar de interceptação telefônica e, estabeleceu a possibilidade do juiz
concede-la de ofício, porém silenciou sobre a legitimidade do querelante (o
titular exclusivo da ação penal privada).
Acredito que a lei também não
impediu a existência de igual legitimidade, excluindo os delitos apenados com
detenção e, neste caso, excluídos por determinação legal (art. 2o,
III, da Lei 9.296/96).
Assim em se tratando dos delitos
previstos nos arts. 213 e seguintes do CP onde a pena é de reclusão, é
admissível a interceptação telefônica desde que presentes os demais requisitos
exigidos pela lei.
A doutrina se atormenta em frente à
legitimidade conferida ao juiz criminal de conceder de ofício, a medida. Há
alguns autores que entendem ser inconstitucional, pois vulnera o modelo
acusatório do processo.
A CFRB atribui aos juízes que tem
competência pra processar e julgar, mas não para investigar principalmente no
âmbito extraprocessual.
Luiz Flávio Gomes ainda preleciona que “Tomar a iniciativa da prova
compromete psicologicamente o juiz em sua imparcialidade”. Tanto o Professor
Paulo Rangel como a autora ousa divergir, pois entendemos que o princípio do
livre convencimento motivado e o princípio da verdade real estão em perfeita
harmonia com a previsão legal.
No Direito Processual moderno o juiz
está reintegrado de sua própria consciência, baseado até nos termos da
Exposição de Motivos do CPP que decreta que o juiz deixará de ser expectador
inerte da produção de provas, sua intervenção é curial para também ordenar de
ofício, as provas que lhe parecerem úteis ao esclarecimento da verdade.
Nada obsta que se conceda a
interceptação como cautelar incidental e possa ser deferida pelo juiz de ofício
em nome do princípio da verdade real e de acordo com o sistema do livre
convencimento.Ora, se sustentarmos a tese contrária, o Juiz também não mais
poderia decretar prisão preventiva ou ainda busca e apreensão.
É destacável a distinção que no
curso do inquérito policial não pode e não deve o juiz conceder de ofício a
interceptação, porém, no curso do processo nada impede que o faça.
A este respeito Marcellus
Polastri Lima atesta: (…) “na fase inquisitiva preparatória não pode
haver ingerência judicial, a não ser em razão de medidas cautelares e controle
de legalidade, sendo que o destinatário das investigações criminais, em caso de
ação penal pública, conforme a norma constitucional do art. 129, I da Lei
Maior, é sempre o Ministério Público”.(MP e persecução criminal, Ed. Lumen Iuris,
pág. 53).
A natureza jurídica da decisão que
concede ou não a interceptação telefônica deve ser analisada pelo momento em
que é concedida e pelo princípio que a informa. Sendo medida cautelar
preparatória concedida na fase inquisitorial, trata-se assim de ato
judicial.Tratando-se de medida cautelar incidental tratar-se-á de decisão
interlocutória.
A medida cautelar preparatória ou
incidental deve ser concedida sob segredo de justiça e inaudita altera pars.
Como decisão judicial (na fase de inquérito) não cabe recurso por parte da
autoridade policial. Porém, o MP possui a legitimidade para impugnar a decisão
que concede ou não a interceptação telefônica (em quaisquer fases).
Cogita-se ser cabível o mandado de
segurança, pois há necessidade de defender o direito líquido e certo do
Ministério Público em face do art. 129, incisos I, VII, VIII da CRFB.
É ainda recomendável o mandado de
segurança para evitarmos o inconveniente da ausência de contra-razões recursais
caso o intérprete entenda que a medida judicial cabível seja o recurso de
apelação com fulcro no art. 593, II do CPP.
Outra questão é quanto à
possibilidade do assistente de acusação poder ou não requisitar a medida
cautelar de interceptação. E a hipótese se encaixa perfeitamente no art. 271 do
CPP, sendo possível, pois a omissão da lei não impede que o intérprete aplique
a analogia, ou os princípios gerais do direito nos exatos termos do art. 4o,
da LICC e do art. 126 CPC.
Como medida cautelar de caráter
excepcional, com sigilo e com prazo de duração de 15(quinze) dias renovável por
igual tempo, desde que comprovada a indispensabilidade do meio de prova.
A contagem do prazo deve ser regida
pelo art. 10 do CP e não pelo § 1o, do art. 798 do CPP (pois é mais
vantajoso para o réu).
Entende-se pro degravação como sendo
a transcrição da gravação telefônica, representando a documentação do meio de
prova. É mesmo palavra do “jurisdiquês brasileiro” e não do idioma pátrio.
É necessária, portanto a degravação
para que posteriormente o acusado possa exercer o contraditório diferido para
através da competente perícia de espectrograma capaz de comprovar tanto a
autenticidade da voz como a integridade do material onde está gravado.
Mediante o princípio da publicidade
interna restrita exigiu o princípio do contraditório diferido. O contraditório
é dogma constitucional e não pode deixar de ser observado no curso do processo
regularmente instaurado.
O princípio do devido processo legal
(segundo a lei e através da lei) após a colheita da prova, necessária a
elucidação do fato, sem, a qual, o processo será manifestamente nulo. Assim a
indispensabilidade da interceptação telefônica como meio de prova é um dos
requisitos cabais para sua validade.
É mais oportuna ao exercício do
contraditório, a fase após a anexação dos autos apartados ao processo criminal
na fase prevista nos arts. 407 e 502 do CPP. A menção da lei ao art. 538 CPP
(conforme elucida o art. 8o, parágrafo único) é equivocada, pois se
refere aos crimes apenados com detenção quando não se admite a interceptação
telefônica.
Sendo cautelar e de índole
eminentemente processual aplica-se desde de logo sem prejuízo dos atos
praticados na vigência da lei anterior (princípio da imediatidade – art. 2o,
do CPP).
A Lei 9.296, de 24/7/1996 veio
substituir a Lei 4.117/62 regulamentando o inciso XII do art. 5o, da
CFRB. Antes vigorava o sigilo das telecomunicações sem qualquer restrição ou
ressalva. Em paralelo vigia também o art. 57 do Código Brasileiro de
Telecomunicações que in verbis: “Não constitui violação de
telecomunicação:
I – a recepção de telecomunicação
dirigida por quem diretamente ou com cooperação esteja legalmente autorizado;
II – o conhecimento dado;
a) ao destinatário da
telecomunicação ou a seu representante legal;
b) aos intervenientes necessários ao
curso da telecomunicação;
c) ao comandante ou chefe, sob cujas
ordens imediatas estiver servindo;
d) aos fiscais do governo junto aos
concessionários ou permissionários;
e) ao juiz competente, mediante
requisição ou intimação deste.”
Parágrafo único: “Não estão
compreendidas nas proibições contidas nesta lei, as radiocomunicações
destinadas a ser livremente recebidas, as de amadores, as relativas a navios e
aeronaves em perigo, as transmitidas nos casos de calamidade pública”.
Algumas decisões judiciais e
balizadas opiniões doutrinárias sustentavam a compatibilidade do art. 57 do
CBTELECOMUNICAÇÕES com a garantia constitucional. Prevalecendo que nenhuma
norma constitucional instituiu direito absoluto, devendo ser compatibilizada
com todo o sistema jurídico.
Com a CFRB de 1988 pretendendo
aplacar a enorme celeuma esta veio a assegurar o sigilo instituindo a ressalva
nos termos do art. 5o, XII.
Outra polêmica é quanto à recepção
ou não do referido art. 57 ou se haveria ainda a necessidade de norma
específica regulamentadora.
O STF no julgamento do HC 73351-4 SP
em 09/05/1996 concluiu não estar o aludido dispositivo recepcionado,
dependendo, pois o texto constitucional de lei específica para tornar-se
eficaz, de modo a partir de 1988, por falta de regulamentação, e até a edição
de norma legal específica, não se admitira a interceptação em nenhum caso.
A chamada gravação clandestina ou
ambiental não é interceptação, nem está disciplinada pela lei 9.296/96 e,
também inexiste tipo penal que a incrimine.
O sigilo existe em face de terceiros
e não entre os interlocutores, os quais estão liberados se houver justa causa
para a divulgação sua validade como prova dependerá se violou ou não a
privacidade ou intimidade, e se há justa causa para gravação.
A Lei 4.117/62 que institui o
CBTELECOMUNICAÇÕES não foi recepcionado assim encontra-se revogado, ante a
colidência imediata ou discrepância mediata com texto da Carta Magna assim
entende a predominante doutrina e grande parte da jurisprudência nacional.
O STF entendeu que o dispositivo foi
recepcionado, dependendo de regulamentação específica, pois do contrário, não
se admitiria a interceptação em nenhum caso. E, neste contexto veio a Lei
9.296/96 regulamentar parcialmente a questão, pois restam ainda novas celeumas
que somente serão dirimidas através da sábia jurisprudência.
A lei não disciplina a interceptação
realizada por terceiro, mas com o consentimento de um dos interlocutores.
Vicente Greco Filho entende que tanto a gravação clandestina ou
ambiental e a interceptação consentida por um dos interlocutores são
irregulamentáveis, pois que fora do âmbito do inciso XII constitucional doa rt.
5o. e, sua licitude, bem como a de prova dela decorrente, dependerá
do confronto do direito à intimidade, bem como o estado de necessidade e a
defesa de direito.
Não é aplicável a Lei 9.296/96
quanto à autorização judicial porque o Poder Judiciário brasileiro não exerce
função consultiva e, no caso de jurisdição voluntária, atua somente nos casos
expressos em lei.
Vicente Greco Filho consigna a posição no sentido de que os titulares
do sigilo das telecomunicações são os interlocutores e estão protegidos
constitucionalmente, e não o dono do direito de uso da linha telefônica.
Não pode o titular do direito de uso
da linha interceptar gravando ou ouvindo, conversas de terceiros, salvo
evidentemente, se providenciada a interceptação nos termos e com as cautelares
da lei, com autorização judicial.
Excetuando se em virtude de norma
empresarial, inexista o sigilo das comunicações com telefones da empresa do
conhecimento daquele que fala ao telefone. Caso contrário chegaríamos ao
despautério de que aquele que fala em telefone público não teria a garantia de
sigilo das comunicações, pois o titular do direito de uso da linha é do poder
Público.
Portanto, o sujeito passivo ou a
vítima, portanto é a pessoa que fala e não o titular formal do direito de uso
da linha.
A interpretação de Vicente Greco
Filho sobre a expressão “no último caso” refere-se apenas às comunicações
telefônicas. É bom ressaltar que a garantira de sigilo é plena no que tange à
correspondência.
Daí decorre ser inconstitucional o
parágrafo único do art. 1o, da Lei 4.296/96, pois não poderia
estender a possibilidade de interceptação do fluxo de comunicações em sistemas
de informática e telemática.
Já o art. 2o, da referida
lei teve uma lamentável redação não indicando taxativamente os casos em que não
será admitida a interceptação. Dando a entender erroneamente que a
interceptação seja a regra, o que não é verdade, pois a regra é o sigilo e a
interceptação é a exceção.
Quanto à possibilidade de
interceptação telefônica com relação a todos os crimes de reclusão precisa ser
restringida, pois muito ampla. Há de se ponderar a respeito dos bens jurídicos
envolvidos na questão: não se pode sacrificar o sigilo das comunicações
telefônicas para a investigação ou instrução de crime em que não envolva bens
jurídicos de maior valor, daí sua apenação ser reclusão.
Os demais incisos do mesmo artigo
segundo contêm conceitos abertos, imprecisos ou indeterminados, e a primeira
hipótese acrescenta mais uma gradação ao termo indícios no processo penal.
Quanto o conceito de indício segundo
Edgar Magalhães Noronha é prova indireta porque a representação do fato
a provar se faz através de construção lógica-crítica. O CPP define indício no
seu art. 239 e Tornaghi critica tal acepção codificada no que se refere
à indução que consiste passar do particular ao geral, concluindo-se, uma lei
geral.
Ao passo que a dedução dá-se o
contrário: conhece-se a lei geral, sabe-se que um fato produz sempre
determinado efeito, de modo que ele ocorrendo, deduz-se o efeito que se
verificou ou se verificará.
É comum invocar-se a indução ao se
tratar de indício e se distingue indício e presunção. Indício é um fato, ao
passo que a presunção encontra sua fonte na experiência.
Assim, o indício é uma circunstância
certa e que se realizou enquanto que, na presunção, considera-se como realizado
um fato não provado, fundando-se, entretanto na experiência.
O raciocínio indiciário é um
silogismo composto de premissa maior (geral), de premissa menor (o fato
ocorrido em particular) e a conclusão lógica (prática do delito).
Freqüentemente se confundem indício
e presunção já que não poucas vezes as leis de um indício tiram uma presunção.(ex
vi art. 302, IV CPP). É tanto mais relevante e forte o indício quanto mais
estreita for sua relação com o fato.
Alguns doutrinadores têm no indício
uma prova de menor valor, indireta. No entanto Manzini afirma: “Ao que
interessa ao direito processual, ou seja, ao que se refere à livre convicção do
juiz, a força probatória dos indícios, é ao revés, igual a qualquer outro
elemento de prova”.
A verdade é que o indício pode gerar
a certeza e, em outras vezes, apenas uma simples probabilidade. Claro que a
prova indiciária pode ser invalidada não só contra-indícios como por qualquer
outra prova.
Assim o texto da Exposição de
Motivos do CPP reitera plenamente o valor do indício; “Todas as provas são
relativas; nenhuma delas terá ex vi legis, valor decisivo, ou
necessariamente maior prestígio que outra” (item VII).
Para alguns doutrinadores e, ainda
em certas legislações, a prova meramente indiciária, não serve como fundamento
de sentença condenatória, pois esta clama certeza e a prova in casu jamais
poderá levar ao induvidoso. Pois incompatível com o princípio da verdade real.
Exemplo clássico é o sistema legal
norte-americano em particular o processo penal. E na mesma esteira seguem
outros sistemas descendentes do common-law.
É bom frisar que a mera suspeita ou
fatos indeterminados não autorizam a interceptação. É, pois curial que haja
vinculação de alguém ao fato criminoso específico punido com reclusão.
A discussão da licitude ou não da
prova decorre em três casos: em virtude da ilicitude do próprio meio (que não
respeita à integridade da pessoa humana); em virtude da imoralidade ou
impossibilidade de sua produção, e, em virtude da ilicitude de sua origem.
A CFRB foi expressa em não admitir
as provas obtidas por meios ilícitos (que goza de aparente taxatividade), assim
se a interceptação não obedecer aos preceitos legais e os parâmetros constitucionais,
a prova com ela obtida não poderá ser utilizada, bem como as dela conseqüentes.
Também se deve apreciar o valor da
prova obtida por meio de interceptação de acordo com a idoneidade técnica.
Passando o conteúdo probatório pelo crivo do sistema da persuasão racional e,
ainda o confronto com as demais provas e da confiabilidade de quem a colheu.
No caso de gravação para atestar sua
idoneidade técnica, não fica excluída a possibilidade de perícia para
identificação das vozes e para constatação da própria integridade e
autenticidade da fita.
O juízo de legalidade sobre a
interceptação é feito antes da ponderação do valor e de autenticidade técnica.
Já o juízo de autorização de realização da prova é provisório, e sem
contraditório, de modo que o juízo definitivo somente pode ser o do juiz da
causa principal (ainda que orgânica e fisicamente o mesmo) após a atuação da
ampla defesa.
Com as devidas cautelas recomendadas
tanto pela doutrina como pela hermenêutica cabe ressaltar que a interpretação
das normas penal da legislação penal especial visa prover a descrição típica e,
não como mera referência de antijuridicidade, mas como comportamento
selecionado e merecedor de repressão penal, excluindo, portanto da incriminação
de comportamentos não previstos ou insignificantes.
A interpretação restritiva não é se
traduz em ser literal. No que tange aos tipos omissivos, o próprio conceito
normativo de omissão é mesmo baseado no dever jurídico de evitar o resultado;
há de se considerar ainda a exclusão de causalidade em virtude de causa
superveniente relativamente independente.
Vencedora a tese finalista desde da
Reforma Penal Brasileira de 1984, esta demonstrou que tanto o dolo e a culpa
encontram-se no tipo, sublinhando-se particularmente a importância dos
elementos normativos e subjetivos imersos no tipo penal.
Assim, finalmente o art. 10 da
referida lei prevê crime que consiste em realizar a interceptação indevida e
quebrar o segredo de justiça. Porém estes podem ocorrer em momentos diferentes,
por agentes diferentes e que serão tratados separadamente e apropriadamente.
Gostaria de ressaltar por derradeiro
a colaboração dos alunos Leonardo Rebouças e Rita Pereira Novo da UNESA
Campus Méier, que ajudaram no levantamento do material bibliográfico para a
elaboração de ciosa pesquisa e deste modesto artigo. Aproveito o ensejo para
agradecer também a Prof ª Flávia Lages (coordenadora de pesquisa do
campus) e parabenizá-la pelo recente lançamento de seu livro “História do
Direito Geral e Brasil” pela Editora Lumen Iuris que foi
recomendado para leitura para as turmas de Ética Geral e Profissional.
Bibliografia:
GRECO FILHO, Vicente Interceptação
telefônica: considerações sobre a lei 9.296/96, de 24 de julho de 1996 /
Vicente Greco Filho São Paulo: Saraiva, 1996.
RABONEZE, Ricardo Provas obtidas por
meio ilícitos / 2 ed., Porto Alegre, Síntese, 1999.
BURGARELLI, Aclibes Tratado das
Provas Cíveis São Paulo. Juarez de Oliveira, 2000.
WAMBIER, Luiz Rodrigues. Curso avançado de processo civil, volume I
SP, Ed. RT,2002.
NERY JUNIOR, Nelson CPC Comentado e
leg. proc.civil extravagante em vigor: 6 ed.ver.atual. Sp, Ver. Dos Tribunais,
2002.
RANGEL, Paulo. Breves considerações
sobre a Lei 9.296/96 Jus Navigandi, Teresina, a. 4, n.41, mai. 2000. Disponível
em http: // www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?
id=195
LINHARES NETO, Benon. Da escuta
telefônica clandestina. Jus Navigandi, Teresina, a.1 , n.15, jun.1997.
Disponível em: http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=192
GRECO FILHO, Vicente. Direito
processual civil brasileiro.(volumes 1, 2 e 3)
São Paulo. Saraiva, 1998.
Professora universitária, Mestre em Direito, Mestre em Filosofia, pedagoga, advogada, conselheira do Instituto Nacional de Pesquisas Jurídicas.
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