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Aspectos do tratamento do desporto nos âmbitos europeu e espanhol

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Resumo: No contexto europeu, serão pincelados preceitos relativos ao esporte previstos no Tratado de Funcionamento da União Europeia, os ambiciosos planos e recomendações do Livro Branco do Desporto, a Convenção antidoping e a Convenção contra a violência dos espectadores durante as manifestações desportivas e, em particular, durante as partidas de futebol. Em âmbito espanhol, merecerão destaque, além da previsão de proteção conferida pela Constituição Espanhola, a Lei do Desporto, a Lei contra violência, racismo, xenofobia e intolerância no desporto, a Lei antidoping.

Sumário: I. O esporte no âmbito europeu. II Alguns aspectos da matéria no direito espanhol. III Conclusão

I ) O esporte no âmbito europeu

O objetivo de desenvolver e fomentar o esporte no âmbito europeu vem plasmado no artigo 165 do Tratado de Funcionamento da União Européia[1] :

“Artigo 165

 1. (…) A União contribui para a promoção dos aspetos europeus do desporto, tendo simultaneamente em conta as suas especificidades, as suas estruturas baseadas no voluntariado e a sua função social e educativa.

2. A ação da União tem por objetivo:         (…)

—  desenvolver a dimensão europeia do desporto, promovendo a equidade e a abertura nas com­ petições desportivas e a cooperação entre os organismos responsáveis pelo desporto, bem como protegendo a integridade física e moral dos desportistas, nomeadamente dos mais jovens de entre eles.

3. A União e os Estados-Membros incentivarão a cooperação com países terceiros e com as organizações internacionais competentes em matéria de educação e desporto, especialmente com o Conselho da Europa”.

Cite-se também que o Conselho da Europa (fundado em 1949) aprovou dois importantes instrumentos no que toca ao desporto, quais sejam: a) Convenção européia contra a violência dos espectadores durante as manifestações desportivas e, em particular, durante as partidas de futebol, firmada em 1985[2]; b) Convenção antidoping, firmada em 1989[3].

Ainda no âmbito europeu, sobre o tema esporte cite-se também o Livro Branco sobre o Desporto[4], aprovado pela Comissão das Comunidades Europeias  em 11 de julho de 2007, que tem seus objetivos fundamentais listados no seu preâmbulo:

“A presente iniciativa assinala a primeira vez que a Comissão aborda os problemas relacionados com o desporto de forma abrangente. O seu objectivo global consiste em dar uma orientação estratégica ao papel do desporto na Europa, incentivar o debate sobre problemas específicos, aumentar a visibilidade do desporto na elaboração das políticas comunitárias e sensibilizar o público para as necessidades e especificidades do sector. Visa igualmente ilustrar questões importantes, como a aplicação do direito comunitário ao desporto, e definir novas acções de âmbito comunitário em matéria de desporto.”

O livro contém uma série bastante abrangente e ambiciosa de ações (ao que se denomina “Plano de Ação de Pierre de Coubertin) a serem implementadas ou financiadas pela Comissão em matéria de esporte, das quais destacam-se: a) desenvolvimento de diretrizes sobre atividade física e criação de uma rede europeia para a promoção do esporte como um fator benéfico para a saúde; b) melhor coordenação da luta contra a dopagem a nível europeu; c) a concessão de um rótulo europeu às escolas que fomentem a prática de atividades físicas; d) o lançamento de um estudo sobre o voluntariado no desporto;  e) melhorar a inclusão social e a integração por meio do esporte, através de programas e fundos europeus; f) promover o intercâmbio de informações, experiências e boas práticas na prevenção de incidentes violentos e racistas pelos aplicadores das leis e pelas organizações desportivas; g) combater a igualdade de tratamento e a não-discriminação por motivo de nacionalidade entre os integrantes dos Estados-Membros; h) fortalecer o apelo do esporte como um instrumento de política europeia de desenvolvimento; i) promover a ecosustentabilidade no esporte e nos eventos esportivos; j) o desenvolvimento de estatísticas que permitam quantificar o impacto económico do desporto; h) realização de um estudo de financiamento público e privado do desporto; l) uma análise de impacto sobre as atividades dos agentes de jogadores e uma avaliação do valor agregado de uma possível intervenção comunitária neste domínio; m) diálogo mais organizado sobre o desporto em âmbito comunitário, nomeadamente através da organização de um fórum anual sobre o desporto; n) intensificação da cooperação intergovernamental em matéria de desporto; o) promover o estabelecimento de comissões de diálogo social europeu no setor do desporto, e apoio a empregadores e trabalhadores

Chama a atenção a amplitude de temas, ações e recomendações contidos no Livro Branco, como a estreita colaboração entre os setores sanitário, educativo e desportivo para reduzir o sobrepeso, a obesidade e outros riscos à saúde; a luta contra o racismo e a violência em eventos desportivos; o tratamento de diversos aspectos econômicos e organizacionais do esporte, como a livre circulação dos atletas e seu agentes; a proteção de menores; a prevenção do racismo, discriminação contra melhores e nacionais de outros países; a promoção de boas práticas no sistema de licenças dos clubes.

II) Alguns aspectos da matéria no direito espanhol

O esporte aparece na Constituição Espanhola de 1978 em duas importantes passagens, a seguir:

“Artículo 43

1. Se reconoce el derecho a la protección de la salud.


2. Compete a los poderes públicos organizar y tutelar la salud pública a través de medidas preventivas y de las prestaciones y servicios necesarios. La ley establecerá los derechos y deberes de todos al respecto.

3. Los poderes públicos fomentarán la educación sanitaria, la educación física y el deporte. Asimismo, facilitarán la adecuada utilización del ocio.

Artículo 148

1.  Las Comunidades Autónomas podrán asumir competencias en las siguientes materias:(…)

19.a  Promoción del deporte y de la adecuada utilización del ocio. “

Também na Espanha foi publicada a Lei 10/1990, de 15 de outubro, denominada Lei do Desporto[5]. O seu preâmbulo traz que seu objetivo é regular o marco jurídico do esporte, evitando uma intervenção excessiva, tampouco adotando uma postura absenteísta.  Esta lei revoga a anterior Lei 13/1980, de 31 de março (Lei Geral da Cultura Física e do Desporto).

Trouxe importante avanço na regulamentação do tema, e trata de tópicos relevantes e variados como, dentre outros: a) Conselho Superior dos Desportes; b) associações desportivas (como os clubes, as ligas e as Federações); c) competições esportivas; d) Comitê Olímpico Espanhol; e) pesquisa e ensino desportivos; f) controles antidoping (com a criação do Comitê Nacional Antidoping);  prevenção da violência nos espetáculos desportivos, com a criação do Comitê Nacional contra a Violência nos Espetáculos Desportivos, e estabelecimento de sanções aos infratores; g) instalações esportivas; h) regime disciplinar desportivo; i) criação da Assembléia Geral do Desporte; j) previsão de meios extrajudiciais de resolução de conflitos em âmbito desportivo. Ainda, nas disposições adicionais, está prevista a repartição entre regras de competência exclusiva do Estado e regras de competência das comunidades autônomas.

Em 11 de julho e 2007 foi sancionada a Lei 19/2007[6], que trata da violência, racismo, xenofobia e intolerância no desporto. Esta lei trata, em suma, dentre os principais temas: condutas que constituem atos violentos ou de  incitação à violência no esporte; condutas constitutivas de atos racistas, xenófobos  ou intolerantes no esporte; medidas para evitar tais atos; proibição do consumo e venda de bebidas alcóolicas e substâncias tóxicas nas competições esportivas; responsabilidades dos organizadores dos eventos esportivos; condições de acesso e permanência no recinto; controle da venda de entradas; regras de composição e funcionamento do Comitê Estatal contra a Violência, o Racismo, a Xenofobia e a Intolerância no Esporte.  A Lei 19/2007 também traz o regime das infrações e sanções seja dos expectadores, seja dos organizadores, seja de outros sujeitos relacionados aos eventos esportivos, revogando nesse ponto o tratamento conferido, ate então, pela Lei do Desporto.

Diante do panorama internacional (com o Código Mundial antidoping) e europeu (Convenção antidoping), na Espanha foi promulgada a Lei Orgânica 7/2006, denominada  “Lei antidoping”. Entretanto, mudanças ocorridas no Código Mundial Antidoping, em 2009, levaram a uma completa reelaboração dessa lei na Espanha, o que culminou com a promulgação de nova Lei antidoping em 2013 (Lei Orgânica 3/2013, de 20 de junho[7]), que revogou a anterior Lei Orgânica 7/2006.

III) Conclusão

O esporte é matéria que se mostra bastante valorizada, incentivada e regulada no âmbito europeu; mereceu previsão no Tratado de Funcionamento da União Europeia, o qual previu que os países-membros envidariam esforços na sua proteção e incentivo. Ainda, chamam a atenção os ambiciosos planos e recomendações do Livro Branco do Desporto, que abarca temas tão importantes como a  cooperação entre os países e promoção do esporte como um fator benéfico à saúde, a promoção da igualdade de gêneros no desporto, práticas ecossustentáveis, financiamento público e privado. Outros diplomas que demostram tamanha preocupação e valorização e proteção do esporte como bem social são a Convenção antidoping e a Convenção contra a violência dos espectadores durante as manifestações desportivas e, em particular, durante as partidas de futebol.

A Espanha acompanha o espírito comunitário, elevando o esporte a valor protegido constitucionalmente. Além disso, a matéria sofre detalhado regramento na Lei do Desporto, que trata por exemplo da Assembléia Geral do Desporto, do Conselho Nacional do Desporto, do Comitê Olímpico Nacional, de regime disciplinar desportivo e meios de resolução extrajudiciais de conflitos.  Além disso, a Espanha internaliza e regulamenta normas europeias, com as quais se comprometeu, como no caso da Lei contra a violência, racismo, xenofobia e intolerância no desporto, e a Lei antidoping.

 

Notas:
[5] Cf. BOE n. 249, de 17/10/1990.
[6] BOE n. 166, de 12/07/2007.
[7] Consta do preámbulo da lei as principais medidas por ela propostas: “De esta manera, el presente texto contempla una nueva regulación íntegra del marco jurídico aplicable a la protección de la salud y a la lucha contra el dopaje en la actividad deportiva, haciendo hincapié en la importancia de establecer un acabado sistema de protección de la salud que beneficie, desde todos los puntos de vista, a los principales receptores de la presente norma, que son las personas que desarrollan cualquier actividad deportiva.
Siguiendo este argumento, la presente Ley excede con mucho de lo que sería una simple norma antidopaje. Por el contrario, la intención del legislador es incluir un potente sistema de protección de la salud para quienes realicen cualquier actividad deportiva, prestando especial atención al grado de exigencia física y, por tanto, al riesgo que se derive de la actividad deportiva en cuestión, así como a los supuestos en los que participen menores de edad.
Del mismo modo, la nueva Ley trata de configurar el dopaje desde una perspectiva integral y como un elemento más dentro del sistema de protección de la salud de los deportistas, a la par que una lacra que afecta a la protección de la salud de los deportistas, al juego limpio en el deporte y a la propia dimensión ética del mismo”. (Cf. BOE n. 148, de 21/06/2013)

Informações Sobre o Autor

Marco Aurélio Mellucci e Figueiredo

Procurador Federal. Graduado pela Faculdade de Direito do Largo de São Francisco – Universidade de São Paulo USP. Mestre em Direito Público pela Universidad Complutense de Madrid


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Equipe Âmbito Jurídico

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