Comentários sobre os contratos de prestação de serviço e de empreitada

“A maioria dos contratos representam relações obrigacionais complexas peculiarizadas pelo sinalagma (…)”. Gisele Leite

Os contratos de prestação de serviços e de empreitada ganharam notoriedade pela Emenda Constitucional 45 de 2004, posto que preveja a competência da justiça trabalhista quando uma das partes do contrato exerce atividade laborativa, de forma individual.

Então, caso o serviço seja prestado por uma pessoa jurídica, não há de se aplicar a competência da Justiça do Trabalho.

É curial para se entender toda a gênese contratual que se saiba bem todos os conceitos relacionados com a teoria geral do negócio jurídico, vislumbrando que todo contrato é negócio jurídico patrimonial esquadrinhado sob a égide de sua função social e a boa fé objetiva.

A maioria dos contratos representam relações obrigacionais complexas peculiarizadas pelo sinalagma, ou seja, respectividade e proporcionalidade das prestações. Assim essas novas práticas contratuais disciplinadas pelo Código Civil de 2002 passaram a ser alvo de atuação dos profissionais da área trabalhista. Talvez com isso, tais lides merecem a celeridade processual tão distante na seara da justiça comum.

O contrato de prestação de serviços ou a locatio operarum é negócio jurídico pelo qual alguém (o prestador) compromete-se a realizar uma determinada atividade com conteúdo lícito no interesse de outrem (o tomador) mediante certa e determinada remuneração.

Quanto a sua natureza jurídica trata-se contrato bilateral, sinalagmático onde as partes são credoras e devedoras entre si. O tomador é simultaneamente credor do serviço e devedor da remuneração enquanto que o prestador é credor do preço e devedor do serviço.

É contrato oneroso calcado na remuneração chamada de preço ou salário civil. Embora o art. 599 do CC ouse denominar a remuneração de salário, sabemos que essa designação seja privativa para o contrato laboral regulado pela CLT. Corrigindo-se mais tarde para o termo “retribuição” nos arts. 594, 596, 597, 602 e 603 do C.C.

Também é contrato consensual que se aperfeiçoa com a simples vontade dos contratantes. É contrato comutativo ou predeterminado, posto que as partes já saibam logo quais suas prestações, qual o objeto do negócio.

Trata-se ainda de contrato informal posto que não solene não sendo exigida sequer forma escrita para sua plena configuração. O art. 593 do C.C. é aplicável às prestações de serviço não sujeitas à legislação trabalhista ou lei especial.

De modo que se a prestação de serviços envolver continuidade, a dependência e a subordinação merecerá a aplicação da CLT (Decreto-Lei 5.452/1943). E, por outro lado, havendo na prestação de serviço a caracterização de relação de consumo, deverá ser aplicado obrigatoriamente o CDC desde que presentes todos os requisitos alardeados nos arts. 2º e 3º. Da Lei 8.078/90.

Como é sabido e decidido recentemente, é aplicável o CDC quanto aos serviços de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, desde que ausente a natureza trabalhista. (http://conjur.estadao.com.br/static/text/51144,1 )

Ademais, as regras do novo codex civil podem ser aplicadas também às relações laborais de consumo seja de forma complementar, e, desde que não conflitem e afrontem as normas especiais e os princípios básicos dessas searas jurídicas específicas.

E, diante da tão festejada e badalada tese do diálogo das fontes da prestigiada Cláudia Lima Marques e Erik James. Traça o art. 594 do C.C. a vedação sobre o objeto de contrato de prestação de serviços seja ilícito. Verifica-se nesse caso a ilicitude em sentido amplo, nos consignados termos dos arts. 186, 187 do C.C. E a referida prestação de serviço não pode embutir contrariedade à função social do contrato, bem como à boa fé objetiva e aos bons costumes, sob pena de nulidade absoluta da previsão (arts. 187 c/c art. 166, II e VI do C.C.).

A prestação de serviço compreende toda atividade lícita de serviço especializado, realizado com liberdade técnica, sem subordinação e mediante certa retribuição. O art. 595 do C.C. visa dar maior segurança e estabilidade ao negócio pactuado, ressaltando que novo codex reduziu o número de testemunhas para provar o referido contrato. Mas a dita redução justifica-se pela busca da facilitação do Direito Privado (princípio de operabilidade).

Quanto ao preço ou retribuição prevê o art. 596 do C.C. que o mesmo sempre deve estar presente, visando a própria configuração do contrato. Não tendo sido claramente fixada, e não havendo acordo entre os contratantes, a retribuição poderá ser determinada por arbitramento (judicial ou extrajudicial) conforme os costumes locais, o tempo de serviço e qualidade.

Desta forma, pode-se ler o art. 596 do C.C. em consonância e sintonia com o art. 460 da CLT. Certo é que não se pode endossar o enriquecimento sem causa no contrato.

Não há prestação de serviços se não for efetivada e fixada a remuneração posto que é vedado o trabalho escravo e, por essa razão, para evitar a má versação sobre o mesmo, o Código Civil vigente prevê que sua duração máxima será de quatro anos (art. 598 C.C.).

É por conta da função social do contrato que se impõe legitimamente a vedação ao enriquecimento sem causa. Desta forma, em não havendo acordo eventual sobre o arbitramento da retribuição, o ajuste judicial poderá basear-se na realidade social.

Ratificando-se que a parte final do art. 113 do C.C. prevê que os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a boa-fé e os usos e costumes do lugar da celebração.

A real função do contrato não é a segurança jurídica e, sim atender aos interesses dos contratantes. O pagamento do contrato de prestação de serviço far-se-á depois de prestado o serviço, se por convenção ou costume não houver sido pactuado diferentemente. E, nada obsta que haja o adiantamento da remuneração.

Ressalte-se que o costume mencionado no art. 597 do C.C. é o secundum legem.

Tanto a doutrina como jurisprudência sempre enxergaram que se a avença for superior a quatro anos, o contrato de prestação de serviço deve se reputado como extinto em relação ao excesso, e, diante do princípio da conservação dos contratos, a extinção contratual é ainda a ultima ratio.

A limitação temporal visa a não mascarar um verdadeiro contrato de trabalho, e como todos os elementos da relação de emprego. E, nesse caso, aplica-se o art. 167 do C.C., pois há simulação.

E sendo assim, a prestação de serviço seria negócio simulado, que é nula, mas será válido o contrato de trabalho (negócio dissimulado) que acabará gerando efeitos.

O art. 599 do C.C. cogita da extinção do contrato de prestação de serviços. E, se não mencionado o prazo, se respeitará como prazo indeterminado.

Em verdade, o art. 599 do C.C. trata de resolução embora o notável doutrinador e professor Flávio Tartuce discorde e aponte eu se trata realmente de resilição unilateral.

Isso porque a resolução é forma extintiva contratual por motivo posterior à celebração do contrato e em virtude de descumprimento. Pode-se perceber conforme aponta Tartuce que o art. 599 do C.C. revela um direito potestativo que o contratante tem em função à extinção (art. 473 do C.C.).

O parágrafo único do art. 599 do C.C. traz prazos específicos para a denúncia do contrato, ou seja, prazos para o aviso prévio. O comando legal explicita prazos para o exercício do dever de informar pela parte contratante como um dos deveres anexos ou laterais diretamente relacionados com a boa fé objetiva.

Não sendo respeitados tais prazos para o aviso prévio, poderá a outra parte pleitear perdas e danos (arts. 402 a 404 do C.C.).

Convém ainda observar a similitude com o art. 487 da CLT concernente ao aviso prévio.

É possível o contrato de prestação de serviços sem prazo, como também é possível o contrato de prazo determinado. O art. 600 do C.C. prevê que não se contabiliza no prazo do contrato, o tempo em que o prestador do serviço, por culpa sua, deixou de servir.

E se o motivo for alheio à vontade do prestador, ou sem sua culpa, o respectivo tempo é computado no prazo contratual. Mas o tempo em que o prestador deixa de cumprir por sua culpa exclusiva, por exemplo, ausência deliberada ao trabalho, não se contará no prazo contratual.

Os arts. 602 e 603 do C.C. trazem regras específicas quanto à rescisão contratual. Pelo art. 602 do C.C., o prestador de serviço contratado por tempo certo ou por obra determinada não pode se ausentar ou se despedir, sem justa causa, antes de preenchido o tempo, ou concluída da obra.

Se o prestador se despedir por justa causa terá o direito à retribuição vencida, mas deverá pagar perdas e danos ao tomador de serviços. O mesmo se aplica ao prestador que for despedido por justa causa. Vige também regra similar no art. 480 da CLT.

Já pelo art. 603 do C.C., sobre a despedida sem justa causa, a outra parte será obrigada a pagar-lhe por inteiro a retribuição vencida e, por metade a que lhe tocaria ao termo final do contrato.

O valor da metade da prestação de serviços serve como antecipação do pagamento das perdas e danos materiais. Quanto aos danos morais, esses podem ser pleiteados, independentemente do dispositivo legal, e, não admitem nenhuma tarifação legal.

Constam propostas de alteração dos referidos artigos do Código Civil de 2002 por conta do PL 7312 de 07/11/2002 que releva a denúncia imotivada, e reforça a responsabilidade por perdas e danos.

Tartuce entende que a referida proposta de alteração perdeu sua razão de ser em face da EC 45/ 2004, com o deslocamento da competência para a Justiça do Trabalho quanto ao serviço prestado por pessoa natural ou por profissional liberal.

A expressão “justa causa” constante do Código Civil constitui cláusula geral podendo a CLT auxiliar no seu preenchimento a bem da tese do “diálogo das fontes de direitos”.

Para os casos em que o prestador é pessoa jurídica não haverá tal incidência. Findo o contrato por seu termo final, o prestador de serviço pode exigir da outra parte a declaração de que esse contrato está extinto e quitado.

Igual direito também lhe cabe se for despedido sem justa causa, ou se tiver havido motivo justo para deixar o serviço (art. 604 do C.C.). O direito à informação é intimamente conexo com a boa fé objetiva.

O art. 605 do C.C. prevê ainda que o tomador não poderá transferir a outrem o direito aos serviços ajustados. Por outro lado, o prestador de serviços, sem a concordância da outra parte, não poderá substituir-se para a atuação contratada.

Pelo referido dispositivo, veda-se a cessão de contrato, sem autorização para tanto, uma vez que é intuitu personae, um contrato personalíssimo. Sendo inválida a cessão contratual não autorizada, podendo gerar a rescisão contratual com as perdas e danos.

Caso o serviço seja implementado por quem não possui habilitação ou não tem atributos profissionais ou técnicos exigidos por lei, não poderá quem os prestou cobrar a retribuição avençada pelo trabalho executado.

Mas, se resultar benefício para outra parte, o juiz poderá atribuir compensação razoável a quem prestou, desde que tenha agido de boa fé (art. 606 do C.C.).

O parágrafo único do art. 606 do C.C. prevê que não se aplica a proibição  na hipótese em que esta resultar de lei, de ordem pública, como é o caso de serviços de saúde (médicos, enfermeiros, dentistas e, etc.). É nítido o sentido ético dessa norma que é muito relevante.

Como é contrato personalíssimo, o contrato de prestação de serviços encerra-se com a morte de qualquer uma das partes (art. 607 do C.C.). E o mesmo ocorrerá pelo escoamento do prazo, pela conclusão da obra, pela rescisão contratual mediante aviso prévio, pelo inadimplemento de qualquer dos contratantes, pela impossibilidade de continuação do contrato, motivada por força maior. Vide sobre o tema o artigo no link: http://jusvi.com/doutrinas_e_pecas/ver/20117

A aplicação direta desse comando legal pode ocorrer no famoso e notório caso em que certo cantor carioca fora aliciado por uma cervejaria enquanto tinha contrato de publicidade com outra. A empresa aliciadora responderá perante a parte contratual, por desprezar a existência do contrato já pactuado (e desrespeitar a função externa da função social dos contratos).

Prevê por derradeiro que o art. 609 do C.C. que a alienação do prédio agrícola onde a prestação dos serviços se opera, não importa em rescisão contratual, ressalvando-se ao prestador de serviço a opção entre continuá-lo com o adquirente ou com o primitivo contratante.

Para Marco Aurélio Bezerra de Melo jaz aqui uma exceção ao princípio da relatividade dos efeitos contratuais, pois ao gerar obrigação de eficácia real para o adquirente no caso do prestador queira continuar executando o serviço contratado.

A lei defere ao prestador de serviços direito potestativo em optar a continuar com o contrato anterior, ou permanecer com seu trabalho no prédio agrícola.

Passemos mormente tratar sobre a empreitada que é forma contratual onde uma das partes se obriga sem subordinação ou dependência, a realizar certo trabalho para a outra parte, comumente denominada de dono da obra, ou seja, com material próprio  ou por este fornecido, mediante remuneração global ou proporcional ao trabalho executado.

O contrato de empreitada se caracteriza por sua finalidade, pelo resultado alcançado, distinguindo-se do contrato de trabalho (regido pela CLT) e, distinto também do contrato de prestação de serviços onde se assume obrigação de meio (como é o caso, por exemplo, dos profissionais liberais).

Por razões históricas, figura por força do direito romano a empreitada entre os tipos de locação, era a chamada locatio-conductio operis, mas já existia então a distinção quanto à locatio-conductio operarum.

De fato, não se pode confundir a empreitada com o contrato de trabalho. Sobre este último esclarece Délio Maranhão que o contrato de trabalho stricto sensu é negócio jurídico pelo qual uma pessoa física (empregado) se obriga mediante o pagamento de uma contraprestação (salário) a prestar trabalho não eventual em proveito de outra pessoa física ou jurídica (empregador), a quem fica juridicamente subordinada.

Registre-se que no contrato de trabalho e no contrato que envolva relação consumerista há uma proteção toda especial para o trabalhador e para o consumidor em razão de sua presumida hipossuficiência. Há ainda o trabalho temporário regido pela Lei 8.019 /1974.

Apesar de que os contratos de empreitada, de prestação de serviços e o contrato de trabalho são todos esses muito próximos entre si, a prestação da atividade na empreitada caracteriza-se nitidamente pela circunstância de se considerar o seu resultado final, e não propriamente a atividade como objeto da relação contratual.

No contrato de serviços se visa atividade como prestação enquanto que na empreitada objetiva-se a obra executada, figurando o trabalho como prestação mediata ou meio de consecução.

Na empreitada mista que além do trabalho há também o fornecimento de materiais pelo empreiteiro, o contrato se aproxima ao de compra e venda de coisa futura. Mas, deste se dista, na medida em que na venda se visa uma obrigação de dar (traditio) enquanto que na empreitada mira-se a produção da obra.

È relevante distinguirmos corretamente a obrigação de fazer (a realização da obra) da obrigação de dar (de entregar a coisa depois de concluída), verificando que esta última é vinculada a primeira e que não se confunde com a obrigação de dar que coroa a execução de contrato de compra e venda.

Orlando Gomes assinala que a atual tendência é conferir a empreitada um tratamento de mera modalidade locatícia com características autônomas.

Há no direito positivo brasileiro duas espécies de empreitada, a simplesmente de lavor ou de mão-de-obra e a que se fornece também os materiais necessários à sua execução (art. 610 do C.C.).

Silente o contrato sua modalidade, vige a presunção de que seja apenas de lavor. Tal distinção é relevantíssima para se avaliar os efeitos contratuais da empreitada.

São características jurídicas da empreitada, o fato de ser contrato: bilateral, oneroso, consensual, comutativo, como regra, podendo ser aleatório, se assim for ajustado expressamente.

Como oneroso que é a remuneração ou preço é essencial seja estipulado em dinheiro, ou outra espécie, seja em uma cota-parte da própria obra a realizar-se. E nada impede a estipulação tácita.

E em razão do preço se classifica a empreitada em duas modalidades: . ) a que a remuneração é fixada pra a obra inteira, estipulando um preço global, e que os franceses chamam de marché à fortait. Onde não é compatível o parcelamento. E também não deixa de ser global se o preço for ajustado para ser feito pagamento escalonado, desde que determinado em função da obra como conjunto;  .) aquela em que a fixação do preço atende ao fracionamento da obra ( marché sur devir). E a fórmula de sua fixação é diversa, pois cabe o pagamento por unidade, ou por parte concluída (art. 614 do C.C.).

A empreitada com reajustamento é a que permite a variação do preço em razão do aumento ou diminuição valorativa de seus componentes. Não há dúvida quanto a plena liceidade desta estipulação e, o art. 620 CC permite-a principalmente quando a variação for superior a 10% do preço global convencionado.

Há, outrossim, a empreitada sem reajustamento ou por preço fixo. E leia-se que no silêncio das partes, presume-se a empreitada sem reajustamento. E tal direito ao preço fixo que tem o dono da obra permanece mesmo que sejam introduzidas modificações no projeto aprovado.

A empreitada por preço de custo é aquela em que o empreiteiro resta obrigado a realizar o trabalho, sob sua responsabilidade com fornecimento de materiais e pagamento de mão-de-obra, mediante reembolso, acrescido de lucro assegurado.

Tal modalidade é compatível com marché sur devis, mas não comporta o marché à fortait onde a remuneração ou preço é ajustado para o todo.

É admissível a aplicação na empreitada da teoria da imprevisão e da cláusula rebus sic stantibus (arts. 478 a 480 do C.C.) situando-se o busilis na apuração de seus requisitos.

Nem mesmo o art. 619 do C.C. ergue-se como obstáculo posto que a proibição ali embutida seja para alteração do preço em razão do custo salarial ou de materiais.

Gera a empreitada diferentes obrigações aos seus contratantes. Por parte do dono da obra, sua primeira obrigação é recebê-la conforme o ajustado, não podendo arbitrariamente enjeitá-la.

Todavia, se o empreiteiro se afastou de suas especificações que são minuciadas, caberá a recusa, posto que o dono da obra não tenha obrigação de receber em partes ou com imperfeições (art. 615 do C.C.) a menos que queira receber no estado, admitindo-se abatimento no preço (art. 616 do C.C.).

Em razão dessa obrigação, possui o empreiteiro o direito de constituir o dono da obra em mora, ou consigná-la judicialmente.

Admite-se, porém o recebimento provisório para verificação, pontifica Eduardo Espínola e, nesse caso, resta em aberto a aprovação. Efetivado o recebimento, presume-se ipso facto aprovada a conduta do empreiteiro quer pela exe4cução quer pela responsabilidade pelos defeitos aparentes. Perdura a garantia em face dos vícios ocultos e pela solidez e segurança.

Se a obra for composta de partes autônomas, ou determinada por medida, o empreiteiro terá direito a que se verifique também por medida, presumindo-s verificado tudo o que se pagou (art. 614 do C.C.).

O C.C. presume ainda que foi aprovado efetivamente e, verificado aquilo que foi medido e em 30(trinta) dias não tiver o dono da obra, ou seu preposto, apontado nenhum vício ou defeito (vide § 2º. Do art. 614 do C.C.).

É obrigação fundamental do dono da obra, pagar o preço fixado contratualmente, honrando com respectivos vencimentos. E a falta de pagamento pode acarretar rescisão contratual com perdas e danos; ou na suspensão da execução, por força da exceptio non adimpleti contractus, ou na sua cobrança executiva ou no direito de retenção.

A obrigação ao preço estipulado não comporta reajuste, salvo estipulação expressa do contrário. Não são lícitos acréscimos a guisa de alterações sofridas nos planos primitivos, excetos se autorizadas expressamente pelo dono da obra (art. 619 do C.C.).

Na falta da fixação do preço ou tarifa preestabelecida é possível o arbitramento judicial ou extrajudicial levando-se em contra a qualidade do serviço e, o tempo demandado para sua execução, além do emprenho pessoal e profissional do empreiteiro.

Nas empreitadas de lavor, os materiais devem ser postos onde seja conveniente à execução, de forma tempestiva. E cabe, ao empreiteiro reclamar e apontar defeitos que possam comprometer a execução do trabalho. Faltando o cumprimento desse dever, é legítima a prorrogação da data de entrega, ou o ressarcimento do empreiteiro das perdas e danos que sofrer.

O empreiteiro assume a priori a obrigação de executar a obra conforme as regras técnicas e normas regulamentares, entregando-a na forma e nos prazos estipulados, sob pena de responder pelas conseqüências de seu inadimplemento, seja a rescisão do contrato com perdas e danos.

Na falta da data a ser efetivada a entrega, presume-se que a obra tem de ser concluída em tempo normal para outras similares. É trivial no contrato de empreitada estabelecer a retenção da prestação final, ou dedução proporcional a título de caução, que o empreiteiro somente levantará após a verificação da obra, tal apuração é freqüente na execução de obras públicas.

Em episódio recente, no desabamento nas obras do metrô de São Paulo, verificamos a responsabilidade civil objetiva do consorcio (empreiteiro), sem embaraço da responsabilidade civil objetiva também do governo estadual paulista que incidiu notoriamente em culpa in eligendo e culpa in vigilando.

O dever de executar com exatidão a obra encomendada e gera outro dever correlato de corrigir os vícios e defeitos que por ventura apresente. Se o empreiteiro receber os materiais do dono da obra, é obrigado a pagar aqueles, que por imperícia, negligência ou por culpa sua, forem danificados (art. 617 do C.C.).

Por não se presumir ser intuitu personae, é possível a subempreitada conforme dispõe o art. 626 do C.C. pode o empreiteiro transferir a outrem as suas obrigações sendo comum a subempreitada parcial.

A subempreitada total é admitida sempre que o texto contratual não contiver ajuste em função das qualidades pessoais do empreiteiro. Na subempreitada a fim de se resguardar os direitos dos empregados e evitar fraudes decorrentes da insolvência dos subemepreiteiros a lei trabalhista (art. 455 da CLT) admite que os empregados do subempreiteiro possam reclamar as obrigações trabalhistas do empreiteiro principal garantindo-se a este, a ação de regresso contra o subempreiteiro.

Não é necessário que os contratantes estabeleçam a vedação a subempreitada expressamente, basta que se possa deduzir que foi celebrado intuitu personae.

Mas de qualquer modo responderá o empreiteiro pela má execução da obra posto que suas obrigações subsistem. A responsabilidade do empreiteiro é objetiva, posto que inerente da culpa deste, e, durante o prazo de cinco anos, pela solidez e segurança da obra, tanto em razão dos materiais, quanto ao solo (art. 618 do C.C.).

Esse prazo não pode ser reduzido pela vontade das partes. O Código Civil de 2002 fixou prazo decadencial para propositura de ação indenizatória contra o empreiteiro, de 180 (cento e oitenta) dias a partir do aparecimento do vício ou defeito.

O art. 618 do C.C. criou um problema, pois agravou a posição jurídica do dono da obra, em comparação do código civil anterior. A leitura fria do parágrafo único do art. 618 do C.C. sugere que se houver defeito aparecendo no segundo ano após a entrega da obra, o seu dono possui o prazo de 180 dias para propor a competente ação indenizatória, sob pena de decair seu direito. Apesar de ainda não ter se esgotado o prazo de cinco anos de garantia.

O que significa um flagrante retrocesso em termos da responsabilidade civil do empreiteiro. Se, a empreitada configurar relação de consumo não se aplicará o parágrafo único do art. 618 do C.C. e, sim, o art. 27 da Lei 8.078/90 (CDC) em face da proteção especial voltada para o consumidor (conforme o art. 5º, XXXII da CF).

Todavia, persiste o problema nas empreitadas que não se configurem como relação de consumo.

Caio Mário atualizado por Regis Fichtner aponta que a melhor interpretação não afasta a garantia de prazo irredutível de cinco anos prevista no caput do art. 618 do C.C. Portanto, o prazo de 180 dias é aplicável apenas após fundo os cinco anos.

É oportuno que frisemos a responsabilidade do empreiteiro perante terceiros pelos danos que causar e, pelos decorrentes de seus empregados ou prepostos. Embora que na falta de recursos de empreiteiro aptos a ressarcir, há quem pretenda que deve responder o proprietário, por ser socialmente mais apto (demogue), pois ao escolher empreiteiro financeiramente inidôneo, incorreu em culpa in eligendo.

Na empreitada mista, correm todos os riscos por conta do empreiteiro até a entrega da obra. Se o dono incorrer em mora, tais riscos se transferem para este (art. 611 do C.C.).

Esmiuçaremos as oito hipóteses de cessação do contrato de empreitada, a saber:

1. pela execução da obra, senda esta concluída e recebida, quando se extinguem as obrigações das partes contratantes;

2. pela morte do empreiteiro, se celebrado intuitu personae, caso contrário, continua com seus sucessores;

3. pela resilição bilateral, em virtude da mesma vontade que inicialmente as vinculou, desatando o liame contratual;

4. pela resolução causada pelo inadimplemento de um dos contratantes, com ressarcimento de perdas e danos.

5. pela falência do empreiteiro, ressalvado o disposto na Lei Falimentar (art. 117 da Lei 11.101/2005), que prevê que o síndico ou administrador judicial notificado para que declare se cumpre ou não o contrato.

6. pela rescisão contratual por parte do dono da obra, com a indenização ao empreiteiro das despesas havidas, o valor da mão-de-obra, e, ressarcimento do lucro razoável que poderia ter tido (lucro cessante) consoante o art. 623 do C.C. Essa faculdade é transmissível hereditariamente;

7. pela excessiva onerosidade superveniente da obra quando surgirem dificuldades incontornáveis de execução e o dono da obra se opuser ao reajuste do preço;

8. pela desproporcionalidade entre o vulto e a natureza da obra e as modificações exigidas pelo seu dono, a critério do empreiteiro ainda que o dono da obra se dispunha a arcar com o acréscimo do preço;

Se houver suspensão da obra sem justa causa pelo empreiteiro, responderá por perdas e danos (art. 624 do C.C.), tendo o art. 625 do mesmo diploma legal previsto expressamente três hipóteses em que terá direito o empreiteiro de suspender a obra.

Dispõe o art. 622 do C.C. sobre o projetista que responde apenas pela solidez e segurança da obra na forma do art. 618 do C.C., naquilo que diga respeito a características do projeto. Pode o projetista se opor contra as modificações de vulto em seu projeto, exceto se por motivos supervenientes ou razões de ordem técnica fique comprovada a inconveniência ou a excessiva onerosidade da execução do projeto em sua forma original (art. 621 do C.C.).

É regra típica do direito autoral prevista no art. 26 da Lei 9.610/98 que não concede ao autor do projeto arquitetônico o direito de impedir modificações no projeto, mas apenas o direito de repudiar a sua autoria caso sejam efetivadas sem o seu consentimento, podendo ser indenizado pelos prejuízos.

Esclareça-se que o vigente Código Civil não revoga o dispositivo da Lei dos Direitos autorais supracitada, mas possibilita que o projetista impeça a execução da obra que está se distanciando de seu original projeto, restando este optar pelo repúdio e eventual indenização por perdas e danos que tiver sofrido.

Sinceramente espero que nessas poucas laudas realmente tenha promovido maior esclarecimento sobre os contratos em tela e, ainda, recomendo a leitura dos seguintes artigos jurídicos acessíveis pelos links abaixo:

http://jusvi.com/doutrinas_e_pecas/ver/22364

http://jusvi.com/doutrinas_e_pecas/ver/22700

http://jusvi.com/doutrinas_e_pecas/ver/19847

http://jusvi.com/doutrinas_e_pecas/ver/17502

http://jusvi.com/doutrinas_e_pecas/ver/22636

http://jusvi.com/doutrinas_e_pecas/ver/20560

http://jusvi.com/doutrinas_e_pecas/ver/17173

http://jusvi.com/doutrinas_e_pecas/ver/18908

 

Referências

GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo curso de direito civil, São Paulo, Editora Saraiva, 2005.
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil, Rio de Janeiro, Forense, 2005. volume III, 12ª edição.

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil: direito das obrigações: parte especial, volume 6, tomo I contratos, Série Sinopses Jurídicas, 7ª. Edição, São Paulo, Editora Saraiva, 2004.

TARTUCE, Flávio. Direito Civil. Série Concursos Públicos, volume três. Editora Método, São Paulo, 2006.

WALD, Arnoldo. Curso de Direito Civil Brasileiro – Obrigações e Contratos. 12 ed. São Paulo, RT, 1995, volume II.

VENOSA, Silvio Salvo. Direito civil: teoria geral das obrigações e teoria geral dos contratos. 5 ed.;. São Paulo, Atlas, 2005(Coleção Direito Civil volume II).

SOARES, Paulo Brasil Dill. Código do Consumidor Comentado. 6a. edição, Rio de Janeiro, Editora Destaque, 2000.

 


 

Informações Sobre o Autor

 

Gisele Leite

 

Professora universitária, Mestre em Direito, Mestre em Filosofia, pedagoga, advogada, conselheira do Instituto Nacional de Pesquisas Jurídicas.

 


 

Equipe Âmbito Jurídico

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