Sumário: Introdução; Cap. I Breve histórico do direito penal; Cap. II Das penas; Cap. III A realidade do sistema penitenciário brasileiro; Cap. IV Sugestões para minorar a crise no sistema penitenciário brasileiro; Conclusão; Referências Bibliográficas.
Resumo: Este trabalho inicia-se com uma breve narrativa da evolução histórica do direito penal, começando pelo período da vingança em que não se admitia a existência de um sistema normativo para reger a vida em sociedade, onde a pena se revelava como uma forma de vingança, até os dias atuais em que os penalistas tem-se preocupado mais com a pessoa do condenado sob uma perspectiva humanista, fundado na idéia de que a sociedade apenas é defendida á medida que se proporciona a adaptação do condenado ao convívio social. Num segundo capítulo, destaca-se a pena como sanção imposta a alguém em razão da violabilidade da norma, a qual se caracteriza pelos princípios da legalidade, personalidade, inderrogabilidade e proporcionalidade. Além disso, é constado que sua finalidade é a retribuição ao mal praticado e a prevenção, tanto em seu aspecto geral como especial. Necessário se faz dar maior realce a prevenção especial, no sentido de oferecer ao condenado condições para sua recuperação social. É feita uma análise sobre a classificação das penas que são a privativa de liberdade (reclusão e detenção) e restritivas de direitos (prestações pecuniárias, perda de bens e valores, prestação de serviço à comunidade, ou entidades públicas e limitação de fim de semana); de multa e suspensão condicional da pena. Num terceiro capítulo, objetivando analisar se o sistema de execução penal proporciona a recuperação do indivíduo, é feito um levantamento da realidade do sistema penitenciário brasileiro. É comprovado através de dados estatísticos, que a superlotação carcerária, bem como, à falta de uma estrutura física condigna e condições de vida adequada contribuem para a formação de um sistema de violência, que envolve não só os presos, como também, policiais e agentes penitenciários. Constata-se que todos esses fatores produzem grande influência no comportamento e na vida do preso, o que acaba refletindo diretamente na coletividade de um modo geral. O quarto e último capitulo são apresentadas algumas sugestões para minorar a grave crise que afeta o sistema penitenciário brasileiro, como aplicação de penas e medidas alternativas à prisão, introdução dos modelos de privatização e terceirização, desde que garantam as funções jurisdicionais do Estado, reformas sócio-econômicas que amenizem o enorme surto da criminalidade, sobretudo da violência, construção de novos estabelecimentos prisionais e recuperação dos estabelecimentos já existentes, como também, efetiva execução do programa nacional de direitos humanos, principalmente no que tange aos direitos dos detentos.
Palavras chaves: crime, execução penal, pena, prisão e ressocialização.
Introdução
A problemática do sistema de execução penal brasileiro vem sendo objeto de preocupação, inclusive de organismos internacionais, em função das inúmeras incompatibilidades que podem ser encontradas entre o sistema primitivo carcerário e as funções legais que se propõe a cumprir, no que se refere ao tratamento dos apenados.
A atual situação, não só tem aumentado as críticas dirigidas contra o sistema penitenciário, como também tem conduzido a idéia de que o mesmo se encontra em crise, necessitando de um sistema prisional reformulado, e, diverso do atual.
O declínio do sistema carcerário vigente no Brasil, fundamenta-se, basicamente, nos altos custos do encarceramento e na falta de investimentos no setor por parte da administração pública, o que ocasiona uma superlotação das prisões. A partir desses pontos relevantes, decorrem problemas que termina por marcar definitivamente a pessoa presa, ficando esta impossibilitada de retomar, num futuro próximo, seu fluxo de vida normal.
Nesse sentido, o trabalho ora apresentado se propõe a estudar os problemas dos presídios brasileiros, bem como, apontar os questionamentos a cerca do modelo de execução penal, que tem se mostrado ineficiente para atender as expectativas sociais relativas à recuperação do condenado para encarar a realidade do sistema penitenciário brasileiro.
Capitulo I
Breve histórico do direito penal
1. Período da Vingança
Iniciou-se nas origens da humanidade e prolonga-se até o século XVIII. Não se admitia nos tempos primitivos a existência de um sistema normativo para reger a vida em sociedade. Havia um ambiente mágico e religioso que envolvia os grupos sociais da época. Estes grupos encaravam fenômenos naturais como a seca, peste, erupções vulcânicas como castigos divinos.
Magalhães Noronha assevera que:
(…).deve advertir-se que esses períodos não se sucedem integralmente, ou melhor, advindo um, nem por isso o outro desaparece logo ocorrendo então, a existência concomitante dos princípios característicos de cada um: uma fase penetra a outra e, durante tempos, esta ainda permanece ao seu lado (NORONHA, 1977, p. 28).
Este período foi dividido em três fases:
– Vingança Privada, neste período poderia envolver desde o indivíduo isolado até o seu grupo social, com sangrentas batalhas, causando, várias vezes, a completa eliminação de grupos. Se o agressor fosse membro da tribo poderia ser condenado à perda da paz ou banimento, deixando-o abandonado à mercê de outros grupos, que fatalmente seria morto. Quando a violação fosse praticada por alguém estranho à tribo seria condenado a vingança de sangue, verdadeira guerra grupal. O revide não aguardava proporção com a ofensa, sucedendo-se, consequentemente, lutas acirradas entre grupos e famílias.
No entanto, com o passar do tempo, com o aumento do número de infratores, as populações deformavam-se pela perda de seus membros. Surge, então o Talião como uma Evolução Social que consistia em aplicar no delinqüente ou ofensor o mal que ele causou ao ofendido, na mesma proporção.
Posteriormente, surge a composição, que vem a ser, a transação feita entre o agressor e o agredido, visando substituir o castigo pela reparação do dano. O ofensor se exonerava da punição com a compra de sua liberdade através de moeda, gado, armas, etc. Foi adotado pelo Código de Hamurabi, Pelo Pentateuco e pelo Código de Manu (Índia).
– Vingança Divina, esta fase caracteriza-se pela influência decisiva da religião na vida dos povos antigos. As penas aplicadas visavam a satisfação da divindade ofendida, pela prática do crime e para a purificação da alma do criminoso. O castigo ou oferenda que ficava a cargo dos sacerdotes era altamente cruéis, severas e desumanas, porque acreditavam que o castigo deveria ser proporcional à grandeza do deus ofendido. Esses princípios foram adotados pela Índia (Código de Manu), Babilônia (Código de Hamurabi), na Pérsia (Avesta), no Egito (Cinco Livros) e por Israel (Pentateuco).
– Vingança Pública, com uma maior organização social, reconhecia-se a autoridade de um chefe ou da assembléia a quem era concedido o Poder de castigar em nome dos súditos. Através de penas severas, cruéis e intimidativas visava-se à segurança do príncipe ou soberano e sua manutenção no poder.
Não era mais o ofendido ou mesmo os sacerdotes os agentes responsáveis pela punição, mas o soberano (rei, príncipe ou regente). Este exercia sua autoridade em nome de Deus e cometia inúmeras arbitrariedades.
Por vários séculos, porém a repressão penal continuou a ser exercida através da Pena de Morte, executadas pelas formas mais cruéis e de outras sanções desumanas e infamantes tais como mutilação, acoites, confiscação dos bens, torturas, etc.
2. Período Humanitário
Foi no decorrer no Iluminismo que teve início este período, no fim do Século XVIII, momento que é caracterizado pela busca da reforma das leis e da administração da justiça penal.
Em 1764, O filósofo César Bonesana, Marquês de Beccaria, foi um dos principais representantes deste movimento, sob a influência dos princípios pregados por Rosseau e Montesquieu, publicando a famosa obra Dei Delitti e delle Pene (Dos Delitos e das Penas).
Os princípios básicos pregado pelo jovem aristocrata de Milão firmaram o alicerce do Direito Penal moderno, e muitos desses princípios foram adotados pela Declaração dos Direitos do Homem, da Revolução Francesa.
Beccaria, em sua obra, reage ao desumano panorama penal vigente à época propondo novo fundamento à Justiça Penal, ou seja, um fim utilitário e político limitado pela lei moral. Ressalta a importância de se fazer leis mais claras, simples e compreensível que possa favorecer a todos com igualdade.
Segundo, esse filósofo (1999, p.125), deveria ser vedado ao magistrado aplicar penas não prevista em lei. A lei seria obra exclusiva do legislador, que “representa toda a sociedade ligada por um contrato social”.
Um ponto importante na sua obra é quanto à moderação e proporcionalidade das penas. Pois condena as penas de confisco e as infamantes, por considerar que elas atingem a família do condenado, quebrando assim, o Princípio da Intranscedência Penal. Reage, também, contra a Pena de Morte e as penas cruéis, ponderando que elas devem ser proporcionais aos delitos cometidos. Destaca que a pena deve ser utilizada como Profilaxia Social, pretendendo não só intimidar o cidadão como também recuperar o criminoso.
César Bonesana finaliza sua obra ressaltando a necessidade de se buscar a prevenção dos crimes:
É melhor prevenir os crimes do que ter de puni-los; e todo legislador sábio deve procurar antes impedir o mal do que repará-lo, pois uma boa legislação não é senão a arte de proporcionar aos homens o maior bem-estar possível e preservá-los de todos os sofrimentos que se lhes possam causar, segundo o cálculo dos bem e dos males desta vida (BECCARA, 1999, P. 125).
Inspirados nas idéias básicas do Iluminismo, primeira metade do Século XIV, várias obras foram expostas, recebendo essa corrente denominação de Escola Clássica. Nesta Escola, dois grandes períodos se distinguiram: O Filosofo ou Teórico e o Jurídico ou Prático. No primeiro destaca-se a incontestável figura de Beccaria. Já no segundo, aparece o mestre de Piza, Fancesco Carrara, que se tornou o maior vulto da Escola Clássica, autor de Programa del Corso di Diritto Criminale (1859), que defende a concepção do delito como ente jurídico, constituído por duas forças: A Física (movimento corpóreo e dano causado pelo crime) e A Moral (vontade livre e consciente do deliquente).
O crime é definido como sendo a infração da lei do Estado, promulgado para proteger a segurança dos cidadãos, resultante de um ato externo do homem, positivo ou negativo, moralmente imputável e politicamente danoso.
3. Período Científico ou Criminológico
Iniciou-se com os estudos do médico César Lombroso, autor do livro L`Uomo Delinqüente (O Homem Delinqüente), quem apontou os novos rumos do Direito Penal após o período humanitário, através do estudo do delinqüente e a explicação causal do delito.
O ponto máximo da obra de Lombroso é a consideração do delito como fenômeno biológico e o uso do método experimental para estudá-lo, ou melhor, acreditava que o crime era uma manifestação da personalidade humana (Fenômeno Biológico), e não um ente jurídico como acreditava Carrara. Defendia a existência do criminoso nato, com peculiaridades físicas e morfológicas específicas. Foi o criador da Antropologia Criminal. Ao seu lado surgem Ferri com a Sociologia Criminal, e Garofalo, no campo jurídico, com sua obra Criminologia, podendo os três ser considerados os fundadores da Escola Positiva, cujos princípios básicos são assim resumidos por Mirabete (2000, p. 40):
O crime é fenômeno natural e social, sujeito às influências do meio e de múltiplos fatores, exigindo o estudo pelo método experimental; a responsabilidade penal é responsabilidade social, por viver o criminoso em sociedade, e tem por base a sua periculosidade; a pena é medida de defesa social, visando à recuperação do criminoso ou à sua neutralização; o criminoso é sempre, psicologicamente, um anormal, de forma temporária ou permanente.
Procurando conciliar os princípios entre as Escolas Clássicas e a Escola Positiva, surgiram Escolas Ecléticas, Mista como a Terceira Escola (Alimena, Carnevale, Impalomeni), também denominada de Positivismo Crítico, e a Escola Moderna Alemã.
Os Penalista, atualmente, tem-se preocupado mais com a pessoa do condenado sob uma perspectiva humanista, fundado na idéia de que a sociedade apenas é defendida à medida que se proporciona a adaptação do condenado ao convívio social. Conforme a doutrina intitulada de Nova Defesa Social ou Teoria da Ressocialização.
4. Direito Penal Brasileiro
No Brasil, quando de processou a colonização, prevalecia o direito costumeiro, entre as tribos indígenas, caracterizado pala vingança privada, a vingança coletiva e talião. Além de tudo isso, as penas eram desproporcionalizadas à falta praticada, sendo fixada com extrema perversidade, atingindo não só o ofensor como também todo o seu grupo familiar.
No Brasil Colonial vigoraram As Ordenações Afonsinas (até 1512) e Manuelina (até 1569), substituídas estas últimas pelo Código de D. Sebastião (até 1603). Passou-se então para as Ordenações Filipinas, que caracterizavam penas severas e cruéis como os açoites, os degredos, as mutilações, etc., em que o crime era confundido com pecado e ofensa moral, punindo-se os hereges, feiticeiros e benzedores.
Após a Proclamação da Independência, previu a Constituição de 1824, que se elaborasse uma nova legislação penal e, em 16 de dezembro de 1830, D. Pedro I sancionava o código criminal do império, regulando a individualização da pena, previa a existência de atenuantes e agravantes, e estabelecia-se um julgamento especial para os menores de 14 anos, prevendo, ainda a pena de morte.
Com a República foi editado, em 11 de outubro de 1890, o Código Criminal da República, abolindo a pena de morte, a de galés e a de banimento judicial e o Regime Penitenciário de caráter correcional.
Em 1º de janeiro de 1942, porém, entrou em vigor o Código Penal (Decreto-lei 2.848 de 07/12/1940), ainda sendo a nossa legislação penal fundamental, o Código de 1940 teve sua origem em Projeto de Alcântara Machado, submetido ao trabalho de uma Comissão Revisora composta de Nelson Hungria, Vieira Braga, Marcelio de Queiroz e Roberto Lira. No ano de 1984 é sancionada a Lei nº 7.209 de 11/07/1984, que alterou substancialmente a parte geral , principalmente adotando o sistema em vigor (pena ou medida de segurança).
Com a nova Parte Geral, foi promulgada a Lei de Execução Penal (LEP), de nº 7.210 de 11/07/1984. É uma lei específica para regular a execução das penas e das Medidas de Segurança, o que era súplica geral, tanto que já se fala na criação de um novo ramo jurídico: o Direito de Execução Penal.
Recentemente, o Estatuto Repressivo pátrio foi alterado pela Lei nº 9.714/98, no que concerne as Penas Restritivas de Direito. Foram incluídos mais dois tipos de penas: a prestação pecuniária e a perda de bens e valores.
Porém, a nova lei não foi suficiente para trazer tranqüilidade, porque a Modernização trouxe além de altas tecnologias, concentrações urbanas provocadas pelo êxodo rural, mudanças de comportamentos, aumento de criminalidade. As Instituições Públicas não acompanharam essas mudanças.
Capítulo II
Das penas
1. Conceito
A norma jurídica é composta por duas partes: O Preceito e a Sanção. Aquele é a parte da norma que indica o que devemos ou não fazer, isto é, constituem ass regras de conduta. A sanção é a pena imposta a alguém em razão da violabilidade da norma.
Para Soller (1970, v. 2, p. 342), “a pena é uma sanção aflitiva imposta pelo Estado, através de ação penal, ao autor de uma infração (sic), como retribuição de seu ato ilícito, consistente na diminuição de um bem jurídico e cujo fim é evitar novos delitos”.
A pena é uma das conseqüências jurídicas do delito, ou seja, uma relação jurídica aplicável à prática de um injusto punível.
2. Finalidade da Pena
O Estado, titular único e exclusivo do direito de punir, tendo por fim buscar o bem estar geral, pune e castiga àquele que pratica uma conduta humana reprovável que atente contra os valores primordiais e básicos da convivência social. A pena que é a sanção mais enérgica que existe, aparece como forma de prevenir e reprimir os atos lesivos à existência e preservação da sociedade.
Entretanto, temos três correntes doutrinárias, que nos explicam o fundamento de punir e os fins da pena, são elas: as absolutistas ou retributivas, as relativas ou utilitárias e as mistas.
As teorias absolutistas (NORONHA, 1990), baseiam-se numa exigência de justiça, ou seja, ao mal do crime, deve-se aplicar o mal da pena, imperante entre eles a igualdade. “Só o que é igual é justo”. Negam os fins utilitários da pena defendendo a aplicação de um mal justo oposto ao mal injusto do crime.
As teorias relativas atribuem à pena um fim prático; a prevenção. Esta seria a aplicação da pena para a intimidação de todos para que não cometam o crime. A pena é considerada um mal para o indivíduo, que a sofre, e para a coletividade, que lhe suporta o ônus. Contudo, justifica-se, por sua utilidade.
Por fim, as teorias mistas, estas sustentam o caráter retributivo da pena, mas agregam os fins da reeducação e da prevenção do delinqüente, ou melhor, um misto de educação e correção.
Nota-se que a pena tem finalidade dupla – retributiva e preventiva. A retributiva é pena integradora, isto é, reintegradora dos valores fundamentais da vida coletiva. É correspondente do mal infligido pelo réu à sociedade. Enquanto a preventiva, cifra-se em prevenção geral e especial. A primeira dirige-se à sociedade, ou seja, tem por escopo intimidar os propensos a delinqüir, os que tangenciam a Lei Substantiva Penal. A Especial tem-se em vista a finalidade utilitária, que é a reeducação do indivíduo e sua recuperação. Assim, a pena deve ser individualizada, constituindo o princípio constitucional expresso no inciso XLVI do art. 5º da nossa Carta Magna.
3. Características
As principais características da pena são: legalidade, personalidade, inderrogabilidade e proporcionalidade.
A primeira, prevista constitucionalmente, no art. 5º, inciso XXXIX, reza a existência prévia de lei para a imposição da pena nullum crimen, nulla poena sine lege.
Júlio Fabbrini Mirabete reza que:
Pelo princípio da legalidade alguém só pode ser punido se, anteriormente ao fato por ele praticado, existir uma lei que o considere como crime. Ainda que o fato seja imoral, anti-social ou danoso, não haverá possibilidade de se punir o autor, sendo irrelevante a circunstância de entrar em vigor, posteriormente, uma lei que o preveja como crime (MIRABETE, 2000, p. 55).
Assim, se de um lado se pode impor ao condenado as sanções penais estabelecidas na legislação, observadas a limitações constitucionais, de outra lado não se admite que seja ele submetido a restrições não contidas na lei.
A legalidade das penas está ligada a prevenção geral, pois a especificação das medidas sancionadoras cria inibições necessárias ao estimulo que alguém possa ter para a prática do crime.
A pena é sanção personalíssima, por força do princípio constitucional da responsabilidade pessoal (art. 5º, XVI, CF.), só devendo alcançar o agente do crime, não podendo ultrapassar sua pessoa, nem atingir descendentes ou ascendentes.
Impõe-se este princípio pela finalidade retributiva, isto é, se a pena é o mal da sanção oposta ao mal do crime, se é retribuição de um mal por outro, é evidente que deve recair sobre quem praticou aquele mal e somente sobre ele.
A proporcionalidade, também denominada de princípio da proibição de excesso, este princípio ensina que a pena tem que ser proporcional ao crime em qualidade e em quantidade.
Cabe ao legislador, no momento da cominação, e o juiz, quando for aplicar, ficar atento para a necessidade de respeitar este princípio entre o fato criminoso e a sanção a ele correspondente.
Esta característica, no direito positivo, foi abrandada: a Constituição Federal de 1988 em seu art. 5º, inciso XLVI determina que “a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, a privação ou restrição da liberdade, perda de bens, multa, prestação social alternativa e suspensão ou interdição de direitos”, e o Código Penal refere-se, quando da aplicação da pena o juiz deve considerar os antecedentes e a conduta social, a personalidade do agente, como também, à reincidência, respectivamente, nos art. 59 e 61, inciso I do Código Penal.
Por fim, a inderrogabilidade penal, reza que praticado o delito, a imposição deve ser certa e a pena cumprida. Essa característica, também é suavizada em várias situações, conforme a lei penal, como nos casos de suspensão condicional, do livramento condicional, do perdão judicial, da extinção da penalidade, etc.
4. Classificação
Varias são as classificações da pena. Destaca-se a que faz referência ao bem jurídico por ela alcançado. Conforme esse critério, a doutrina classifica as penas em: corporais, privativas de liberdade, restritiva de liberdade, pecuniárias, privativas e restritivas de direito.
A nossa Magna Carta preceitua em seu artigo 5º, incisos XLVI, quais as penas possíveis: privação ou restrição de liberdade, perda de bens, multa, prestação social alternativa e suspensão ou interdição de direitos. Já o inciso o XLVII, do mesmo preceito constitucional estabelece quais as penas não admitidas, tais como: pena de morte, exceto em caso de guerra declarada; trabalhos forçados; caráter perpétuo; banimento e cruéis.
Pelo exposto acima, observa-se três princípios norteadores das penas, tais como, a eliminação o quanto possível da pena segregativa imposta pelo cárcere, a humanização das penas e a individualização da reprimenda. A primeira está demonstrada na possibilidade de ser substituída por várias outras penas, principalmente, pelas restritivas de direito; quanto a humanização é sensível não só em relação a natureza das penas escolhidas como também pelas formas de execução. Com relação a individualização presencia-se tanto na aplicação da reprimenda conforme o artigo 58 do nosso Código Penal, como também da execução, através de exame criminológico e da personalidade que estabelece as condições para o cumprimento.
As Penas Corporais, em sentido estrito, refere-se a própria integridade física do criminoso como os açoites, as mutilações e a morte. Com relação às primeiras, estas eram adequadas aos brutos e degredados, que só se sensibilizavam por estímulos materiais e pelo temor dos castigos, proclamando-se, ainda, a vantagem de dispensar a pena pela prisão e todos os inconvenientes desta, inclusive as conseqüências para a família do condenado (GARCEZ, 1972, p. 56)
Pena de Morte, os defensores desta pena, entendem que é a única pena que realmente intimida o delinqüente perigoso, por ser um meio econômico e eficaz de proteção à sociedade. Já os opositores alegam a sua imprestabilidade, inconveniência e ilegitimidade.
É importante ressaltar que a nossa Carta Cidadã impede que o Congresso Nacional delibere, através de emenda constitucional, visando a inclusão de qualquer das penas do art. 5º, inciso XLVII no ordenamento jurídico penal brasileiro (art. 60, § 4º, IV da CF).
4.1. Pena privativa de liberdade
A natureza desta pena está contida no seu nomen juris, ou seja, restringe a liberdade do condenado, mantendo-o enclausurado num estabelecimento prisional. A nossa Carta Cidadã enfatiza em seu art. 5º, inciso XLVI que “a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as seguintes: privação ou restrição da liberdade, perda de bens, multa, prestação social alternativa e suspensão ou interdição de direitos.”
As penas privativas de liberdade são duas: reclusão e detenção. O art. 33 do Código Penal estabelece que:
(…) a pena de reclusão, mais grave, deve ser cumprida em regime fechado, semi-aberto ou aberto; a detenção comporta apenas dois requisitos, isto é, menos severo: semi-aberto ou aberto, exceto a necessidade de transferência no regime fechado.
A nossa Carta Magna estabelece, aliás, em seu artigo 5º, inciso XLVIII, que “a pena será cumprida em estabelecimento distinto, de acordo com a natureza do delito, a idade e o sexo do apenado”
Embora, ambas sejam privativas de liberdade, a diferença, sob o aspecto formal, cinge-se no sentido de que na pena de detenção, quando o agente é inimputável, faculta-se ao juiz a substituição da medida de segurança de internação em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico pela sujeição a tratamento ambulatorial (art. 97 do CP). A contrario censu, se ao crime praticado pelo inimputável é aplicada abstratamente pena de reclusão, aplica-se medida de segurança detentiva. Aplicada a pena pelo juiz da sentença, deve ele observar, obedecendo aos critérios da lei, fixar o regime inicial do cumprimento da pena (art. 59, III, do CP, e art. 110, da LEP), mas, durante a execução o condenado poderá ser transferido para regime menos severo se seu mérito indicar a progressão (art. 112 da LEP), ou seja, preenchidos os requisitos legais, será transferido do regime fechado para o semi-aberto ou deste para o aberto. De outro lado, é possível também a regressão, que é a transferência do condenado para o regime mais rigoroso (art. 118 da LEP).
Após o transito em julgado da sentença condenatória, o exame criminológico será realizado, visando a individualização da pena privativa de liberdade, e será obrigatório para o condenado a regime fechado, e facultativo para os que estão sujeito desde o início ao regime semi-aberto, conforme os artigos 34 e 35 do Código Penal e art. 8º e seu parágrafo único da LEP.
As mulheres estão sujeitas a um regime especial, isto é, cumprem pena em estabelecimento próprio. Dispõe, inclusive a Constituição Federal de 1988, em seu artigo 5º inciso L, que “às presidiárias serão asseguradas as condições para que possam permanecer com seus filhos durante o período de amamentação”, ou melhor, destinam-se essas instalações à prestação de assistência ao filho desamparado da presa (art. 89 da LEP).
O regime fechado, caracteriza-se por uma limitação das atividades em comum dos presos e por maior controle e vigilância sobre eles. Devem, cumprir pena nesse regime os presos de periculosidade extrema, assim considerados na valoração de fatores objetivos como a quantidade de crimes, penas elevadas no período inicial de cumprimento, presos reincidentes, etc. Nos termos legais, considera-se regime fechado a execução da pena em estabelecimento de segurança máxima e média, estabelecimento este denominado Penitenciária, conformes os art. 33, § 1º , a, do CP, e 87, da LEP.
A LEP adota que na penitenciária, a cela individual deve conter além de dormitório, aparelho sanitário e lavatório (art. 88 da LEP), exista também, requisitos básicos como salubridade do ambiente pela concorrência de fatores da aeração, insolação e condicionamento térmico adequado á existência humana, área mínima de seis metros quadrados, áreas destinadas à assistência, educação, trabalho, recreação e prática desportiva.
O regime semi-aberto, deve ser cumprido em colônia agrícola, industrial ou estabelecimento similar, podendo o condenado alojar-se em compartimento coletivo, observando-se os mesmos requisitos de salubridade de ambiente exigidos na penitenciária como a seleção adequada dos presos, o limite de capacidade máxima, objetivando a individualização, conforme os artigos 91, 92 e 93, parágrafo único da LEP.
Este regime é necessário quando o condenado tiver que cumprir um período mais longo da pena em regime fechado, ou melhor, o regime semi-aberto é uma transição para o regime aberto, nessa hipótese, no processo de reinserção social do condenado.
Finalmente, o regime aberto, destina-se aos condenados capacitados a viver em semiliberdade, ou seja, aqueles que não apresentem periculosidade, não desejem fugir, que possuírem autodisciplina e senso de responsabilidade. Deverá ele, fora do estabelecimento e sem vigilância trabalhar, freqüentar curso ou exercer outra atividade autorizada, recolhendo-se à prisão no período noturno ou de folga conforme preceitua o artigo 36, § 1º do Código Penal.
4.2. Pena restritiva de direito
A natureza desta pena consiste no impedimento temporário de um ou mais direitos do condenado ou então na perda de parte de seu patrimônio, imposta em substituição e cuja pena escolhida está relacionada diretamente com a infração cometida.
Referida pena, surgiu com a reforma da Parte Geral do Código Penal para substituir a pena privativa de liberdade, não perdendo seu caráter de castigo, objetivando evitar os malefícios carcerários.
As características das penas restritivas de direito são:
a) Substitutivas, que visam afastar a aplicação das penas privativas de liberdade, quando estas demonstrarem que sua aplicação descaracteriza a sua finalidade ressocializadora.
b) Autônoma, pois gozam de peculiaridade e formas de execução própria, conforme o texto do artigo 44 do Código Penal “as penas restritivas de direitos são autônomas e substituem as privativas de liberdade”.
A aplicação das penas restritivas de direitos em substituição às penas privativas de liberdades estão condicionadas a determinados pressupostos, uns objetivos, outros subjetivos, que devem estar presentes simultaneamente. Dentre os requisitos objetivos estão o de a pena privativa de liberdade não ser superior a quatro anos e o da natureza do crime, isto é, quando este não for praticado com violência ou grave ameaça.
O art. 44, II do Código Penal brasileiro esboça em seu texto que a reincidência em crime doloso impede sua aplicação, exceto na forma excepcional prevista no art. 44, § 3º, quando admissível socialmente e não corresponda ao mesmo crime, i. e., não seja reincidente específico. Já quanto as penas substitutivas subjetivas que dizem respeito a culpabilidade do agente e as circunstância do crime (art. 44, III), por exemplo, para a substituição, deve-se examinar a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social, a personalidade do condenado, bem como os motivos e as circunstâncias do crime.
No entanto, a conversão da pena restritiva de direito em pena privativa de liberdade, conversão às avessas, é possível em duas hipóteses: quando houver descumprimento injustificado da pena restritiva imposta e, que deve-se descontar o tempo já cumprido; assim como, na hipótese de uma nova condenação por pena privativa de liberdade e por outro crime, facultando ao magistrado mantê-la, desde que possível e recomendável a sua continuidade, como deixa evidente os parágrafos § 4º e § 5º do art. 45 do Código Penal.
As penas alternativas existentes em nosso Código Penal, acrescidas a este pela cogitada Lei 9714/98, são, de acordo com o artigo 43 e seus incisos, daquele diploma legal, as seguintes: prestação pecuniária, perda de bens e valores, prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas, interdição temporária de direitos e limitação de fim de semana.
4.2.1. Prestação pecuniária
A prestação pecuniária que, de acordo com o parágrafo primeiro do artigo 45 do CP, consiste no pagamento em dinheiro à vítima, a seus dependentes ou a entidade pública ou privada com destinação social, de importância fixada pelo juiz, não inferior a um salário mínimo nem superior a trezentos e sessenta salários mínimos. O valor pago será deduzido do montante de eventual condenação em ação de reparação civil, se coincidentes os beneficiários.
Nota-se, todavia, pela redação do dispositivo retrocitado que a finalidade desta secção é reparar o dano causado pela infração penal. O § 2º do art. 45 prevê a substituição do pagamento em dinheiro por pagamento em espécie, desde que, haja aceitação por parte do beneficiário.
4.2.2. A perda de bens e valores
Esta modalidade, vem estabelecida no parágrafo terceiro do artigo 45 do CP e consiste na perda de bens e valores pertencentes aos condenados dar-se-á, ressalvada a legislação especial, em favor do Fundo Penitenciário Nacional, e seu valor terá como teto, o que for maior, o montante do prejuízo causado ou o do provento obtido pelo agente ou por terceiro, em conseqüência da prática do crime.
4.2.3. Prestação de serviço à comunidade
A prestação de serviço à comunidade é aplicável em substituição à pena privativa de liberdade de média duração (art. 44, I do CP). Acerca da mesma estão diluídas no art. 46 e nos seus quatro parágrafos. De acordo, pois, com tais dispositivos, ela será aplicada sempre que a pena privativa de liberdade for superior a seis meses, consistente na atribuição de tarefas gratuitas ao condenado; dar-se-á em entidades assistenciais, hospitalares, escolas, orfanatos, e outros estabelecimentos congêneres, em programas comunitários ou estatais e o cumprimento das tarefas deverá obedecer à razão de uma hora por dia de condenação, fixadas de modo a não prejudicar a jornada normal de trabalho. Para não sacrificar a subsistência do condenado, o magistrado deve aplicar esta pena aos sábados, domingos e feriados, salvo o interesse do condenado em substituir por um outro dia da semana, desde que não seja superior a oito horas. A critério do juiz, ele poderá fixar pena menor que a fixada primitivamente, porém não poderá ser inferior à metade da pena de liberdade fixada, caso esta seja maior que um ano, como preceitua o parágrafo 4º do art. 46 do Código Penal.
A prestação de serviço a comunidade é o maior exemplo de evolução do direito penal moderno, porque, ao mesmo tempo que pune a transgressão praticada, valoriza o condenado, dando-lhe a oportunidade de, por meio de trabalho, demostrar suas aptidões profissionais e artísticas, as quais serão, certamente, aproveitadas após o cumprimento da sanção, retirando o infrator do caminho do crime, levando-o ao exercício consciente da cidadania.
4.2.4. Interdição temporária de direitos
A interdição temporária de direitos tem como sub-espécies: proibição do exercício de cargo, função ou atividade pública, bem como de mandato eletivo; proibição do exercício de profissão, atividade ou ofício que dependam de habilitação especial, de licença ou autorização do poder público; suspensão de autorização ou habilitação para dirigir veículo e proibição de freqüentar determinados lugares. Conforme os incisos I a IV do art. 47 da Lei Substantiva Penal.
4.2.5. A limitação de fim de semana.
Segundo os artigos 151 e 153 da Lei de Execução e artigo 48, caput, do CP consiste na obrigação de permanecer, aos sábados e domingos, por cinco horas diárias, em casa de albergado ou outro estabelecimento adequado. O parágrafo único do art. 48 do CP esclarece que, “durante a permanência poderão ser ministrados ao condenado cursos e palestras ou atribuídas atividades educativas, tudo com o escopo de reeducar e ressocializar o condenado”.
4.3. Da Pena de Multa
É uma modalidade de pena patrimonial que consiste no pagamento por parte do sentenciado, a um fundo penitenciário, um valor correspondente, no mínimo de dez e no máximo de trezentos e sessenta dias-multa, calculado na proporção de um trigésimo do salário mínimo vigente à época da sentença.
A pena de multa é mais um instrumento destinado a evitar o encarceramento, por prazo de curta duração, dos autores de ilícitos penais que não apresentem maior gravidade.
Observa-se que a multa não é o pagamento, e sim a obrigação de pagar ao Estado certa quantia.
Esta sanção apresenta várias vantagens tais como: não retira o condenado do convívio com a família nem o afasta de trabalho, não corrompe o condenado, evitando-o do convívio deletério da prisão, não o avilta, pela ausência de peculiaridade infamante desta pena, atinge um bem jurídico menor que a liberdade, possibilita a individualização judicial por visar a situação econômica do condenado e não sobrecarrega o Estado, pelo contrário, constitui fonte de recursos para o erário público.
TACRSP: “Por outro lado, o art. 49, § 1º do CP indica que a multa será fixada com base no salário mínimo vigente ao tempo do fato, em regra de intuitiva compreensão” (MIRABETE, 2000, pag. 645)
Entretanto, conforme a nova redação dada ao artigo 51 do código penal “transitada em julgado a sentença condenatória, a multa será considerada dívida de valor, isto é, na hipótese de não-pagamento, será considerada dívida ativa da Fazenda Pública”. Pelo diploma legal, extinguiu-se a conversão da pena de multa em detenção.
A substituição não é automática, entretanto, o juiz deverá atender à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e conseqüências do crime, bem como o comportamento da vítima, conforme dispõe o art. 59 do Código Penal.
TJAP: Pena de Multa. Critérios em duas etapas: a primeira de caráter objetivo; estriba-se nas circunstâncias do art. 59, do CP, devendo resguardar compatibilidade com a decisão, a Segunda, de natureza subjetiva, direciona-se na fixação do quantum e deverá guardar equivalência à situação econômica do apenado, teor do art. 49 do CP.
Assim, como na pena de multa não há cominação especifica para cada delito, mas apenas a regra geral que delimita um mínimo e um máximo tanto no que diz respeito ao número de dias-multa como ao valor de cada dia-multa, na fixação da pena o juiz deverá levar em consideração a espécie de crime praticado pelo réu, como também, deve atender, principalmente, à situação do réu (art. 60, do CP).
A multa deverá ser paga dentro de dez dias depois de transitada em julgado a sentença condenatória (art. 50, caput do CP). Após este prazo, o valor da multa será atualizada pela correção monetária.
Luiz Flávio Gomes, por sua vez, não discrepa:
O réu tem dez dias para pagar a multa espontaneamente no juízo criminal mesmo (não foi revogado o art. 50 do CP). Não efetuado o pagamento, extrai-se certidão da condenação, que será enviada à Fazenda Pública para inscrição. A partir daí é pura ‘dívida de valor’, sem nenhum reflexo na liberdade do condenado, e já não será correto falar em prescrição penal, senão em prescrição (de crédito) civil. (1997, p. 15-17).
Assim, a pena substitutiva não constitui faculdade ou opção ao réu, mas o castigo a que fica sujeito, com exclusão de qualquer outro, por ser aquele que foi considerado suficiente à reprodução e prevenção do crime.
5. Da Suspensão Condicional da Pena ou Sursis
A suspensão condicional da pena ou sursis é um instituto pelo qual a execução da pena privativa de liberdade é suspensa sob certas condições, e durante determinado período de tempo, extinguindo-se a pena ao término do prazo, como preceitua o art. 77 do nosso Código Penal: “A execução da pena privativa de liberdade, não superior a 2 (dois) anos, poderá ser suspensa, por 2 (dois) a 4 (quatro) anos…”.
Pelo Sursis o juiz ao invés de determinar a execução da sanção imposta na sentença, concede a suspensão condicional da pena, que significa que o réu não irá iniciar o cumprimento da pena, ficando em liberdade condicional, por um período, que é chamado de período de prova, que pode variar de dois a quatro anos.
A suspensão condicional da pena é um direito subjetivo do sentenciado. Embora o texto legal diga que a execução da pena poderá ser suspensa, o juiz não pode negar sua concessão ao acusado, ele deve concedê-la ao réu se satisfeitos os requisitos legais à sua concessão.
Sobre o assunto Julio Fabrini Mirabete (MIRABETE, 2000. p. 323), comenta:
Trata-se de dar-se um crédito de confiança ao criminoso, estimulando-o a que não volte a delinqüir e, além disso, prevê-se uma medida profilática de saneamento, evitando-se que o indivíduo que resvalou para o crime fique no convívio de criminosos irrecuperáveis.
Nos termos do art.157 da Lei de Execução Penal, o juiz ou tribunal deverá se pronunciar-se, motivadamente, sobre o sursis na sentença que aplicar pena privativa de liberdade.
Existem três espécies de Sursis: Comum ou simples, em que o condenado submete-se às condições do art. 78, § 1º, com prestação de serviços à comunidade ou submeter-se à limitação de fim de semana, acrescidas ou não de condições judiciais; o Especial , que tem caráter excepcional, é menos rigoroso. O condenado, desde que reparado o dano e as condições do art. 59 o beneficiem, não se submete às condições do citado art. 78, § 1º, sendo-lhe impostas vedações de caráter social ou de ausentar-se da comarca sem autorização judicial; o sursis Etário ou por motivo de saúde, que é reservado aos condenados que completaram 70 anos de idade ou que estejam com razões de saúde que justifiquem a suspensão nos termos do art. 77, § 2º.
Os requisitos para a concessão da suspensão condicional da pena se dividem em objetivos e subjetivos. Os requisitos objetivos são: 1) de a pena privativa de liberdade dever ser igual ou inferior a dois anos, com exceção para a hipótese do condenado ter idade superior a 70 anos ou se for portador de enfermidade que justifique a suspensão, que a poderá ser concedido o sursis se a pena for inferior a quatro anos; 2) e não ser possível a substituição da pena por outra restritiva de direitos. Os requisitos subjetivos estão previstos no art. 77, incisos I e II do CP, todos abaixo transcritos:
I. o condenado não seja reincidente em crime doloso;
II. a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e personalidade do agente, bem como os motivos e as circunstâncias autorizem a concessão do benefício.
A suspensão condicional da pena pode vir a ser revogada, não sendo obedecidas as condições da sua concessão, deve o condenado cumprir integralmente a pena a qual foi condenado. As causas da revogação do sursis podem ser obrigatória ou facultativa. As causas de revogação obrigatória estão previstas no art. 81, incisos I, II, III do Código Penal, in verbis:
I – é condenado, em sentença irrecorrível, por crime doloso;
II – frusta, embora solvente, a execução de pena de multa ou não efetua, sem motivo justificado, a reparação do dano;
III – descumpre a condição do § 1.º do art.78 de código.
As causas de revogação facultativas da suspensão estão descritas no § 1.º art. 81, do CP: “A suspensão poderá ser revogada se o condenado descumpre qualquer outra condição imposta ou é irrecorrivelmente condenado, por crime culposo ou por contravenção, a pena privativa de liberdade ou restritiva de direitos”.
Essas causas não levam obrigatoriamente a revogação. O código penal atribui ao juiz o dever de investigar, valorando a causa, se há um caso de revogação da suspensão ou prorrogação do período de prova.
Ocorre a prorrogação do prazo da suspensão, prescrito no § 2.º do art. 81, quando o beneficiário está sendo processado por outro crime ou contravenção. Esta prorrogação será até o julgamento definitivo do processo em andamento. A palavra processo nos faz entender que não basta a prática de uma infração penal ou a instauração do inquérito policial, tem que ter havido a abertura do processo judicial (nova ação penal), para que se prorrogue o prazo do sursis. A prorrogação é automática, não dependendo de decisão do juiz.
Capítulo III
A realidade do sistema penitenciário brasileiro
1. A Superlotação do Sistema Carcerário
A grave superlotação é talvez o mais crônico problema que aflige o sistema penal brasileiro. Conforme pesquisa realizada pelo Departamento Penitenciário Nacional (DEPEN), do Ministério da Justiça sobre a situação das prisões no Pais, concluído em junho de 2003, constatou-se que o Brasil tinha nos seus estabelecimentos penais 284.989 presidiários recolhidos nos 1.431 presídios brasileiro. São 168 presos por 100 mil habitantes.
De acordo com a pesquisa evidenciada no parágrafo anterior, em dezembro de 2002, a população carcerária era de 240 mil e, em seis meses apenas, esses estabelecimentos receberam mais 40 mil detentos, atingindo a cifra de 284.989 presidiários. Desde então, por mais que alguns esforços tenham sido feitos para resolver o problema, a disparidade entre a capacidade instalada e o número atual de presos tem apenas piorado. O déficit no sistema carcerário brasileiro é de 104.263 vagas.
Caso os números dos últimos anos servirem como indicação, a população carcerária do Brasil continuará a crescer e, mais provavelmente, superará a expansão da capacidade prisional. O déficit na capacidade instalada cresceu 27% entre 1995 e 1997, enquanto a capacidade total dos presídios cresceu apenas 8,1% durante o mesmo período.
A Human Rights Watch[1] (1998), produziu um relatório com base base em pesquisas desenvolvidas no Distrito Federal e em mais sete estados brasileiros (Amazonas, Ceará, Minas Gerais, Paraíba, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul e São Paulo) cujos resultados se apresentaram igualmente contundentes, no tocante à situação dos estabelecimentos prisionais pela grave superlotação nas prisões, condições de detenção horríveis e execução sumária de detentos.
As prisões superlotadas, como todos os administradores prisionais tem ciência, são extremamente perigosas porque aumentam as tensões elevam a violência entre os presos, as tentativas de fuga e os abusos por parte de policiais. E que esta situação tem contribuído de uma forma significativa aos incidentes de rebeliões ou de outras formas de protesto nos estabelecimentos prisionais do país.
Inúmeros fatores contribuem para o agravamento dos índices de superpopulação, dentre eles, podemos mencionar o confinamento de presos não condenados. Além disso, os efeitos do uso excessivo da prisão preventiva ou temporária e o demorado julgamento dos processos criminais, durante os quais o acusado permanece encarcerado, comprometem, ainda mais, a situação da superlotação carcerária.
Conforme registrado em Nota Técnica do Departamento Penitenciário Nacional – DEPEN, do Ministério da Justiça, temos que:
O Sistema Penitenciário Nacional, um dos setores mais críticos do segmento da segurança pública no Brasil, com graves problemas de ordem social, decorrentes, principalmente, da superpopulação, vivendo em condições subumanas e em instalações físicas em estado precário de conservação, vem sendo objeto de constantes focos de rebeliões e tentativas de fugas, resultando quase sempre em mortes de presos e reféns. Tal situação pode ser mensurada pelo número crescente de rebeliões que colocam em risco a segurança do pessoal diretamente envolvido, bem como a população vizinhas as unidades (sic) prisionais.
As delegacias e as cadeias públicas brasileiras são utilizadas como mini-presídios, pois as populações carcerárias são submetidas pelo Poder Público a condições animalesca, em flagrante desprezo e desrespeito às disposições legais vigentes, não proporcionando uma estrutura adequada ao cumprimento da pena, privando o preso de qualquer possibilidade de acesso à educação, lazer, trabalho e varias outras atividades.
Em 1995 foi realizado um Censo Penitenciário e, este constatou que, 39,96% da população carcerária total eram mantidos em delegacias e cadeias públicas, confinados entre presos provisórios, violando normas internacionais, isto é, o que era provisório, entretanto, vem se eternizando.
Segundo, Klester Cavalcanti (1999, p. 134), alguns Estados brasileiros apresentam uma percentagem de presos provisórios aguardando julgamento, em relação à população carcerária, cuja realidade se mostra preocupante à sociedade. Observe alguns dados expostos por este autor: Pará 73%, Mato Grosso 63%, Amazonas 61%, Pernambuco 60%, Alagoas 59%, Roraima 53%, Sergipe 49%, Tocantins 47%, Acre 41% e Piauí 35%.
A falta de vagas nas prisões é particularmente dramática quando considera-se o enorme número de acusados que livraram-se de cumprir suas penas, deixando essas penas pendentes. Em 1994, o Ministério da Justiça estimou que havia 275.000 mandados que não foram cumpridos, significativamente mais do que o número de presos detidos. Obviamente, caso esses acusados fossem repentinamente encontrados e presos, as prisões explodiriam.
Outro fator relevante para o significativo aumento da população carcerária é o fracasso na progressão das penas. A individualização e a progressão da penas de cada preso significando que o juiz deve considerar as circunstâncias individuais do acusado antes de determinar a sentença. Ao verificar que o réu é reincidente ou primário para determinar se o cumprimento da pena será em uma prisão de regime fechado, aberto ou prestação de serviço a comunidade. Fiscalizando após, continuamente o apenado enquanto estiver encarcerado, ajustando os termos da sentença segundo sua conduta.
A LEP estabelece que o preso condenado inicialmente em regime fechado, após cumprir uma parte de sua pena deveria ser transferido para um estabelecimento de regime semi-aberto onde cumpriria mais uma parte da pena, quando até passar ao regime aberto e, por fim, retornar à sociedade.
No entanto, as exigências da Lei de Execução Penal com relação à progressão de penas não tem sido posta em prática, porque grande parte dos presos nunca vê um estabelecimento de regime aberto ou semi-aberto, i. e., cumpre toda sua pena numa prisão de regime fechado ou até mesmo em delegacias, segundo o relatório do Comitê Internacional de Direitos Humanos1.
Existe, ainda, conforme os artigos 15 e 16 da LEP a assistência técnica jurídica aos presos, mas, esta assistência mostra-se deficiente, pois a demanda é muito maior que a oferta e o número de juízes é insuficiente para analisar e julgar os processos.
Observa-se que são inúmeras as causas responsáveis pela ineficácia da progressão das penas, como o descaso das autoridades competentes, a falta de assistência jurídica, a escassez de juízes para analisar e julgar os processos e o pequeno número de estabelecimentos de regimes aberto ou semi-aberto.
No Brasil a superpopulação dos presídios constitui um problema longe de ser resolvido, porque a par do incremento da criminalidade violenta, praticamente nada se fez em termos de construção de novos estabelecimentos penais, entre outros.
Observa-se que a tendência atual é a busca de alternativas à pena de prisão, que sejam capazes de recuperar a finalidade da pena, trazendo o condenado de volta ao convívio social, e respeitando, sobretudo a dignidade da pessoa humana.
2. O perfil da população carcerária
Conforme dados fornecidos pelo Departamento Penitenciário Nacional – DEPEN, até junho de 2003, a população carcerária foi estimada em 284.989 mil pessoas e, o fator preocupante, é que, maior parte dessa massa de presos compunha-se de jovens em idade ativa.
Pesquisa realizada sobre o sistema prisional indicam que mais da metade dos presos tem menos de 30 anos; 95% são pobres, cerca de 85% das mulheres são mães, mais de 50% são negros e pardos, menos de 3% cumprem penas alternativas, etc.
Dentre os tipos de crimes praticados pelos encarcerados, destaca-se o crime contra o patrimônio, com aproximadamente 50% prevalecendo sobre o homicídio, 15%; tráfico de drogas, 10,6%; crimes sexuais, 6,9%; entres outros, 18,2%.
Também merece registro, ainda, conforme relatório acima evidenciado, o baixo nível de escolaridade dos detentos, mais de 90% tem menos dos que os oito anos de estudo garantidos pela Constituição Federal e, cerca de 12% são analfabetos.
No sistema prisional brasileiro apenas cerca de mil estrangeiros são mantidos presos, incluindo presos da Bolívia, Nigéria, Uruguai, África do Sul e Argentina.
Quanto ao cumprimento da pena, 90% são condenados a cumprir suas penas em regime fechado, enquanto os 10% restantes, cumprem penas em regimes semi-aberto, aberto e medida de segurança.
Conforme pesquisa do Tribunal de Alçada Criminal do Estado de São Paulo (TACRIM), com base em processos instaurados entre 1991 a 1999, revelou que o jovem entre 19 e 21 anos está envolvido nos crimes contra o patrimônio, respondendo por 63% dos furtos e 69% dos roubos, 85% dos presos tinham concluído apenas o 1.º grau, 10% o 2.º grau e 70% se declararam desempregados. O índice de reincidência era de 50%. A condenação é maior nos níveis mais baixos de escolaridade: 92% dos analfabetos foram condenados.
Este quadro alimenta o imaginário social brasileiro que, com sabedoria, associa criminalidade à desigualdade social e à seletividade do sistema de Justiça criminal, que pune os mais vulneráveis e cria inúmeros meios pelos quais os mais privilegiados podem escapar à ação da Justiça.
3. Os Estabelecimentos Carcerários
Os estabelecimentos carcerários, destinam-se ao condenado, ao submetido à medida de segurança, ao preso provisório e ao egresso. A população carcerária do Brasil está distribuída em vários estabelecimentos de diferentes categorias, incluindo penitenciárias, presídios, cadeias públicas, cadeiões, casas de detenção e distritos ou delegacias policiais. A LEP estabelece que as várias categorias de estabelecimentos sejam identificáveis por características específicas e que sirvam a tipos específicos de presos. Na prática, no entanto, essas categorias são muito mais maleáveis e a troca de presos das várias classificações entre os diversos estabelecimentos, muito maiores do que a lei sugere.
A LEP adota no seu art. 88, a regra de que “os detentos sejam mantidos em celas individuais, com requisitos básicos, como a salubridade e pelo menos seis metros quadrados”. De acordo com essa norma, vários presídios brasileiros possuem celas individuais em toda ou boa parte de suas áreas de reclusão. Mesmo assim, com exceção de alguns presídios, a superlotação superou os planos originais, ou seja, ao invés de manter um preso por cela, normalmente, essas celas estão sendo usadas para dois ou mais detentos. Em alguns estabelecimentos, a superlotação atingiu níveis desumanos, com presos amontoados em grupos.
Julio Fabrini Mirabete (1993, pag. 241) ressalta que:
(…) nos dias de hoje, no recinto das prisões, respira-se ar de constrangimento, repressão e verdadeiro terror, agravado pela arquitetura dos velhos presídios, em que há confinamento de vários presos em celas pequenas, úmidas, de tetos elevados, escassa luminosidade e ventilação, num ambiente que facilita não só o homossexualismo como o assalto sexual.
Várias doenças infecto-contagiosas tais como tuberculose e Aids são as doenças mais comuns entre a população carcerária brasileira. Geralmente, essas doenças são simultânea, pois quando uma pessoa está com Aids torna-se mais vulnerável à tuberculose.
Em 1995, pesquisadores da Universidade de São Paulo, constataram que 80% dos presos homens eram portadores do bacilo da tuberculose enquanto entre as presas esse percentual era de 90%. Esses resultados mostraram uma rápida evolução em relação a poucos anos atrás, indicando que o problema está se agravando. Aproximadamente 10% dos presos portadores do bacilo desenvolvem casos ativos da doença. Estudos conduzidos nos maiores presídios de São Paulo, por exemplo, constataram que entre 2% e 4% dos presos estão convalescendo dessa doença.
No final de 1997, conforme a pesquisa evidenciada acima, foi realizado um estudo e constatou-se que cerca de 20% da população carcerária do Brasil viviam com o vírus HIV. Ainda segundo essa pesquisa, os maiores índices de contaminação por HIV eram nos presídios do sudeste do Brasil. Em alguns momentos atingindo cerca de 30% deste contingente. Os índices mais baixos de contaminação foram encontrados no nordeste, onde apenas entre 2% a 3% dos presos estão contaminados.
Uma abordagem de campo realizada no Estado de Manaus revelou que inúmeras outras doenças afligem os presidiários, onde 41% deles tinham problemas de saúde, quase metade deles, possuíam doenças respiratórias e outros 11%, problemas digestivos. Um estudo conduzido por pesquisadores da Universidade de São Paulo revelou que 18% dos presos da Casa de Detenção tinham sífilis.
Embora a LEP, nos artigos 10 a 24, estabeleça que os presos devem ter acesso a vários tipos de assistência, inclusive assistência médica, jurídica e serviços sociais, nenhum desses benefícios é oferecido na extensão contemplada pela lei, nem mesmo a assistência médica básica e necessária está disponível sequer em níveis mínimos para muitos presos.
Assim, ao negar tratamento adequado aos presos, o sistema prisional não apenas ameaça a vida destes, como também facilita a transmissão dessas doenças à população em geral através das visitas conjugais e o livramento dos presos.
As populações carcerárias, em toda parte, tendem a requerer mais assistência médica do que a população como um todo. Contudo, as reclamações dos presos sobre a ausência de dessa assistência são bastante freqüentes.
A lei supra citada permite que a assistência técnico necessária seja prestada em outro local quando o estabelecimento penal não estiver aparelhado, mediante autorização da direção do estabelecimento, medida esta reconhecidas pelas Regras Mínimas da Organização da Nações Unidas (ONU).
Um relatório recente sobre o Hospital Penitenciário de Manaus ilustra algumas das deficiências do tratamento médico oferecido nos presídios do Brasil:
a) espaços físicos inadequado, incompatíveis com a prática de atividades médico-sociais;
b) distribuição inadequada de enfermeiros e seus assistentes, que não possuem o treinamento básico para exercer algumas de suas atribuições, especificamente o tratamento de doentes mentais;
c) inexistência de fundos mensais o que causa a falta de medicamentos básicos e resultam no comprometimento da saúde do paciente;
d) falta de equipamento técnico para facilitar o atendimento básico de emergência.
A Lei de Execução Penal (art. 83 e seguintes) preceitua que todos os presos condenados no Brasil deveriam ter oportunidade de trabalho, educação e treinamento. Apesar da lei claramente estabelecer isso, apenas a menor parte dos presos brasileiros tem a oportunidade de trabalho. Assim, os presos que trabalham são candidatos à redução de suas penas, com a escassez de trabalhos, contribui-se para a superlotação dos presídios.
Segundo a lei a supra citada (art. 110 e seguintes), os estabelecimentos para presos condenados seriam divididos em três categorias básicas: estabelecimentos fechados, i.e., presídios; semi-aberto, que incluem colônias agrícolas e industriais; e estabelecimentos abertos, i.e., casa do albergado. Um preso condenado seria transferido para um desses estabelecimentos segundo o período de sua pena, o tipo de crime, periculosidade avaliada e outras características. No entanto, se ele iniciasse o cumprimento de sua pena em um presídio, ele deveria normalmente ser transferido para um do tipo menos restritivo antes de servir toda sua pena, permitindo assim que ele se acostumasse com uma liberdade maior e, de forma ideal, ganhasse noções úteis, antes de retornar à sociedade.
A realidade brasileira passa longe das descrições da lei, porque, o sistema penal do país sofre a falta de uma infra-estrutura física necessária para garantir o cumprimento da lei. Em muitos estados, por exemplo, as casas dos albergados simplesmente não existem; em outros, falta capacidade suficiente para atender o número de detentos. Não existem vagas suficientes nos presídios para suportar o número de novos detentos, forçando muitos presos condenados a permanecerem em delegacias durante anos.
Segundo o Censo Penitenciário de 1995, os estabelecimentos penais brasileiros espalham-se por todo o país, mas estão mais concentrados nos arredores das zonas urbanas e regiões mais populosas. São Paulo, o estado mais populoso do Brasil, tem de longe a maior população carcerária, mantendo cerca de 40% dos presos do país, uma população carcerária maior do que a da maioria dos países latino-americanos. Outros estados com significativas populações carcerárias são os de Rio de Janeiro, Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Paraná e Paraíba.
Ainda, conforme o censo acima mencionado, no Brasil, oito dos vinte e seis estados, mantêm cada um menos do que mil presos. Dentre esses, há vários com os mais baixos índices de encarceramento; em outras palavras, suas pequenas populações carcerárias não apenas refletem seus menores números de habitantes como também que se prende uma proporção menor de pessoas. O Estado de Alagoas, por exemplo, possuía um índice de encarceramento de 17,8 presos por 100.000 habitantes em 1995, o menor índice do Brasil, daí, o estado só mantinha 478 pessoas confinadas, muito embora fique entre os estados brasileiros de população de médio porte.
Nesse contexto, observa-se que o Brasil administra um dos maiores sistemas penais do mundo.
4. A Violência no sistema carcerário
As prisões e penitenciárias constituem um espaço propício para produção e reprodução da violência, não só em relação a abusos entre os presos, como, também, aqueles cometidos por policiais carcerários.
Nas prisões mais perigosas, presos poderosos matam outros com impunidade, enquanto que em prisões relativamente seguras, extorsão e outras formas mais brandas de violência são comuns. Inúmeros fatores combinam-se para causar essas revoltas, a saber: os maus tratos, as torturas, a precariedade das condições de vida, as arbitrariedade de toda ordem dentro dos sistemas prisionais, a abundância de armas dentro das prisões, falta de supervisão suficiente, a má remuneração dos agentes penitenciários, falta de atividades e, talvez a mais importante, a falta de classificação dos presos, contribuem para o embrutecimento dos apenados, além do que, revelam a incapacidade do poder público em gerenciar as massas carcerárias.
Os atos de abusos de autoridade e violência praticados por policiais também constituem um sério problema. Mortes que resultam do uso de força excessiva em ações policiais ou, ainda, vítimas encontradas em circunstâncias suspeitas que indicam a ocorrência de execuções arbitrárias, são comuns em diversas regiões do país.
De acordo com informações prestadas pelo departamento de Ouvidoria de São Paulo, 272 pessoas foram mortas por policiais militares durante a primeira metade do ano de 2001, ou seja, três mortes a cada dois dias. Ainda que surpreendentes, os números apresentados apontam uma diminuição da prática de violência policial, se comparados com dados do mesmo período no ano de 2000. A maior parte das vítimas não tinha antecedentes criminais. Notadamente, negros ou mulatos foram desproporcionadamente sujeitos a tiroteios policiais fatais.
A Constituição Federal de 1998 prevê no seu artigo 5º inciso XLIX, do Capitulo dos Direitos e Garantias Fundamentais que “é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral”, mas o Estado continua fracassando nas prerrogativas mínimas de custódia; não conseguindo nem mesmo garantir a vida dos apenados que estão sob sua tutela e responsabilidade. Somam-se, ainda, a uma condição de marginalização, conforme bem explica Manoel Pedro Pimentel (1983, p. 156):
… o guarda de presídio faz parte de um grupo profissional marginalizado, porque não consegue granjear inteiramente a confiança da Administração e também não atinge a confiança do preso, embora esteja, pelas suas condições, muito mais próximas destes do que daquela.
Hoje, nas cadeias e presídios, estão pessoas que, em sua grande maioria, praticaram pequenos delitos e são obrigados a conviverem, ainda que com penas menores, as mesmas punições que aqueles que cometeram grandes delitos ou são reincidentes violentos.
O Censo Penitenciário Nacional de 1994 reportava um total de 131 homicídios entre os presos e quarenta e cinco suicídios. Embora estas estatísticas não sejam nem de longe chocantes como as de outros países da América Latina, elas permanecem indicando às autoridades que elas precisam tomar medidas para prevenir a violência nas prisões. A pesquisa da Human Rights Watch sugere, de forma complementar, que o número de homicídios recentes entre os presos é substancialmente maior, porque, infelizmente, o Censo Penitenciário realizado no ano de 1995, falhou em providenciar qualquer informação estatística sobre violência nas prisões.
Não se pode deixar de citar a chacina ocorrida em 2 de outubro de 1992, na Casa de Detenção de São Paulo – Carandiru, uma das piores tragédias ocorridas no sistema prisional brasileiro, em que 111 presos foram mortos por membros da Polícia Militar. Infelizmente, o massacre no Carandiru não constitui fato isolado. Em várias ocasiões, integrantes das polícias civil e militar espancaram detentos depois de dominar rebeliões e tentativas de fuga
Não obstante a existência de inúmeras regras, a violência continua a fazer parte da relação entre agentes penitenciários e/ou policiais e prisioneiros. Contribui-se para esta realidade a impunidade e a falta de investigação quanto aos abusos físicos cometidos aos mesmos.
As Regras Mínimas para Tratamento de Reclusos (ONU) em seu artigo 46.1 estabeleceu que, in verbis:
Art. 46.1. A administração penitenciária escolherá cuidadosamente o pessoal de todos os graus, uma vez que da integridade, humanidade, aptidão pessoal e capacidade profissional desse pessoal dependerá a boa direção dos estabelecimentos penitenciários.
Acrescenta, ainda, As Regras Mínimas, nos artigos 23 e 24, que sejam estabelecidas normas que proíbam a aplicação indiscriminada de sanções, in verbis:
Art. 23. Não haverá falta ou sanção disciplinar sem expressa e anterior previsão legal ou regulamentar.
Parágrafo único – As sanções não poderão colocar em perigo a integridade física e a dignidade pessoal do preso.
Art. 24. São proibidos, como sanções disciplinares, os castigos corporais, clausura em cela escura, sanções coletivas, bem como toda punição cruel, desumana, degradante e qualquer forma de tortura.
Em atendimento a essas e outras orientações nacionais e internacionais, a Lei de Execução Penal (Lei nº 7.210/93), estabelece nos seus artigos 44 a 60, diversas normas sobre a disciplina nos estabelecimentos penais, ressaltando o § 1º do art. 45, em que “as sanções não poderão colocar em perigo a integridade física e moral do condenado. Não podem as autoridades, ao livre arbítrio, estabelecer e aplicar penalidades, sem a observância das normas legais”.
5. A influência da prisão na vida dos presos
A verdadeira finalidade da prisão parece ter sido esquecida. Ressocializar a pessoa presa, nas situações atuais é tarefa impossível. Denise de Roure (1998, p. 15-17), evidenciou que falar em reabilitação é quase o mesmo que falar em fantasia, pois hoje é fato comprovado que as penitenciárias em vez de recuperar os presos os torna piores e menos propensos a se reintegrarem ao meio social.
O fato de o indivíduo estar encarcerado e isolado do de outro indivíduos da sociedade pode causar distúrbios em sua conduta.
O mais notório entre outros problemas de ordem psicológica é o sentimento de vingança contra a sociedade, de injustiça e de inferioridade, fazendo com que esses presos tenha uma vontade de vingar-se, refletindo, quando soltos, em continuados atos criminosos.
O encarceramento do indivíduo impõe um rompimento de vinculo com a sua família e com a privacidade do lar. Na prisão, o indivíduo tem que se adaptar a uma nova realidade, passa a conviver dentro de grupos fechados, que tem como grupo maior à população carcerária de onde se encontra recolhido, com regras próprias e peculiares nas quais os indivíduos descendem de diferentes realidades sociais, concepções diferentes em relação à família, a vida em sociedade, ao comportamento, ao ambiente, a religião e também de diversas faixas etárias. Essa convivência com uma realidade distinta a sua, ocasiona a gradativa perda da própria individualidade e mutação na sua conduta social. A promiscuidade, conseqüência da superlotação, por se reunirem numa mesma cela um amontoado de presos das mais variadas espécies nas prisões, é tão grande que faz com que o preso, com o tempo, perca o sentido. Em vez do Estado por meio da pena, guiar a sua reintegração ao meio social, fornecendo ao preso capacidade ética, profissional e de honra, age de forma contrária, introduzindo o condenado num sistema destruidor de personalidade.
Na prisão todas as relações sociais são diferenciadas dos padrões sociais comuns. É o início da perda da identidade, moldando-se enfim, uma nova pessoa aprisionada.
A submissão à nova realidade e a subordinação absoluta que os presos são submetidos privando-os complemente de autonomia, são outros aspectos fundamentais que contribuem para esta perda de identidade. Uma vez que não só estão subordinados diretamente à direção do estabelecimento prisional, ao guardas, aos regulamentos e aos horários, bem como as regras que entre os detentos é estabelecida.
A vedação imposta ao preso de extremar sua opinião ou a sua vontade ocasiona um retardamento na readaptação do indivíduo, pois essa submissão às regras pré-determinadas e estabelecidas por terceiros, diferem-se das regras aplicadas na sociedade comum, causando ao indivíduo sua autodeterminação.
A violência é mais um aspecto relevante e decorrente da falência do sistema atual, contribuindo para a mutação do comportamento do preso, uma vez que se torna praticamente impossível a quem vive em ambiente carcerário, sujo, sem privacidade, sem respeito ao homem e dignidade humana, deixar de incorporar atitudes violentas em sua conduta perante terceiros.
Nesse sentido, insalubridade e má conservação das instalações, condições inadequadas de higiene, de assistência à saúde e a alimentação, além da falta de despreparo técnico dos recursos humanos utilizados no corpo administrativo e funcional das instituições, bem como submissão, a privação do convívio com a família e com os amigos, a contaminação do indivíduo com diferentes realidades, somadas ao ambiente promiscuo existente dentro dos estabelecimentos prisionais, conjugados com o tráfego de drogas e ainda com a superlotação dessas unidades são os principais aspectos que necessitam serem revistos, melhorados e muito, para que se obtenha do estabelecimento prisional brasileiro que se espera.
O sistema carcerário está centrado preponderantemente na premissa da exclusão social do criminoso, visto como perigoso e insubordinado. O enclausuramento e a vigilância a que está submetido é estrategicamente ordenado por mecanismos de opressão.
O Estado coloca nas prisões presos, às vezes, nem tão perigosos, mas que no convívio com a massa prisional iniciam um curto e eficiente aprendizado de violência, corrupção, promiscuidade e marginalidade, manifestada quer no comportamento dos presos, quer no dos agentes incumbidos de preservar a ordem interna.
O sentenciado quando ingressa no sistema penitenciário, deve adaptar-se, rapidamente, as regras da prisão. Seu aprendizado, nesse universo, é estimulado pela necessidade de se manter vivo e, se possível, ser aceito no grupo. Portanto, longe de ser ressocializado para a vida livre, é, na verdade, socializado para viver na prisão.
Dentro das penas, o regime de controle disciplinar apresenta dois aspectos antagônicos: por um lado, o policiamento tático, meticuloso, que controla uma possível insubordinação, impondo ao preso o mecanismo de disciplina individualizante. Por outro lado, a universalidade do controle disciplinar que permite ao preso, conhecer seu protótipo ideal, bem como fabricar os mecanismos de poder. Assim, o preso adota um comportamento, uma personalidade de fachada, destinada a salvar as aparências e livrá-lo do sistema prisional.
O preso, descrente da legislação vigente e em face da forma como é tratado, vê com ceticismo e desconfiança a perspectiva de sua recuperação pelas regras impostas através do sistema prisional, e desenvolve uma aguda sensibilidade aos excessos de punição que lhe infligem as precárias condições da prisão e as penas privativas de liberdade.
Capítulo IV
Sugestões para minorar a crise no sistema penitenciário
1. Recuperação do sistema penitenciário brasileiro
A arquitetura dos estabelecimentos penais, hodiernamente, revela-se como um aparelho destruidor da honra e dignidade que ainda resta ao preso. A Constituição Federal de 1988 contém garantias explícitas para proteção da população encarcerada, entre essas o inciso XLIX do artigo 5º onde “é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral”.
Segundo a tese de que o objetivo primordial do sistema carcerário é a ressocialização e conseqüente integração do preso à sociedade, faz-se necessário que o Estado exerça uma política voltada para a recuperação do nosso atual sistema prisional, assegurando às pessoas que venham a cumprir a pena privativa de liberdade condições adequadas de readaptação, pois essas pessoas voltarão a conviver na sociedade e por isso é imprescindível que elas sejam ressocializadas nesse período.
Michel Foucault (1999, p.224/225), enumera os sete princípios básicos para uma boa condição penitenciária:
· Princípio da correção, onde a detenção penal deve então ter por função essencial a transformação do comportamento do indivíduo;
· Princípio da classificação, por este princípio, os detentos devem ser isolados ou pelo menos repartidos de acordo com a gravidade penal de seu ato, mas principalmente segundo sua idade, suas disposições, as técnicas de correção que se pretende utilizar para com eles, as fases de sua transformação;
· Princípio da modulação das penas, através deste, as penas, cujo desenrolar pode ser modificado segundo a individualidade dos detentos, os resultados obtidos, os progressos ou as recaídas;
· Princípio do trabalho como obrigação e como direito, neste princípio, o trabalho deve ser uma das peças essenciais da transformação e da socialização progressiva dos detentos;
· Princípio da educação penitenciária, a educação do detento é, por parte do poder público, ao mesmo tempo uma precaução indispensável no interesse da sociedade e uma obrigação para com o detento;
· Princípio do controle técnico da detenção, o regime da prisão deve ser, pelo menos em parte, controlado e assumido por um pessoal especializado que possua as capacidades morais e técnicas de zelar pela boa formação dos indivíduos;
· Princípio das instituições anexas, o encarceramento deve ser acompanhado de medidas de controle e de assistência até a readaptação definitiva do antigo detento. Seria necessário não só vigiá-lo à sua saída da prisão, mas prestar-lhe apoio e socorro.
A moderna arquitetura penitenciária tem que ter preocupações mais amplas do que teve no passado, partindo do pressuposto de que as horas do preso vão ser divididas entre o descanso, trabalho, a educação, as atividades recreativas e esportivas, conforme preceitua a LEP.
Nesse sentido, posiciona-se Júlio Fabbrini Mirabete (1993, p. 241):
Já se tem afirmado que uma autêntica reforma penitenciária deve começar pela arquitetura das prisões. Entretanto, ainda nos dias de hoje no recinto das prisões respira-se um ar de constrangimento, repressão e verdadeiro terror, agravado pela arquitetura dos velhos presídios em que há confinamento de vários presos em celas pequenas, úmidas, de tetos elevados e escassas luminosidade e ventilação, num ambiente que facilita não só o homossexualismo como o assalto sexual.
Augusto Thompson (1980, p. 1) em sua obra, A Questão Penitenciária, deixa claro que dois são os objetivos fundamentais na recuperação do Sistema Penitenciário: “propiciar à penitenciária condições de realizar a regeneração dos presos, e dotar o conjunto prisional de suficiente número de vagas, de sorte a habilitá-lo a recolher toda clientela que, oficialmente, lhe é destinada”.
Para alcançar esses objetivos é necessário que o Estado destine verbas para construir novas penitenciárias, recuperar as já existentes e manter um grande número de funcionários para assegurar o bom funcionamento do estabelecimento e fornecer aos presos programas destinados a sua recuperação, reeducação e reintegração ao meio social.
Como adverte Alvino Augusto de Sá (2002, p. 238):
Há que se repensar profundamente a questão carcerária e a começar da própria edificação, do próprio arranjo arquitetônico do presídio. Tal arranjo pode estar serviços, seja de uma piora gradativa da qualidade de adaptação da conduta do preso, rumo à reincidência, seja de uma melhora gradativa, rumo a ressocialização e readaptação social.
Os centros penitenciários, conforme amparo legal, devem conter os locais adequados para dormitórios individuais ou coletivos, enfermarias, escolas, biblioteca, oficinas, instalações recreativas e esportivas, pátios, cozinhas, sala de recreação entre outros. O artigo 83 caput da LEP determina que “o estabelecimento penal, conforme a sua natureza, deverá conter em suas dependências, áreas e serviços destinados a dar assistëncia, educação, trabalho, recreação e prática esportiva”.
A reestruturação dos presídios, não se trata de normas destinada a desartificializar o cenário que ainda hoje transparece em muitos presídios, nos quais se conserva a arquitetura e o cheiro de antiguidade medievais, Mas de um verdadeiro imperativo de ordem material para que se cumpram os propósitos externados pela Lei de Execução. Este objetivo só será alcançado quando possibilitarem todas as atividades que devem ser desenvolvidas pelos presos e internados em locais a elas adequados.
A falta de vagas nas prisões e de pessoal são particularmente dramáticas, por isso, são indiscutíveis a necessidade de se contratarem mais funcionários e construir novos estabelecimentos para suprir tamanho déficit de vagas, bem como readaptar os presídios existentes, devendo ser obedecidas as regras gerais referentes aos estabelecimentos prisionais como: tamanho e números dos presos para cada cela e áreas destinadas à assistëncia, ao trabalho, direitos e deveres dos presos, conforme estabelecem os artigos 10 a 60 da LEP.
Também merece registro, a questão das penitenciárias estarem há vários anos, ausente da agenda política tanto a nível Federal quanto Estadual. É um problema tratado apenas no âmbito da polícia e da justiça e a sociedade se contenta apenas com o encarceramento do criminoso. Portanto, é imprescindível debater a questão com as instituições, a sociedade e os políticos associando-a as políticas públicas dirigidas a outros segmentos da sociedade como saúde, educação, geração de empregos e renda.
É importante ressaltar que apenas a contratação de pessoal, a construção e adaptação dos estabelecimentos já existentes, bem como a aplicação de programas destinados à recuperação e reintegração dos presos à sociedade são insuficientes para solucionar a grave crise que aflige o sistema penitenciário, somando-se a isto, a situação econômica inviável e da falta de vontade política para a recuperação do sistema penitenciário brasileiro, a opção é buscar outras alternativas, como a aplicação do direito penal alternativo conjugado com o princípio da intervenção mínima onde a prisão seria a última das medidas a ser adotada.
2. Reforma Sócio-Econômica
Nos últimos anos, o Brasil sofreu profundas, sucessivas e apressadas transformações políticas econômicas, financeiras e legais com naturais vantagens e muitas desvantagens, sobretudo estas pela ausência de uma verdadeira política social e econômica que trouxesse realmente benefícios para o povo, ocorrendo, então uma correlação entre o alto nível de desemprego e o aumento da criminalidade, principalmente da violência.
Nesse contexto, a má distribuição de renda provocada pelos recentes planos econômicos, bem como os processos de urbanização e industrialização, intensificados, notadamente nos últimos anos, causaram a grande movimentação demográfica, obrigando as grandes cidades a receberem milhares de pessoas provindas do campo, vítimas da pobreza, da falta de assistência e do abandono.
A grande maioria dessas pessoas são totalmente despreparadas para o campo profissional seletivo de trabalho dos grandes centros urbanos, o que acaba gerando numerosos conglomerados, de cidadão desempregados, nas periferias das grandes cidades brasileiras com a formação de verdadeiros bolsões de pobreza, onde pessoas das mais variadas posições sociais e costumes se misturam.
Essa situação gera tensão permanente, levando pessoas que, vivendo em condições precárias, na incerteza de se conseguir trabalho e até mesmo de sobreviver diante da deficiência de estrutura básica urbana, da falta de habitação, educação, saúde, etc., perdem os valores morais e referenciais e, em presença dos defeitos de vigilância e repressão, se envolvem na prática da violência, sobretudo de roubos e furtos que atinge aproximadamente 50% dos delitos cometidos pelos homens que o Estado, em face de sua omissão, transforma-os em detentos.
Ante a conjuntura social exposta, faz-se necessário a adoção de reformas econômicas e sociais, concretas e decisivas, visando a elevação do nível de vida dos cidadãos brasileiros e proporcionando-lhes melhores condições de viverem com dignidade. Assim, torna-se indispensável rever as estratégias de batalha contra o crime, efetuando, nesse sentido, critérios jurídicos e políticos.
É importante ressaltar , ainda, o importante papel da família, da escola, do trabalho, entre outros, no estimulo do desenvolvimento da política social que contribui para a prevenção do crime. Esses fatores devem ser considerados no planejamento nacional, do progresso da política penal, como também, nos programas preventivos da criminalidade.
3. Aplicação de penas e medidas alternativas
Atualmente, o grande desafio do mundo é reduzir, ao máximo, a aplicação das penas privativas de liberdade, porque estas penas são caras, desumanas e não ressocializam os condenados.
Nesse sentido, se posiciona César Leal (2000, p. 26) reforçando que o sistema prisional fracassou; “a prisão faliu, isto porque, além de não intimidar, não recupera ninguém. Em outras palavras, não cura, corrompe”.
Segundo esse autor, países como Suécia, Espanha, Japão e Coréia do Sul oferecem uma execução penal digna, da qual constam a oferta de trabalho, conforto e assistência material, social, médica e jurídica em níveis adequados. Porém, é interessante observar que neles os índices de reincidência são elevados e se justificam por diferentes razões, estando entre elas: a própria prisão, uma organização social, sistema de poder, espaço de violência, de artificialismo e promiscuidade, no tocante às relações interpessoais.
Acrescenta, ainda, esse autor, diante desse contexto, a justificativa da necessidade de penas e medidas alternativas, em resposta à falência do sistema prisional e consolidando a percepção de que o cárcere deve ser visto como ultima ratio, um mal necessário que cumpre restringir-se apenas aos crimes graves, aos crimes violentos, sem dúvida muito menos onerosas, mais humanas e capazes de garantir a reintegração do condenado, na medida em que não o afastam do trabalho, da família e do grupo social ao qual pertence.
Tais penas, encaradas no contexto de uma política penal de intervenção mínima, estão sendo aplicadas cada vez mais em todo o mundo, sendo o caso, por exemplo, do Japão, onde menos de 6% das penas aplicadas são de privação da liberdade, e da Alemanha, onde 80% das infrações são sancionadas com multas ou penas restritivas de direito.
Esta opinião, também foi defendida no IX Congresso da ONU (1995), sobre Prevenção do Crime e Tratamento do Delinqüente onde se recomendou a utilização da pena privativa de liberdade em último caso, somente nas hipóteses de crimes graves e de condenados de intensa periculosidade; para outros delitos e criminosos de menor intensidade delinquencial, medidas e penas alternativas.
É válido, não deixar de expor a opinião pessoal de um dos mais renomados penalistas de nosso país, Dr. Damásio E. de Jesus:
É crença errônea, arraigada na consciência do povo brasileiro, a de que somente a prisão configura a resposta penal. A pena privativa de liberdade, quando aplicada genericamente a crimes graves e leves, só intensifica o drama carcerário e não reduz a criminalidade. Com um agravante: a precariedade dos estabelecimentos prisionais no Brasil, permitindo a convivência forçada de pessoas de caráter e personalidades diferentes (1997, pag. 48).
Nessa perspectiva, as penas alternativas vêm de encontro aos males da reclusão, mantendo o condenado (responsável por pequenas infrações) sob controle, em seu meio familiar, não podendo, por isso, jamais ser considerada com impunidade ou como remédio para todos os males, físicos e morais.
A consolidação do ideário das penas alternativas resulta do malogro da pena privativa de liberdade de curta duração e este malogro, por sua vez, não deriva da precariedade física que afeta a maioria das prisões (…) O fracasso provém da prisão em si mesma, como instituição total, fomentadora de uma subcultura inapta a garantir o cumprimento da meta de ressocialização, uma das mais ridículas falácias do direito penal (…). (LEAL, 1998, p. 4)
Na realidade, a pena privativa de liberdade vem perdendo gradualmente espaço frente as penas alternativas, entre elas, inclusive, a admoestação ou repreensão pública, em audiência ou privada; o exílio local ou rural; o pedido de desculpas à vítima; a multa assistencial ou indenizatória; o tratamento de desintoxicação; a proibição de freqüência a determinados lugares; a manutenção de distância da vítima e o confisco de bens pessoais, entre outras.
No Brasil, a legislação prevê a aplicação de várias medidas alternativas à pena de prisão. Entre as leis mais recentes, editadas com o fim de ampliar os substitutivos à pena privativa de liberdade, destacam-se as Leis nº 9.099/95 e 9.714/98.
A Lei nº 9.099/95, apelidada de despenalizante, introduziu novas possibilidades de aplicação de medidas alternativas consensuais despenalizadoras, como a composição civil extintiva da punibilidade, exigência de apresentação nas lesões corporais culposas e dolosas leves, aplicação de pena alternativa, suspensão condicional do processo, conforme os artigos 74, parágrafo único, 88, 76 e 89, respectivamente, que favoreceu a ressocialização do infrator.
A Lei nº 9.714/98, além de reforçar o arsenal colocado a disposição do magistrado, que já dispunha das tradicionais penas de prestação de serviços à comunidade, a interdição temporária de direitos e a limitação de fim de semana, cria outras, como a prestação pecuniária, a perda de bens e valores, entre outras sanções substitutivas menos severas, também estendeu, extraordinariamente, a sua aplicação a condenações até quatro anos de reclusão ou detenção. Antes, essa substituição só era aplicada a condenações de até um ano.
Contrariamente, no entanto, existem as campanhas, os movimentos de lei e de ordem que estimulam uma legislação de conjuntura, proclamando ser necessária a pena severa de longa duração. As sugestões apoiam-se, segundo LEAL (2000), no modelo americano que optou pela aplicação de penas rigorosas e pelo encarceramento em larga escala.
Esse impasse denota, até o presente, uma relativa timidez do sistema penal na adoção da pena alternativa em larga escala, do que se pode conotar uma resistência mais cultural, haja vista a lógica dos fatos e a realidades das prisões constituírem o argumento maior em favor dessa pena.
4. A Privatização e a Terceirização do sistema carcerário
O sistema penitenciário brasileiro encontra-se em franca decadência e não recupera ninguém, ao lado da enorme carência de vagas nos estabelecimentos já existentes, tornando-se de extrema importância o aparecimento de alternativas novas para solucionar este grave problema social. Assim, é dentro deste contexto que surgiu o fenômeno privatização do sistema carcerário, e que, hodiernamente, já é adotado em diversos países.
A idéia de privatização do sistema carcerário é nova no Brasil, como também no mundo, pois somente há cerca de, aproximadamente, dez anos é que se criaram os chamados presídios privados.
Aliás, a chamada privatização dos presídios é uma denominação inadequada, pois não se trata de vender em Bolsa ações dos estabelecimentos prisionais, mas tão somente chamar e admitir a participação da sociedade, da iniciativa privada, que viria colaborar com o Estado nessa importante e arriscada função que é a de administrar nossas unidades prisionais, vez que a gestão privada poderia oferecer soluções onde a burocracia estatal tem demonstrado sua total ineficácia.
Há, hoje, mundialmente, duas formas de privatização. A primeira é o modelo americano, nesta o preso é entregue pelo Estado à iniciativa privada que o acompanhará até o final de sua pena, ficando aprisionado nas mãos do administrador. No Brasil é indelegável o poder jurisdicional do Estado, que contempla o tempo que o homem fica encarcerado e suas infrações disciplinares no cárcere. A Segunda é o modelo francês, adotado pelo Brasil, onde o Estado permanece junto à iniciativa privada, numa co-gestão. O administrador gerencia ss serviços da unidade prisional como alimentação, higiene lazer e etc. Já o Estado administra a pena, cuidando do homem sob o aspecto jurídico, punindo-o ou prevenindo-o quando merecer, isto é, em nenhuma hipótese a contratação dos serviços operacionais diminui a competência e o poder da administração pública ou dever do Estado.
Os defensores da privatização dos presídios defende que este método de administrar traz a melhoria da condições de vida dos familiares do preso, o incremento da atividade produtiva na região, a redução de gastos com funcionários, o aumento de vagas na iniciativa privada, etc.
Os que argumentam contra a privatização, apresentam teses difíceis de serem sustentadas e, mais das vezes não oferecem alternativas. O ponto principal dos defensores desta idéia é o enfoque materialista e a possibilidade de exploração do trabalho do preso, ou melhor, temem a transformação dos presídios em unidades de trabalho forçado, abusando-se da força laborativa do preso que pode ser levado a excesso e, a criação de situação análoga ao escravagismo
A terceirização, é outra forma de participação da iniciativa privada que, ao contrário da privatização, há no ordenamento jurídico, previsão legal, dispensando-se qualquer reforma legislativa e, é bem aceita pelos juristas, porque ela faz cumprir a lei, oferecendo efetivas condições para que o preso se recupere. Já o sistema estatal só piora o preso, no seu retorno à vida livre na sociedade.
A primeira experiência, no Brasil, de terceirização dos serviços penitenciários teve lugar no Paraná, e mais especificamente, na Penitenciária industrial de Guarapuava. Trata-se de um exemplo de parceria entre a segurança pública e privada, onde o presídio, administrado pelo governo do estado, obedece ao modelo de terceirização dos serviços, a cargo de empresas privadas, que inclui segurança interna, assistência social, médica e psicológica, entre outras.
As dependências para serviços técnicos são dotadas de parlatório privativo para advogados, consultório médico, enfermaria, ambulatório, gabinete dentário, farmácia, gabinete psicológico, salas de aula, setor de informática e biblioteca.
As dependências para serviços gerais contam com cozinha, refeitório, lavanderia, rouparia e padaria.
O estabelecimento é dotado de espaços destinados ao lazer e visitas, inclusive de natureza íntima, sendo todo o aparato material necessário proporcionado pela empresa contratada como roupa de cama, uniforme, material de higiene e limpeza etc.
A todos os internos, além do trabalho remunerado, é propiciada a educação gratuita da alfabetização ao ensino médio.
Todo material escolar é fornecido pela Secretaria de Educação, e todas as atividades desenvolvidas são acompanhadas por técnicos em pedagogia.
A assistência laborterápica é exercida através do encaminhamento do preso aos canteiros de trabalho internos e externos, de acordo com a possibilidade e aptidão de cada um.
Já a Segunda experiência ocorre em Juazeiro do Norte, Ceará, com os mesmos resultados destacados na penitenciária do Paraná, destacando-se, que os presos, que também trabalham, confecciona jóias, sem que tenha havido qualquer incidente.
De acordo com estudos realizado pelo governo do Paraná, os índices de reincidência nos presídios de gestão compartilhada com a iniciativa privada é de apenas 2%, enquanto nos demais é de 82%. Não existe rebeliões e fugas nesses estabelecimentos. Isso prova que a iniciativa privada pode contribuir com o poder público, de forma decisiva, para a melhoria do sistema prisional brasileiro e a um custo menos oneroso
É importante ressaltar que a terceirização tem se revelado uma barreira eficaz à corrupção que nas demais prisões prolifera.
Porém, a terceirização dos presídios é uma alternativa e não implica na perda de direção do estabelecimento pelo Estado, e sim, que determinados serviços sejam executados pela iniciativa privada.
Assim, todavia, quanto mais rápido o governo multiplicar essas experiências pelo país, maior será a possibilidade de retomar o controle do sistema prisional, hoje dominado por criminosos que dirigem, de dentro das cadeias, os seus comparsas livres.
5. Programa Nacional dos Direitos Humanos
A Constituição da Declaração Universal dos Direitos Humanos se deu graças a uma intensa luta para sua efetivação, eles consistem um poder adquirido por toda a humanidade, pois foram concebidos através de uma luta coletiva a fim de garantir uma vida digna e diminuir as diferenças sociais e políticas.
Os direitos humanos são os direitos fundamentais de todas as pessoas e devem ser protegidos em todos os Estados e nações. Assim com o objetivo de reprimir a banalização da violência e proteger a existência humana, o governo federal por meio do Ministério da Justiça em conjunto com diversas organizações da sociedade civil, decidiu elaborar um programa que tem como finalidade elementares:
· Proteção de direito à vida;
· Proteção de direito à liberdade;
· Proteção do direito a tratamento igualitário perante à lei;
· Proibição de distribuição de informações e conhecimentos;
· Conscientização e mobilização pelos direitos humanos;
· Ratificação, implementação pelos direitos humanos;
· Apoio à organização e operações de defesa dos direitos humanos; e
· Implementação e monitoramento do Programa Nacional dos Direitos Humanos.
O Programa contempla uma ampla lista de medidas na área de direitos civis que terão conseqüências decisivas para a efetiva proteção dos direitos sociais, econômicos e culturais. Na apresentação do programa, o governo reconhece que não há como conciliar democracia com as mais variadas formas de exclusão, e as violações reiteradas aos direitos humanos que ocorrem em nosso país.
Um exemplo histórico de violação dos direitos humanos em nosso país, é o que ocorre nas prisões brasileiras, a começar pelas condições insalubres de acomodação, vários presídios mantém uma superlotação, e, ainda, nos dias atuais existe o mito de que a prisão é o ambiente de sofrimento, onde o condenado não deve perder somente a liberdade, mas deve ser punido, castigado e torturado como forma de pagar pelo seu erro.
Também os centros de detenção destinados a menores, constituem exemplos de violação aos direitos humanos, em face da desorganização e as péssimas condições em que se encontram; não existe separação por idade ou infração cometida, e os jovens mais velhos de abusam e espancam os mais novos sob o aparente consentimento das autoridades de tais estabelecimentos.
Assim, todavia, o Programa Nacional de Direitos Humanos enfatiza a importância do compromisso do Estado e da sociedade com a proteção e promoção dos direitos humanos e do estabelecimento de uma parceria entre o Estado e a sociedade para aumentar o grau de respeito aos direitos humanos no Brasil.
Entre as ações propostas no Programa Nacional de Direitos Humanos, destacam-se, aqui, aquelas que visam à proteção do direito à liberdade, as quais transcrevo na íntegra:
Curto prazo
· Reativar e difundir nos Estados o sistema de informática penitenciária – INFORPEN, de forma a agilizar processos e julgamentos e evitar excessos no cumprimento de pena;
· Apoiar programas de emergência para corrigir as condições inadequadas das prisões, criar novos estabelecimentos e aumentar o número de vagas no país, em parceria com os Estados, utilizando-se recursos do Fundo Penitenciário Nacional – FUNPEN;
· Estimular a aplicação dos dispositivos da Lei de Execuções Penais referentes a regimes de prisão semi-aberto e aberto;
· Incentivar a implementação de Conselhos Comunitários, conforme determina a Lei de Execuções Penais, em todas as regiões, para auxiliar, monitorar e fiscalizar os procedimentos ditados pela Justiça criminal;
· Levar à discussão, em âmbito nacional, sobre a necessidade de se repensar as formas de punição ao cidadão infrator, incentivando o Poder Judiciário a utilizar as penas alternativas contidas nas leis vigentes com vistas a minimizar a crise do sistema penitenciário;
· Propor legislação para introduzir penas alternativas à prisão para os crimes não violentos;
· Estimular a criação de cursos de formação de agentes penitenciários;
· Propor normatização dos procedimentos de revista aos visitantes de estabelecimentos prisionais, com o objetivo de coibir quaisquer ações que atentem contra dignidade e os direitos humanos dessas pessoas.
Médio prazo
· Incentivar a agilização dos procedimentos judiciais, a fim de reduzir o número de detidos à espera de julgamento;
· Promover programas de educação, treinamento profissional e trabalho para facilitar a reeducação e recuperação do preso;
· Desenvolver programas de assistência integral à saúde do preso e de sua família;
· Proporcionar incentivos fiscais, creditícios e outros às empresas que empreguem egressos do sistema penitenciário;
· Realizar levantamento epidemológico da população carcerária brasileira;
· Incrementar a descentralização dos estabelecimentos penais, com a construção de presídios de pequeno porte que facilitem a execução da pena próximo aos familiares dos presos.
Longo Prazo
· Incrementar a desativação da Casa de Detenção de São Paulo (Carandiru), e de outros estabelecimentos penitenciários que contrariem as normas mínimas penitenciárias internacionais.
Conclusão
A presente monografia procurou abordar de forma analítica a problemática do sistema de execução penal que é a questão de se o sistema de execução penal, realmente recupera o indivíduo. O sistema revela a existência de inúmeras e sérias deficiências que afetam intimamente a honra e a dignidade do indivíduo, tornando-se ineficaz à sua reabilitação.
Constatou-se que a pena se destina a um fim prático; a prevenção – geral e especial – porém, face a crise do sistema penitenciário, a prevenção especial praticamente não existe. Prisões superlotadas, com suas inegáveis falhas e deficiência no cumprimento das funções que lhes são atribuídas por lei, com lamentáveis condições de vida, sem infra-estrutura física, impossibilita a redução e readaptação do apenado. Não são oferecidas aos presos meios para que se recupere e volte à vida em sociedade, contrariamente, acaba por envolvê-lo em um sistema de privações e violência, devendo obedecer normas e regras instituídas por lei e pelos próprios detentos. Essa submissão às regras pré-determinadas e estabelecidas por terceiros e a convivência com pessoas de valores totalmente adversas daqueles oferecidas na sociedade comum, ocasiona um retardamento na sua readaptação e uma dificuldade de autodeterminar-se. Sua ressocialização, no entanto, se dá para a sobrevivência na prisão e não para a vida em liberdade.
Quanto a prevenção geral, o sistema penal brasileiro mostra-se ausente de rumo e está colhendo o fracasso de seus contraditórios. A inexistência de uma política criminal única estabelecida pelos poderes executivos e legislativos, além de não ter conseguido baixar os índices de criminalidade, gera a consciência popular de impunidade, aumenta a lentidão da justiça criminal e agrava o problema penitenciário.
Evidencia-se no estudo realizado, que a pena privativa de liberdade deve ser a última forma de penalizar o indivíduo, pois há muito se tem demonstrado ineficiência, não atingindo os fins a que foi proposta. Suprimi-lo por inteiro, contudo, não é possível. Devem, no entanto, serem reservados para os agentes de crimes graves e cuja periculosidade recomende seu isolamento do meio social.
A adoção de penas e medidas alternativas, reduzindo a aplicação das penas privativas de liberdade, constituem formas concretas de respeito aos direitos humanos; proporcionam a diminuição do custo dos sistema repressivo; promovem a adequação da pena à generalidade objetivo do fato e às condições pessoais do apenado, além de contribuírem para o não encarceramento do indivíduo nas infrações penais de menor petencial ofensivo, cumprindo, portanto, os desígnios da prevenção especial e da prevenção geral, tornando possível a recuperação do criminoso ao convívio social. Porém, cabe ao Estado viabilizar recursos que possibilitem a efetiva aplicação das penas e medidas alternativas à prisão.
Constatou-se, ainda, que apesar da incontestável importância das medidas não-privativas de liberdade, deve-se reconhecer que apenas estas não são suficientes para superar a crise do sistema prisional, visto que os mesmos não reduzem o número de encarcerados – referente a superpopulação – bem como não têm o conteúdo intimidativo, parecendo mais uma medidas disciplinadora.
Portanto, o Estado necessita de medidas práticas para garantir aos que estão sob sua custódia, as proteções de seus direitos como cidadãos e o respeito a sua integridade física e moral. É fato que, o modo como está sendo colocado em prática o encarceramento é falho, e, ainda, é um flagrante desrespeito aos direitos humanos do presos às suas possibilidades concretas de recuperação e reintegração social não permitindo que o apenado volte a viver em comunidade uma vez que tenha sua pena cumprida.
Ao sistema carcerário deve-se implementar idéias e inovações penais, destacando-se a recuperação dos estabelecimentos prisionais, a construção de novos estabelecimentos carcerários para os diferentes regimes de cumprimento de pena, desenvolvimento de programas voltados á recuperação do preso, introdução de penas e medidas alternativas à prisão, implantação de privatização e terceirização de presídios, já adotados por outros países, desde que preserve a função jurisdicional do Estado, adoção de programas de desenvolvimento econômico e social e de prevenção a criminalidade entre outras medidas.
Em contrapartida, não se pode negar que o Estado vem desenvolvendo medidas no sentido de solucionar esses problemas. Porém, nota-se, evidentemente, que tais medidas têm-se demonstrado modestas e incapazes de minimizá-los.
Ante o aumento da criminalidade, sobretudo da violência a sociedade brasileira tem exigido cada vez mais das autoridades competentes providências realmente capazes de lhes oferecer e garantir maior segurança. Todavia, ainda cresce no país a idéia infundada de que a redução da criminalidade somente pode ser alcançada com a definição de novos tipos penais e com o agravamento da prisão.
Portanto, conclui-se que é responsabilidade de todos buscar alternativas viáveis que possibilitem amenizar os efeitos degradantes do cárcere e que sejam capazes de recuperar a finalidade da pena, trazendo o condenado de volta à vida em comunidade e, respeitando acima de tudo a dignidade da pessoa humana.
Servidor público do Tribunal de Contas do Estado da Paraiba-TCE/PB, com graduação de Bacharel em Direito, pelo Centro Universitário de João Pessoa-UNIPÊ e cursando Ciências Contábeis pelo Instituto de Educação Superior da Paraíba-IESP.
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