O CDC criou, sem dúvida, novos símbolos e, ipso facto uma linguagem própria, dentro de um novo sistema legislativo.
O art. 5º, inciso XXXII da CF estabelece que o Estado promoverá na forma da lei, a defesa do consumidor.
No art. 170, inciso V da Lei Maior, a categoria de consumidor é considerada princípio geral da atividade econômica: “A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: … V – defesa do consumidor.
Assim, a defesa do consumidor é considerada um princípio constitucional, uma garantia constitucional, dada a importância e relevância desse tema nos planos nacional e internacional.
Na realidade, o CDC é um microssitema, na medida em que regula APENAS a relação de consumo, dentro do macrossistema que é o Código Civil.
Traduz uma técnica legislativa moderna pois somente as relações de consumo são disciplinadas pela CDC, restando revogadas as normas do Código Civil, Penal, Comercial, Processo Civil, Processo Penal e demais leis esparsas sempre prevalecendo a norma específica.
Somente nos casos omissos é que se pode aplicar às relações de consumo, o disposto nas leis codificadas e extravagantes, aplicação que se dá por extensão ou por analogia.
O CDC emprega linguagem técnica e usa também expressões naturais, como por exemplo, a prevista no caput do art. 4º do CDC.
Os sujeitos da relação de consumo são o fornecedor e consumidor, tendo por objeto produto ou serviço.
Merecida análise deve-se fazer a figura do consumidor que é quem se utiliza de um bem ou serviço colocado no sistema econômico por um profissional.
Ao definir o consumidor, no art. 2º do CDC, acrescentou a expressão “destinatário final” para que fossem evitadas maiores indagações sobre a existência ou não da figura do consumidor em casos concretos.
Podendo ser pessoa física, jurídica, entes despersonalizados, sociedade de fato, quaisquer formas de cooperativas.
E, também definiu a figura do fornecedor em seu art. 3º , bem como produto e serviço conforme expõem os parágrafos primeiro e segundo do art. 3º do CDC.
Contrariando o afamado adágio que omnis definitio periculosa este in jure o legislador pátrio elaborou várias definições, mas há quem sustente que ser uma impropriedade em face da constante evolução das relações sociais.
De qualquer maneira, a mens legislatoris foi no sentido de se evitar a interpretação inadequada e, por via de conseqüência a má interpretação da lei.
O CDC trata desiguais de forma desigual, deixando evidenciado em seu inciso I do art. 4º o reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor, além de adotar conceitos e princípios que devem nortear as relações entre consumidor e fornecedor, ao tratar da política nacional de relações de consumo.
Trata-se de tutela especial protetiva ao consumidor. Sendo protegido tanto no aspecto substancial como também no processual.
Desta forma, a relação entre fornecedor e consumidor, tornou-se mais equânime. Podendo-se argumentar que não há violação do princípio da isonomia, ou ao art. 5º caput da CF haja vista que essa desigualdade é reconhecida pela própria lei.
Ensina Nelson Nery Júnior que dar tratamento isonômico às partes significa tratar os iguais igualmente, e desigualmente os desiguais, na exata medida de suas desigualdades.
A igualdade significa a isonomia real, substancial e não meramente formal.
Técio Sampaio Ferraz Junior ao tratar do tema direito e justiça, aduz que: …”o princípio da igualdade imprime à justiça um caráter de racionalidade que preside permanente e constantemente o sentido do jogo sem fim do direito. O direito é um jogo de igualdades e desigualdades. No decorrer do jogo, porém, as jogadas ou atos de jogar são decodificações, fortes ou fracas, que admitem variedade e composições nem sempre universalizáveis no tempo e no espaço. Por isso, se a justiça, no seu aspecto formal, exige igualdade proporcional e exclui a desigualdade desproporcionada como princípio sem o qual não há sentido no jogo jurídico, no seu aspecto material se denuncia um campo de probabilidades e possibilidades que tornam a justiça o problema que dá também sentido ao jogo.
Não há no CDC qualquer violação à Carta Magna e, apenas trouxe a real possibilidade de se decidir com justiça as relações de consumo.
Daí, justifica-se plenamente o enunciado pelo art. 6, VIII do CDC que versa da inversão do ônus da prova.
Como microssistema o CDC possui uma linguagem própria porém, nem sempre é fácil identificar se a relação é ou não de consumo. Somente por meio da produção de provas é que se torna possível constatar se as normas consumeristas terão aplicação ou se refere relação entre particulares clamando a aplicação do direito comum.
A autonomia do direito do consumidor significa que não é mero ramo do direito civil ou comercial, nem querer isolá-lo dos demais ramos jurídicos, mas ao contrário ressaltar que sua estrutura gira em torno de um núcleo particular que é uniforme e coerente, o que lhe dá o contorno de regime especial dotado de princípios, conceitos, institutos e método interpretativo próprios.
A autonomia do direito do consumidor também não veda o diálogo das fontes” pois é nítida sua multidisciplinaridade que informa todo novo sistema.
O presente artigo deseja apenas dar uma introdução didática ao direito do consumidor que tanto aviva em nós a cidadania e a necessidade de vivermos num Estado de direito.
Professora universitária, Mestre em Direito, Mestre em Filosofia, pedagoga, advogada, conselheira do Instituto Nacional de Pesquisas Jurídicas.
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