Este artigo busca discorrer acerca das diferentes interpretações da Doutrina no que diz respeito à classificação do juiz de paz dentro do Direito Administrativo brasileiro e as conseqüências e prerrogativas que surgem quando se adota um ou outro posicionamento.
De antemão é conveniente lembrar, apenas a título didático, o conceito de agente público, categoria que engloba as duas classificações em questão. Segundo Cármen Lúcia Antunes Rocha, em um conceito do qual exclui as empresas estatais, agente público é “a pessoa física que, vinculando-se juridicamente a uma pessoa pública, dispõe de competência legalmente estabelecida para o desempenho de função estatal em caráter permanente ou transitório” (Princípios constitucionais dos servidores públicos,, p. 59).
Isto posto, é oportuno explicitar os conceitos de agente político e agente honorífico. Aí já surgem as primeiras divergências doutrinárias com relação ao tema, que serão vistas a seguir.
O agente político é aquele ligado à função política, que ocupa cargos estruturais na organização política do país. Celso Antonio Bandeira de Mello exemplifica o agente político como, exclusivamente, o Presidente da República, Governadores de Estado, Prefeitos e vices, Deputados federais e estaduais, Senadores e auxiliares dos Chefes do Executivo. Acontece que este conceito é de certa forma excessivamente restrito, analisando a questão apenas através da idéia de sujeito de governo.
Figuras como os magistrados e membros do Ministério Público não podem ficar de fora do conceito de agente político, uma vez que seu vínculo com o Estado também não é de natureza profissional, e sim política. Vale lembrar que o agente político se liga não somente à idéia de sujeito de governo, mas também, e igualmente, com a sua função, sua atividade política, buscando executar atribuições constitucionais. É uma questão de sujeito e objeto.
Outro aspecto que não pode ser esquecido, e que avaliza ainda mais a presença dos magistrados e membros do Ministério Público neste rol é o de que seus poderes advêm diretamente da constituição e das Leis, e não de contrato firmado com o Estado, uma vez que seus atos não podem ser contestados ou modificados por terceiros. A incontestabilidade dos atos do Presidente ao sancionar uma lei, é proporcional à presente no ato de um Juiz proferir uma sentença judicial ou um Promotor de Justiça emitir um parecer.
Já na conceituação de agente honorífico a doutrina é mais pacífica. Romeu Bacellar Filho costuma afirmar que “Os agentes honoríficos são convocados para cumprir objetivos cívicos, sem usufruir nenhuma retribuição de cunho pecuniário.”(Direito Administrativo, 2005, Editora Saraiva, p.132). Afirma ainda, que, alheios à malha estatal, os agentes honoríficos têm, em sua função, a idéia de honra. São nomeados, eleitos ou designados em caráter transitório e sua contribuição ao estado diz respeito à sua parcela de entrega individual em detrimento do bem estar coletivo. No rol dos agentes honoríficos encontram-se os mesários nas eleições e jurados, juntamente com os membros do Conselho Tutelar.
Com os dois conceitos expostos, ainda são necessários esclarecimentos quanto ao juiz de paz e suas características.
A figura do juiz de paz, juntamente com a justiça de paz, surge no artigo 98, inciso 2º, da Constituição de 1988, que versa o seguinte:
“Art. 98. A União, no Distrito Federal e nos Territórios, e os Estados criarão.
II-Justiça de paz, remunerada, composta de cidadãos eleitos pelo voto direto, universal e secreto, com mandato de 4(quatro) anos e competência para, na forma da lei, celebrar casamentos, verificar, de ofício ou em face da impugnação apresentada, o processo de habilitação e exercer atribuições conciliatórias, sem caráter jurisdicional, além de outras previstas na legislação.”
Desta forma, temos bem claro os seguintes pontos: A) O juiz de paz é remunerado. B) É eleito. c) Tem mandato transitório. D) cumprem objetivos cívicos E) têm autonomia em seus atos, sem ter que se reportar a ninguém, sendo subordinados apenas à lei. F) tem relação com o Estado através da Lei, e apenas dela, sem vínculos estatutários ou profissionais.
Na busca de um posicionamento sobre a classificação dos juizes de paz seria simples catalogá-los como agentes políticos, justificando que realizam uma atividade política, tendo supremacia em seus atos, sem que sejam revogados ou modificados por quem quer que seja.
Porém, a controvérsia surge justamente quando se analisa a situação do ponto de vista subjetivo. É notável que os juizes de paz não sejam sujeitos de governo, pois não estão situados em uma posição do alto escalão do Executivo, como Presidente, Prefeitos ou Governadores.
Neste ponto, surge a figura do agente honorífico, para suprir esta lacuna subjetiva na classificação. Sendo o juiz de paz uma figura desvinculada profissionalmente do estado, que é convocada, selecionada, ou eleita, para, durante certos períodos, exercer atividade cívica, poderia ser possível, também, caracteriza-lo como agente honorífico, através dessa ótica.
A conclusão a que se chega é a de que o juiz de paz é caracterizado como uma figura híbrida no Direito Administrativo, que possui nuances de agente político e honorífico.
Se por um lado o juiz de paz desempenha uma função política, com autonomia fornecida pela Lei para exercer atividade que resguarda valores sociais e constitucionais, por outro, não ocupa cargo de alto escalão do Executivo, se caracterizando como agente honorífico devido a seu vínculo apenas transitório com o estado no qual é convocado para exercer uma atividade cívica.
Acadêmico da Faculdade de Direito de Curitiba(Unicuritiba)
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