Resumo: A presente pesquisa tem por escopo a análise e o estudo do cumprimento de sentença das obrigações de pagar quantia e suas implicações jurídicas após o advento da Lei 11.232/05. Para tanto, faz-se necessária uma releitura crítica, por meio do método hermenêutico teórico, de maneira descritiva e sistemática, em relação à Lei 11.232/05 que introduziu tal instituto no Código de Processo civil brasileiro. Ressalta-se o modus operandi, e as questões atinentes ao procedimento, que extinguiu a dicotomia do processo brasileiro. Objetiva-se demonstrar a importância da reforma em consonância com o princípio constitucional da celeridade. Este trabalho, além disso, apresenta os principais entendimentos jurídicos quanto à posição adotada nos Tribunais Superiores brasileiros e doutrinárias. Conclui-se pela correlação da efetividade, da modernidade e a efetividade do direito, na aplicação das novas regras de Direito Processual Civil.
Palavras-chave: Direito processual civil. Cumprimento de sentença. Obrigações de pagar quantia certa. Impugnação. Execução por título judicial.
Abstract: The scope of this research is the analysis and study of the fulfillment of obligations to pay the award amount and its legal implications after the enactment of Law 11.232/05. Therefore, it is necessary a critical re-reading through the hermeneutical method basis in descriptive and systematic way in relation to Law 11.232/05 which introduced such institute in the Brazilian Civil Procedure Code. It should be noted the modus operandi, and matters relating to the procedure, which abolished the dichotomy of the Brazilian. The objective is to demonstrate the importance of reform in line with the constitutional principle of speed. This paper also presents the key understandings about the legal position taken in the Superior Courts in Brazil and doctrinal. It is concluded that correlation of effectiveness, efficiency and modernity of law, the new rules of Civil Procedure.
Keywords: civil procedural law. Compliance with judgments. Obligations to pay the right amount. Challenge. Execution by judicial title
INTRODUÇÃO
O presente estudo tem por escopo analisar as alterações impostas pela Lei 11.232/05 no sistema processual brasileiro, detectando os dispositivos no Código de Processo civil (CPC) que tratam do cumprimento de sentença, O atual Código de Processo civil tem-se revelado insuficiente para atender de forma satisfatória as crescentes demandas sociais. Plaina sobre o mesmo a acusação de ser extremamente formal e, com isso, desviar-se da finalidade instrumental do processo, causando extrema morosidade para o desfecho das lides a que se propõe solucionar. Em outras palavras, o Processo civil não tem se afigurado como resposta à altura das exigências sociais, e, por esse motivo vem recebendo ao longo dos anos diversas alterações destinadas ao seu aperfeiçoamento.
1 CUMPRIMENTO DE SENTENÇA
1.1 A expressão “cumprimento de sentença”
O art. 4º da Lei 11.232/05 introduziu um novo Capítulo no Código de Processo civil para disciplinar o ‘cumprimento de sentença’, que é abrangida no Capítulo X.
Significa afirmar, sob o aspecto cronológico do procedimento, que após a prolação da sentença comumente condenatória, abre-se uma nova fase para o adimplemento da obrigação nela determinada, chamada cumprimento de sentença.
Para Cássio Escarpinella Bueno (2008, p. 164), as expressões “execução” e “cumprimento de sentença” são sinônimas. Ambas estão a descrever o desencadeamento da atividade jurisdicional com vistas à satisfação do credor naqueles casos em que, a despeito do título executivo, o devedor não cumpre a obrigação nele retratada.
E ainda:
“A denominação do Capítulo 10, ‘DO CUMPRIMENTO DA SENTENÇA’, não alcança em toda a sua extensão a realidade que pretende exprimir, pois de efetivo cumprimento se trata apenas nas hipóteses de obrigações de fazer e não fazer (art. 461) e de entrega de coisa (art. 461-A); em se tratando de obrigação por quantia certa, faz-se por execução, embora nos termos dos demais artigos do capítulo.” (ALVIM; ALVIM, 2008, p. 58).
No entanto, para Elpídio Donizetti (2007, p. 194):
“Cumprimento na acepção utilizada nos artigos 475-I ao 475-R, é termo genérico. Abrange tanto a efetivação das obrigações de fazer, não fazer e dar coisa diferente de dinheiro, consoantes de sentenças, quanto a execução de obrigação de pagar quantia, consoante dos títulos judiciais previstos no art. 475-N.”
O cumprimento de sentença é aplicação direta do princípio da economia processual e da celeridade, uma vez que, finda a ação de conhecimento, não é mais necessário que se instaure um novo processo para efetivação do direito já reconhecido na sentença, basta que, no mesmo processo, a parte interessada junte aos autos uma simples petição para dar o prosseguimento à nova fase executiva ou satisfativa da sentença.
“A idéia básica dessa Lei foi fazer com que o processo executivo deixasse de ser um processo próprio e independente do processo de conhecimento para se tornar uma fase deste feito.” (WAGNER JUNIOR, 2008, p. 465).
Ou seja, a novidade diz respeito às sentenças condenatórias que versarem sobre obrigação de pagar quantia, cuja execução deverá ocorrer de forma incidental, em fase complementar sucessiva, na mesma relação jurídica processual, dispensando-se a instauração de outra estrutura processual autônoma.
1.2 Objeto do cumprimento de sentença
O cumprimento de sentença é pois a fase do processo cognitivo que visa a satisfação do direito material do credor introduzido pela Lei 11.232/05, e não apenas o acertamento do direito.
“Se com a promulgação do Código de 1973, a maior parte da doutrina só aceitava a divisão trinária do processo, desde a alteração introduzida pela Lei 8.952/94 ao art. 461 do Código, passou-se a nele antever a existência de um processo mandamental e, agora no regime de cumprimento de sentença, processo executivo latu sensu, que se destina a acertamento e, subsequentemente, em nova fase, sem necessidade de execução ex intervallo, a realização prática da condenação”. (WAMBIER, 2006, p. 150-151).
A regra do art. 475-J do CPC não abrange somente o cumprimento de sentenças, mas também abarca qualquer execução de títulos executivos judiciais, quais sejam:
“Art. 475-N:
São títulos executivos judiciais:
I – a sentença proferida no processo civil que reconheça a existência de obrigação de fazer, não fazer, entregar coisa ou pagar quantia;
II – a sentença penal condenatória transitada em julgado;
III – a sentença homologatória de conciliação ou de transação, ainda que inclua matéria posta em juízo;
IV – a sentença arbitral
V – o acordo judicial, de qualquer natureza, homologado judicialmente;
VI – a sentença estrangeira, homologada pelo Superior Tribunal de Justiça;
VII – o formal e a certidão de partilha, exclusivamente em relação ao inventariante, aos herdeiros e aos sucessores a título singular ou universal.”
As normas do cumprimento de sentença enfatizam a obrigação de pagar quantia, enquanto que as demais dizem respeito às obrigações de fazer ou não fazer, e a obrigação de dar coisa seguem o procedimento previsto no art. 461, e 461-A, respectivamente.
Nesse sentido: “as normas referentes ao cumprimento da sentença enfatizam a execução por quantia. Entretanto, a forma de execução será determinada pela natureza das prestações estipuladas nos títulos judicias.” (DONIZETTI, 2007, p. 195).
“O art. 475-J, desta maneira, não se ocupa da forma de cumprimento diferente daquela que determina o pagamento em dinheiro, ou, ou para empregar a expressão usada no inciso I do art. 475-N, que reconheça a existência de obrigação de pagar quantia.” (BUENO, 2008, p. 163).
“[…] em se tratando de obrigação de fazer ou não fazer, o cumprimento de sentença irá se processar sob a forma do art. 461 do CPC. As hipóteses de obrigação de dar serão guiadas pelas regras do artigo 461-A do CPC.” (WAGNER JUNIOR, 2008, p. 194).
Mesmo que se trate de obrigações de fazer e não fazer, ou de dar coisa, há a possibilidade de conversão em perdas e danos dessas obrigações em obrigação de pagar quantia, prevista no art. 461, e 461-A, chamada de tutela específica, que seguirá as regras do cumprimento de sentença.
“Registre-se, por oportuno, que, na obrigação por quantia certa, se subsume a conversão em perdas e danos das obrigações de fazer e não fazer, caso em que, o cumprimento também se dará por execução; da mesma forma, dar-se-á por execução o cumprimento dessas sentenças na parte relativa à imposição das multas”. (ALVIM; ALVIM, 2008, p. 59).
E ainda:
“Assim, por exemplo, nos casos em que, pela impossibilidade da prestação in natura (tutela específica) ou, quando menos, do ‘resultado prático equivalente’ ou ainda, quando por desejo do credor a obrigação de fazer, não fazer e de entrega de coisa converter-se em perdas e danos (art 461, §1º). Neste caso, desde que o devedor tenha ciência previa de que o credor passará a perseguir o equivalente monetário da obrigação reclamada na inicial, não há como recusar, a partir daí, a incidência das regras contidas no art. 475-J. Justamente porque a obrigação de fazer, não fazer ou entregar coisa passou a ser, a partir daquele instante, obrigação de pagar quantia.” (BUENO, 2008, p. 164).
1.3 Exceções ao cumprimento de sentença
As ações cujo objeto seja a prestação de alimentos e a Execução contra a Fazenda Pública não seguirão o procedimento do cumprimento de sentença, embora sejam decisões que versem sobre a obrigação de pagar quantia.
Quis o legislador ao tratar da pensão alimentícia, que o rito fosse diferenciado, seguindo as disposições previstas no art. 733 do CPC, em que há a necessidade de propositura de uma nova ação para executar o título obtido no processo de conhecimento, sendo que o devedor será citado para, em 3 (três) dias, efetuar o pagamento, provar que o fez ou justificar o impossibilidade de efetuá-lo, sob pena de prisão.
Para Humberto Theodoro Júnior:
“Como a Lei 11.232/05 não alterou o art. 732 do CPC, continua prevalecendo nas ações de alimentos o primitivo sistema dual, em que acertamento e execução forçada reclamam o sucessivo manejo de duas ações separadas e autônomas: uma para condenar o dever a prestar alimentos e outra para forçá-lo a cumprir a condenação. A segunda via executiva à disposição do credor de alimentos também não escapa do sistema dual. A redação inalterada do art. 733 determina, expressamente, que na execução de sentença que fixa a pensão alimentícia, ‘ o juiz mandará citar o devedor para, em três dias, efetuar o pagamento, provar que o fez ou justificar a impossibilidade de efetuá-lo’. Logo, tanto na via do art. 732 como na do art. 733, o credor de alimentos se vê sujeito a recorrer a uma nova ação para alcançar a satisfação forçada da prestação assegurada pela sentença. O procedimento executivo, é pois, o dos títulos extrajudiciais (Livro II)) e não o de cumprimento de sentença instituído pelos arts. 475-J a 475-Q.” (THEODORO JÚNIOR, 2003, p. 370).
Ocorre o mesmo quanto à Execução contra a Fazenda Pública, que o legislador optou por diferenciar o procedimento, que será aquele previsto no art. 730, CPC, onde haverá a citação do devedor para opor embargos no prazo de 10 (dez) dias.
Há também os casos em que os títulos judiciais versem sobre obrigação diversa de pagar quantia, ou seja, se o formal de partilha verse, por exemplo sobre obrigação de fazer, seguirá embora seja um título executivo judicial o procedimento dos artigos 461 e 461-A, e não as regras atinentes ao cumprimento de sentença.(art. 475-A e seguintes)
A doutrina ainda é divergente quanto à aplicação ou não do cumprimento de sentença em alguns casos, mas frisa-se o argumento de que tais procedimentos estão previstos em separado, e, assim, não se aplica as regras atinentes ao cumprimento de sentença.
1.4 Competência na execução da sentença
A competência para a execução da sentença (sentença, acórdão ou decisão monocrática) encontra-se disciplinada pelo art. 475-P e respectivos incisos do Código de Processo civil.
Nas causas de sua competência originária, a execução incidental deverá ocorrer perante os Tribunais, tendo mantido o legislador, tal como ocorria no sistema anterior, uma modalidade de conexão sucessiva.
A competência dos Tribunais, na espécie, é funcional, portanto absoluta. A competência é originária, ou seja, aquela que se iniciou no Tribunal e não chegou por via de recurso, ainda que seja pacífico o entendimento de que o acórdão tem o condão de substituir a sentença recorrida. A competência será do juízo que processou a causa no primeiro grau de jurisdição, ou seja, onde teve curso o processo que originou a sentença condenatória.
“Os tribunais só têm competência executiva quando perante eles originariamente flui o processo cognitivo; o fato de terem julgado o feito em grau de recurso não desloca a competência, que continua sendo do juiz a quo.” (DINAMARCO, 2002, p. 205).
Porém, o exeqüente poderá optar pelo juízo do local onde se encontram os bens sujeitos aos atos materiais executórios ou pelo domicílio atual do executado. Tal possibilidade é novidade introduzida pela Lei 11.232/05.
De tal sorte, para exercer tal faculdade, deverá o exeqüente requerer ao juízo que prolatou a decisão que determine a remessa dos autos ao juízo por ele escolhido. Não há nada que impeça que o exeqüente postule a remessa dos autos na própria peça de requerimento de abertura da fase de execução forçada incidental, em atenção ao princípio da economia processual, sendo necessário que o referido requerimento seja feito ao juízo onde fora processada a causa.
Neste sentido:
“A novidade corre por conta do disposto no parágrafo único do art. 475-P, facultando ao exeqüente, no caso do inciso II, do mesmo artigo – juízo que processou a causa no primeiro grau de jurisdição –, optar pelo juízo local onde se encontram bens sujeitos à expropriação, ou pelo do atual domicílio do executado, caso em que os autos do processo serão solicitados ao juízo de origem. A opção pelo atual domicílio soa como uma restrição injustificável, na medida em que, tendo a pessoa mais de um domicílio, poderia o credor escolher e executar qualquer deles.” (ALVIM; ALVIM, 2008, p. 122).
Assim, ocorreu a quebra da competência funcional do juízo da causa para processar ulterior execução, dando a lei um passo significativo em benefício da brevidade do processo e da economia dos atos posteriores da penhora, avaliação e realização de hasta pública, onde não é mais necessária a expedição de carta precatória com essas finalidades. Porém, é de se ressaltar que se trata de uma faculdade do credor escolher pela mantença no foro do processo de conhecimento, ou no local onde se encontram os bens do devedor, e não ato de imposição legal. Com a criação dos dois foros concorrentes, tornou-se relativa a competência.
A disposição ora em análise (art. 475-P, parágrafo único, do CPC) tem aplicação às sentença homologatórias de conciliação ou transação (art. 475-N, III), ao acordo extrajudicial homologado judicialmente (art. 475-N, V), e ao formal e à certidão de partilha (artigo 475-N, VIII).
Finalmente, em tratando de cumprimento de sentença penal condenatória, de sentença arbitral ou de sentença estrangeira, a execução será processada perante o juízo cível competente, visto que não existe processo anterior na área cível, inclusive com necessidade de citação do devedor para cumprimento da decisão, sob pena de realização de penhora.
Competência
1- tribunais, em caso de competência originária
2- juízo onde se processou a causa em 1º grau. Pode o credor optar pelo juízo do local dos bens sujeitos a expropriação ou pelo atual domicílio do executado. (princípio da celeridade)
3- o juízo cível competente, quando for sentença penal condenatória (executada conforme art.100, V foro onde foi cometido o crime), sentença arbitral e sentença estrangeira.
1.5 Execução provisória e multa do artigo 475-J
Execução provisória se dá naqueles casos em que o credor, através de provocação específica, antes do trânsito em julgado da decisão, deseja promover a execução do julgado, ou ainda, nos casos em que interposto recurso sem que lhe seja atribuído efeito suspensivo.
A previsão da execução provisória está no art. 475-O, I, CPC, onde afirma que esta ocorrerá “por iniciativa, conta e responsabilidade” do credor, que reafirma com outras palavras, o revogado art. 588, inciso I, CPC. Por isso, para Scarpinella Bueno (2008) é necessário que se intime o devedor para que este tenha ciência de que o credor pretende executá-lo provisoriamente, e que tem início o prazo de quinze dias para pagar o valor devido.
Quanto à incidência da multa prevista no art. 475-J de dez por cento a lei é omissa no caso de ocorrência de execução provisória, mas também não há motivo que se possa fundar a escusa de sua não aplicação, sendo que a execução provisória será realizada nos mesmos moldes da execução definitiva. Apenas que sua incidência dar-se-á após a intimação do devedor para o pagamento da dívida, porque se trata de execução provisória, e com o decurso do prazo legal de 15 dias.
O devedor que requer a execução provisória se responsabiliza caso a sentença seja reformada pelo juízo ad quem.
Nesse sentido:
“Ao promover e execução provisória da sentença, o exeqüente, na verdade, não se obriga, mas, “fica obrigado” a reparar os danos causados ao executado, caso venha a sentença ou ao acórdão a ser reformado em grau de recurso. Não apenas a sentença é objeto de execução provisória, mas também o acórdão, quando a sua plena eficácia esteja pendente de julgamento de recurso sem efeito suspensivo”. (ALVIM; ALVIM, 2008, p. 110).
Dispõe o inciso II do art. 475-O que: “fica sem efeito, sobrevindo acórdão que modifique ou anule a sentença objeto da execução, restituindo-se as partes ao estado anterior e liquidados eventuais prejuízo, nos mesmos autos, por arbitramento.” (Grifo nosso).
O antigo art. 588 tratava de tal hipótese, e tem perfeita coincidência, exceto pelo fato de que, tratava de sentença e não de acórdão.
A sentença exeqüenda é modificada ou anulada por acórdão, pode também ser através de decisão monocrática do relator, conforme prevê o art. 557, CPC, e, ainda, por outras sentenças de alçada, como os embargos declaratórios com efeitos infringentes no primeiro grau.
A restituição ao estado anterior significa retorno ao estado anterior à prolação da sentença, uma vez que esta foi anulada ou cassada..
O inciso II prevê que a liquidação de eventuais prejuízos será feita por arbitramento, o que tem sido objeto de crítica de alguns doutrinadores.
“A apuração dos prejuízos nos mesmos autos, qualquer que seja a hipótese, traz problemas, porque exige postulação do prejudicado e impugnação do exeqüente, ao mesmo tempo em que novos atos processuais serão praticados, quer tenha a sentença sido anulada ou cassada, ou simplesmente reformada”. (ALVIM; ALVIM, 2008, p. 111).
Quanto à hipótese do inciso III, do art. 475-O, repete o preceito do art. 588, II do art. 588, que também vedava o levantamento de depósito em dinheiro e a prática de atos que importassem a alienação de domínio, dos quais pudesse acarretar grave dano ao executado, que necessitam de caução idônea, que será requerida e prestada nos próprios autos da execução.
A prestação de caução idônea, como requisito para que se faça a execução provisória, afasta o risco de prejuízo ao devedor, caso seja o título executivo cassado ou reformado posteriormente.
Para Humberto Theodoro Júnior (2003, p. 22): “permitir a execução provisória sem acautelamento integral do risco de prejuízo para o executado equivale a ultrajar o devido processo legal e realizar um verdadeiro confisco de sua propriedade, ao arrepio das normas constitucionais que protegem tal direito.”
A caução apresentada pelo credor pode ser real ou fidejussória. A caução real é aquela que se funda em direitos reais de garantia, como hipoteca, penhor anticrese ou depósito em dinheiro. Já a caução fidejussória baseia-se em obrigação pessoal, como a fiança, por exemplo.
A Lei autoriza duas hipóteses nas quais a caução será dispensada, aquelas contidas no § 2º, I, art.475-O, do CPC:
“a) nos casos de crédito de natureza alimentar ou decorrente de ato ilícito, até o limite de sessenta vezes o valor do salário mínimo, o exeqüente demonstrar situação de necessidade;
b) nos casos de execução provisória em que pensa agravo de instrumento junto ao Supremo Tribunal Federal ou ao Superior Tribunal de Justiça (art.544), salvo quando da dispensa possa manifestamente resultar risco de grave dano, de difícil ou incerta reparação.”
São requisitos para a dispensa da caução idônea de forma cumulativa que o valor não deve ultrapassar sessenta salários mínimos e o credor deve encontrar-se em estado de necessidade.
Os documentos que de que trata o art. 475-O, § 3º, serão juntados à petição de requerimento de execução provisória, estes devem ser cópias autenticadas. A autenticação poderá ser feita pelo próprio advogado da parte.
2 PROCEDIMENTO DO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA
2.1 Necessidade de requerimento para início da fase executiva
A atividade jurisdicional, até o momento da prolação da sentença da ação de cognição, seria inócua ou pouco efetiva, sem que houvesse a implementação da obrigação que se pretende por força da sentença das normas ali decididas pelo Estado-juiz no caso concreto.
Então, numa ação de conhecimento que objetiva a condenação ao pagamento de quantia foi preciso o surgimento da fase de cumprimento de sentença, para possibilitar o “link” entre ação de conhecimento e ação de execução, tornando-se fases sucessivas.
O juiz não pode, de ofício, dar início a fase processual de execução, pelo fato do legislador ter homenageado o princípio da demanda, sendo, portanto, a parte responsável pelo ato executivo.
“De fato, de já não constituir a execução da sentença, em regra, processo formalmente individuado não se infere que possa que possa promovê-la o próprio órgão judicial, ex officio, independentemente da iniciativa da parte vitoriosa.” (MOREIRA, 2008, p. 195-196).
Prolatada a sentença que condena o devedor a obrigação de quantia certa, espera-se que ele, o devedor, cumpra voluntariamente a obrigação. Caso o devedor assim não o faça, cabe ao credor elaborar memória de cálculo para que este efetue o pagamento em quinze dias.
Então, o modus operandi, ou seja, o meio utilizado para efetivar a sentença da ação de cognição, e início da ação de execução, é a juntada de simples requerimento aos autos do processo, como diz o artigo 475-J de forma expressa:
“Art. 475-J Caso o devedor, condenado ao pagamento de quantia certa ou já fixada em liquidação, não o efetue no prazo de quinze dias, o montante da condenação será acrescido de multa no percentual de dez por cento e, a requerimento do credor e observado o disposto no art. 614, II, desta Lei, expedir-se-á mandado de penhora e avaliação”. (grifo nosso)
Em razão de ser um requerimento, este pode ser de forma simples, sem a necessidade da observância dos requisitos estampados no art. 282 do CPC, devendo o autor, contudo, instruir sua solicitação com memória de cálculo, conforme o art. 614, inciso II, do Código de Processo civil.
“A idéia da Lei 11232/05 em unificar o processo de conhecimento e o processo de execução em um mesmo processo, criando fases distintas e imediatamente interligadas entre si, não como se imaginar que da sentença proferida no final da fase de conhecimento para o inicio da fase de execução seja necessário ato complexo e revestido de formalidades”. (WAGNER JUNIOR, 2008, p. 490).
Caso o requerimento para abertura da fase processual complementar não seja apresentado no prazo de seis meses, importará no arquivamento dos autos do processo, sem prejuízo do desarquivamento a pedido da parte (o tema prescricional, poderá, mercê da Lei 11.280/06, ser conhecida de ofício pelo Juiz, pois revogou o art. 194 do Código civil brasileiro, dando nova redação ao § 5º do art. 219 do CPC).
2.2 Necessidade de intimação do devedor
Com a juntada do requerimento aos autos do processo, o juiz competente verificará se estão presentes os requisitos necessários para dar seguimento ao feito, ou então, ordenar que a parte saneie o defeito no prazo de 10 dias, como por exemplo, a necessidade da sentença ser liquidada.
Caso não haja necessidade de liquidação, o juiz deferirá o pedido e não há necessidade de intimação do credor, uma vez que não está se inciando um novo processo, e basta que se expeça mandado de penhora e avaliação.
Quanto ao devedor, este é um dos assuntos mais polêmicos que causou discussões nos Tribunais, primeiramente se há ou não necessidade de intimação, e, havendo intimação, quem será a pessoa responsável por recebê-la, principalmente no caso do devedor ter advogado constituído no processo.
Ao certo é que, após a condenação do devedor ao pagamento da quantia, cabe-lhe a obrigação de pagar o montante da dívida no prazo de 15 dias, após a prolação da sentença.
Mas surgiram algumas correntes acerca da necessidade intimação do devedor:
A primeira corrente, inclusive acolhida pelo Superior Tribunal de Justiça, diz que o devedor deve ser intimado do deferimento do cumprimento da sentença com o propósito de dar ciência que uma nova fase se iniciou.
Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery (2007, p. 641) lecionam que: “o devedor deve ser intimado para que, no prazo de quinze dias a contar da efetiva intimação, cumpra o julgado e efetue o pagamento da quantia devida.”
Para José Carlos Barbosa Moreira (2008) há a necessidade apenas de intimação do devedor do auto de penhora e avaliação.
No entanto, a segunda corrente entende que não há necessidade de intimação do devedor do devedor da expedição do auto de penhora e avaliação, uma vez que se tratando do mesmo processo, uma mera fase, sendo que o devedor após a prolação da sentença já estaria automaticamente intimado que deveria pagar o montante ou indicar, desde logo, bens para penhora.
Nesse sentido, o jurista Humberto Theodoro Júnior asseverou que:
“Há, porém, um prazo legal para cumprimento voluntário pelo devedor, que corre independentemente de citação ou intimação do devedor. A sentença condenatória líquida, ou a decisão de liquidação da condenação genérica, abrem, por si só, o prazo de 15 dias para o pagamento do valor da prestação devida.” (THEODORO JÚNIOR, 2003, p. 502).
O art. 475-J confere à parte devedora a faculdade de cumprir a obrigação de maneira voluntária. Nesse sentido, ensina o Ministro Athos Carneiro Gusmão (1983, p. 55): “com a intimação da sentença, o réu está ciente do prazo em Lei pra que cumpra a decisão e pague a quantia devida. Não o fazendo, estará inadimplente, e sujeito à incidência da multa.”
Após reiteradas discussões prevaleceu nos Tribunais que o melhor entendimento seria que o devedor fosse intimado para o pagamento ou indicação de bens para penhora, pelos motivos aqui já discutidos, como se desprende do diz uma decisão do Superior Tribunal de Justiça: “O executado deve ser intimado, na pessoa do seu advogado (se houver patrono constituído), sobre a obrigação de pagar reconhecida na decisão.”
E ainda o Tribunal de Justiça de Minas Gerais:
“Agravo de instrumento – cumprimento de sentença – art. 475-J – intimação pessoal do devedor – desnecessidade. A intimação do devedor para pagamento de obrigação por quantia certa, nos termos do art. 475-J, deve ser feita na pessoa de seu procurador regularmente constituído nos autos, por meio da imprensa oficial, sendo desnecessária a intimação pessoal do devedor para o seu cumprimento espontâneo. Recurso provido.”
2.3 A incidência da multa e prazo
O legislador ao instituir a multa prevista no art. 475-J quis prestigiar o cumprimento voluntário e imediato da obrigação pelo devedor, uma vez que a fase do cumprimento de sentença visa a satisfação do direito do credor.
Então, caso, o devedor faça o pagamento voluntário da obrigação, o processo terá alcançado seu objetivo, e então será extinto.
Mas, escoado o prazo de quinze dias sem pagamento do devedor, o total da condenação deverá ser acrescido de multa de 10% (dez por cento), conforme diz o art.475-J, e, a requerimento do credor, terão início as atividades jurisdicionais executivas, que objetivam atingir o patrimônio do devedor para a satisfação do direito do credor.
Segundo a primeira parte do art. 475-J, a multa de dez por cento incidirá sobre “o valor da condenação”. Para isso é necessário compreender o que significa valor da condenação.
Segundo o jurista Cássio Scarpinella Bueno (2008, p. 147-148):
“Acredito que a melhor forma de interpretar o dispositivo – até como forma de criar condições as mais objetivas possíveis para o cumprimento “voluntário” da obrigação, mesmo depois de jurisdicionalmente chancelada – é entender como “montante da condenação” tudo aquilo que deve ser pago pelo devedor, em função do proferimento da sentença em seu desfavor (ou da existência de outro título, observando-se o rol que, doravante, ocupa o art. 475-N). Por isso mesmo, afasto que o dispositivo seja interpretado como se “montante da condenação” fosse “montante da obrigação” inadimplida. Penso, sinceramente, que esta interpretação deve ser afastada.”
A fluência do prazo de quinze dias, desde o advento da Lei 11.232/05, é questão que dividiu a doutrina e a jurisprudência, onde surgiram várias correntes como afirma Cássio Scarpinella Bueno:
“[…] formaram-se quatro correntes sobre o assunto. A primeira delas sustenta que o prazo de quinze de dias para pagamento flui desde que a decisão que se pretende ver cumprida (o título executivo judicial) transitar em julgado, independente de qualquer comunicação ao devedor […]. A segunda das correntes que se formaram sobre o tema sustenta a necessidade de fluência do prazo de quinze dias para pagamento depender de intimação do advogado do devedor. A terceira corrente entende, a exemplo da segunda, a necessidade de intimação para início da fluência do prazo para pagamento. A distinta reside na circunstância de que, em qualquer caso, esta intimação ser a dirigida ao próprio devedor (e não ao seu advogado) porque o pagamento é ato de direito material e não de direito processual. A quarta corrente também entende necessária uma prévia intimação do advogado devedor. A diferença com a segunda corrente, contudo, é que a intimação depende, de qualquer caso, da prévia quantificação do valor devido, inclusive quando o quantum debeatur depender de apresentação de cálculos aritméticos.E por fim acolhe a segunda corrente: O melhor entendimento para o tema, […] é o defendido pela “segunda corrente”: o prazo de quinze dias tende a fluir desde o instante em que a decisão jurisdicional a ser cumprida reúna eficácia suficiente, mesmo que de forma parcial […]. O prazo correrá da intimação judicial que comunique que o julgado reúne suficientemente condições de eficácia plena, qualquer que seja a forma adotada por esta intimação. Sejam os usuais “cumpra-se o v. acórdão”, “ciência às partes do retorno dos autos ao juízo” ou que, para os tempos da Lei n. 11323/05, é mais correto, “fica intimado o devedor a pagar o montante devido em quinze dias sob pena de multa de 10% sobre o total”, é desta intimação que fluirá o prazo a que se refere o caput do art. 475-J.” (BUENO, 2008, p. 168).
Segundo o Instituto Brasileiro de Direito Processual (IBDP):
“O prazo de quinze dias referido no art. 475-J, caput, do CPC:
a) inicia-se independentemente de uma nova e específica intimação(ou seja, em princípio, basta ter havido a regular intimação das partes, em regra na pessoa de seus advogados, a respeito da última decisão proferida no processo depois da qual a sentença já deve ser cumprida);
b) sempre se inicia apenas depois de nova e específica intimação para tal fim, a ser feita na pessoa do próprio condenado, por via postal ou oficial de justiça;
c) sempre se inicia apenas depois de nova e especifica intimação para tal fim, a ser em regra na pessoa do advogado do condenado;
d) somente no caso de ter havido recurso depende de uma nova e específica intimação para dar ciência às partes a respeito do retorno dos autos ao primeiro grau de jurisdição – intimação essa a ser feita na pessoa do próprio condenado, por via postal ou por oficial de justiça;
e) somente no caso de ter havido recurso depende de uma nova e específica intimação para dar ciência às partes a respeito do retorno dos autos ao primeiro grau de jurisdição – intimação essa a ser feita na pessoa do advogado do condenado.”
E ainda:
“A Lei silencia sobre o termo inicial da contagem do prazo de quinze dias para efetuar o pagamento. Assim, dúvidas surgirão quanto a isso. Nos parece que o mais acertado deveria ser contar a partir do trânsito em julgado, independentemente de requerimento do credor.” (WAMBIER, 2006, p. 39).
“A multa de dez por cento, prevista no texto legal, incide de modo automático caso o devedor não efetue o pagamento no prazo concedido em lei. Visa, evidentemente, compeli-lo ao pronto adimplemento de suas obrigações no plano do direito material, desestimulando as usuais demoras “para ganhar tempo”. Assim, o tardio cumprimento da sentença, ou eventuais posteriores cauções, não livram o devedor da multa já incidente.” (WAMBIER, 2006, p. 40).
O melhor entendimento é que se deve aguardar o escoamento do prazo de quinze dias, contado a partir do trânsito em julgado, com a respectiva intimação do devedor na pessoa do seu advogado, de acordo com noção constitucional de que a decisão deve reunir condições suficientes para seu cumprimento, como a publicidade e as condições materiais suficientes.
No caso do devedor que deposita a quantia devida para questioná-la em juízo, não há como afastar a incidência da multa do 475-J, a não ser por expressa concordância do credor com o valor do quantum depositado.
A multa sempre é revertida a favor do credor, vez que este é o seu beneficiário.
É válido lembrar que, caso o devedor faça o pagamento parcial da dívida, a multa incidirá sobre o valor restante, conforme previsão do §4º do art. 475-J:
“Havendo pagamento parcial no referido prazo, a multa do art. 475-J, caput, incidirá sobre o saldo remanescente.” (THEODORO JUNIOR, 2003, p. 53).
Tal fato se deve por possuir o denominado prazo de espera a finalidade de evitar o desencadeamento das medidas reais executivas, facultando ao devedor o pagamento voluntário.
Professora da UEMG Unidade Cláudio/MG. Mestre em Direito pela UIT. Advogada
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