A indenização por dano moral decorrente de atraso no transporte internacional de passageiros tem gerado inúmeras discussões no Brasil, principalmente no tocante ao diploma legal aplicável à solução dos conflitos, ante a existência de uma antinomia entre a Convenção para Unificação de Certas Regras Relativas ao Transporte Aéreo Internacional (assinada em Varsóvia) e o Código de Defesa do Consumidor (CDC).
Todavia, antes de se analisar tal questão, faz-se imperativo discutir um pouco acerca do próprio conceito de atraso de vôo que, por si só, já gera inúmeros problemas.
A essência do contrato de transporte aéreo é justamente o transporte do passageiro são e salvo até o destino final, mediante o pagamento de uma contraprestação.
Ocorre que o transporte aéreo está sujeito a inúmeras variáveis, tais como o clima, o serviço do aeroporto, o controle de vôo, a segurança, a manutenção do aparelho, entre outras.
Tais variáveis podem fazer com que o vôo não saia no horário marcado, acarretando o atraso. A primeira discussão é exatamente quando o atraso deixa de ser escusável, gerando um dano moral que possa ser indenizável.
A jurisprudência é unânime: utiliza por analogia o artigo 230 do Código Brasileiro de Aeronáutica, entendendo que até quatro horas de retardo na partida não pode ser considerado atraso, razão pela qual não gera nenhum tipo de dano.
Ocorre que tal raciocínio também não pode ser levado ao pé da letra, haja vista que o retardo por mais de quatro horas não gera automaticamente o direito a uma indenização por danos morais, sendo mais do que certo que outros fatores devem ser considerados.
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem entendido reiteradamente que poucas horas de atraso no vôo, com espera em aeroporto dotado de boa infra-estrutura, aliado a hospedagem em hotel, alimentação e transporte podem afastar a caracterização do dano moral, não passando o evento de mero percalço ou contratempo.
Tal entendimento visa justamente evitar que o dano moral seja banalizado, impedindo a criação de uma verdadeira indústria de indenizações – tal como o modelo norte-americano.
Ou seja, o dano moral não pode servir como meio de punição, razão pela qual as indenizações milionárias têm sido reduzidas pelo STJ, atribuindo a elas tão somente o caráter compensatório.
De qualquer forma, o presente estudo não visa se aprofundar no caráter da indenização por danos extrapatrimoniais, mas sim sobre a suposta antinomia existente entre o Sistema Varsóvia e o CDC no atraso de vôo.
Com o advento do CDC, inúmeros autores se posicionaram no sentido de que a Convenção de Varsóvia teria sido revogada, principalmente no tocante à indenização tarifada pelos problemas decorrentes do transporte aéreo.
O CDC veio alterar profundamente a forma de negociar e de agir dos fornecedores.
No transporte aéreo internacional – como qualquer outra relação de consumo – a responsabilidade civil é objetiva, ou seja, não se discute a culpa pelo evento.
Assim, estando configurado o dano moral decorrente do atraso excessivo na partida de algum vôo, resta saber qual seria a forma de arbitrar o valor indenizatório.
Vários autores já tentaram criar alguns meios de facilitar o arbitramento da indenização por danos morais, sendo certo que um até fórmula matemática já foi criada… Tudo isso para tentar dar uma maior certeza tanto ao consumidor quanto ao fornecedor, a fim de que saibam de antemão o valor de indenização que deveriam receber/pagar.
O STJ entende que, nos casos em que o atraso no vôo é excessivo, mas que este não causa nenhum outro tipo de desconforto, o arbitramento da indenização por danos morais pode obedecer aos parâmetros fixados pela Convenção de Varsóvia, já que tais valores seriam justos para compensar o dano operado.
Dessa forma, a indenização por danos morais decorrentes de atraso de vôo excessivo deveria ser arbitrada no valor de 332 Direitos Especiais de Saque, que correspondem a aproximadamente US$ 400,00.
Ressalte-se que não se está utilizando uma tarifação para arbitramento da indenização, mas sim alguns parâmetros, já que tal valor é mais do que suficiente para compensar integralmente os transtornos advindos de apenas um atraso.
Resta claro, assim, que o operador do direto deve utilizar para a solução dos conflitos decorrentes de atraso de vôo ambos os diplomas legais sob discussão: o CDC – para fixar a responsabilidade do transportador – e o Sistema Varsóvia – para arbitrar o valor da indenização.
Bacharel em Direito pela Pontifícia Universidade Católica (PUC-SP) em 2000, trabalha especificadamente com Direito Aeronáutico na área do contencioso cível do escritório D’Andrea Vera Advogados, consultores da JURCAIB (Junta de Representantes das Companhias Aéreas Internacionais do Brasil).
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