Bertrand de Jouvenel é, seguramente, um clássico a ser lido portodos aqueles que se interessam pelas variações do Poder, sabendo-se que o bichoé um só, dividindo-se em metamorfose às vezes conflituosa, à maneira de umacélula cujos componentes se combatem, embora provindos do mesmo material. Éinteressante, dentro desse tema global, a análise do que vem acontecendo nasrelações entre o Governo brasileiro e alguns segmentos da sociedade, algunsligados umbilicalmente ao próprio Estado, outros sobrevivendo – e bem – a partirda liberdade que lhes foi concedida no retorno teórico à democracia.
Valem dois exemplosaparentemente desligados mas sempre unidos, virtualmente, pelo binômioliberdade-poder. Um, o Ministério Público, surgindo, na Constituição de 1988,como o maior detentor de arbítrio, usada a palavra, aqui, no sentidoabsolutamente técnico; outro, a imprensa, nesta última compreendidas todas asmanifestações de pensamento sob o uso da escrita ou da verbalização,acompanhadas ou não pelo visual de quem propaga o pensamento. Ambos – MinistérioPúblico e imprensa – têm, no Brasil redemocratizado, indizível projeção nãocensurada de força, o primeiro utilizando extravagante dose de autônomapersecução, a segunda impulsionando a denominada vontade popular no sentido quelhe aprouver, mas sempre – e isto é curioso – em detrimento do cidadão enquantosolitário, beneficiando, em patente desequilíbrio, a denominada “vontadepopular”, terminologia absolutamente mística, porque gerada, quase sempre, noartificialismo dos ventos políticos.
Vêm àsuperfície tais considerações quando se analisam dois acidentesjurídico-políticos concretizados nos últimos dias: de um lado, o MinistérioPúblico pretendeu verrumar as gavetas da Secretaria de Coordenação Política e Assuntos Institucionais daPresidência da República, agindo em concurso com a Polícia Federal. A condutaprovocou reação imediata do Palácio do Planalto, tornando-se infrutífera apretensão; de outra parte, o Poder Executivo expressa a determinação de criar oConselho Federal de Jornalismo, ou órgão análogo, tudo no sentido decinturamento dos exageros verificados na já mencionada imprensa nacional.Tocante ao primeiro fenômeno – a investida contra expressão do poder central –,já se viu que a incursão, prevista por este cronista há alguns anos, é oresultado do amolecimento do controle que o Poder Judiciário deveria exercer – enão exerceu –, ou por entusiasmo episódico com o desdobramento das denominadasforças do bem, ou por enfraquecimento da própria estrutura, expressão elegantepara disfarçar um atributo negativo, omedo, que o juiz não pode ter. Quanto àdelimitação da força do Ministério Público, a responsabilidade é dupla, devendoser dividida entre o magistrado e o próprio Poder Executivo, um por deixarfazer, o outro por querer fazer além dos limites adequados. Agora dizendo com aimprensa, não parece adequada a idéia, hoje veiculada pelo diferenciadopenalista Miguel Reale Júnior, no sentido de se tratar, o Conselho, de um órgãoque não interferiria na liberdade do jornalista, encarregando-se apenas de lherefrear os excessos, a exemplo da Ordem dos Advogados do Brasil. A comparaçãonão é a melhor, pois a tentativa de fechar a boca de um profissional de imprensacom o uso de um poder disciplinar organizado fica assemelhada àquela de seamordaçar a vizinha fofoqueira, amarrando-lhe os braços inclusive. Bem se sabeque em lhe sobrando só um dedo livre, ela continua a fazer sinais indicativos damiséria da vizinhança. Aliás, já houve hipótese dessa no interior paulista: umjuiz tresloucado determinou que duas tias difamadoras só saíssem à rua portandomáscaras cirúrgicas. A decisão foi reformada. Entretanto, o próprio fato daexibição das mordaças significava o reasseguramento das injúrias. É dramático,mas é real. Além disso, o advogado, ao ser punido, é proibido de advogar, issona censura máxima, mas não se pode proibir a qualquer do povo, jornalista ounão, a expressão do pensamento. Imagine-se uma sanção impondo a um escriba osacrifício do silêncio…
Não significa que o cronista se ponha ao lado da grande imprensa, especialista em destruir, quando quer, de um dia para o outro, o presente e o futuro de quem lhe cair nas garras. Há na legislação, insista-se, meios extremamente apropriados à reposição do caluniador, do difamador enfim, a parâmetros apropriados ao exercício regular do direito de crítica. Se o Governo não usa tais meios, e para tanto tem o próprio Ministério Público como escudeiro-mor, podendo também, se e quando quiser, preferir a querela (v. Súmula 714 do Supremo Tribunal Federal), não os utiliza por medo, insegurança ou por não querer ferir quem pode apoiá-lo mais tarde. Por fim, se o cidadão não chega ao Poder Judiciário para punir o caluniador, é por ter a enganosa impressão da inutilidade da queixa-crime. Contrariamente ao que se pensa, a Lei de Imprensa contém mecanismos eficazes à regulamentação da expressão do pensamento. Em síntese, o jornalista pode dizer e escrever o que quiser, mas deve sofrer castigo quando extravasa os limites da legalidade. Se todos os difamadores e caluniadores fossem punidos nessa medida, o Poder Executivo e os funcionários públicos em geral não se colocariam atrás das portas, buscando soluções anômalas, à moda de quem lava as mãos enquanto entrega a sujeira a servos terceirizados. O raciocínio tem idêntico valor para o cidadão.
Seguem os comentários por “e-mail”, constando de modesto “site” mantido na “internet”. O jornal “A Folha”, mesmo divulgando muitas opiniões respeitantes ao tema, não o faz quanto às reflexões do cronista. Apesar disso, envia-se a crítica para o endereço eletrônico daquele órgão de imprensa, a exemplo, rotineiramente, de outros destinatários.
Advogado criminalista em São Paulo e presidente, no Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, da Comissão Nacional de Defesa das Prerrogativas do Advogado.
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