Sumário. 1. Problema controvertido. 2. Direito uniforme e direito internacional privado. 3. A nacionalidade. 4. Condição jurídica do estrangeiro. 5. Conflito de leis. 6. Direitos adquiridos. 7. Conflito entre normas de direito interno.
1.Problema controvertido.
Diferentes são as idéias dos doutrinadores acerca do objeto do direito internacional privado. Sabendo-se ser esta uma disciplina das mais importantes, principalmente no tocante ao aumento dos relacionamentos entre diferentes pessoas por todos os lugares do mundo, maior será a sua necessidade de conhecimento e aplicação.[1]
É a opinião de Amílcar de CASTRO:
“…o direito internacional privado, ou visto como setor da ordem jurídica estatal, ou tido como técnica de aplicação de certos ramos do direito, só pode ter um objeto. A orientação clássica é no sentido de considera-lo como parte integrante do direito positivo; e, assim compreendido, só pode ter um objeto, ou melhor, só deve ser direito com diferença específica, que não seja predominante nos demais compartimentos jurídicos. E se não for tido como direito, mas como técnica de aplicação do direito, ainda assim não se lhe poderá atribuir função própria de qualquer seção da ordem jurídica, sem investir contra a lógica…”
e
“…mas em direito internacional privado, tudo tem sido tão confundido e controvertido que, em torno do seu objeto, não poderá deixar de haver acesa discussão”.[2]
Muitos autores atribuem a cinco problemas o possível objeto do direito internacional privado:
criar um direito uniforme, uniformizar as leis;
nacionalidade;
condição jurídica de estrangeiro;
conflitos de leis;
reconhecimento internacional de direitos adquiridos.
2. Direito uniforme e direito internacional privado.
O objeto do direito internacional privado, segundo sustentam alguns, seria a criação de um direito uniforme. No entanto, sabe-se que isto dificilmente se tornará realidade.
Novamente CASTRO:
“Direito uniforme e direito internacional privado são coisas inconfundíveis: resume-se aquele na coincidência de normas emanadas de duas ou mais ordens jurídicas estatais, enquanto este seria o conteúdo de uma única ordem jurídica mundial. De tal sorte, só qundo houver jurisdição universal, é que poderá haver direito universal. Como se vê, o direito uniforme não é ramo do direito, não é parte da ciência ou d arte jurídica, nem do direito positivo, pois consiste na simples semelhança dos direitos positivos, ao passo que o direito internacional privado, visto por uns como parte do direito positivo, e por outros como técnica de aplicação do direito, é secção da ciência ou da arte jurídica, com finalidade própria, que não é de modo algum a de uniformizar o direito”.[3]
Autores como Asser e Jitta entendem que o direito internacional privado sempre teve por objeto o conflito de leis, mas seu verdadeiro objeto é criar um direito privado para a humanidade, ou seja, a uniformidade legislativa.
STRENGER conclui que, embora existama várias posições a respeito da uniformidade legislativa, nenhuma atende ao que “…parece ser o objeto do direito internacional privado: conflito de leis no espaço”.[4]
3. A nacionalidade.
A nacionalidade é apontada por muitos como sendo o objeto do direito internacional privado. Este seria o de regular a nacionalidade.
É sabido que sem a determinação das nacionalidades dos envolvidos na relação jurídica anormal, não há como solucionar o problema.
O surgimento dos problemas de direito internacional privado tem sempre conexão com a nacionalidade das partes.
A nacionalidade teria sido cogitada de maneira muito profunda por diferentes internacionalistas. Entretanto, não se teria conseguido provar, mesmo assim, que ela é objeto desta ciência do direito.
É o que diz CASTRO:
“…a nacionalidade e o domicílio são relevantes circunstâncias de conexão tomadas em consideração pelo direito internacional privado, mas decididamente não fazem parte do objeto desta disciplina, que não regula, nem a aquisição, nem a perda, nem a mudança de uma ou de outra”.[5]
Elas são somente importantes circunstâncias de conexão.
4. Condição jurídica de estrangeiro.
A condição jurídica de estrangeiro não é o objeto do direito internacional privado. A mesma tem como objetivo a solução de um problema e o direito internacional privado de outro.
Condição jurídica de estrangeiro é o conjunto de direitos de que o mesmo pode usufruir em determinado país, que não o seu próprio, durante um certo período de tempo. É o estado de estrangeiro em oposição ao estado de nacional.
5. Conflito de leis.
A tarefa do direito internacional privado pode ser considerada como a de procurar qual a solução adequada para resolver um conflito de leis no espaço. Este pode ser considerado como o objeto básico do direito internacional privado.[6]
6. Direitos adquiridos.
Doutrina desenvolvida pelos EUA e Inglaterra, a doutrina dos direitos adquiridos crê que a única lei capaz de criar um direito é a do próprio país onde aconteceram os atos geradores do mesmo. A função do direito internacional privado é proteger os direitos criados no interior de suas fronteiras, nas fronteiras de cada país. O seu objeto, portanto, seria o reconhecimento em um Estado dos direitos adquiridos ou declarados por sentença em outro.[7]
7. Conflito entre normas de direito interno.
O objeto do direito internacional privado realmente é o conflito de leis no espaço.
Resta saber se o direito internacional privado abrange tanto os conflitos de leis no espaço de direito público, quanto os de direito privado.
STRENGER faz longo estudo a respeito de diferentes espécies de direito público como o constitucional, o administrativo, penal e processual para reconhecer que pertencem ao campo do direito internacional privado os conflitos de leis processuais relativos às provas dos atos jurídicos.
São suas as palavras:
“Em resumo, o objeto do direito internacional privado é o conflito de leis no espaço,inclusive os problemas de direito processual a respeito de provas”.[8]
O direito internacional privado também pode ser utilizado para resolver conflito de leis de direito privado no espaço interno de um mesmo país. É o caso dos Estados Unidos da América.
O fato é que existe uma multiplicação de direitos privados num só Estado soberano.
A conclusão de STRENGER é a seguinte:
“A corrente dominante e, ao que parece, não ultrapassada, explica o objeto do direito internacional privado sob a perspectiva de que o problema somente pode ser considerado no plano dos conflitos de leis. O Direito internacional privado tem por fim principal a aplicação da lei estrangeira em determinado país. Como as legislações não apresentam as mesmas características, sendo ao contrário dessemelhantes e até contraditórias e antagônicas, os conflitos de leis formam elemento peculiar às organizações políticas constituídas em Estados. Somente a existência e a permanência desses conflitos justificam e explicam o direito internacional privado e seu desaparecimento não parece provável, em face das peculiaridades histórico-culturais de cada povo”.[9]
Doutor em direito administrativo pela UFMG, advogado, consultor jurídico, palestrante e professor universitário. Autor de centenas de publicações jurídicas na Internet e do livro “O Servidor Público e a Reforma Administrativa”, Rio de Janeiro: Forense, no prelo.
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