A alteração legislativa perpetrada pela Lei 11.280 de 2006, envolvendo a prescrição, em que pese não mais tão recente, ainda provoca vários questionamentos quando se discute a matéria no âmbito de aplicação do direito e processo do trabalho.
Vejamos um pouco do histórico que envolve a matéria. Na vigência do Código Civil de 1916, a alegação da prescrição em direitos patrimoniais era responsabilidade da parte a quem aproveitava a prescrição, como dispunha o artigo 166:
Art. 166. O juiz não pode conhecer da prescrição de direitos patrimoniais, se não foi invocada pelas partes[1].
Mesma disposição se encontrava no artigo 219, § 5o, do Código de Processo Civil, que rezava:
“Art. 219, §5o – Não se tratando de direitos patrimoniais, o juiz poderá, de ofício, conhecer da prescrição e decretá-la de ofício”[2].
A redação destes artigos podia invocar inicialmente perplexidade, pois dava a entender que a prescrição de direitos não patrimoniais podia ser conhecida de ofício, o que seria um erro, posto que os direitos não-patrimoniais[3] não são suscetíveis à prescrição[4]. Os artigos se explicavam quando recordamos que no Código Civil de 1916 prescrição e decadência foram tratadas, de forma criticável, conjuntamente. Assim, se não houvesse as disposições legais que remetessem à interpretação da possibilidade do conhecimento de oficio de direitos extrapatrimoniais, a decadência ficaria descoberta pela legislação, pois não era tratada em nenhum outro dispositivo[5].
Com a entrada em vigor do Código Civil atual, em 2003, houve alteração na disciplina da matéria, pois a nova lei rezava em seu artigo 194:
“Art. 194. O juiz não pode suprir, de ofício, a alegação de prescrição, salvo se favorecer a absolutamente incapaz”[6].
O atual Código, que trouxe a distinção de tratamento entre a prescrição e a decadência, não precisou assim incorrer em erro como fez seu antecessor ao cuidar do tema. A disciplina que existiu durante o tempo em que vigeu o artigo 194 era de que o juiz não podia conhecer de ofício da prescrição, salvo se fosse para aproveitar à absolutamente incapaz[7]. Sobre o tema, houve alteração do Código Civil anterior para o atual, pois pelo artigo 166 do diploma de 1916, não havia a possibilidade de suprimento da alegação da prescrição em nenhuma hipótese, nem mesmo para beneficiar absolutamente incapaz.
A entrada em vigor do atual Código inaugurou um período de descompasso entre a legislação material e a processual, pois enquanto o artigo 194 do Código Civil havia inovado e permitido o reconhecimento de ofício quando este beneficiasse a absolutamente incapaz, o artigo 219, §5o, do Código de Processo Civil continuava com sua redação que não permitia o conhecimento de ofício da prescrição[8]. Qualquer discussão que poderia haver quanto a isto se dissipou com a mudança legislativa que ocorrida por meio da Lei 11.280, de 2006.
A continuidade das denominadas reformas do Código de Processo Civil entrou em sua terceira fase, que se iniciou ao final de 2005, com as Leis 11.187 e 11.232, e prosseguiu, com a edição de outras leis, dentre elas a 11.280, de fevereiro de 2006. O mencionado diploma legal alterou a redação do artigo 219, § 5o, do Código de Processo Civil, que dispõe:
“Art. 219, §5o – O juiz pronunciará, de ofício, a prescrição”.
Para que não restasse nenhuma dúvida quanto a sua aplicação, a Lei. 11.280, de 2006, revogou expressamente o artigo 194 do Código Civil que, como visto anteriormente, determinava o conhecimento de ofício da prescrição somente para absolutamente incapazes. Ou seja, a Lei 11.280 de 2006 guinou para sentido diametralmente oposto a posição da legislação sobre o tema.
Antes mesmo da alteração legislativa trazida pela Lei 11.280, de 2006, já havia defensores da aplicação de ofício da prescrição, sendo talvez o mais expressivo deles Carpenter, que desde o início do século passado prega tal idéia. A defesa do conhecimento da prescrição de ofício pelo magistrado, então, é tema discutido há mais de um século, mas a idéia foi renovada por ocasião do advento da Constituição de 1988.
Uma “nova corrente” surgiu, tendo entre seus adeptos Irany Ferrari e Thereza Christina Nahas. Argumenta esta nova corrente, que o reconhecimento de ofício aproveita toda a sociedade; que preceitos constitucionais têm caráter imperativo, que o inciso constitucional que trata da prescrição não pode ser analisado fora do contexto em que se encontra, do capítulo da norma suprema do qual faz parte, nem no caput do artigo 7º. Sustentam, assim, que a Constituição não colocou nenhum condicionante para a aplicação da prescrição, quanto mais a provocação do particular, do que esta deve ser conhecida de ofício pelo juiz, resguardadas as situações referentes à competência e à coisa julgada[9].
Ari Pedro Lorenzetti criticou ferozmente tal corrente, iniciando por sustentar que nada de novo possuía, que a bandeira já havia sido levantada por Carpenter no início do século 20. Repudia também as idéias de que, com a Constituição de 1988, a prescrição tomou ares de norma de ordem pública e cogente, impondo-se aos trabalhadores, empregadores e também ao Poder Público. Busca reduzir a pó a tese da cogência como motivo para se conhecer a prescrição de ofício, defendendo que, muito antes da prescrição, os direitos trabalhistas foram erguidos ao patamar constitucional, e por esta tese, teriam então passado a ser cogentes. Desta feita, questiona, estariam os juízes autorizados a prolatar sentenças de direitos não-postulados, posto que os mesmos são cogentes? A resposta é negativa, revelando o grau de fragilidade da teoria. Aduz que a presença de um direito na constituição não o faz mais ou menos cogente, apenas lhe confere mais estabilidade. Deve ser recordado também que somente em matéria trabalhista a prescrição foi erguida ao patamar constitucional, isto levaria a crer, pelo entendimento ora refutado pelo autor, que somente a prescrição de direitos trabalhistas poderia ser conhecida de ofício. Questiona o jurista: seria esta prescrição mais significativa à ordem pública do que a dos outros direitos? E se o legislador tivesse mesmo este intuito, de apenas a prescrição trabalhista ser conhecida de ofício, qual a razão desta opção? E por que então teria escolhido justamente a Constituição para ampliar o prazo prescricional trabalhista[10]? Não seria um contra-senso, a norma suprema, ao mesmo tempo em que ampliou o prazo prescricional (depois de acirrada discussão na Assembléia Constituinte, em que havia posição inclusive defendendo a não-contagem do tempo durante a vigência da relação de emprego), pretender dizer que a prescrição deveria ser conhecida de ofício?
Ari Pedro Lorenzetti continua e sustenta que não foi com a Constituição de 1988 que a prescrição passou a ser matéria de ordem pública, isto o era desde o direito romano[11]. Deve ser sempre lembrado que a prescrição é instituto de ordem pública, mas seus efeitos repercutem na vida privada das partes, exclusivamente. A despeito de ser instituto de ordem pública, após consumada, só diz respeito ao patrimônio do devedor, restando aprisionada no âmbito das relações privadas. Se o devedor decidir argüi-la ou não, é problema restrito à esfera privada, que não contempla mais o interesse público, e nem poderia, pois qual a importância deste aspecto para a sociedade como um todo?[12] A sociedade tem a necessidade da existência da prescrição, e o efeito que dela se pretende é conseguido com a alegação ou não pelo devedor. Ari Pedro Lorenzetti lembra que o fator importante é o “efeito moral” da prescrição. Coloca o autor, que a parte, sabedora dos efeitos avassaladores da prescrição em suas pretensões, se apressará em postulá-los judicialmente[13]. Entendo que é mais do que isto; é também o efeito que traz sobre o devedor e sobre a sociedade. O devedor sabe que passando o tempo estabelecido em lei, poderá alegar a prescrição em uma possível postulação judicial de seu credor, e este não poderá mais exigir seu direito de forma coercitiva. A sociedade ganha em segurança, pois a prescrição garante a estabilidade das relações jurídicas, trazendo a tão almejada paz social. A prescrição tem assim benesses espalhadas por todos, mas observe-se, todas são conseguidas, independentemente do fato, privado, do devedor utilizar ou a prescrição e alegá-la oportunamente. Afinal, este fato é eminentemente privado e não repercute na ordem pública.
Com todo respeito, também discordo do entendimento de Carpenter e da interpretação surgida com a edição da atual Constituição. Os motivos são os acima já descritos e também em decorrência da singularidade que possui a relação de emprego. As peculiares características do contrato de trabalho não fazem ser aceitável que o juiz suprima a vontade de um empregador, normalmente em melhores condições econômicas, em melhores condições de conseguir um bom advogado, para pronunciar de ofício a prescrição. Esta postura olvida que atrás da figura do autor está um empregado, que na imensa maioria dos casos não intentou sua ação antes não porque não o quisesse, e sim porque diversos outros fatores o impediam de fazê-lo. Em poucos casos há uma inércia injustificada do empregado, e esta realidade deve ser levada em consideração quando se trata de qualquer questão referente à prescrição.
A discussão hoje tem outro tom, afinal, não cumpre mais discutir se a prescrição pode ou não ser conhecida de ofício. O Código de Processo Civil é claro em sua nova redação: “O juiz pronunciará, de ofício, a prescrição”, e a Lei 11.280, de 2006, expressamente revogou o artigo 194 do Código Civil, não deixando dúvidas sobre as intenções do novo texto legislativo. O que pode ser discutido é se há aplicação ou não ao Processo do Trabalho desta nova determinação.
A novidade trazida pela Lei 11.280, de 2006, mereceu encômios de parte da doutrina, como podemos perceber em Gustavo Filipe Barbosa Garcia, que defende que, em nome dos princípios da primazia da realidade, celeridade e economia processual, uma pretensão que não é mais exigível não possui razão de continuar sendo analisada pelo Poder Judiciário e deve assim ser exterminada de ofício pelo juiz[14].
Não discuto o fato de que as inovações trazidas pelas reformas do Código de Processo Civil busquem celeridade e efetividade do processo, mas que vantagens para o Direito e Processo do Trabalho representará a alteração do conhecimento de ofício da prescrição? Para o Direito Civil acredito que possa ser interessante tal medida[15], pois não temos normalmente a hipossuficiência carregada em um dos pólos do vínculo, nem tampouco a forte subordinação de uma das partes em relação à outra, como existe no Direito do Trabalho. Na relação civil a parte autora não está pressionada por questões que a impedem de litigar em juízo, como está o empregado em plena vigência da relação de emprego que vê a prescrição qüinqüenal gradativamente fulminar suas pretensões. Nas circunstâncias civis em que a parte estaria sendo pressionada por algum aspecto a não ingressar em juízo, algumas delas já foram há muito tempo reconhecidas pelos legislador, como as causas impeditivas e suspensivas da prescrição, descritas nos artigos 197 a 200 do Código Civil.
Vejo, ainda, um problema sério na alteração trazida pela Lei 11.280, de 2006. Este diploma legislativo expressamente revogou o artigo 194 do Código Civil, mas nada disse a respeito do artigo 191, que reza:
“Art. 191. A renúncia da prescrição pode ser expressa ou tácita, e só valerá, sendo feita, sem prejuízo de terceiro, depois que a prescrição se consumar; tácita é a renúncia quando se presume de fatos do interessado, incompatíveis com a prescrição”.
O problema que se coloca é como compatibilizar o artigo 219, § 5o, do Código de Processo Civil com o artigo 191 do Código Civil. O juiz deve conhecer da prescrição de ofício, mas a parte a quem ela aproveita pode renunciar, expressa ou tacitamente.
A renúncia expressa não parece ser problema; se ela ocorrer, entendo que o juiz não pode pronunciar a prescrição; do contrário, estaria o julgador impedindo que o direito seja reparado na violação que sofreu. Situação insólida seria a do réu pretender abrir mão da prescrição, e ser impedido de fazê-lo pelo magistrado, que insiste em pronunciá-la.
Quanto à renúncia tácita, parece ter sido criada uma incompatibilidade de normas. Esta, como dita a lei: “se presume de fatos do interessado, incompatíveis com a prescrição” (artigo 191 do Código Civil). Desta feita, a não-alegação em juízo da prescrição corresponde a um exemplo de sua ocorrência[16]. Então, como poderia o juiz passar por cima desta renúncia, mesmo que tácita, que a parte optou por fazer, e pronunciar a prescrição? Existe, desta forma, uma incompatibilidade entre o texto hoje alterado do Código de Processo Civil e a disposição remanescente do Código Civil. Desta questão, deverão se ocupar os civilistas, e não os juslaboralistas, pois entendo que esta circunstância sequer afetará o Processo do Trabalho, pelo que explanarei a seguir.
Para o Processo do Trabalho, enxergo a questão por outro prisma. Inicialmente, sou contrária à própria idéia da contagem da prescrição como ela se dá hoje em nosso sistema jurídico laboral, ao haver sua contagem durante a vigência da relação de emprego, momento em que existe a subordinação a pairar sobre o empregado. Quase como corolário desta idéia, sou contrária também ao seu reconhecimento de ofício, pois o que ainda restaria de esperança ao trabalhador, premido de prazos tão exíguos de prescrição, seria a possibilidade de sua não-alegação pelo empregador, configurando uma renúncia tácita por parte deste.
Tenho que lembrar que sou defensora do conceito de prescrição como a extinção da pretensão, e não da prescrição como a morte do direito. Assim, se o que falecesse fosse o direito, pareceria incongruente o juiz prolatar uma sentença com base em um direito que não mais existe, mas como o falecimento é o da pretensão, não há problema em se conceder o direito do autor, que ainda existe, e inclusive existirá mesmo se a prescrição for pronunciada, pois continuará vivendo, como obrigação natural.
Defendo que o reconhecimento de ofício pelo juiz, não obstante estar cristalina a modificação feita pelo processo civil, não pode ser aplicado ao Processo do Trabalho. Afinal, o artigo 769 da Consolidação das Leis do Trabalho, ao permitir a aplicação do processo comum ao processo laboral, fez duas exigências para tanto: a omissão da consolidação e a compatibilidade das normas civis com as trabalhistas.
A literalidade do dispositivo que consagra o princípio da subsidiariedade disponha que o direito processual comum será fonte subsidiária do direito processual laboral, desde que exista omissão e compatibilidade “com as normas deste Título”. A despeito de mencionar a lei a expressão “normas deste Título”, não é possível interpretar-se a palavra “título” de forma restrita. O Título a que se refere o dispositivo legal é o Título X – DO PROCESSO JUDICIÁRIO DO TRABALHO. Ao falar do processo judiciário do trabalho, não está se referindo apenas às normas que estão escritas na Consolidação das Leis do Trabalho. Contempla-se todo um conjunto que circunda estas normas, com os princípios e objetivos que permeiam o processo trabalhista. Neste mesmo sentido de pensamento, Valentin Carrion: “Ao processo laboral se aplicam as normas, institutos e estudos da doutrina do processo geral (que é o processo civil), desde que: […] não ofendam os princípios do processo laboral (‘incompatível’)”[17] e Francisco Antonio de Oliveira: “O processo do trabalho se ressente de normas próprias, obrigando-se a buscar subsídios em sede civilista, desde que não previstas e desde que não sejam incompatíveis com os princípios que regem o processo laboral”[18]. Não me parece que exista compatibilidade das normas nesta circunstância.
José Augusto Rodrigues Pinto, ao questionar da aplicação da alteração trazida pela Lei 11.280, de 2006, ao Processo do Trabalho, conclui pela possibilidade de fazê-la. Analisando os requisitos do artigo 769, indica que há a omissão da Consolidação das Leis do Trabalho sobre o tema. Reconhece que maléfica é a alteração para o empregado, como se extrai do texto abaixo, no qual questiona a aplicação ou não do reconhecimento de ofício da prescrição ao Processo do Trabalho:
“Modestamente entendemos que, se fôssemos levar a fundo o detalhe da filosofia do Direito do Trabalho, responderíamos pela negativa, respaldados na clara evidência de que a declaração da prescrição, sistematicamente benéfica ao réu, praticamente só favorece ao empregador nos dissídios do trabalho”[19].
A despeito da afirmação feita, o autor não descarta a aplicação ao Processo do Trabalho do reconhecimento de ofício da prescrição, sustentando que ela não é apta a indicar a incompatibilidade da norma processual civil. Argumenta que o Processo do Trabalho não é tutelar do hipossuficiente, como o é o direito material laboral, devendo reger-se pelo princípio constitucional da simetria de tratamento das partes. Finaliza por dizer que somente se o legislador, percebendo “que o mecanismo de reconhecimento ex officio do efeito prescricional pelo juízo trabalhista, é madrasta para o empregado”, venha a fazer uma ressalva na norma trabalhista, é que não será aplicada a inovação legislativa ao processo laboral[20].
Data venia ao ilustre jurista, autor de tantas importantes obras, mas suas colocações no sentido de ser assim tão injusto o conhecimento de ofício da prescrição no processo trabalhista, não são um indício de incompatibilidade? Afinal, o que é o processo, senão um instrumento de realização do direito material? Os princípios que regem o Processo do Trabalho são os mesmos do Processo Civil? Não me parece que sim. Se assim o fosse, por que somente no Processo do Trabalho a ação pode ser iniciada de forma oral (ressalvados os Juizados Especiais)? Por que somente nele existe o depósito recursal, e aplicável somente ao empregador? Por que seus recursos não possuem como regra geral o efeito suspensivo? Por que não se pagam custas para ingressar com a reclamatória? Ora, não parece que seja assim tão simétrico em suas formas, e que não tutele o hipossuficiente.
Além de tudo o que foi discutido, mais uma situação se coloca: a dificuldade que teria o juiz de alegar de ofício a prescrição, pois ela está sujeita a causas impeditivas, suspensivas e interruptivas de seu prazo. A decadência, que sempre foi conhecida de ofício, não guarda este problema, pois não está sujeita a tais causas, seu prazo corre sem nenhum óbice (salvo quanto aos absolutamente incapazes, que também podem estar sujeitos às causas imunizadoras). De qualquer forma, se o intérprete entender que a prescrição deve ser conhecida de ofício, deve o juiz ouvir a parte antes de realizar sua pronúncia, para evitar equívocos na contagem do prazo prescricional.
O reconhecimento de ofício da prescrição total, a bienal, não choca tanto, pois dois anos para intentar a ação após o fim do contrato de trabalho não parece tão pouco tempo, mas considerar a aplicação da prescrição qüinqüenal de ofício é um absurdo[21]. Imagine-se o trabalhador que laborou durante dez anos em uma mesma empresa, sendo, ao final deste tempo, despedido. Ele pode se apressar o mais possível para ingressar com sua ação, mas terá a prescrição qüinqüenal possibilitando ao empregador pagar somente os últimos cinco anos contados da data em que ingressou com a demanda. Se este empregador resolver renunciar, mesmo que tacitamente, à prescrição, por que haveria o juiz de pronunciá-la de ofício?
Ari Pedro Lorenzetti também pronuncia-se contrário ao reconhecimento de ofício da prescrição e finaliza seu posicionamento de forma eloqüente, afirmando que:
“(…) no processo trabalhista, chega a ser até cinismo, na grande maioria dos casos, defender o reconhecimento da prescrição de ofício. Seria conferir mais um benefício àquele que inibiu a liberdade do empregado de exigir os seus créditos. (…) Maior dano para a ordem jurídico-social e a própria estabilidade dos negócios resulta quando milhares, senão milhões de trabalhadores têm seus direitos postergados, durante longos anos, sabendo o inadimplente que a vítima não pode fazer uso do direito de ação, em virtude da coação notória do empregador sobre o empregado. O emprego é sempre a única fonte de sobrevivência do trabalhador e seus dependentes. Logo, a lesão do seu direito, desde que não ponha em risco a precária sobrevivência, não significa tanto que possa conduzir o credor a um ato, não raro irracional, embora apoiado no direito, na busca de muito pouco, para perder o próprio emprego”[22].
Em verdade, esta discussão representará, de forma prática, muito pouco, pois é sabido que os advogados trabalhistas têm em suas “contestações modelo” um item pronto para alegar a prescrição trabalhista. Raros são os casos em que a contestação não trará o item prescrição, e nestes casos, em que se operou a renúncia tácita por parte do empregador, defendo que não deve o juiz pronunciá-la de ofício, seja por respeito ao artigo 191 do Código Civil, seja por não-aplicação do artigo 219, § 5º, do Código de Processo Civil ao Processo do Trabalho, por incompatibilidade com os princípios que regem este ramo jurídico. Mas mesmo tendo baixa importância prática, o conteúdo da idéias defendidas aqui tem grande significado ideológico, ao demonstrar quais os fundamentos sobre os quais entendo que repousam o Direito e Processo do Trabalho.
Gostaria de salientar que respeito os argumentos em contrários e que foram por mim refutados durante esta discussão, mas entendo que o Direito do Trabalho é mais do que tudo isto que aqui se discutiu, é, em verdade, um instrumento de justiça social, um instrumento para atender aos anseios dos trabalhadores. O Processo do Trabalho, forma de realização deste direito, deve atentar para os princípios que o governam, e não descuidar da realidade em que lida.
Em última análise, independente da opinião a que o intérprete da lei vá se filiar, importante é que o faça alicerçado por argumentos e pelas suas convicções jurídicas e jamais imbuído do espírito, que, infelizmente, rodeia alguns, de apenas ter encontrado mais um argumento para não precisar analisar o restante do processo.
Bacharel em Direito pela UFRGS. Advogada trabalhista. Especialista em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho. Mestre em Direito do Trabalho pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP). Consultora da área trabalhista da Secretaria da Reforma do Judiciário – Ministério da Justiça, e Relatora na Comissão de Alto Nível para aprimoramento e modernização da legislação material e processual do trabalho (2008-2010). Professora de Direito do Trabalho no curso de graduação em Direito do Uniritter/RS. Coordenadora do curso de Pós-graduação em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho da Escola Superior Verbo Jurídico. Professora nos cursos de Pós-graduação em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho do Uniritter, Unisinos, Feevale, UPF, Unesc e da Escola Superior Verbo Jurídico.
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