Redução da maioridade penal: advento do retrocesso

Sumário: 1. Introdução. 2. Breve Histórico da Maioridade Penal no Brasil. 2.1. O Código Penal de 1940. 2.2. O Código de Menores de 1979. 2.3. A Constituição Federal de 1988. 3. O Estatuto da Criança e do Adolescente. 4. A Inimputabilidade. 5. Argumentos acerca da Proposta Reducionista da Maioridade Penal. 6. Considerações Finais. 7. Bibliografia.

Resumo – O presente trabalho visa a realização de estudo científico acerca da problemática no rebaixamento da imputabilidade penal (hoje definida em dezoito anos), enfocando os aspectos sociais e jurídicos que o envolvem, analisando a eficácia da redução da idade da imputabilidade penal como forma de combater a sensação de insegurança pública, em face de atos infracionais praticados por menores. Seu objetivo específico é entender em até que ponto a redução da maioridade penal será uma alternativa eficaz no combate à criminalidade juvenil.

Palavras-Chave: Imputabilidade, Redução, Maioridade.

1. Introdução

O clamor social em relação ao jovem infrator, menor de dezoito anos, surge da equivocada sensação de que nada lhe acontece quando autor da infração penal. Seguramente a noção errônea de impunidade tem-se revelado como o maior obstáculo à plena efetivação do ECA, principalmente diante da crescente onda de violência, em níveis alarmantes. Daí se acredita ser necessário reduzir a idade de imputabilidade penal para responsabilizá-los.

2. Breve Histórico da Maioridade Penal no Brasil

2.1 O Código Penal de 1940

O vigente Código Penal fixou o limite da inimputabilidade penal aos menores de dezoito anos para não serem submetidos a processo criminal. Porém, a prática de um ilícito, enseja na submissão a procedimentos e normas previstas em legislação especial.

Foi adotada pela legislação brasileira a presunção absoluta da falta de discernimento ao menor de dezoito anos que praticar um fato descrito como crime ou contravenção penal. Tal presunção obedece ao critério puramente biológico, não havendo preocupação com o discernimento do menor.

Em sendo assim, o Código Penal presume sua incapacidade tanto para entender a ilicitude do ato quanto para sofrer uma sanção penal.

2.2 O Código de Menores de 1979

O Código de Menores, criado pela Lei n.° 6.697 de 1979, disciplinou a lei penal de aplicabilidade aos menores e atingiu os mais expressivos avanços da legislação menorista brasileira na esfera da assistência, da vigilância e da proteção aos menores de dezoito anos.

Era uma legislação marcantemente repressiva e correcional.

Esse Código surgiu da necessidade do Estado disciplinar os delitos praticados por menores de dezoito anos, almejando com isso a fixação do grau de responsabilidade desses indivíduos perante a sociedade. O Código de Menores classificava o menor de dezoito anos como incapaz, irresponsável por suas condutas e potencialmente delinqüente.

A aplicação do Código de Menores estava restrita aos casos de patologia social, ou seja, a legislação menorista destinava-se a crianças e adolescentes especiais, definidos pelo próprio Código de Menores como indivíduos em situação irregular, não garantindo uma verdadeira proteção, pois se apoiava na falsa idéia de que todos teriam as mesmas oportunidades sócio-econômicas e como se o caminho do crime fosse uma opção.

De acordo com essa legislação, consideravam-se menores em situação irregular as crianças privadas das condições essenciais de sobrevivência; as vítimas de maus tratos e castigos imoderados; as que se encontrassem em perigo moral, entendidas como as que viviam em ambientes avessos aos bons costumes e as vítimas de exploração por parte de terceiros; as privadas de representação legal pela ausência dos pais; as que apresentassem desvios de conduta e as autoras de atos infracionais.

Havia vinculação entre a delinqüência e a condição de pobreza, de abandono, de desvio e de transgressão. O menor era considerado perigoso para a sociedade e por isso sujeito às medidas de proteção estabelecidas por esse Código.

O Código de Menores recomendava, como medidas aplicáveis ao menor, objetivando a sua integração sócio-familiar: a advertência; a entrega aos pais, ao responsável ou a pessoa idônea, mediante termo de responsabilidade; a colocação em lar substituto; a imposição do regime de liberdade assistida; a colocação em casa de semiliberdade e a internação em estabelecimento educacional, psico-pedagógico, hospitalar, psiquiátrico ou outro adequado.

Para a aplicação de tais medidas foram criados reformatórios, internatos, orfanatos, buscando, através deles uma orientação correcional.

Em meio a muita polêmica, o Código de Menores não passava de um Código Penal do Menor disfarçado em sistema tutelar, onde suas medidas não passavam de verdadeiras sanções, ou seja, penas camufladas em medidas de proteção.

Não existia proporcionalidade entre as circunstâncias irregulares e as medidas adotadas, de modo que o emprego destas estava sujeito a um exame socioeconômico e cultural do menor e de sua família. Com isso, as medidas de proteção podiam ser aplicadas independentemente da prática de um fato delitivo.

Concedia vastos poderes à autoridade judiciária, que não necessitaria acatar os direitos e garantias individuais dos menores para reeducá-los. O prazo das internações dos menores era indeterminado, pendente de despacho motivado da autoridade judiciária para o seu afastamento, e os menores poderiam não ter advogados para defendê-los. Se não fosse declarada a suspensão do período de internação do menor que completasse vinte e um anos, ele estaria sujeito ao Juízo das Execuções Penais.

2.3 A Constituição Federal de 1988

A Constituição Federal de 1988, inovou a legislação brasileira, ao tratar a criança e o adolescente como prioridade incondicional, sendo dever da família, da sociedade e do Estado protegê-los.

O artigo 228 estabeleceu o limite de idade para a imputação penal aos dezoito anos, corroborando, assim, com o disposto do artigo 27 do Código Penal. Essa previsão converte-se em especialíssimo o tratamento prestado ao menor de dezoito anos em relação à lei penal. Dessa forma, impossível a legislação ordinária prever responsabilidade penal aos menores de dezoito anos.

A Constituição Federal de 1988 adotou a tendência internacional ao fixar a imputabilidade penal aos dezoito anos, elevando o nível de garantia constitucional à criança e ao adolescente.

A imputabilidade penal aos dezoito anos, prevista no artigo 228 da Constituição Federal, constitui verdadeira garantia individual fundamental das crianças e adolescentes. Tal garantia não pode ser objeto de deliberação por proposta de emenda constitucional, conforme preceitua o artigo 60, § 4º, inciso IV do mesmo diploma legal, ficando assegurado, às crianças e adolescentes que praticarem atos ilícitos a sujeição a uma legislação especial, que levará em conta sua condição peculiar de pessoa em desenvolvimento.

3. O Estatuto da Criança e do Adolescente

O Estatuto da Criança e do Adolescente foi criado no dia 13 de julho de 1990 pela Lei n° 8.069, especificamente para os menores de 18 anos, que contém medidas administrativas destinadas a sua reeducação e recuperação.

O ECA é considerado um microssistema jurídico e foi fruto da necessidade da concepção de uma Justiça especializada para os menores, diferenciada daquela empregada para adultos, em virtude de suas diferenças, pois as crianças e os adolescentes, como seres especiais, possuem a personalidade, o intelecto e o caráter ainda em desenvolvimento, necessitando de proteção especializada e integral. O propósito do Estatuto é o de julgar as infrações praticadas pelos adolescentes entre doze e dezoito anos.

O Estatuto consentiu que o direito de menores cedesse lugar ao direito da infância e da juventude. A alternativa teve como embasamento o abandono da doutrina da situação irregular em favor da doutrina da proteção integral, pois não trata apenas dos menores de dezoito anos que se acham em circunstância irregular, conforme definia o Código de Menores de 1979, mas sim da proteção integral à criança e ao adolescente em geral. O ECA trocou o termo menor pelos termos criança e adolescente, especificando assim a condição de infância e de adolescência.

O Estatuto da Criança e do Adolescente é aplicável à criança e ao adolescente, considerando-se criança a pessoa até doze anos de idade incompletos, e adolescente, aquele entre doze e dezoito anos de idade. Os que se encontrarem nessa faixa etária serão inimputáveis, não sendo responsabilizados tal como os adultos por atos censuráveis ou juridicamente ilícitos pois, ao invés de sofrerem as penas previstas no Código Penal, os adolescentes são alvos de medidas sócio-educativas estabelecidas no Estatuto e às crianças são aplicadas as medidas de proteção.

Dessa forma, enquanto para o Código de Menores o menor era a pessoa com menos de dezoito anos em situação irregular, para o Estatuto a criança e o adolescente é pessoa em desenvolvimento e com direitos especiais a serem garantidos, inovando ao abarcar toda criança e adolescente em qualquer situação jurídica, rompendo decisivamente com a doutrina da situação irregular, garantindo que cada brasileiro que nasce possa ter assegurado seu completo desenvolvimento, ainda que pratique um ato ilícito.

Foi por meio do Estatuto da Criança e do Adolescente que o constituinte estabeleceu como obrigação da família, da sociedade e do Estado garantir, com irrestrita prioridade, os direitos da criança e do adolescente. Portanto, o Estatuto origina-se da percepção doutrinária de direitos humanos, tratando, sem discriminação, de todas as crianças e adolescentes, adotando assim a doutrina da proteção integral.

Assim sendo, o Estatuto da Criança e do Adolescente, baseando-se na norma constitucional, conservou a imputabilidade penal aos dezoito anos, não obstante tenha reduzido a responsabilidade do adolescente para doze anos completos o qual, se praticar algum ato infracional, será punido por meio das medidas sócio-educativas.

A nova legislação menorista também veio a proteger, excepcionalmente, os menores na faixa etária entre 18 e 21 anos, assegurando-lhes todos os direitos fundamentais essenciais à pessoa humana, que deverão ser respeitados, prioritariamente não só pela família, pela sociedade, como também pelo Estado, sob pena de responderem pelos danos causados.

O ECA resgata a qualidade de sujeito de direito intrínseco a todo ser humano, com inclusão da criança e do adolescente, até então tratados como meros objetos de intervenção, com apenas um direito, qual seja o de resignação ante as medidas aplicadas, tidas como educativas e ressocializadoras.

Em meio aos diversos avanços estabelecidos pelo ECA, destaca-se a criação dos Conselhos de Direitos e Tutelares, deflagração da participação do Poder Público e da sociedade organizada na elaboração de políticas sociais, assegurando e concretizando plenamente o exercício da cidadania a todas as crianças e adolescentes.

O Estatuto da Criança e do Adolescente não busca simplesmente punir menores mas, antes de tudo, visa amparar crianças e adolescentes. Busca a recuperação daquele que errou levado por inúmeros fatores sociais, ou até mesmo por sua imaturidade, objetivando sempre, reeducá-lo para que possa retornar à sociedade.

O ECA procura especialmente estabelecer um sistema de preservação da educação, sem abandonar as exigências de defesa social. Impõe-se a punição pelo fato praticado, mas as medidas se destinam essencialmente a impedir que o adolescente volte a delinqüir. As medidas têm, por isso, um caráter mais subjetivo que objetivo, mais educativo que repressivo.

As medidas sócio-educativas aplicadas como reprimenda aos atos infracionais praticados por adolescente infrator têm por finalidade a sua reeducação e reintegração à sociedade. Têm, portanto, por escopo, corrigir o adolescente infrator, sendo pressuposto para a sua aplicação a prática de ato infracional, mas só pode ser aplicada ao adolescente pois às crianças são aplicadas as medidas específicas de proteção.

As medidas sócio-educativas aplicáveis ao adolescente, no caso de prática de ato infracional, estão previstas no artigo 112 do Estatuto da Criança e do Adolescente e são as seguintes: advertência; obrigação de reparar o dano; prestação de serviço à comunidade; liberdade assistida; inserção em regime de semiliberdade; internação em estabelecimento educacional e qualquer uma das previstas no artigo 101, incisos I a VI, do ECA.

Ao aplicar as medidas sócio-educativas, o Juiz da Infância e da Juventude, se baseará nos fatores: a capacidade do infrator em cumpri-la, as circunstâncias do fato e a gravidade da infração.

A aplicação de medidas diversas das previstas no artigo 112, do ECA, não será permitida, pois o rol é taxativo e não exemplificativo.

A autoridade competente a que se refere o artigo 112, e que irá aplicar as medidas sócio-educativas são o juiz e o promotor de justiça da infância e da juventude (este último somente no que diz respeito às medidas previstas nos incisos I, II, III, IV e VII, quando se tratar de conceder remissão com aplicação de medida).

A advertência é a primeira medida observada pelo ECA. Consiste na admoestação verbal, ou seja, numa conversa do adolescente com o juiz ou com o promotor de justiça, na presença dos pais ou responsáveis e que deve ser promovida em audiência e reduzida a termo.

A obrigação de reparar o dano ocorre quando o adolescente pratica um ato infracional com reflexos patrimoniais, e poderá ser obrigado a reparar o dano causado à vítima pela restituição da coisa subtraída, pelo respectivo ressarcimento ou por outra alternativa compensatória. Portanto, essa medida visa o reconhecimento do erro pelo adolescente e sua reparação.

A prestação de serviços à comunidade consiste na realização de tarefas gratuitas de interesse geral efetuadas pelo adolescente por um período não superior a seis meses, em entidades assistenciais, hospitais, escolas e outros estabelecimentos congêneres, bem como em programas comunitários ou governamentais, devendo ser aplicada de acordo com a gravidade do ato infracional praticado. Tal medida tem por objetivo a ressocialização do adolescente infrator através dessas tarefas.

A medida sócio-educativa da liberdade assistida é considerada pelos especialistas na matéria como a mais importante de todas porque possibilita ao adolescente o seu cumprimento em liberdade, junto à família, porém sob o controle sistemático do Juizado e da comunidade.

A liberdade assistida consiste no acompanhamento, auxílio e orientação do adolescente infrator, visando sua integração familiar e comunitária. Essa medida é aplicada quando se mostrar a mais adequada ao caso concreto.

A medida sócio-educativa de semiliberdade é a medida mais restritiva de liberdade do adolescente infrator depois da internação. Trata-se de um meio termo entre a privação de uberdade, imposta pela internação, e a liberdade assistida. Permite que os adolescentes infratores trabalhem e estudem durante o dia e se recolham a uma entidade especializada à noite.

A internação é a mais severa de todas as medidas sócio-educativas previstas no Estatuto, por privar o adolescente de sua liberdade, devendo ser imposta somente em casos mais graves e de extrema necessidade. A internação deve obedecer aos princípios da brevidade (deve ser decretada pelo período mais curto possível), da excepcionalidade (deve ser adotada como última alternativa, ou seja, somente se for inviável a aplicação das demais medidas) e do respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento.

Destarte, o ECA é uma legislação em conformidade com todas as diretrizes internacionais sobre os direitos das crianças e dos adolescentes, e se não representa a solução para todos os problemas que a infância e a adolescência brasileira deparam, seguramente propõe o caminho.

4. A Inimputabilidade

A circunstância de o menor de dezoito anos não responder pelos atos delituosos tipificados pelo Direito Penal não o faz irresponsável, impune, mas inimputável. O artigo 228 da Constituição Federal preceitua que são penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos, sujeitos às normas da legislação especial.

Os menores de 18 anos respondem frente à legislação especial (Lei n.° 8.069/90 – Estatuto da Criança e do Adolescente), sendo imputáveis diante dessa lei, respondendo pelos delitos que praticarem, ficando submetidos às medidas sócio-educativas que vão da advertência à privação de liberdade.

O Estatuto da Criança e do Adolescente reserva aos menores de 18 anos que praticarem uma infração penal um procedimento próprio e especial, além das medidas sócio-educativas que podem atingir, conforme o caso, inclusive a privação de liberdade, respeitando o limite de três anos.

A redução da idade para a imputabilidade penal tem causado discussões, pois uns defendem que a idade de 18 anos para a imputabilidade penal deve ser mantida, conforme prevê a legislação vigente, enquanto outros defendem que a redução da idade para 16 anos é necessária devido o desenvolvimento mental e discernimento dos adolescentes nos dias atuais, pelo fato de que os mesmos praticam cada vez mais ilícitos penais, pois são impunes.

Portanto, o argumento de que os adolescentes tudo podem, pois ficam impunes, é uma ilusão pois, quando infringem a legislação penal, são submetidos a uma legislação especial, o Estatuto da Criança e do Adolescente, pelo qual sofrerão um processo judicial específico e receberão uma punição, que também será específica devido à sua condição peculiar de pessoa em desenvolvimento. Tal punição busca a reeducação desses adolescentes para o convívio social.

5. Argumentos acerca da Proposta Reducionista da Maioridade Penal

A maioridade penal é atingida aos dezoito anos, conforme disposto nos artigos 228 da Constituição Federal, 27 do Código Penal e 104 do Estatuto da Criança e do Adolescente, mas frequentemente ocorrem discussões sobre a redução da imputabilidade penal para dezesseis anos. Nesse sentido, tramitam no Congresso Nacional várias propostas de emendas constitucionais para o rebaixamento da maioridade penal.

Os principais argumentos utilizados pelos defensores da redução são: 1°) a violência praticada por adolescentes vem aumentando assustadoramente; 2°) os jovens entre 16 e 18 anos possuem, pelo grau de informação a que estão expostos, discernimento, podendo ser responsabilizados por seus atos; 3°) os adolescentes infratores não são punidos; 4°) os adolescentes são utilizados por adultos para a prática de crimes; 5°) os maiores de dezesseis anos já têm direito de votar; 6°) a insuficiência do Estatuto da Criança e do Adolescente.

Um dos argumentos utilizados pelos defensores da redução da idade para a imputabilidade penal é o de que os adolescentes têm sido os responsáveis pelo aumento da taxa da criminalidade. Insistem em ignorar as verdadeiras causas que levam o menor a praticar infrações e encaram tal medida como a solução deste amplo e grave problema social.

É preciso atacar as causas da violência e não o seu efeito. As causas do crescimento da criminalidade são inúmeras, podendo ser citadas a desigualdade social, o desemprego, a miséria, a desagregação familiar e social. Estas sim devem ser combatidas. Assim, não há como afirmar que os responsáveis pelo aumento da criminalidade do Brasil sejam os adolescentes.

Levantamento realizado pela Associação Brasileira de Magistrados e Promotores de Justiça da Infância e Juventude – ABMP, demonstra que os adolescentes são responsáveis por apenas 10% do total de crimes ocorridos no Brasil, sendo que deste percentual, 90% são infrações contra o patrimônio, meros furtos, sem, portanto, emprego de violência ou ameaça à pessoa. Outro dado interessante é o de que o envolvimento dos jovens nos crimes de homicídio é muito pouco significativo, pois corresponde a 1,3% do total de ocorrências policiais.

Os crimes violentos perpetrados por jovens são exceções, mas quando ocorrem, geram muita indignação e forte repercussão na mídia, dando a impressão de que fazem parte do cotidiano. Entretanto, a sua ocorrência esporádica é que causa o alarme.

A redução da idade para a imputabilidade penal em nada contribuiria para a redução da criminalidade. O que se deve, pois, é exigir do governo soluções para o problema, já que o desemprego, a miséria, a falta de educação, dentre outras, são causas que influenciam o aumento da criminalidade. Então, tem-se que sanar as causas para se extinguir os efeitos.

A Constituição Federal e o Estatuto da Criança e do Adolescente, somados à boa vontade do Estado e da sociedade, são instrumentos que oferecem os subsídios necessários para se estabelecer a justiça social e a qualidade de vida aos jovens em formação.

Outro argumento bastante utilizado pelos defensores da redução da idade para a imputabilidade penal é que os menores entre 16 e 18 anos já possuem completo discernimento, e, portanto, precisam ser encarados como pessoas capazes de entender as conseqüências de seus atos, devendo ser submetidos à legislação penal, pois possuem maturidade suficiente para tanto.

Psicólogos, antropólogos e sociólogos conceituam a adolescência como um estágio peculiar no desenvolvimento humano, um período de alterações físicas, psíquicas e sociais. Juntamente com modificações hormonais, o adolescente vive uma fase de amadurecimento psicológico que passa pela reavaliação das relações parentais e por um período de desajuste social, no qual deixou de ser criança, inconsciente e inconseqüente, mas ainda não é aceito na sociedade adulta.

Não se trata de possuir ou não capacidade para discernir entre o certo e o errado. Por estarem passando por uma fase peculiar de desenvolvimento, os adolescentes devem receber um tratamento de recuperação específico, diferente daquele aplicado aos adultos que são submetidos à legislação penal, pois o objetivo pretendido com a submissão de um adolescente a um tratamento específico é o de recuperá-lo para o convívio social.

Outro argumento de que se utilizam os defensores da redução da idade penal é o de que os adolescentes menores de 18 anos, são usados por adultos para realizarem ilícitos penais, pois aqueles, dessa forma, não são responsabilizados penalmente.

Observa-se, nesse caso, que a redução da imputabilidade penal não resolverá o problema, pois o mandante do crime, no caso maior de 18 anos, continuará atuando, recrutando outros jovens pois, se os menores de 18 anos são instrumentos dos criminosos adultos, os menores de 16 anos também o serão, com maior probabilidade.

Se há impunidade, nessa situação, tal impunidade estaria relacionada ao adulto (mandante), e não ao adolescente infrator (mandado) pois, para este, o Estatuto da Criança e do Adolescente prevê medidas sócio-educativas, enquanto que os mandantes não respondem pomada.

Portanto, essa questão só se resolverá se o controle da criminalidade se estender ao mandante do crime porquanto, punido o mandante, acaba a ação. Com isso, não há necessidade de se reduzir a idade penal, o que seria o mesmo que atacar o problema em sua causa e não em suas conseqüências.

Outro argumento de que se valem os defensores da redução da idade para a imputabilidade penal está centrada na questão do voto. Defendem que, se o jovem com dezesseis anos pode votar, poderá ter maturidade suficiente para determinar-se diante do caráter ilícito de um fato e assim, deverá responder penalmente. Ou seja: defendem que o próprio legislador constituinte reconheceu aos maiores de 16 e menores de 18 anos discernimento e maturidade na tomada de decisões, concedendo-lhes capacidade eleitoral, conforme previsão expressa no artigo 14, § 1°, inciso II, alínea c, da Constituição Federal.

No entanto, tal entendimento é equivocado pois não se pode confundir imputabilidade penal com capacidade eleitoral, coisas que a própria Constituição Federal distingue. Além do mais, há várias outras limitações etárias previstas na Constituição Federal, como a exigência de 18 anos para se candidatar a vereador, 21 anos para Prefeito, 35 anos para Presidente da República, entre outras, sendo que todas essas limitações possuem razões próprias. Verifica-se, por conseguinte, que, para cada situação se exige uma capacidade e com relação ao menor, tal exigência também deve ser observada.

O menor infrator não pode ser comparado ao adulto delinqüente, pois aquele possui personalidade ainda em formação, seu discernimento não se encontra plenamente formado e tem seu nível de consciência e formação infinitamente inferior ao dos adultos.

Comparar em igualdade de condições menores com adultos criminosos é desconsiderar o ideal de justiça conferido por Aristóteles, tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, na medida das suas desigualdades. Portanto, se o menor fosse equiparado aos adultos criminosos estar-se-ia tratando igualmente os desiguais.

Além disso, é relevante lembrar que o voto para maiores de 16 anos é facultativo, enquanto que a imputabilidade penal é compulsória. Trata-se de situações diferentes e, portanto, exigem-se capacidades diferentes.

Outro argumento utilizado pelos defensores da redução da imputabilidade penal é que as medidas sócio-educativas estabelecidas pelo Estatuto da Criança e do Adolescente não são suficientes para a punição dos menores.

Alguns juristas sustentam que o Estatuto é falho porque suas medidas são muito brandas, fazendo com que, ao invés de diminuir a criminalidade juvenil, seja um estímulo para a prática de ato infracional.

Tal argumento não procede pois as medidas sócio-educativas do Estatuto da Criança e do Adolescente, além de buscar a punição dos menores infratores, buscam também sua reeducação e recuperação para que ele possa retornar ao convívio social.

6. Considerações Finais

As causas da criminalização juvenil devem ser atacadas e não os seus efeitos. Tornar o menor imputável seria desarrazoável, contraproducente e inoficioso.

Desarrazoável porque não leva em consideração os fatores sociais, psicológicos, políticos e pedagógicos, fixando-se tão somente na exegese de sua conduta; Contraproducente porque uma vez abduzido pelo cárcere, diplomar-se-á nas faculdades do crime, em detrimento da pretendida ressocialização; e Inoficioso porque a subsunção do menor infrator ao código penal acarretará em danos irreversíveis na formação do adolescente, que nutrido pelo ódio vingativo do Estado não retribuirá outra coisa a sociedade senão a própria desgraça e a instauração do caos que se tornou a sua vida.

 

Bibliografia
BRASIL. Código Penal. Decreto-Lei nº 2.848, de 1940. São Paulo: Saraiva, 2005.
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado, 1988.
BRASIL. Estatuto da Criança e do Adolescente. Lei nº 8.069, de 1990. 5 ed. Brasília, DF: Senado Federal, 2002.
MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de direito penal. vol. 1. 20 ed., São Paulo: Atlas, 2003.
SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 19 ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2001.

 


 

Informações Sobre os Autores

 

Ivana dos Santos Monteiro

 

Acadêmica de Direito, Oficiala e Justiça do TJ/BA

 

Rodimar da Silva Santos Júnior

 

Acadêmico de Direito. Capitão da Polícia Militar do Estado da Bahia

 


 

Equipe Âmbito Jurídico

Recent Posts

TDAH tem direito ao LOAS? Entenda os critérios e como funciona o benefício

O Benefício de Prestação Continuada (BPC), mais conhecido como LOAS (Lei Orgânica da Assistência Social),…

5 horas ago

Benefício por incapacidade: entenda como funciona e seus aspectos legais

O benefício por incapacidade é uma das principais proteções oferecidas pelo INSS aos trabalhadores que,…

5 horas ago

Auxílio reclusão: direitos, requisitos e aspectos jurídicos

O auxílio-reclusão é um benefício previdenciário concedido aos dependentes de segurados do INSS que se…

5 horas ago

Simulação da aposentadoria: um guia completo sobre direitos e ferramentas

A simulação da aposentadoria é uma etapa fundamental para planejar o futuro financeiro de qualquer…

5 horas ago

Paridade: conceito, aplicação jurídica e impacto nos direitos previdenciários

A paridade é um princípio fundamental na legislação previdenciária brasileira, especialmente para servidores públicos. Ela…

5 horas ago

Aposentadoria por idade rural

A aposentadoria por idade rural é um benefício previdenciário que reconhece as condições diferenciadas enfrentadas…

5 horas ago