O presente artigo visa, ainda que de forma breve e sem pretensão de esgotar o assunto, demonstrar que não há responsabilidade civil indireta do ex-cônjuge que não detém a Guarda exclusiva de filho menor em face de dano causado a terceiros.
1. A responsabilidade indireta no Código Civil
Art. 932. São também responsáveis pela reparação civil:
I – os pais, pelos filhos menores que estiverem sob sua autoridade e em sua companhia;
(…)
Os pais, tutores ou curadores, respondem pelos danos causados pelos que estiverem sob sua Guarda, independente de culpa. A responsabilidade do pai, do mesmo modo que a do tutor e a do curador, deriva das funções por eles exercidas, haja vista que sua responsabilidade está baseada na culpa in vigilando, que decorre “da falta de atenção ou cuidado com o procedimento de outrem que está sob a Guarda ou responsabilidade do agente”.
Por sua vez, o empregador responde pelos atos praticados pelos seus prepostos, em serviço, que causarem prejuízos a outrem. Trata-se de “culpa in eligendo aquela que se caracteriza pela má escolha do preposto”. A culpa do patrão é presumida, conforme entendimento já sumulado do Supremo Tribunal Federal (súmula 341) “é presumida a culpa do patrão ou comitente pelo ato culposo do empregado ou preposto”. Cabendo ao empregador propor ação de regresso contra o empregado para reaver o que injustamente pagou, caso prove que o ato ilícito se deu por culpa exclusiva do empregado.
Para Pontes de Miranda, “a culpa do responsável consiste em não haver exercido, como deveria, o dever de vigiar, de fiscalizar (culpa in vigilando) ou de não haver retirado do serviço ou de haver aceito quem não podia exercer com toda correção o encargo (culpa in eligendo)”. No entanto, vale dizer que incumbe ao ofendido provar a culpa do incapaz, do empregado, dos hóspedes e educandos. Presumida é apenas a responsabilidades dos responsáveis, sendo indispensável e precedente a prova da culpa daqueles para a configuração do dever de indenizar.
Igualmente, ressalvados casos especiais, os empresários individuais e as empresas respondem independentemente de culpa pelos danos causados pelos produtos postos em circulação, é o que dispõe o art. 931 do Código Civil, em referência ao também prescrito no Código de Defesa do Consumidor.
Em linhas gerais, a responsabilidade do preponente existe efetivamente “desde que o ato danoso seja cometido durante o tempo de serviço, e esteja em relação com este serviço”, não se configurando se ocorreu em local e tempo diverso, sem conexão com as funções confiadas ao agente. O dever de indenizar, da pessoa jurídica de direito público, portanto, “decorre do nexo causal entre o desempenho das tarefas do Poder Público e o prejuízo da vítima, e não do dolo ou culpa do servidor estatal”, que só será apurado em sede de ação regressiva que poderá ser movida pela pessoa pública contra seu preposto.
2 – CARACTERÍSITICA DA RESPONSABILIDADE INDIRETA
Assim, a responsabilidade indireta ou vinculada, consiste numa pessoa responder por fato de outrem, mas para que esta se configure é preciso que a pessoa tenha vínculo jurídico com o autor do ato ilícito, neste caso, um dever de vigilância, entre outros elementos. O fundamento desta responsabilidade é que ela se caracteriza como fato próprio omissivo, infração do dever de vigilância que deveria ter tido. A culpa é presumida e relativa, júris tantum. Pode haver delegações de vigilância, mas nem todas isentam os pais. Somente aquelas de caráter de substituição, permanente, duradoura e jurídica. Entendo que a Guarda exclusiva exercida por um dos cônjuges seja uma delas. Embora, o simples afastamento do filho da casa dos pais, não elide a responsabilidade dos mesmos, nem mesmo a emancipação de fato o faz. Mas, a polêmica se instaura quando se trata de pais separados ou divorciados, quando um detém a Guarda exclusiva do filho menor.
Diante da colocação do problema acima, objeto deste artigo, algumas premissas serão importantes para esclarecer as dúvidas nesta questão. Senão vejamos:
3 – GUARDA EXCLUSIVA DE FILHO VERSUS PODER FAMILIAR
Quanto a Guarda, em sentido genérico, exprime proteção, observação, vigilância ou administração. Por sua vez, a Guarda de filhos – É locução indicativa, seja do direito ou do dever, que se compete aos pais ou a cada um dos cônjuges, de ter em sua companhia ou de protegê-los, nas diversas circunstâncias indicadas na lei civil. E guarda, neste sentido, tanto significa custódia como a proteção que é devida aos filhos pelos pais. Em regra, a Guarda dos filhos compete ao cônjuge em que se conserva o Poder Familiar pleno. Na separação consensual, cabe aos cônjuges deliberar a respeito. Na separação contenciosa, a guarda dos filhos se defere ao cônjuge inocente, ou ao cônjuge a que pode lei assistir esse direito ou dever, quando ambos culpados. Assim ainda reza a lei do Divórcio.
Quanto ao Poder Familiar, Art. 1.631 do Código Civil, temos:
“Durante o casamento e a união estável, compete o poder familiar aos pais; na falta ou impedimento de um deles, o outro o exercerá com exclusividade.”
“Parágrafo único. Divergindo os pais quanto ao exercício do poder familiar, é assegurado a qualquer deles recorrer ao juiz para solução do desacordo.”
Assim sendo, é fato que com a separação ou o divórcio, a guarda dos filhos menores tomará um dos seguintes destinos:
a)No procedimento consensual(separação ou divórcio), os genitores deliberam o que entenderem quanto à guarda dos filhos (art. 9o., Lei 6.515/77).
b) No procedimento litigioso (separação ou divórcio), o juiz, ao proferir a sentença, decidirá sobre a guarda dos filhos.
Num e noutro caso, a guarda (direito/dever) se revestirá das seguintes características:
1- Guarda Única ou Exclusiva – quando o filho é confiado a um dos genitores, que o terá em sua companhia, sob exclusiva responsabilidade legal e doméstica; garantido ao outro genitor o direito de visitação, com regulamentação judicial.
2- Haverá também a possibilidade da Guarda alternada ou compartilhada, algo que ainda é muito incipiente em nossos Tribunais.
Vejo como ponto crucial neste debate a questão do Poder Familiar versus Guarda exclusiva do menor. Haja vista que aqueles que sugerem a responsabilidade solidária dos pais em qualquer circunstância se apegam a este detalhe.
Evidentemente que os institutos da Guarda de filhos menores e o Poder Familiar são coisas distintas, mas, não podemos ignorar que o deferimento da Guarda exclusiva para um dos cônjuges interfere no exercício pleno do Poder Familiar do outro, fazendo reflexo direto na questão da responsabilidade vinculada.
Portanto, cobrar responsabilidade civil indireta de um dos cônjuges que não detém a Guarda do filho, conseqüentemente não exerce o Poder Familiar pleno, nos moldes da guarda exclusiva que ainda predomina em nossos Tribunais, parece-me por demais exagerado. Posto que, o Direito não é matemática, mas, deve obedecer a uma certa lógica e esta lógica deve está baseada em parâmetros aceitáveis.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Finalizando, é importante ressaltar que, na constância do casamento ou união estável, quando falamos da responsabilidade civil dos filhos, estamos nos referindo a uma responsabilidade civil solidária. Isto é cristalino. Todavia, quando ocorre a ruptura conjugal, e conseqüentemente o deferimento da Guarda única ou exclusiva ( modelo de Guarda que ainda predomina nas Varas de Família), cessa a solidariedade da responsabilidade civil dos pais, passando o encargo apenas para o cônjuge ou companheiro que fica com a Guarda do menor. Portanto, na guarda única ou exclusiva fica claro que o legislador incubiu o detentor da Guarda pela responsabilidade civil, salvo suas excludentes. Por outro lado, caso a opção seja pela guarda compartilhada, tendência atual, a ruptura conjugal não modificará a situação na constância da união; ou seja: continuará a responsabilidade solidária de ambos os pais, uma vez que o quadro não se alterou e dessa forma não existe a figura da imediatidade e fiscalização.
Historiador e Bacharelando em Direito
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