A pesquisa dos tipos de vinculação a serem estabelecidas entre o Estado e seus agentes representa o tratamento da natureza jurídica da função pública. ARAÚJO constata a existência de diversas teorias que buscam a explicação de sua natureza.[1]
As teorias da função pública tratam da natureza do vínculo entre o servidor e o Estado e dividem-se, segundo o autor, entre as de direito público e as de direito privado.[2]
Também são estas últimas agrupadas em duas concepções chamadas unilateralista ou regulamentar e bilateralista ou contratual.[3]
Em relação às teorias da função pública ARAÚJO faz longo estudo de cada uma como a seguir[4]:
Os aspectos gerais das teorias da função pública de direito privado indicam o vínculo jurídico entre o servidor e o Estado como uma relação contratual, de acordo com os modelos do direito civil. Presentes estão o livre consentimento, a capacidade de contratar e o objeto lícito, requisitos sem os quais não seria o contrato válido no mundo do direito.[5]
O cidadão não é obrigado a prestar serviços ao Estado em função de lei, slavo as exceções existentes.[6]
Devem estar também o Estado e o servidor com plena capacidade para contratar e, este último, para prestar serviços, sem nenhuma situação de subordinação à soberania do primeiro.[7]
Isto tudo acrescentado, é claro, da forma prescrita pela lei.[8]
São palavras do autor:
“As teorias de direito privado diferem quanto à caracterização do objeto[9] da relação contratual entre servidor e Estado. Em função disto, podem ser divididas em teorias de direito real, que vislumbram o contrato de função pública como atribuidor de direitos e obrigações em torno de uma coisa; e as teorias de direito pessoal, que reconhecem apenas obrigações pessoais recíprocas”.[10]
Pelas teorias de direito real, os ofícios públicos eram coisas sujeitas à apropriação. Devem estas sua existência ao modo pelo qual era apresentado o exercício dos ofícios públicos.[11]
Dentro desta teoria vislumbra o autor a teoria da posse como a que explica o contrato do ofício público como precário, ou como doação, ou como locação de coisa.[12]
No contrato precário, o proprietário de uma coisa cede o seu uso ou sua posse a outra pessoa que a solicita, devendo esta restituí-la assim que requisitada.[13]
A teoria da propriedade entende o ofício público como uma propriedade de seu ocupante.[14]
Já entre as teorias do vínculo pessoal – as quais entendem existir relação direta e pessoal entre o funcionário e o Estado – estão as de gestão de negócios, mandato, locação de serviços e contrato inominado.[15]
Pela teoria do mandato, existe um contrato deste tipo entre o servidor e o Estado, sendo o Poder Público o mandante e o servidor, o mandatário.[16]
A teoria da locação de serviços explica a relação Estado-funcionário desta forma. Foi fortalecida quando o Estado passou a assumir tarefas industriais, comerciais e de prestação de serviços, nos fins do século XIX , e a adotar normas similares às utilizadas para os trabalhadores do setor privado no relacionamento com os seus agentes. No século XX aplicou-se a certos servidores do Estado as normas trabalhistas do setor privado.[17]
A teoria da gestão de negócios tinha aplicação restrita às hipóteses em que não poderia ser caracterizado tanto o mandato quanto o contrato de prestação de serviços. Os exemplos citados pelo autor neste ponto são a destituição do poder constituído por movimentos de força ou a circunstancial atuação do agente público fora de seu âmbito regular de competência.[18]
Os teóricos que enxergavam na relação de função pública um contrato de direito privado que não correspondia aos já definidos em lei eram os que denominaram-no de contrato especial de serviço público. Também foram conhecidos como contratos inominados.
Lembra o autor, porém, que no que concerne à adoção desta última teoria, a dificuldade para enquadramento da regulamentação do serviço ao Estado entre os contratos de direito privado à medida que crescia a tendência para o estabelecimento de regras legais específicas para a função pública no século XIX.[19]
As teorias analíticas ou complexas de função pública pertenciam ao campo do direito privado e atribuiam à relação entre o servidor e o Estado uma natureza específica e uma combinação de diferentes figuras jurídicas.[20]
Em um ramo distinto do pensamento jurídico, as teorias de direito público não aceitavam fosse possível a existência do vínculo Estado-servidor dentro dos moldes do direito privado.[21]
Para estes últimos teóricos não era possível a coexistência e o relacionamento do direito privado e o exercício das prerrogativas de autoridade dos funcionários públicos sobre os cidadãos.[22]
Duas são as teorias de direito público. A primeira caracteriza o vínculo como ato contratual de poder público e a última como ato unilateral de poder público que institui relação unilateral.[23]
A teoria do contrato de direito público sustenta tese de que o vínculo de função pública assinala-se como contrato originado da teoria do contrato inominado de direito privado.[24]
Para ARAÚJO, os autores que defendiam a teoria do contrato de direito público para a função pública o faziam também na defesa da própria existência deste tipo de contrato, com conjunto de caracteres especiais autônomas em relação aos contratos de direito privado.[25]
O que o autor acima destaca é que, mesmo possuindo características comuns como manifestação livre de vontade, capacidade das partes e objeto lícito, os contratos seriam de direito privado e de direito público. Porém, os de direito público refeririam-se aos interesses gerais enquanto os de direito privado refeririam-se aos interesses particulares.[26]
Em relação às teorias que caracteriza o vínculo como ato unilateral de poder público que institui relação unilateral, pode-se dizer alguns aspectos gerais a seu respeito. Inicialmente que a função pública se estabelece em termos unilaterais, podendo-se exemplificar com a nomeação e o regime legal a que ela se submete.[27]
Do dito acima nasceram as teorias que embora aceitem todos a unilateralidade do ato de nomeação, opina ARAÚJO:
“…dividem-se quanto à natureza específica da relação criada por tal ato no âmbito do direito público.”[28]
As teorias que surgiram foram então as do vínculo de direito real, do vínculo de direito pessoal, do regime de coação legal e do regime legal especial.[29]
Comenta ARAÚJO que a nomeação é ato unilateral por ser ato de autoridade e pelo seu objeto ser a atribuição a alguém de prerrogativas especiais de poder público. Tudo isto de acordo com a previsãoi legal, não gerando efeitos além dos já previstos.[30]
Para o autor a exigência da aceitação da nomeação pelo indivíduo nomeado não modifica a unilateralidade do provimento. Isto porque ela só é necessária para o exercício da função.[31]
O próprio concurso público para a escolha de servidores também não traz em si a obrigatoriedade de nomeação após a seleção realizada.[32]
As teorias unilaterais da função pública, segundo aponta ARAÚJO, dividem-se nas que atribuem ao vínculo criado com o servidor natureza de direito real e as que o qualificam como relação pessoal.[33]
Concluindo a respeito da teoria do direito real ARAÚJO expõe:
“A teoria do direito real originou-se na tese da propriedade privada sobre a função pública, característica do feudalismo e do Estado patrimonial, sendo, então, adaptada aos parâmetros do direito público. Embora ainda sustentada por Hauriou no final do século XIX, perdera prestígio a possibilidade de sustentação do exercício de direito de propriedade sobre os ofícios públicos desde as revoluções liberais, com a consequente afirmação do conceito de soberania, atribuida à nação. Constituindo-se o Poder Público em expressão da soberania, não mais se concebe que a função pública, manifestação deste Poder, possa apresentar-se como objeto de domínio particular, nem de domínio público transferível aos indivíduos.”[34]
As teorias do vínculo pessoal, por sua vez, negam a possibilidade de serem constituidos direitos sobre a função pública. Os direitos seriam constituidos apenas em relação a ela. São as teorias da coação legal ao exercício da função pública e a da relação legal especial e unilateral.[35]
Pela teoria da coação legal – desenvolvida a partir do contrato social – a coação legal partiria do pressuposto que o Estado é abstração necessária desejada por toda a nação.[36]
O Estado necessitaria, assim, de indivíduos a seu serviço. O dever de prestar serviços ao Estado seria imponível a todos quando fosse necessário.[37]
Na teoria da situação legal o indivíduo ingressaria no serviço público por livre aceitação, entretanto, sem formação de um contrato.[38]
O autor esclarece que a partir de meados do século atual, a teoria da situação legal ou estatutária passou a dominar na doutrina e na jursiprudência.[39]
No Brasil, a maioria dos autores do Direito Administrativo optou pela teoria estatutária. Foi aceito também que o vínculo estatutário é o mais apropriado à Administração Pública e que ele é caracterizado pela superioridade do Estado em relação ao servidor. Diferentemente das relações trabalhistas privadas, não há direito adquirido à manutenção dos direitos e obrigações existentes quando da investidura no cargo. O direito adquirido só surge quando da concretização de situação de fato criada em lei capaz de gerar um direito. Um bom exemplo disto é o que nos dá o autor em estudo:
“…se a lei estabelece o direito a um prêmio ao servidor que completa cinco anos de serviço, concretizada esta circunstância para determinado agente, este deverá recebê-lo, não podendo a Administração negá-lo ou pretender estabelecer outras condições para a sua quitação. Mas, se antes de decorridos os cinco anos sobrevém norma que prevê seja conferido o prêmio após decorridos dez anos de serviço, vale o novo prazo, pois não existe direito adquirido às condições gerais e hipotéticas preexistentes.”[40]
As teorias do vínculo unilateral e a do vínculo legal adaptadas eram à teoria orgânica do Estado. Esta teoria nascida entre o fim do século XIX e o início do século XX ainda hoje influemciaa doutrina do Direito Administrativo.[41]
A teoria orgânica do Estado nasceu para expilcar a relação do Estado com a sociedade. Veio como reação à concepção individualista do Estado e da sociedade.[42]
Acrescenta ARAÚJO que dentro do contexto da teoria orgânica florecseu com mais força a tese da situação legal do funcionário público frente ao Estado. Para ele, a definição unilateral e regulamentar deste vínculo, afastadas as teses contratualistas, foi a que mais se apresentou apropriada à idéia da função representativa do servidor público, predisposto a incorporar os próprios valores legais relativos ao Estado.[43]
Este autor explica ainda que da conjugação entre a teoria da situação legal ou estatutária e a teoria orgânica do Estado, resultaram as diretivas básicas da teorização e explicação pelo Direito Administrativo da função pública.[44]
A partir desta concepção os seus traços principais seriam:
“a) automática ligação entre funcionário e cargo público, na sua concepção tradicional de parte determinada (inclusive numericamente) e indivisível dos órgãos públicos; [45]
b) concepção do funcionário como exclusivo meio de ação administrativa, ao qual cabe o status unilateralmente determinado pelo Estado;
c) recusa em conhecer a legitimidade do conflito entre interesses dos servidores públicos, principalmente os de natureza coletiva, e os do Estado e, conseqüentemente, inadmissibilidade de meios jurídicos capazes de compor tais conflitos;
d) pronta justificação da proibição de sindicalização e de greve na função pública e, quando previstos legalmente, como no regime da viugente Constituição brasiliera, notória omissão em se dedicar a estes temas, mostrando que a tradição unilateralista e organicista ainda pesa mais que a dicção renovadora da norma jurídica.”[46]
As teorias que admitiam a função pública apresentar elementos de direito público e de direito privado eram chamadas de teorias mistas.[47]
Algumas destas teorias consideravam a nomeação ato unilateral do Poder Público, entretanto, o regime criado a partir de então, um regime contratual de direito privado.[48]
Outras enxergavam as obrigações profissionais do funcionário como contrato de direito público, já os seus direitos pecuniários originados de um contrato de direito privado.[49]
No tratamento da natureza e do regime da função pública, após o estudo das teorias de direito privado, público e mistas, o autor em análise trata dos regimes estatutário e contratual.[50]
Inicia apontando a caracterização doutrinária da natureza do vínculo do Estado com seus servidores como de direito público face à sua sujeição à instabilidade das normas que o governam. Estas normas podem ser estabelecidas e alteradas somente pelo Poder Público.[51]
A teoria da situação legal acima é a de maior adesão no Brasil e em outros países.[52]
O regime contratual é característico do direito privado e, diferentemente do estatutário, pode ser distinguido pelo contrato entre o Estado e seu servidor. Este contrato é nascido da conjugação da vontade de ambas as partes e não pode ser unilateralmente modificado.[53]
Aponta o autor:
“…o servidor possui, neste caso, direito adquirido à manutenção das condições contratuais que regem seu vínculo com o Estado.”[54]
O contrato de trabalho é o que tem sido usado em diversos países.
Além do mais, este tipo não costuma atingir a totalidade dos servidores públicos. Desta situação nasce uma dualidade de regimes jurídicos na função pública.[55]
Uma das concepções do que se entende por função pública é a que a trata como o conjunto de atividades das pessoas que trabalham na Administração Pública. BARACHO trata do tema nos seguintes termos: “Entende-se como função pública, no sentido orgânico, o conjunto das atividades das pessoas da administração pública, sendo que sua composição é diversa e compreende categorias extremamente variadas.”[56]
Enfocando o sentido orgânico de função pública, o autor citado apresenta que pode se entender somente parte do pessoal que exerce trabalho para a Administração. Ressalta o mesmo que estes não se encontram submetidos às normas do direito comum do trabalho, mas sim a um estatuto de direito público. Aponta também outros tipos de ligação jurídica da Administração com o seu pessoal, denominados estes últimos funcionários públicos.[57]
Aponta ainda que no sentido formal, “…a função pública pode designar, ainda, o regime jurídico aplicável ao conjunto do pessoal administrativo. Esse regime é desprovido de unidade, desde que parte desse pessoal está submetido a um estatuto de direito público e outra parte está vinculada a um direito comum do trabalho, acrescentado por certas regras exorbitantes.”[58]
Por fim, indica o mesmo que o “regime da função pública é mais coerente e designa o conjunto de regras aplicáveis aos agentes de direito público.”[59]
Materialmente falando, função pública seria “…a atividade consistente em colaborar, de maneira permanente e a título profissional, das atividades das pessoas públicas da administração”[60]. Demonstra o autor que a própria atividade administrativa de função pública seria a produção de serviços, produção possibilitada pela participação dos seus agentes. Ressalta também que a atividade da administração passou por diversas modificações que a diferenciam das noções tradicionais. Isto se dá em virtude das várias e distintas “…intervenções no domínio econômico, gerando a diversidade do pessoal participante em atividades do setor primário e secundário”.[61]
Neste momento de análise da função pública, demonstra a semelhança que existe até um certo grau entre o trabalho prestado nas administrações pública e privada. Lembra ele: “Até certo ponto o trabalho que se processa na função pública é equivalente aquele que ocorre na administração privada. Tais circunstâncias explicam as perspectivas comuns das diversas formas do trabalho administrativo, pelo que as técnicas de organização científica do trabalho se apresentam de maneira análoga.”[62]
Analisando os motivos que levaram à formação crescente do pessoal administrativo, este autor elenca as seguintes:
causas econômicas decorrentes do progresso técnico, que geram numerosos serviços públicos;
novas necessidades sociais, onde o Estado passa a intervir para satisfazer as necessidades da população, tendo em vista a carência ou insuficiência da iniciativa privada;
simultaneamente, o Estado passa a ser promotor do progresso tecnológico, através de pesquisas científicas que geram a ampliação do quadro administrativo;
o desequilíbrio econômico como fator motivador da intervenção estatal. Isto para a correção do jogo natural das leis econômicas. É o que pode ser denominado “dirigismo econômico”, que ocorre junto com métodos de intervencionismo autoritário ou não. [63]
Outro aspecto posteriormente apresentado é o do crescimento demográfico que pode levar à necessidade de uma adequação e reforço do equipamento administrativo. Tal crescimento demográfico se dá também muito pelo fenômeno tão comum nos dias de hoje que é o da concentração urbana[64].
As causas sociais também levam ao crescimento das necessidades administrativas. Isto porque são numerosas as atividades a serem reguladas pelo Estado. As atividades administrativas também crescem em virtude da necessária atuação da administração em certas situações sociais e jurídicas[65].
BARACHO fala ainda das causas políticas e psicológicas que trazem verdadeiro aumento de importância e quantidade de atividades administrativas. Em virtude disto, ressalta o autor como conseqüências: “…a tendência crescente dos parlamentos a legiferar nos domínios mais variados. Muitas vezes, ocorre a inflação de textos administrativos. Outro tema que tem sido abordado é o da persistência de estruturas administrativas inúteis que precisam ser reformuladas”.[66]
Em matéria de causas psicológicas, ressaltada é a sua importância, também pelo concernente ao aumento dos diferentes empregos. Estas razões explicam o desenvolvimento quantitativo da administração. Aponta o autor que o “…desenvolvimento deve ser proporcional às necessidades da administração e das técnicas administrativas”.[67]
O autor mineiro demonstra que no processo evolutivo do Estado, “… a função administrativa não era conhecida como um meio de ação do executivo. Entretanto, com Duguit e Jèze, passou a ser considerada como fenômeno político fundamental da distinção entre governantes e governados.” Traz às claras também, a distinção entre governantes e agentes. No caso, os agentes devem são executores das decisões dos governantes. [68]
Para o mesmo, aspecto de relevo da função pública é a subordinação ao poder legislativo. Isto porque é de competência do Parlamento estabelecer regras de direito a serem impostas à administração, tudo isto conforme o princípio da legalidade. Diz o autor: “As constituições estabelecem que é competência do legislativo, determinar o estatuto pessoal da administração. Esta questão está ligada a temas financeiros quando se trata da criação de empregos administrativos e na determinação das dotações. É nesse sentido que o parlamento exerce controle sobre a administração pública, inclusive de formas indiretas, no que se refere à responsabilidade política daqueles que exercem atividades e serviços. Também existe a subordinação ao poder executivo, desde que o governo dispõe da administração, sendo que esta matéria é definida de conformidade com os sistemas e governo, presidencial ou parlamentar.”[69]
São características da função pública:
atividade habitual, normalmente permanente;
corresponde habitualmente à totalidade da vida, profissional normalmente exclusiva;
ela pode ser em tempo parcial e permitir o acúmulo com outros empregos;
é uma atividade remunerada, exercida por uma prestação financeira, destinada a acorrer às necessidades da existência.
Aponta ainda que no tratamento de uma teoria geral da função pública, encontramos um sistema de emprego, ou seja, duas formas de função pública, exercitadas no Estado nos dias de hoje.
Uma é o sistema de carreira:
“…através do qual o funcionário exerce sua profissão, mediante certas condições. É recrutado em um corpo de membro que recebe empregos variados. Pode ser recrutado para um emprego determinado, através do qual é escolhido, não por sua aptidão para certo emprego, mas em função de certas atribuições. Nem sempre o recrutamento é efetuado normalmente por um contrato.”[70]
O que acontece comumente é o servidor (antigo funcionário) consagrar a função pública à totalidade de sua vida.
No que se refere ao sistema e emprego:
“…ocorre o recrutamento para certa atividade, trazendo várias conseqüências para esta situação, em que o recrutado passa a ocupar determinado emprego, não podendo mudar do mesmo.”
Várias são as diferenças entre os sistemas de função pública no direito comparado, tendo em vista o particularismo jurídico da função pública. Discute-se o princípio de submissão ou não da função pública ao direito comum do trabalho. Nessa situação, o funcionário é ligado a um contrato de trabalho, submetido a outros, com determinação salarial. Vários são os particularismos inerentes ao direito aplicável à administração, no que se refere às pessoas que participam funcionalmente da mesma: admite-se agentes públicos que têm uma situação legal e regulamentar, que exclui a existência de um contrato; consagra-se os estatutos dos agentes públicos, com base no direito público. Existem limites para a compreensão destes tipos quando se trata dos colaboradores da administração, onde surge agentes submetidos a um regime jurídico de direito privado.
Na temática contemporânea, com o Direito Comunitário, surge a questão da “despublicização”.
Outros princípios são examinados para a caracterização da função pública, no que se refere ao princípio da neutralidade política da função pública, pelo que os funcionários não são recrutados por via de eleição; o recrutamento dos funcionários exclui toda a consideração política; as mudanças políticas não podem Ter qualquer incidência sobre os funcionários; consagra-se a liberdade política dos funcionários.
Outro princípio inerente à teoria geral da função pública está ligado a noção de autoridade e hierarquia. O princípio da autoridade domina a concepção clássica da função pública, sendo que esta noção está ligada a hierarquia administrativa. Na modernização desses princípios, destaca-se a concentração das idéias democráticas e o princípio da participação. A concepção moderna de função pública, realiza uma conciliação entre o princípio democrático e a administração pública e o desenvolvimento dos seus direitos profissionais. A composição do pessoal da administração, é bem diversa, tendo em vista sua origem e situação. A teoria contemporânea faz o elenco de diversas formas de participação na administração: os colaboradores da administração (colaboradores benévolos da administração; colaboradores requisitados; contratantes com a administração; contratos com associação de estabelecimentos privados).
Há uma pluralidade do pessoal da administração pública, alguns submetidos a um regime de direito público e outros a um regime de direito privado. Essa teoria geral também destaca a distinção dos agentes públicos e os salários privados da administração. Em certas ocasiões aplica-se ao pessoal da administração o regime do direito comum do trabalho. O particularismo da função pública e a repartição do pessoal da administração pública pode ser distinguida de duas maneiras: funções de autoridade que comportam poderes de comando e aplicação de um estatuto de direito público; as funções de gestão submetidas a um regime de direito privado.
Os agentes públicos apresentam certas particularidades no que se refere ao modo de recrutamento, a qualificação do contrato, as diferentes categorias de agentes públicos e os funcionários.
O termo funcionário, muitas vezes substituído por servidor, apresenta certa imprecisão, daí as diversas noções de funcionário. A lei francesa de 11 de janeiro de1984, tratando da noção de funcionário do Estado, apresenta algumas características referentes a nomeação e recrutamento, distinguindo também o emprego.
A titularização na grade da hierarquia administrativa é muito importante, surgindo discussões sobre a participação em um serviço público do Estado, administrações centrais e serviços exteriores, bem como estabelecimentos públicos nacionais. Existem diferentes categorias de agentes públicos, como agentes públicos não titulados. Ao mesmo tempo, a doutrina tem examinado os salários privados da administração e a tipologia desse regime.
Aspecto significativo na matéria é o exame do Estatuto do Funcionário, do Servidor ou o Regime Único, conforme certas nomeclaturas, onde são hoje examinadas as fontes internacionais ou européias, desde que o direito comunitário estabeleceu o princípio da livre circulação. O termo estatuto dos funcionários designa o conjunto de regras jurídicas que aplicam à atividade profissional do funcionário. A situação estatutária, legal e regulamentar do funcionário tem gerado diversas controvérsias, com as posições monistas (teoria do direito privado; teoria do direito público; situação contratual de direito público; situação legal e regulamentar). Ao lado das mesmas, ocorrem as posições dualistas (em princípio, os agentes públicos são colocados em uma situação legal e regulamentar, ou ainda estatutária; aceita-se, entretanto, agentes públicos contratados, de conformidade com a situação jurídica contratual).
O sistema da carreira dos funcionários do Estado apresenta várias particularidades, que partem do desenvolvimento da situação administrativa dos mesmos: suas colocações frente à administração (posições, atividade em tempo completo ou parcial; disponibilidades, proteção dos funcionários, funcionários e liberdades públicas, regime disciplinar, formas de recrutamento).
O regime estatutário consagra a primazia dos interesses do serviço público, com várias conseqüências: a situação do agente decorre de regras gerais; sua posição resulta de um estatuto do direito; este estatuto é modificável. Os estatutos da função pública do Estado, comportam diversas classificações como: estatutos que consagram a unidade e pluralidade da função pública; estatutos autônomos; estatutos dos militares; estatutos dos magistrados judiciários; estatutos particulares dos corpos de funcionários do Estado; Estatuto dos Congressistas e estatutos especiais.
BARACHO conclui o seu texto demonstrando que:
“Os caracteres gerais da função pública, têm certa especificidade e devem ser examinados, não apenas no seu aspecto apenas puramente jurídico.”
E que:
“A função pública é uma atividade profissional, daí a palavra profissão ou funcionário usada por diversos autores.”
MOREIRA NETO, ao tratar da teoria geral da função pública[71], começa por evidenciar estudo detalhado da natureza do vínculo que se estabelece entre o funcionário ou servidor e o Estado. Demonstra o autor a importância deste estudo, o estudo da relação jurídica administrativa da função pública e traz os dois grandes grupos de teorias que tratam do tema.
São elas as teorias bilaterais e as teorias unilaterais.
As teorias bilaterais são mais antigas, presas historicamente ao liberalismo, fundando a relação jurídica da função pública no contrato entre o indivíduo e o Estado.
Os partidários da teoria contratual, além de anacrônicos, se perdem entre si e acirram suas divergências ao pretenderem fixar que tipo de contrato estabelecer-se-ia. As semelhanças de alguns aspectos pluralizam as sub-teorias: da locação de serviços, do mandato, da gestão de negócios, do contrato de adesão e outras, todas figuras emprestadas do Direito Civil.
Observando que um grande equívoco das teorias contratualistas reside em aferrarem-se aos modelos civilistas, surgem então aqueles como BIELSA, defendem a existência de um contrato de Direito Público, ou contrato sui gêneris, no qual coexistiriam, como sabemos, cláusulas públicas ao lado das cláusulas privadas, ou seja: estas alteráveis apenas pelo consenso e as outras, unilateralmente.
De modo geral, todas partem de um princípio falso, inaplicável à teoria da função pública: o da autonomia da vontade. Como, à sua luz, seriam explicáveis as alterações unilaterais relativamente à remuneração, às condições de serviço, às atribuições e, principalmente, à extinção do vínculo? Como, se admitida a autonomia da vontade, seria justificável a imperatividade, de que se não despoja o Estado, e conciliável esta com a sistemática do inadimplemento?
Caracterizam-se por fundara relação jurídica da função pública apenas na vontade unilateral do Estado. De logo se vê que esta vontade pode ser emitida através de ato legislativo ou de ato administrativo, daí as duas correntes unilaterais: a do ato administrativo e a legal, ou do estatuto.
A teoria que funda no ato administrativo a criação, modificação e extinção da função pública, defendida por nomes como OTTO MAYER e MARCELLO CAETANO, vislumbra uma total submissão do funcionário à Administração. O simples exame da Seção VIII – Dos Funcionários Públicos. Capítulo VII, Título I da Constituição da República Federativa do Brasil, que arrola os princípios da função pública, demonstra, entretanto, que pouco resta, entre nós, à discrição da Administração no que respeita às linhas mestras do instituto.
Chegamos, então, à teoria que funda na lei o vigamento da função pública. Não é o contrato nem o ato administrativo que forma e rege o vínculo, mas o ato legislativo, em sentido formal.
O conjunto de preceitos legais que disciplinam uma relação de função pública denomina-se estatuto, daí as denominações: teoria do estatuto e regime estatutário; nele se define uma situação abstrata e geral, um status ao qual se sujeitam os funcionários: estabelece-se uma situação jurídica.
Os arquitetos desta teoria, DUGUIT, HARIOU e D’ALESSIO, frisam o fato de não ser a Administração que fixa ou ajusta as condições de desempenho de serviço e de pagamento de remuneração com seus funcionários, seja unilateralmente, seja, como querem os mais antigos, contratualmente, mas quem o faz é o próprio Estado, sob critérios político-administrativos, de modo a que o interesse público esteja atendido antes e acima de tudo.
Resulta do exposto que, cada pessoa de Direito Público centralizada, podendo organizar seu próprio funcionalismo sob os critérios político-administrativos que lhe parecer em mais convenientes, existirão tantos estatutos quantas daquelas pessoas; há, pois, estatutos para os funcionários federais, estaduais e municipais e, dentro desses âmbitos, estatutos para os respectivos Poderes Orgânicos e autarquias e para os servidores estatutários civis e militares. Teoricamente seriam milhares de regimes, não fossem a abrangência de uns ou as remissões que, facultativamente embora, são feitas.
Institutos básicos de um estatuto.
Variarão, assim, certos conceitos, segundo a orientação que, a cada estatuto, tenha imprimido o seu órgão legiferante. Há, todavia, duas classes de conceitos estabilizados, que formam como que a estrutura comum a todos os estatutos da função pública no Brasil: são, 1º) – os fixados constitucionalmente, nos princípios, a que já nos referimos, e, 2º) – aqueles sedimentados na doutrina estatutária que, entre nós, juntamente com outros grandes nomes, contou com o magistério consolidador de CAIO TÁCITO, CRETELLA JÚNIOR e HELY LOPES MEIRELLES.
Doutor em direito administrativo pela UFMG, advogado, consultor jurídico, palestrante e professor universitário. Autor de centenas de publicações jurídicas na Internet e do livro “O Servidor Público e a Reforma Administrativa”, Rio de Janeiro: Forense, no prelo.
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