Human organs trafficking: a black market expanding.
Letícia Caroline Fernandes Aldá[1]
Ewerton Araújo de Brito [2]
RESUMO
O transplante e o tráfico de órgãos são coexistentes na nossa sociedade. Assim, será abordado as principais legislações acerca do tema tanto em âmbito nacional como internacional, dando ênfase na Lei 9.434/97 que trata da regulamentação da doação e transplante de órgãos e tecidos e na Resolução nº 1.931/09 do Conselho Federal de Medicina, que trata da conduta ética dos profissionais de medicina, especificando os casos de transplante de órgãos. Será apresentado também os marcos internacionais como a Declaração de Istambul que estabelece padronização das ações para combater o tráfico de órgãos, e o Protocolo de Palermo que trata sobre o tráfico de pessoas, crime diretamente ligado ao tráfico de órgãos. Também será abordado a presença e relação com os direitos humanos nas referidas leis que protegem a vida e dignidade humana, compreendendo a vida como essência do Estado Democrático de Direito. Além disso, discorre sobre os fatores que podem atuar como facilitadores, proporcionando o tráfico de órgãos. Apresenta uma análise e diálogo entre conceitos doutrinários e discussões associadas ao tema. Por ser um tema pouco abordado em ambientes sociais, também se trata aqui do papel do direito diante do atual cenário, quais medidas estão sendo tomadas, qual o caminho a percorrer, e quais ações e planos a longo prazo podem auxiliar na efetivação das medidas de prevenção do tráfico de órgãos.
Palavras-chave: Transplante.; Tráfico de órgãos; Direitos Humanos.
ABSTRACT
Transplantation and organ trafficking are coexisting in our society. Thus, the main legislation on the subject will be addressed both nationally and internationally, with emphasis on Law 9.434 / 97, which deals with the regulation of organ and tissue donation and transplantation and Resolution No. 1,931 / 09 of the Federal Medical Council, which deals with the ethical conduct of medical professionals, specifying cases of organ transplantation. International milestones will also be presented, such as the Istanbul Declaration, which establishes standardization of actions to combat organ trafficking, and the Palermo Protocol on trafficking in persons, a crime directly linked to trafficking in organs. It will also address the presence and relationship with human rights in these laws that protect human life and dignity, including life as the essence of the Democratic State of Law. In addition, it discusses the factors that can act as facilitators, providing the organ trafficking. It presents an analysis and dialogue between doctrinal concepts and discussions related to the theme. Because it is a topic that has not been approached in social environments, it is also about the role of law in the current scenario, what measures are being taken, which way to go, and what actions and long-term plans can help to prevention of trafficking in organs.
Keywords: Transplantation; Trafficking of organs; Human rights.
Sumário: RESUMO, INTRODUÇÃO, 1 O CENÁRIO ATUAL, 2 LEGISLAÇÕES ACERCA DE DOAÇÃO, TRANSPLANTE E TRÁFICO DE ÓRGÃOS, 2.1 A legislação sobre doação e transplante de órgãos e tecidos no Brasil , 2.2 A legislação internacional sobre doação e transplante de órgãos e tecidos, 2.3 A proteção legal sobre a dignidade da pessoa humana, intangibilidade e autonomia sobre o corpo , 3. FATORES QUE PROPORCIONAM O TRÁFICO, 4. O PAPEL DO DIREITO NESTE CAMPO, CONCLUSÃO, REFERÊNCIAS.
INTRODUÇÃO
A doação de órgãos e tecidos para transplante tem salvado vidas há muitos anos, é também considerado um ato de amor, bondade e principalmente generosidade. Infelizmente não há doadores o suficiente para suprir a demanda de pacientes que necessitam de um novo órgão para sobreviver, por isto a lista de pacientes que aguardam um órgão para transplante são grandes e o tempo de espera também aumenta.
Lamentavelmente, o ato que surgiu como esperança aos doentes e suas famílias, e representava grande generosidade dos doadores, transformou-se em um lucrativo mercado ilegal. Percebendo a alta demanda por órgãos e tecidos e a baixa disponibilidade dos órgãos, este mercado, conhecido como mercado negro, oferece aos compradores interessados a possibilidade de cura sem precisar aguardar na lista de espera como os demais. Não se trata apenas de conseguir o órgão mais rapidamente, mas também de alimentar a pratica criminosa que também adquire sua “mercadoria” de forma ilegal, não respeitando a vida nem a dignidade humana.
É evidente que esta situação é muito grave e que não se sabe muito sobre a temática. Essa ausência de conhecimento, fomentou este estudo, que busca entender o que se sabe sobre doação, transplante e tráfico de órgãos, assim como quais leis abordam o assunto e quais medidas estão sendo tomadas. Para tanto, uma abordagem completa sobre tema é realizada aqui.
O Brasil está em segundo lugar no mundo em transplante de órgãos e em primeiro lugar em transplante gratuito feito pelo sistema único de saúde. Apesar destes índices, o que torna possível e atraente o crime de tráfico de órgãos em nosso país é exatamente esta escassez de órgãos compatíveis disponíveis para doação, tal como a falta de investimentos em estrutura hospitalar, de logística, formação e contratação de mais profissionais competentes e éticos, dentre outras especificidades próprias da doação, como a compatibilidade. Tudo isso são fatores geradores de filas gigantescas a espera de um transplante. Nessa imensa fila em quem cada segundo é importante, a oportunidade de conseguir um órgão mais rapidamente passa a ser interessante e isto chama a atenção de criminosos que veem nessa precariedade uma forma de obter altos valores financeiros ao custo de vidas “desvalidas” ou “desconhecidas”.
O comercio de órgãos no Brasil é proibido e a doação é normatizada pela lei dos transplantes 9.434/97, esta lei trata dos assuntos relacionados a doação, tanto em casos de doação Inter vivo como também post mortem, sendo essencialmente fundamentada pela Constituição Federal de 1988, e pela Declaração Universal dos Direitos Humanos. (BRASIL, 1997).
Diante desse fato, o problema apresentado afirma-se da seguinte maneira: como estudar, relatar, combater e solucionar este problema que vem crescendo desenfreadamente? Como planejar ações que possam efetivamente prevenir as populações carentes dos aliciadores? Como pensar em soluções para a imensa fila de espera para transplantes, na qual o tempo é um bem precioso? Como identificar e punir as quadrilhas? É fácil perceber que há muito que se fazer em prol da solução destes problemas, mas o longe caminho precisa inicialmente ser estudado e o conhecimento proveniente destes estudos ser propagando dentre os diversos meios.
Hoje em dia, e de acordo com os critérios especificados pela lei dos transplantes 9.434/97, é possível realizar transplante com órgãos de doadores mortos, que tiveram suas mortes constatadas como “morte encefálica” e doadores vivos em alguns casos. Em ambos os casos os órgãos só podem ser retirados do doador mediante autorização do doador (vivo), família, responsáveis, ou autorização judicial em alguns casos, sempre garantindo que os devidos responsáveis pela autorização e doação não sofreram nenhum tipo de coação ou retribuição financeira. (BRASIL, 1997).
Todo este cuidado e especificação legal, foi criado com o intuito de evitar a retirada ilegal de órgãos que alimentam o mercado negro. Busca-se com este dispositivo legal, coibir a ação de criminosos que tentam adquirir órgãos coagindo doadores e/ou familiares, oferecendo dinheiro a pessoas em situação de extrema necessidade financeira, ou ainda outras modalidades ilegais. Não há dúvidas de que a prática criminosa de aquisição de órgãos por meios ilegais, é uma violação a vida e a dignidade humana, sacrificadas em nome do lucro.
O autor Pellegrini (2013) apresenta dados da ONU sobre os números de transplantes de órgãos realizados a cada ano, além de uma perspectiva de quantos destes procedimentos são realizados com órgãos fornecidos pelo mercado negro. De acordo com as informações do autor, cerca de 5% dos procedimentos de transplante só ocorreram porque o órgão foi comprado no mercado negro, o que significa uma movimentação de até 1,2 bilhões de dólares. Ainda de acordo com o disposto pelo autor, boa parte destes órgãos do mercado negro são obtidos através da compra de órgãos de pessoas pobres, indivíduos em situação de extrema pobreza e vulnerabilidade social que concordam em vender seus órgãos por algum dinheiro
Pellegrini (2013) cita ainda dados da Global Finance Integrity, uma ONG especializada no rastreamento de fluxos financeiros ilegais, segundo os quais os números desse mercado de horror apresentam crescimento constante.
A escolha do tema além de mera curiosidade por parte de quem escreve, também vem com o objetivo de mostrar a sociedade um tema pouco falado, porem de suma importância, que vem se alastrando devido a todos os problemas mostrados a seguir. Assim como o tráfico de drogas, o comércio clandestino de órgãos humanos para fins de transplantação, é uma prática ilegal. Há legislação vigente específica sobre o tráfico de órgãos em nível internacional e nacional. (HANSER, 2015, p 103).
A Lei n.º 9.434/97, que trata da remoção de órgãos, tecidos e partes do corpo humano em vida ou post mortem para fins de transplante, define, também, o diagnóstico de morte encefálica. A doação de órgãos e tecidos na modalidade inter vivos, dispõe que qualquer pessoa capaz poderá consentir e, na impossibilidade, seu representante legal, desde que se trate de órgãos duplos ou partes renováveis do corpo humano. No caso de morte encefálica, a doação dos órgãos só poderá ser feita mediante autorização da família, cônjuge ou responsável.
Art. 9o É permitida à pessoa juridicamente capaz dispor gratuitamente de tecidos, órgãos e partes do próprio corpo vivo, para fins terapêuticos ou para transplantes em cônjuge ou parentes consanguíneos até o quarto grau, inclusive, na forma do § 4o deste artigo, ou em qualquer outra pessoa, mediante autorização judicial, dispensada esta em relação à medula óssea. (BRASIL, 1997).
A mesma lei citada acima, definiu o conceito de morte, ajustando-o à falência encefálica e não à vida biológica, regida pelo batimento cardíaco. Antigamente, diante da falta de conhecimento científico sobre coma, atividade cerebral, morte encefálica, a morte só era declarada quando o coração parava de bater, ou seja, diante da falência de órgãos, morte do corpo. No entanto, com o desenvolvimento da ciência, da medicina, e dos estudos sobre morte cerebral, passou-se a declarar óbito quando não há registro de atividade cerebral, visto que já se sabe que sem atividade cerebral não há chances de o corpo sobreviver.
Como o corpo não sobrevive sem atividade cerebral, a partir do momento em que se declara o óbito, começa uma corrida contra o tempo para conseguir as autorizações necessárias e realizar a retirada de órgãos para o transplante. Em ambas as situações, exige a lei que o ato seja representativo da solidariedade humana, revestido sempre de gratuidade.
Sem o princípio de solidariedade garantindo a gratuidade, estaria aberta a possibilidade de se realizar comércio com órgãos e tecidos humanos, fazendo com que muitos dos chamados investidores sejam atraídos pela banalização do ser humano. Às vezes, vê-se anúncio em que uma pessoa coloca à venda, alegando necessidade financeira, um de seus rins, deixando o endereço para a negociação. Cogitou-se, através de projeto de lei criado pelo deputado Valdemar Costa Neto em 2003, possibilitar ao presidiário servir de doador de órgãos e em troca receberia comutação de sua pena. São situações que confrontam com o princípio ético que reveste o ser humano na sua dignidade e desprestigiam a própria raça humana. (NETO, 2003).
A rigorosa exigência legislativa tem seu fundamento no controle do procedimento médico, que com base no princípio da Justiça, proporciona a qualquer pessoa o direito de receber órgãos ou tecidos humanos, independentemente de sua situação financeira. Do contrário, somente os favorecidos teriam acesso ao procedimento regenerativo. Por este mesmo motivo, a lista é única e estabelece as posições de acordo com vários critérios, tais como o grau de urgência, risco do candidato, ordem de entrada na lista, dentro outros. Mesmo assim, com tamanha rigidez, o sistema vem sendo burlado e órgãos são desviados para pessoas que não se encontram listadas ou, se inscritas, não ocupam lugar de preferência.
Com o objetivo de apresentar um panorama mais completo do problema em questão, o tráfico de órgãos e tecidos, surge a necessidade de abordar algumas das leis e protocolos mais importantes para a temática. Serão apresentadas a seguir as principais leis e protocolos em vigência tanto em âmbito nacional como internacional e os avanços produzidos por essas iniciativas.
2.1 A legislação sobre doação e transplante de órgãos e tecidos no Brasil
De acordo com o Art.5° da Constituição Federal a vida é inviolável, sendo o indivíduo o principal elemento da sociedade. Compreende-se a vida como um bem jurídico, a vida de cada ser humano é inviolável e indisponível, não é possível dispor dela em favor de terceiros. Este conceito é essencial para a discussão a ser colocada, ninguém tem autoridade sobre a vida de outra pessoa, mesmo em casos de menores de idade e tutelados, existem normas especificas sobre cada situação relacionadas a doação de órgãos. (BRASIL, 1988).
A principal lei brasileira que trata da doação de órgãos e transplante de órgãos é a Lei n° 9.394 de 4 de fevereiro de 1997, dispõe sobre a remoção de órgãos, tecidos e partes do corpo humano para fins de transplante e tratamento e dá outras providências. A partir da criação desta lei, a prática de transplante de órgãos foi autorizada no Brasil, estabelecendo ainda que a doação de órgãos e tecidos deve ser gratuita e seguir os dispostos na lei. (BRASIL, 1997).
De acordo com o disposto no artigo 2° da Constituição Federal de 1988, todo e qualquer remoção de órgãos e tecidos com a finalidade terapêutica deve ser previamente autorizada pelo SUS e realizada por equipe autorizadas em locais cadastrados. Desta forma, todo procedimento desta natureza realizado em locais inadequados e por pessoas não autorizadas é ilegal e não está de acordo com a legislação vigente.
Art. 3º A retirada post mortem de tecidos, órgãos ou partes do corpo humano destinados a transplante ou tratamento deverá ser precedida de diagnóstico de morte encefálica, constatada e registrada por dois médicos não participantes das equipes de remoção e transplante, mediante a utilização de critérios clínicos e tecnológicos definidos por resolução do Conselho Federal de Medicina. (BRASIL, 1997).
Esta especificação presente no art. 3° é essencial para garantir que nenhum ser humano seja violado, ou seja, para garantir que ninguém seja “induzido à morte cerebral”, ou tenha o óbito declarado indevidamente para favorecer a doação dos órgãos. A referida lei apresenta ainda especificações acerca de autorização de doação post mortem de pessoa juridicamente incapaz, estabelecendo que esta é possível desde que a família ou responsável autorizem a retirada dos órgãos e tecidos. Estabelece ainda que não é permitido realizar a retirada de órgãos e tecidos para transplante ou finalidade terapêutica, de indivíduos declarados como “desconhecido” ou “não identificado”. (BRASIL, 1997).
A ambição pelo valor dos órgãos no mercado negro torna provocante para aqueles que não se ligam aos princípios éticos da profissão, retirar ilegalmente órgãos de indigentes e/ou moradores de rua sem identificação que tem a morte cerebral declarada para dispor à venda no mercado ilegal. Assim, a especificação da lei é mais uma forma de coibir a prática criminosa.
Considerando que o tráfico de órgãos é um crime complexo e exige uma rede cooperação ilegal, não apenas a Lei 9.394/97 deve ser lembrada aqui. Retirar órgãos post mortem ilegalmente é uma violação do corpo e um desrespeito à dignidade e a vida. Retirar órgãos inter vivos oferecendo dinheiro a pessoas em situação de pobreza ou mesmo sequestrando pessoas “ insignificantes”, pobres e desamparados para retirar órgãos, é um desrespeito a dignidade humana, é uma violação a sua vida, seu corpo suas crenças, personalidade e tudo que a define. Pior do que um ato criminoso, é também um reflexo das extremas situações de vulnerabilidade social em que um ser humano se encontra a ponto de vender um órgão seu em troca de algum dinheiro para sobreviver, este é um reflexo da falha da sociedade em garantir igualdade e dignidade. Os bens jurídicos mais valiosos como a vida, liberdade, propriedade, casamento, incluindo a família, honra, saúde, enfim, todos estes valores são muitos valiosos e importantes para a sociedade. (Teles 2004 p. 46)
Todos estes são valores éticos sociais que são resguardados pelo Direito, com o intuito de assegurar a paz social, objetivando proteger para que não sejam violados ou colocados a perigo de ataque ou a lesões. (TOLEDO, 1994, p. 16).
Buscando proteger a vida e dignidade de todos os seres humanos, o Conselho Federal de Medicina também adotou legislação especifica sobre transplante e doação de órgãos, por meio da na resolução nº 1.931/09 que institui o código de ética profissional, em seu capítulo VI que trata da doação e transplante de órgãos e tecidos. A presente resolução estabelece direcionamento aos profissionais sobre a declaração de óbito, a coleta de órgãos e tecidos, e dispõe sobre obrigações éticas dos médicos em relação a este assunto tão delicado.
É VEDADO AO MÉDICO: Art. 23. Tratar o ser humano sem civilidade ou consideração, desrespeitar sua dignidade ou discriminá-lo de qualquer forma ou sob qualquer pretexto. Art. 24. Deixar de garantir ao paciente o exercício do direito de decidir livremente sobre sua pessoa ou seu bem-estar, bem como exercer sua autoridade para limitá-lo. (CFM, 2009, p. 37)
Os artigos apresentados também são parte do código de ética profissional e regem os profissionais de medicina. É com o intuito de proteger à vida e a dignidade que o presente documento organizou um capítulo em respeito aos direitos humanos. Com base nestes princípios, entende-se que a prática de retirada de órgãos ilegalmente fere os princípios éticos da profissão em relação aos direitos humanos. A resolução estabelece ainda que:
É vedado ao médico: Art. 43. Participar do processo de diagnóstico da morte ou da decisão de suspender meios artificiais para prolongar a vida do possível doador, quando pertencente à equipe de transplante. […] Art. 46. Participar direta ou indiretamente da comercialização de órgãos ou de tecidos humanos. (CFM, 2009, p. 40).
Logo, de acordo com o disposto pelo Conselho Federal de Medicina, a prática do crime de tráfico de órgãos não só é crime civil como também fere aos preceitos éticos estabelecidos e cumpridos pela profissão, de modo que associar-se e realizar esta pratica ilegal, não apenas corre o risco de ser preso como também coloca em risco seu registro profissional.
Além destas, a Constituição Federal de 1988 também dispões sobre a proteção dos direitos humanos em ênfase à dignidade e inviolabilidade da vida e corpo humano. Sendo a CF/88 respeitada em essência e preferencialmente, e utilizada como guia para outras leis especificas, tem a dignidade como um de seus princípios fundamentais:
Art. 1º – A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constituindo-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: III – a dignidade da pessoa humana.” (BRASIL, 1988).
Faça-se saber ainda, que a Constituição Brasileira em seu art. 5° estabelece o respeito aos corpos e crenças, assim como a livre expressão do pensamento, a liberdade de consciência e crença. Considera ainda a vida privada e a intimidade como INVIOLÁVEIS, considerando a violação destes como danos morais, materiais ou à imagem. (BRASIL, 1988).
2.2 A legislação internacional sobre doação e transplante de órgãos e tecidos
Assim como já foi dito, infelizmente o mercado que abriga o tráfico de órgãos, chamado de “Mercado Negro” encontra-se e ritmo de crescimento, e que é um crime que acontece em redes organizadas com extensas quadrilhas que atuam no mundo todo. Por este motivo, faz-se necessário abordar algumas das medidas legais em vigência que buscam combater este crime.
O Protocolo de Palermo é uma iniciativa global que visa combater o tráfico de pessoas. O protocolo foi formulado no ano 2000 e entrou em vigor em 2003, trata-se de um protocolo adicional à Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional Relativo à Prevenção, Repressão e Punição do Tráfico de Pessoas, em Especial Mulheres e Crianças. Considerando a gravidade deste crime, o protocolo apresenta três vertentes de atuação: prevenção, repressão e punição a este crime. O Protocolo de Palermo fornece aos países membros um direcionamento regularizado quanto as medidas cabíveis. (ONU, Protocolo de Palermo, 2003).
Este protocolo é considerando um grande marco no combate ao crime transnacional do tráfico de pessoas e da associação de vários países em prol do combate a um tipo de crime específicos, todos que assinaram o protocolo estão determinados a atuar associadamente para dissipar a atuação internacional dos criminosos de maneira efetiva. Por este motivo, o Brasil ratificou em 2004 através da lei 5.017 de fevereiro de 2004 o protocolo, tornando-se parte do grupo e estabelecendo o protocolo em vigor no Brasil. (BRASIL, 2004).
O Protocolo de Palermo é importante no combate ao tráfico de órgãos porque inibe o tráfico de pessoas, sendo esta uma das mais comuns formas de captação ilegal de órgãos. Para explicar a relação entre o tráfico de pessoas e tráfico de órgãos e como o Protocolo de Palermo é importante para o combate deste crime, a autora Ingrid Foltz Hanser (2015) apresenta uma elucidação:
Considerando que o tráfico para remoção de órgãos e tecidos consiste em uma das modalidades do crime de tráfico de pessoas, os dados obtidos a respeito deste último são fundamentais para o entendimento da dinâmica do tráfico de órgãos. (HANSER, 2015, p.16).
É possível compreender a partir disso, que ambos os crimes estão atrelados enquanto prática e finalidade, por isso, discorrer sobre leis fundamentais como o Protocolo de Palermo é essencial ao entendimento de que diretrizes estão sendo tomadas rumo ao combate do tráfico humano, sejam pessoas vivas ou partes delas.
O direito visa proteger a sociedade e as atividades que nela se desenvolvem, esta proteção é feita pela dignidade bem como todas as relações entre elas sendo qualquer ato que possa lesionar condenado pelo direito, para Bittencourt bens jurídicos são a vida da sociedade e das pessoas, onde todos merecem proteção constitucional exatamente em razão de sua significação social. ( Bittencourt 2010, p. 38)
Dada a importância do combate ao tráfico de órgãos, uma declaração foi criada para abordar especificamente o tráfico de órgãos e turismo de transplantes, a chamada Declaração de Istambul. Estabelecendo que:
A presente Declaração representa o consenso dos participantes. Todos os países necessitam de um enquadramento jurídico e profissional para reger as atividades de doação e de transplante de órgãos, bem como de um sistema de supervisão regulamentar transparente que assegure a segurança de doadores e de receptores e a aplicação de normas e proibições de práticas não éticas. (Declaração de Istambul, 2008, p.1).
De acordo com HANSER (2015 p 103), apesar da Declaração de Istambul apresentar os primeiros delineamentos acerca de princípios e medidas em busca da prevenção, combate e punição da prática, ela não tem valor normativo, ou seja, diferente do Protocolo de Palermo, ela não obriga os signatários a seguir suas diretrizes. Apesar da não obrigatoriedade, representa um grande avanço no interesse global de agir em prol da proteção das vítimas e combate aos criminosos, incitando ao planejamento de medidas de curto, médio e longo prazo que visam coibir a ação das quadrilhas.
É importante esclarecer que a Declaração de Istambul no sentido de uniformizar as diretivas de combate apresenta uma definição clara sobre o tráfico de órgãos e tecidos, esta definição assim como HANSER (2015) também relaciona o tráfico de órgãos ao tráfico de pessoas.
Consiste no recrutamento, transporte, transferência, refúgio ou recepção de pessoas vivas ou mortas ou dos respectivos órgãos por intermédio de ameaça ou utilização da força ou outra forma de coacção, rapto, fraude, engano, abuso de poder ou de uma posição de vulnerabilidade, ou da oferta ou recepção por terceiros de pagamentos ou benefícios no sentido de conseguir a transferência de controlo sobre o potencial doador, para fins de exploração através da remoção de órgãos para transplante. (Declaração de Istambul, 2008, p.2).
Junto ao tráfico de órgãos e de pessoas, há um outro de crime associado, o turismo de transplante, trata-se de viagens entre fronteiras jurisdicionais que envolvem tráfico de órgãos, comercialismo de transplante e/ou seus recursos, tal como equipe médica, local adequado, proximidade com o receptor, dentro outros.
É perceptível que o caminho a seguir em direção ao enfrentamento efetivo desta problemática é longo, mas já começou. Embora pareça que nada está sendo, as medidas começam a ser planejadas e executadas, isto coloca o tráfico de órgãos e pessoas entra para a agenda mundial.
2.3 A proteção legal sobre a dignidade da pessoa humana, intangibilidade e autonomia sobre o corpo
A dignidade é o princípio principal dos Direitos Fundamentais que regem a Constituição Brasileira, devendo ser respeitado em sua essência e íntegra, encontrando-se assim no artigo 1º, III quando afirma que:
Art. 1º – A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constituindo-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: III – a dignidade da pessoa humana. (BRASIL, 1988).
A dignidade humana é o princípio prevalente na maioria das culturas e nações. Por isso, toda legislação contra o tráfico de pessoas busca proteger a dignidade a vida, entendendo o tráfico como uma violação do corpo. A dignidade humana, constitui a essência do Estado Democrático de Direito.
Miguel Reale (1989), apresenta três concepções da dignidade humana, sendo a primeira delas o individualismo, no qual cada sujeito de forma individual visando cumprir seus objetivos, protege e realiza de modo indireto o objetivo coletivo. A segunda concepção é chamada de transpersonalismo, no qual o interesse coletivo indiretamente protege os objetivos e interesses individuais. A terceira e última concepção é o personalismo, esta busca relacionar os objetivos e interesses coletivos com os individuais, visa compatibilizar os valores. Assim, de acordo com a ideia de Reale sobre a dignidade, a pessoa humana tem valor absoluto e deve prevalecer sobre qualquer outro valor ou princípio.
Entender que a dignidade humana deve prevalecer, significa compreender que o Estado não tem poder de propriedade sobre o indivíduo, assim, muitas pessoas veem a dignidade como argumento de proteção ao corpo. É por tamanha importância deste conceito que ele é citado na maioria dos acordos internacionais, protocolos, declarações e também na própria Constituição Federal de 1988.
A Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948) criada pela Organização das Nações Unidas considera essencial que os direitos humanos sejam protegidos pelo império da lei e dispõe:
Art. 1°:Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotados de razão e consciência e devem agir em relação uns aos outros com espírito de fraternidade. […] Art.5°: Ninguém será submetido à tortura nem a tratamento ou castigo cruel, desumano ou degradante. (ONU, DUDH, 1948, p.5)
A Declaração de Direitos Humanos é vigente na maioria dos países e serve de base para a Constituição Brasileira e muitos outros protocolos. A DUDH atribui grande importância a dignidade e o direito de autonomia humana, assim como o direito à liberdade.
O princípio da intangibilidade do corpo, impõe que o corpo pertence à identidade pessoal, reafirma o conceito de direito de propriedade do corpo. Ou seja, o corpo é de total direito do indivíduo, e como parte de sua identidade e pessoa é também portador do direito à dignidade e, portanto, protegido legalmente. Ninguém tem direito de captar órgãos e tecidos sem o consentimento do indivíduo.
Com a dignidade e direito de propriedade do corpo reafirmado, o corpo assim como a dignidade e a indisponibilidade é inerente à pessoa humana. Corroborando este princípio, Tepedino (2009, p. 39) apresenta que “retira do seu titular a possibilidade dele dispor, tornando-os também irrenunciáveis e impenhoráveis”, ou seja, também não permitido ao titular dispor de seus órgãos por dinheiro, assim como não é renunciável o poder sobre órgãos, o que esclarece a invalidez consentimento sob ameaças.
No princípio da autonomia é apresentado o direito do indivíduo de tomar decisões em sua vida particular, assim como sobre seu corpo, seguindo seus próprios interesses e objetivos, além de suas preferências, é dever do Estado e da sociedade respeitar estas decisões. O art. 3° da Declaração Universal dos Direitos Humanos dispõe que “todo ser humano tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal”. Sendo a liberdade o similar à autonomia sobre decisões. (ONU, DUDH, 1945, p.5).
O art.13° do Código Civil estabelece que “salvo exigência médica, é defeso o ato de disposição do próprio corpo, quando importar diminuição permanente da integridade física, ou contrariar os bons costumes”. Assim, entende-se que o código civil brasileiro também garante o direito de autonomia sobre corpo, sendo de direito, desde que respeitada a legislação especifica ser doador de órgãos se for do interesse da pessoa, ou também negar o pedido a alguém. (BRASIL, 2002).
O filósofo que preconizou o conceito da Dignidade da Pessoa Humana foi Immanuel Kant, defendendo a ideia de que as pessoas deveriam ser tratadas com um fim em si mesmas, e não como meio, formulando o princípio de que “no reino dos fins, tudo tem ou um preço ou uma dignidade. Quando uma coisa tem preço, pode ser substituída por algo equivalente; por outro lado, a coisa que se acha acima de todo preço, e por isso não admite qualquer equivalência, compreende uma dignidade” (KANT, 2004, p. 65).
A legislação brasileira é fundamentada na Declaração Universal dos Direitos Humanos, e em consonância com esta, apresenta-se em defesa da vida e dignidade, incentivando a extinção de práticas que desrespeitam estes princípios. Portanto, sua postura diante do tráfico de órgãos, é totalmente contrária, entendendo como intolerável e punível com multas e reclusão, agindo assim em defesa das vítimas e proteção da vida.
3. FATORES QUE PROPORCIONAM O TRÁFICO
O tráfico existe porque há compradores, a busca ilegal por órgãos cresce, porque cresce também o número de terceiros interessados em adquirir os órgãos mais rapidamente, independente do preço, seja financeiro ou humano. Buscar entender o que possibilita e torna este crime tão favorável ao crescimento e lucrativo, é essencial para descobrir o que fazer para coibir a ação criminosa.
Muitos são os fatores associados ao desenvolvimento deste crime. Besson (2018) apresenta quatro deles: socioeconômicos, socioculturais, estruturais e a indefinição de limites entre a ciência e a ética. É obvio que existem outros fatores importantes que precisam ser abordados, mas vamos começar por estes que apresentam um quadro mais geral e são descritos pela autora.
O fator socioeconômico é um dos mais importantes porque está relacionado à vítima, às famílias, e aos interessados ou receptores. A condição de pobreza em que um indivíduo ou família se encontra pode ser determinante para que ele concorde em vender os seus órgãos. Também afeta a qualidade e disponibilidade de tratamento médico que um paciente em estado grave vai receber, se ele for atendido em um hospital com poucos recursos tem mais chances de evoluir com morte cerebral e tornar-se um doador potencial. Além disso, moradores de rua ou “não identificados” que são diagnosticados com morte cerebral podem se tornar alvos fáceis aos criminosos e terem seus órgãos retirados sem nenhum consentimento, isso porque são indivíduos considerados “sem importância social”, e, portanto, não recebem muita atenção sobre procedimentos e consentimentos.
O fator sociocultural está relacionado a falta de informação da sociedade como um todo. Não se sabe muito sobre morte cerebral, possibilidade de reversão do quadro, doação de órgãos, etc. Por isso, muitos dos possíveis doadores não têm seus órgãos aproveitados, porque a família não consente. Culturalmente nossa sociedade não tem conhecimento sobre doação de órgãos, com isso, há maior escassez de órgãos disponíveis, a lista e o tempo de espera aumentam. Os fatores estruturais estão relacionados há falta de equipe técnica de transplantes cadastrados, locais habilitados, dificuldade de locomoção do doador e do receptor, tempo hábil para transplantação de órgão.
A indefinição de limites entre ciência ética, envolve profissionais de medicina e seu compromisso de informar familiares e paciente (quando for o caso), sobre possibilidades de tratamento, intervenção, e realizar procedimentos apenas com consentimento. Envolver-se com captação ilegal de órgãos é crime e também é falha ética. Outros fatores tornam a lista de espera por um órgão maior e mais lenta, tal como a dificuldade em encontrar órgãos compatíveis e viáveis, baixo número de doações, durabilidade do órgão após a captação, inexistência de equipe e local adequado e capacitado para realizar o transplante.
O direito, nesta delicada área, consiste em definir quem pode ser doador, os critérios para doação em vida e post mortem, e defender aqueles que sentirem-se violados. Besson (2018) busca fazer um breve delineamento dos requisitos para doação em vida, citando Fábio Ulhôa Coelho (p.491, 2012) “As possibilidades são: capacidade do doador, autorização judicial, justificativa médica e vínculo parental entre o doador e receptor”. De acordo com os autores, estes requisitos dificultam a ação do tráfico.
Ainda de acordo com o apresentado por Besson (2018) em outras situações que escapam aos requisitos iniciais o juiz pode conceder liberação, porém sob averiguação das condições em que a doação está sendo planejada, se não há fatores econômicos envolvendo doador e receptor.
Em casos em que o doador potencial é um irmão menor de idade ou incapaz, a autorização dos pais ou tutor, juntamente ao laudo médico garantindo que não há riscos para a saúde do doado, é suficiente para autorizar o transplante sob homologação judicial. Esta última, deve ser requerida através de um advogado. Se o doador for capaz, maior de idade e/ou saudável, também casos de doação de medula óssea, a homologação judicial é desnecessária, e deve seguir os preceitos especificados em lei. A lei permite a doação em vida para parentes consanguíneos de até 4° grau e cônjuges, também em casos de evidentes amizades íntimas e de longa data o juiz pode autorizar a doação dirigida.
A dificuldade maior em constatar a compra de órgãos em vida, acontece em casos familiares, quando um parente compatível é sujeito a receber uma parte maior da herança, ou mesmo receber pagamento direto, por ser parente é de difícil constatação. Ou ainda, menores parcialmente incapazes são pressionados e influenciados, ou até mesmo obrigados a realizar a doação. Estas práticas também são ilegais e enquadram-se no crime de tráfico.
O desafio do Direito, apresenta-se na dificuldade de equilíbrio entre o total direito de quem doa e o direito de quem recebe. É dever do Direito, zelar pela dignidade de cada ser humano, protegendo sua integridade física e moral, para tanto estabelecer limites e critérios para a doação de órgãos em vida ou morte, seja dirigida ou não, é essencial para evitar a compra e venda de órgãos que sustentam um mercado negro milionário.
A doutrina a respeito desse assunto é extremamente escassa, restando da doutrina clássica do Direito Penal. Para Zaffaroni e Pierangeli:
Os sujeitos podem ser ativo e passivo. Sujeito ativo é o autor da conduta típica. Sujeito passivo é o titular do bem jurídico tutelado. O sujeito passivo da conduta pode não ser o sujeito passivo do delito; aquele que sofre os efeitos do ardil ou engano no estelionato pode não ser necessariamente o que sofre os efeitos lesivos do patrimônio. (PIERANGELI e ZAFFARONI, 2002, p. 475).
Em se tratando especificamente sobre o crime de Tráfico de Órgãos, considerando a doutrina clássica, pode-se afirmar que: Neste caso o sujeito ativo da ação poderia ser qualquer pessoa. Desde pessoas físicas a funcionários públicos, médicos, enfermeiros, familiares, enfim, qualquer pessoa. O sujeito passivo neste caso poderia ser dois. Se tratarmos do tráfico de órgãos intervivos será a própria pessoa que teve seu órgão retirado, porém se tratar do tráfico de órgão post mortem, será a família do morto. (BUONICORE, 2011, p. 20). Tendo em vista que o sujeito passivo do delito é o portador do bem juridicamente tutelado que fora ofendido, o indivíduo que vende o próprio órgão nos moldes é sujeito ativo e passivo do crime ao mesmo tempo. Ou seja, ele comente um crime contra si mesmo.
Também é papel do direito fiscalizar as práticas, equipes e locais habilitados para transplantes, assim como averiguar a efetiva obrigação moral e ética dos profissionais de saúde. A obrigação maior do direito neste aspecto, trata-se de proteger os direitos totais de cada indivíduo, tais como o direito à vida, à integridade física e moral, à dignidade humana, à propriedade do corpo, à autonomia, liberdade e à saúde.
Assim como exposto por Besson (2018) a vida da sociedade e vida das pessoas são um bem jurídico que merecem e têm proteção constitucional, em função de sua importância social. O direito busca proteger a sociedade de ações que podem ferir a dignidade e de qualquer ato que possa causar lesão corporal e psíquica. O principal objetivo dos direitos fundamentais é o bem-estar da sociedade, entendendo assim a vida como o bem mais caro tutelado pelo direito, senda está a maior preocupação do Estado. Por isso, a Constituição estabelece e direito e a proteção da vida.
CONCLUSÃO
Diante do conteúdo apresentado, é evidente que é longo o caminho a ser percorrido para combater o tráfico de órgãos e tecidos e o mercado negro. Apesar disso, as primeiras iniciativas já foram tomadas, e há amparo legal para a criminalização de combate do tráfico de órgãos, o que representa determinação do Estado em eliminar o tráfico de órgãos e prestar proteção e assistência às vítimas.
Apesar das especificações legais, a principal lei nacional que versa sobre doação e transplante, representa um marco nacional da luta contra o tráfico de órgãos, mas não faz referência à canais de denúncias, ou mesmo canais publicidade sobre o tema, ou seja, formas de propagar informação útil à sociedade. Outras leis são importantes nesta luta, como por exemplo o Protocolo de Palermo, e a Convenção de Istambul.
Sabe-se que o que torna o tráfico um mercado atraente é cenário atual composto pelo crescimento desmedido da demanda por órgãos, o crescimento constante das listas de espera, maior tempo de espera, escassez de órgãos, uma classe de sujeitos em situação de extrema vulnerabilidade e pobreza, além dos financeiramente abastados que estão dispostos a pagar o preço necessário para “subir” sua posição na lista, ou mesmo nem entra na lista, mas consegue o órgão adquirido ilegalmente.
O crime de tráfico de órgãos é complexo, atinge vítimas em maioria pobre e socialmente sem importância que geralmente não querem fazer denúncias, principalmente porque a lei brasileira trata a vítima como conivente ao crime deixando-a passível de punição. Diante da alta procura por órgãos e as possibilidades de fluxo de órgãos, tecidos e partes do corpo possibilitadas pela globalização, assim como o próprio tráfico de pessoas, este crime é considerado como de difícil combate.
Considerando tudo isto, o melhor caminho a seguir para evitar estas violações é a adoção de medidas preventivas. Investimento em estrutura, treinamento, capacitação e habilitação de equipes de saúde, assim como adequação em mais unidades de saúde para habilitação em transplantes. Planejar e executar planos a longo prazo, que efetivam a transmissão de conhecimentos sobre assuntos relacionados à doação de órgãos, tecidos, medula e sangue, assim como sobre morte encefálica, impossibilidade de reversão do quadro, benefícios da doação de órgãos.
Também são necessárias medidas comprometidas com a redução da pobreza, buscando a promoção da vida, saúde e dignidade. Estas medidas devem valorizar a dignidade humana, integridade física e moral, assim como a saúde, corpo e a vida, de forma que os indivíduos não vejam o ato de vender os órgãos como única forma de sobreviver e mudar de vida, tornando assim inacessível aos criminosos. E por último, porém não menos importante, implantação de ações que busquem identificar as vítimas e prestar assistência, possibilitar e incentivar as denúncias. Empenhar-se incansavelmente no combate a este crime tanto em nível nacional como internacional, associando-se à outras nações e entidades em prol da preservação da vida e dignidade.
Há muito que ser feito, mas os primeiros passos já foram dados, cabe agora Estado buscar por mudanças sociais, ao Direito proteger a vida, a dignidade, a autonomia, a liberdade, a saúde e os direitos fundamentais dos indivíduos, mas cabe principalmente à sociedade, refletir sobre doação de órgãos como algo benéfico, e ser totalmente intolerante com o tráfico de órgãos e tecidos.
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[1] Acadêmica do 5º ano de Direito no Centro Universitário da Grande Dourados-UNIGRAN, e-mail: leticia.alda@hotmail.com
[2] Orientador Graduado e com especialização em Direito pelo Centro Universitário da Grande Dourados – UNIGRAN, Mestre em Direito Processual e Cidadania pela UNIPAR e Advogado. Formou-se Oficial-do-exército em 2001, sagrando-se 1º colocado no curso de formação de oficial, foi 1º colocado nos Estágios: de Instrução e de Preparação de Oficiais. Tem experiência na área de Defesa, Administração Pública no Âmbito do Exército, Licitações e Contratos, Direito Penal e Processual Militar, Auditoria e docência em Direito Penal, Processo Penal e Legislação Social. Atualmente é Advogado militante, Consultor Jurídico do Sebrae e Professor do Centro Universitário da Grande Dourados – UNIGRAN, nos cursos de graduação de Direito, Administração e Contábeis, e nos cursos de graduação EAD de Administração e Contábeis, e ainda em MBA Executivo em Administração com ênfase em Recursos Humanos.
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