Resumo: Tomando-se por base o forte cunho social-democrata que embriagou os constituintes, por ocasião da confecção da Carta Magna de 1988, no Brasil, esperava-se fossem estendidos também aos militares todos os direitos e garantias individuais que, de forma tão veemente se instalou favorável ao cidadão brasileiro. O ponto focal deste trabalho se situa na crítica a uma possível discriminação feita à classe militar, na medida em que se permitem possibilidades ao cidadão civil, e não aos servidores militares, chegando a arranhar princípios constitucionais básicos, com o da Igualdade e Dignidade Humana. Assim, busca-se assegurar os direitos e garantias fundamentais previstos na Constituição Federal de 1988, dita “Cidadã”, também aos militares, partindo-se de uma análise crítica, e apresentando a proposta de participação de uma instituição representativa da classe, politicamente a favor do crescimento e valorização das Forças Armadas. A própria formação profissional do militar, ao longo do tempo, o prepara para o estrito cumprimento do dever, sob risco da própria vida, o bem mais importante, em face da possibilidade de emprego em conflitos armados e situações de emergência, o que já educa toda a coletividade a imprimir uma cultura de eterno sacrifício, convivendo com restrições salariais, limitações de moradia, preparo técnico limitado, afastamentos da família, restrições sociais e discriminações culturais. Resta a certeza de que, com a apresentação desse estudo comparativo, diante de outros modelos internacionais, foi argumentada, favoravelmente, a necessidade de introdução, em nossa cultura coletiva, de uma instituição, com a estrutura que for conveniente e legal, do ponto de vista constitucional, para tomar a frente às necessidades do militar, enquanto profissional e ser humano, passível que é de pressões, erros e impulsos primários. Após a exposição deste trabalho, buscou-se convencer o leitor de que uma possível associação de defesa da categoria pode corrigir desvios de critérios na própria carreira militar, na aplicação da legislação pertinente à classe, nos pleitos de aparelhamento adequado da Força, para cumprir a missão prevista, e adequação de seu efetivo, tudo no campo político, evitando-se que ilegalidades ou injustiças sejam praticadas. Atualmente, isso é difícil de efetivar, pois exigiria uma atuação direta dos Comandantes militares em searas políticas desgastantes, o que poderia prejudicar suas próprias carreiras, dependentes que são da vontade e humor dos nossos governantes. A metodologia aplicada partiu de pesquisa qualitativa de opinião, dentre universos específicos, para avaliar a receptividade e conhecimento da atuação de um sindicato, dentro dos modelos brasileiros, coleta de informações sobre exemplos de sucesso dentro de categorias do serviço público, e análise de posicionamento de doutrinadores, buscando-se sentir os reflexos dessa normatização na caserna. Ao final, chegou-se à conclusão de que é possível, do ponto de vista legal, criar-se associações representativas da categoria militar, sem ferir a Carta Magna, a qual se buscará suprir lacunas nos pleitos da classe.[1]
Palavras-chave: Militares. Sindicalismo. Direito constitucional militar. Greve. Direitos Fundamentais. Direitos Sociais.
Sumário: Introdução. 1. O regime jurídico constitucional do militar. 1.1. Direitos Sociais. 1.2. Constituições Anteriores. 1.3. Regime Atual. 1.3.1. Razões do regime. 1.3.2. O Panoptismo. 1.3.3. O Movimento revolucionário de 1964. 1.4. Direito Comparado. 2. Prejuízos potenciais – visão prospectiva. 2.1. Representação Política. 2.2. Carreira Militar. 2.3. Remuneração Militar. 2.4. Condições de Trabalho. 3. Proteção necessária. 3.1. Princípios Fundamentais. 3.2. Sindicatos e Associações. 3.3. Sindireceita – Uma Visão no Serviço Público. 4. Associação sindical militar. Conclusão. Referências.
INTRODUÇÃO
Este trabalho tem a intenção de analisar e criticar, sempre de forma construtiva, o ordenamento jurídico pátrio, no tocante ao tratamento dispensado aos militares das Forças Armadas, quanto aos ditames previstos na Constituição Federal de 1998, chamada de constituição “Cidadã”, principalmente em seu art. 142[2].
Os militares, segundo nossa Carta Magna, formam uma categoria diferenciada de servidor público, diante de sua especial funcionalidade e importância na Defesa da Pátria, Garantia do poderes constituintes, Garantia da Lei e da Ordem. Tal atribuição foi alvo de registro em todas as constituições, à exceção da constituição outorgada em 1937, a “Carta Polaca”, redigida por Francisco Campos, fruto do Golpe de Estado realizado por Getúlio Vargas[3].
O militar sempre foi alvo de extremo rigor, por ocasião de sua formação técnico-profissional. Tornou-se notório o reconhecimento popular da estrutura militar estar alicerçada na hierarquia e na disciplina, imaginando que a possibilidade de um subordinado recusar o cumprimento de uma ordem recebida, fosse desestabilizar todo o alicerce das Forças Armadas e, como conseqüência, do próprio Estado.
Em contrapartida, apesar de também estar prevista a prestação regular da proteção do território nacional, as Forças Armadas deparam com constantes reduções orçamentárias para manutenção de seus equipamentos, redução de horas de treinamento, preparo da tropa, Manutenção Operacional, aquisição de material de suprimento ou para manutenção técnica, principalmente visto a partir dos anos 90[4], decorrente de diferentes papéis assumidos na evolução social, política e econômica do país, então sem visualizar aplicação da Força contra inimigos externos.
A classe militar, sempre temente a seus deveres regulamentares, depende muito da importância que os governantes políticos atribuem às Forças Armadas, para verificar a manutenção de condições apropriadas ao trabalho, uma vez que poderia repercutir negativamente na carreira dos comandantes militares, a constante exposição de situação adversa, como falta de recursos materiais, ao cumprimento da missão. Por outro lado, o silêncio do comando de uma organização militar expõe seu comandante à tropa, e distancia oficiais dos graduados (sargentos, cabos e soldados), por deixar a impressão de que as chefias não se preocupam com a situação dos subordinados.
Assim delimitado, o problema de pesquisa pode ser definido sob a seguinte questão: “A legislação brasileira possibilita a criação de instituição sindical ou associação de servidores militares com fins de representação política e social?”.
A escolha do tema, inicialmente diante de uma contradição aos ditames constitucionais, merece acolhida em torno da experiência pessoal do autor deste trabalho, ao estagiar no Sindireceita – Sindicato dos Analistas-Tributários da Receita Federal do Brasil, verificando a importância do papel de um sindicato ativo, nas condições de trabalho de uma categoria. Não seria exagero verificar, podendo-se demonstrar com facilidade, que um sindicato chega a fazer o papel que seria da direção geral do próprio órgão, no caso do exemplo do Serviço Público, por conseguir atingir o âmago do parlamento brasileiro, vital para propiciar alterações em políticas e legislações aplicáveis aos servidores[5].
Uma instituição independente das Forças Armadas poderia representar a classe, em pleitos e objetivos favoráveis à categoria, sem ferir a Constituição Federal, diante de suas limitações sociais e políticas, impostas aos militares? Há necessidade? Há interesse? Há vontade política? No decorrer do trabalho, partindo-se de levantamento qualitativo de enquete dentro do universo militar, somado à pesquisa de campo conduzida dentro de um sindicato específico de servidor público, no caso o Sindireceita, o leitor poderá verificar hipóteses de solução para o problema visto, que não afetarão a estrutura organizacional das Forças Armadas, nem tão pouco seus pilares de sustentação, a disciplina e a hierarquia.
Intimamente relacionado com a questão da soberania, a destinação constitucional das Forças Armadas, de defesa da pátria, garantia dos poderes constituídos, da lei e da ordem, impõem aos militares peculiaridades intrínsecas, que justificam o seu tratamento específico. Apesar de sua destinação diferenciada, os militares sofrem restrições de ordem material e pessoal, para cumprir suas atividades rotineiras, passando por vários períodos de escassez de verbas de diárias de deslocamentos para fora de sede, ou mesmo restrições orçamentárias para combustível de aviação, ou para pagamento de serviços públicos, por exemplo. Todas essas carências financeiras mudam o comportamento do militar e refletem efeitos negativos na tropa e na organização militar.
A solução imediata para estes problemas de carência de apoio ao homem, no intuito de facilitar o cumprimento do seu dever, reside na atuação do comandante de cada organização militar, uma vez ser o gerente maior da unidade e ter a obrigação de buscar meios para o cumprimento da missão atribuída. Para tal, uma vez que o seu orçamento anual foi delineado muito antes, quase sem possibilidades de suplemento, seu novo percalço seria enfatizar a necessidade de remediar tal fluxo de recursos, junto aos seus superiores hierárquicos.
Não fossem muitos os afazeres de um comandante, mais uma preocupação causaria a interrupção do cumprimento da missão original atribuída, perdendo oportunidade de continuar a exercer a liderança operacional, para seguir pelo campo político. Nesse raciocínio, é fácil concluir que nenhum responsável por um setor militar poderia arriscar seu cargo, com esses desgastes, uma vez designado para tal missão por um critério meritório, maculando sua imagem com exaustivos pedidos e interferências aos Comandantes maiores da Força.
As divergências na nossa Carta Magna, no tocante às restrições políticas ao militar, geram pouco interesse na comunidade acadêmica, não despertando interesse da maioria dos pesquisadores, salvo os que trazem maior vínculo original com as instituições militares. Este trabalho traz a justificativa, por abordar e discutir algumas questões controvertidas do ordenamento jurídico militar, principalmente sobre o artigo 142, da Constituição Federal, que veda uma solução prática para a maioria dos pleitos dessa categoria de trabalhadores.
Serve, assim, de orientação para delinear os seus objetivos, os próprios dispositivos constitucionais que tratam sobre o tema. A CF/88 discorre sobre os militares em 24 artigos, subdivididos em parágrafos e incisos, estruturados nos mais diversos títulos, capítulos, seções e subseções. Todo o aparato legislativo servirá de argumento par mostrar o rol de limitações e discriminações estendidas à categoria da caserna, ao contrário de qualquer outra, que usufrui de compensações, quando há uma missão específica, ou se ampara em um sindicato, o qual passa a fazer valer a busca por melhores condições de trabalho.
A metodologia consistirá, em específico, no debruçar sobre a literatura relativa ao tema, com enfoque nas constituições anteriores e no papel das Forças Armadas, ao longo dos tempos, no apoio no posicionamento de doutrinadores, que produziram matéria a respeito, uma visita pormenorizada ao estatuto e realizações de um sindicato da classe de servidores do Estado, em específico o Sindireceita, absorvendo ensinamentos do que poderia ser utilizado em favor dos militares, e uma pesquisa de opinião com militares da ativa e da reserva das Forças Armadas.
Todos os termos e detalhes mais importantes estarão enaltecidos em “negrito”, recebendo, quando for o caso a devida referência ao final de cada página, para clarear origem do assunto e dados do criador, em numeração completa e contínua.
1 O REGIME JURÍDICO CONSTITUCIONAL DO MILITAR
Se buscarmos a origem do comportamento rígido do militar, sua justificativa para ter base tão sólida na disciplina e na hierarquia, seremos obrigados a retroceder aos tempos pré-romanos, desde a existência das lutas de conquista de terras e da tentativa de sobrevivência dos povos, que necessitavam construir barreiras de soldados, frente a tentativas externas de invasão. Uma vez que o profissional militar estaria previsto para utilização em situações extremas de conflito ou emergência, seria provável que a dúvida permeasse a mente dos menos preparados. O exercício à exaustão massificava os jovens soldados até para evitar que perdessem tempo de reação, numa avaliação prévia do perigo. A atitude instintiva seria mais adequada do que a racional. Esta é a herança bélica da humanidade, observada em diversos trechos do trabalho visto na página da internet, http://rotasdomundoantigo.blogspot.com/2007/07/imperio-romano.html, de autoria do professor André Bueno
“[…] Estes pontos nortearam, por conseguinte, algumas das ações desenvolvidas pelos romanos no campo político ao longo dos séculos I a III d.C. Observamos um longo processo de envolvimento das legiões romanas com as fronteiras orientais, notadamente nas províncias da Síria, Judéia, Arábia Petréia e com o reino da Armênia, além dos territórios disputados e invadidos por Trajano. Estas ações tinham os mais variados fins: defesa contra agressões partas, domínio de áreas de transito comercial, interferência na política externa, etc,[…]” [6].
Segundo informações do texto acima citado, as legiões romanas de conquistadores avançavam e se instalavam ao longo dos terrenos. A necessidade da presença do Pretor, para homologar a incorporação de novas terras ao império romano e atender demandas, faz surgir o nome “castro” aos acampamentos militares, que assumiram até os dias atuais a expressão “castrense”, caracterizadora da Justiça.
Conforme registra Fernando Diogo de Alcântara, em sua publicação “As Forças Armadas nas Constituições Brasileiras, p. 36-37”
“As Forças Armadas Nacionais passaram a existir na Proclamação da Independência, porém seu processo histórico de formação, no entanto, é bem anterior, tendo suas raízes no período colonial, nas lutas contra as invasões estrangeiras e no espírito das grandes navegações portuguesas”.
Todas as mudanças políticas significativas no Brasil foram caracterizadas por mudanças no ordenamento jurídico constitucional. Todas as vezes em que passou a vigorar nova constituição, as Forças Armadas tiveram papel de destaque, ou por ser protagonista, no apoio das mudanças ou influenciando a situação no retorno à estabilidade política.
Nos tópicos a seguir, veremos alguns aspectos do caminhar jurídico, específico para a classe militar, de acordo com sua atribuição constitucional.
1.1 Direitos Sociais
Se olharmos friamente o texto constitucional atual, o militar brasileiro nem chega a ser considerado um cidadão brasileiro, pelo menos não na proporção devida à peculiaridade de suas atribuições. Muitas condições, garantias e direitos são disponibilizados aos cidadãos civis e servidores públicos, mas vedados aos militares, como se estivessem em outra dimensão política.
Como inicia seu capítulo sobre “Direitos Sociais”, o doutrinador constitucionalista Alexandre de Moraes explica:
“Direitos Sociais são direitos fundamentais do homem, caracterizando-se como verdadeiras liberdades positivas, de observância obrigatória em um Estado Social de Direito, tendo por finalidade a melhoria de condições de vida aos hipossuficientes, visando à concretização da igualdade social, e são consagrados como fundamentos do Estado democrático, pelo art. 1º, IV, da Constituição Federal.”[7]
Quando lemos atentamente os ensinamentos nesse ponto, imaginamos inicialmente, tratar-se de benefícios garantidos pelo Estado a uma determinada classe trabalhadora, talvez aquela sob o regime da Consolidação das Leis do Trabalho, mas é possível entender a abrangência do público-alvo.
Como não há uma definição clara na Constituição de 1988, do que seja um trabalhador, o autor e doutrinador Alexandre de Moraes recorreu à legislação infraconstitucional, buscando o subordinado, um sujeito com vínculo que o faz trabalhar ou prestar serviços por conta de uma autoridade, pessoa física ou jurídica, entidade privada ou pública, donde se conclui que o trabalhador pode ser urbano, rural, avulso, doméstico ou mesmo um servidor público.
O servidor militar se localiza, observando-se do ponto de vista constitucional, em um limbo político-social, uma vez que, por ser uma classe diferenciada, com atribuições especiais, tem tratamento diferenciado, mas não usufrui dos benefícios assegurados até para o servidor público civil. O militar não tem oportunidade de usufruir de todas as garantias e direitos, disponibilizadas a um trabalhador, de acordo com as garantias dos trabalhadores chamados celetistas, mas também não abraça todos os direitos de um servidor público, visto que esta categoria possui direitos sociais e políticos mais amplos. Acredita-se, nesse ponto, que deve haver uma forte razão para manter a classe militar em uma espécie de redoma constitucional, em um universo politicamente delimitado.
O servidor militar, pela sua própria aplicação em conflitos, conviveu, ao longo da carreira, com um sentimento de “sacrifício coletivo em prol da Nação”, como que se preparando eternamente, para uma espécie de “economia de guerra”, quando haveria escassez de recursos materiais e humanos, e estes se reservem, desde já, para momentos de extrema necessidade. Com essa formação diferenciada, o meio militar sempre enxergou a administração pública geral como esbanjadora de recursos públicos.
Como exemplos de tratamentos sociais diferenciados, não há um parâmetro para a jornada de trabalho. É definida uma rotina que se assemelha ao Serviço Público em geral, mas há variações em períodos do ano e mesmo de uma região para outra.
Podemos encontrar uma jornada de trabalho variável para os militares, sob a justificativa de manter-se em treinamento específico. Eventos podem prosseguir em horários noturnos ou em finais de semana, sem qualquer compensação. Não é raro vermos atividades na rotina que passam das 12 horas em expediente, e algumas das experiências vividas perduraram pelas 24 horas do dia, ou seja, a tropa foi mantida em alerta e em combate simulado, sem descanso.
Todas as situações de esforço máximo têm a justificativa de acostumar a tropa às condições inóspitas do combate. O que se estranha é o fato de se adotar medidas de contenções também para possibilidades de benefícios previstos ao servidor civil e ao trabalhador em geral, como se fossem esperar eternamente um regime de baixa disponibilidade orçamentária.
Outro exemplo do cotidiano militar reside no fato de que os aviadores nunca seguiram as limitações de jornada imposta pela própria Aeronáutica aos pilotos civis, só que as empresas comerciais estão voando equipamentos mais modernos, e recebem melhores remunerações. Os aviadores começaram a realizar menos esse tipo de desregulamentação, por força de contenções orçamentárias, e não por um sentimento de fazer viger a lei.
Todos os exemplos de jornada e atividade militar passam em muito os parâmetros do servidor civil. Não seria plausível comparar isso com a iniciativa privada, pois visa lucro e compete nas regras do mercado. O problema é que a diferença do militar é justificada na especificidade da missão, sem, contudo, se imaginar uma aplicação prática imediata. Na verdade, o militar vive uma eterna sensação de “estar pronto para ser usado em situação real”, abrindo mão de qualquer benefício que possa obstar isso.
Os patamares salariais se mostram aquém do desejado. A variação do salário do servidor militar, ao longo do período de Governo Militar, sofreu perdas consideráveis, pois o reajuste sempre era concedido no final do ano, com base na inflação oficial, porém sempre aquém desta. A título de exemplo, o salário de um Tenente Aviador, em 1986 era equivalente a U$ 700.00 (setecentos dólares), conforme consulta à tabela de valores da moeda americana, constantes no site da internet – http://www.ditizio.ecn.br/tabelas/dolar.html, comparado com consulta realizada no site do órgão de pagamento de pessoal do Comando da Aeronáutica (www.sdpp.aer.mil.br), ambos acessados no dia 12/9/2008.
Se tomarmos literalmente os valores e princípios defendidos e protegidos na nossa Carta Magna, concluímos que o militar tem menos direito ou benefícios que um trabalhador comum. Assim, só podemos continuar nossa caminhada e tentar descobrir o motivo de tamanha diferença.
Se passearmos nossos olhares pela Declaração Universal dos Direitos Humanos, documento considerado fundamental da Organização das Nações Unidas (ONU), assinado em 1948 com a participação brasileira, será possível constatarmos em nossa Administração Pública, no mínimo, uma falta de atenção aos valores morais ali enaltecidos. A declaração pode ser vista na íntegra, por exemplo, no site http://www.onu-brasil.org.br/documentos_direitoshumanos.php, acessado em 04 out. 2008, onde são enumerados os direitos que todos os seres humanos possuem.
“DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS – Adotada e proclamada pela resolução 217 A (III) da Assembléia Geral das Nações Unidas em 10 de dezembro de 1948.
Preâmbulo – Considerando que o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da família humana e de seus direitos iguais e inalienáveis é o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo; […]
Artigo XXIII.
1. Todo ser humano tem direito ao trabalho, à livre escolha de emprego, a condições justas e favoráveis de trabalho e à proteção contra o desemprego.
2. Todo ser humano, sem qualquer distinção, tem direito a igual remuneração por igual trabalho.
3. Todo ser humano que trabalha tem direito a uma remuneração justa e satisfatória, que lhe assegure, assim como à sua família, uma existência compatível com a dignidade humana e a que se acrescentarão, se necessário, outros meios de proteção social.
4. Todo ser humano tem direito a organizar sindicatos e a neles ingressar para proteção de seus interesses.
Artigo XXIV.
Todo ser humano tem direito a repouso e lazer, inclusive a limitação razoável das horas de trabalho e a férias remuneradas periódicas. […] “
A seguir poderemos começar a entender o objetivo político, pelo qual há espaço para delimitar as garantias do servidor militar das Forças Armadas.
1.2 Constituições Anteriores
Tomando-se por base a visão histórica da instituição, a atribuição das Forças Armadas sempre esteve vinculada ao papel de independência, defensora, guardiã da integridade territorial do país. À exceção da constituição outorgada em 1937, por Getúlio Vargas, todas as demais enalteciam o valor militar na defesa da Nação, e atribuíram missões voltadas para a soberania do Brasil.
A origem do Exército Brasileiro tem seu marco nas lutas contra invasores holandeses, em meados de 1600, unindo brasileiros brancos e índios, com ápice na Batalha dos Guararapes, fazendo surgir desse momento, o Dia do Exército. Seu papel principal até hoje é a proteção do território nacional, contra invasores. Sua presença se confunde com o terreno, com a pátria, com nossas riquezas naturais.
A importância da Marinha Brasileira, herdada de tempos anteriores à descoberta do Brasil, pelas naus portuguesas, foi enaltecida pela cobertura bélica dada aos navios mercantes nacionais, que poderiam ser abalroados e afundados em mares antes desprotegidos, em busca de divisas para a independência do país. A Marinha permitiu confirmar a conquista de nossas áreas marítimas, para exploração de fontes de energia e para a pesca.
A Força Aérea Brasileira, a mais jovem Arma, teve seu batismo na Segunda Grande Guerra Mundial, após absorver pilotos e aeronaves da Marinha e do Exército Brasileiro. A eficiência contra submarinos alemães, a quem a História atribui os ataques a navios mercantes brasileiros, além da campanha militar na Itália, glorificando a “Senta a Pua”[8], ajudando na derrota alemã, foram marcos importantes para o retorno aos patamares democráticos no Brasil. Sem a capacidade de defender o Espaço Aéreo contra possíveis invasões inimigas, a Nação estaria vulnerável e nada poderia ser feito para manter seu patrimônio.
Segundo comentários colhidos na obra de Fernando Alcântara, de 2007, “As Forças Armadas nas Constituições Brasileiras”, já citada anteriormente, à exceção da primeira constituição brasileira, outorgada por nosso imperador D. Pedro I, em 1824[9], e a constituição “polaca” de 1937, já comentada anteriormente, a garantia da ordem foi considerada uma destinação constitucional das Forças Armadas. A defesa da pátria também está inserida em quase todas as constituições brasileiras, como atribuição das Forças Armadas. Os princípios da Disciplina e da Hierarquia estão inscritos na ordem constitucional desde 1934.
Os doutrinadores apresentam um posicionamento comum, ao considerarem as Forças Armadas necessárias à existência do Estado. Os elementos essenciais do Estado, a sua população, o seu território e sua organização política, todos são garantidos pela eficiência das Forças Armadas.
Fernando Alcântara conclui sua obra, enaltecendo o papel das Forças Armadas no desenvolvimento do país, em face da necessidade de instituições fortes, que podem evitar retrocessos e ações de oportunistas de plantão:
“Com base nas pesquisas bibliográficas é possível afirmar que as Força Armadas brasileiras foram e, ainda são, o elemento fundamental da organização coercitiva a serviço do direito e os garantes materiais da subsistência do Estado e da perfeita realização dos seus fins. Nos momentos críticos da vida internacional, no passado, foram a afirmação do prestígio do Estado e da sua soberania. Se no presente e no futuro continuarão só dependerá da visão dos que governam hoje o País.”
Porém, no posicionamento deste pesquisador, os últimos constituintes não têm acompanhado a possibilidade de evoluir do servidor militar, pelo seu conteúdo constitucional apresentado, uma vez que se mostra necessária a adaptação das Forças a um novo cenário, com conflitos internos dependentes de influências internacionais, e isso não foi permeado no produto final da Assembléia Nacional Constituinte. Há mudanças significativas na valorização do ser humano, em respeito a princípios consagrados mundialmente, mas as legislações que amparam a conduta do profissional militar permanecem inalteradas, sob um manto do velho engano da soberba disciplina e hierarquia.
O mundo atual se mostra globalizado, unificado e próximo em todos os sentidos, dominado por espasmos de uma só nação poderosa, por rompantes de governantes e ditadores de “republiquetas”, e por regiões em busca de independência, fazendo com que um instante de falsa calmaria levante a opinião de serem as Forças Armadas instituições caras ou desnecessárias. Na verdade, um mundo calmo e pacífico é uma raridade hoje. A regra é que haja conflito bélico em algumas partes do mundo, ao mesmo tempo.
Ao observar o noticiário pela televisão, hoje, dia 12 de setembro de 2008, numa das primeiras fases de confecção deste trabalho, podemos verificar conflitos na Bolívia, pela questão de repasse de impostos quanto à exploração boliviana do gás, entre região local e governo, assim como podemos verificar o governante venezuelano em mais uma tentativa de chamar a si a mídia internacional, expulsando o diplomata americano do seu país, sendo seguido da mesma atitude por parte do governo americano.
Em todos os conflitos há homens agindo de forma a fazer valer seus interesses, que talvez representem sua classe, sua empresa, sua região ou mesmo o país. Todo enfrentamento, ajuste ou disputa por interesses causam atritos, que vão surtir efeitos negativos a sua volta, até o equalizar de suas atividades. O homem causa e sofre o efeito dessas atitudes.
Em meio a conflitos bélicos, críticas populares, discriminação cultural, crítica de políticos ditos de ideologia mais radical, e a própria severidade regulamentar e limitações normativas, no seio das Forças Armadas, existe o profissional militar, que também é um ser humano e possui necessidades, limitações, anseios, família, acertos, erros e sonhos.
Vejamos o que reserva a Constituição de 1988 para as Forças Armadas brasileiras, após essa evolução histórica, uma vez que são formadas por homens, profissionais sujeitos às mesmas necessidades que o trabalhador comum, e tanto quanto o servidor público civil.
1.3 Regime Atual
A Constituição Federal de 1988 foi erigida em torno de uma retomada do ambiente democrático no Brasil. Os governos militares se estenderam por mais de vinte anos, recebendo críticas até mesmo dentro da caserna. Os militares mais conservadores não mostravam tanta desconfiança na direção civil, uma vez que “político é igual no mundo todo”[10], e a opinião pública se mostrava impaciente com o retorno da democracia plena, com participação popular da escolha presidencial.
Este “retorno” ao regime democrático de direito foi homologado pela constituição cidadã de 1988, com forte teor social. Tamanha vontade de participação dos constituintes, diante dessa saudade em legislar livremente, resultou na edição de uma carta extensa, detalhista, quase que transitória, e perto de sessenta emendas, em pouco mais de vinte anos de vida, além de mais de mil projetos de emendas.
As Forças Armadas têm o privilégio da inserção em um capítulo exclusivo, dentro dessa constituição, com dois artigos principais, o de nº 142 e o nº 143[11], e somente uma emenda veio a alterar o artigo nº 142, até hoje. Uma das mais significativas alterações na vida organizacional dos militares foi a emenda 23/1999, que alterou a estrutura do Governo, extinguindo os ministérios militares, passando ao nível e título de “Comandos”. Passam os Comandantes das Forças Armadas à subordinação de uma autoridade civil, à frente do Ministério da Defesa. Atualmente, o acesso dos líderes militares passa por um filtro político, onde prioridades são realinhadas segundo nova visão civil e política. Tudo é mudança de comportamento corporativo.
Vendo o tema em uma ordem inversa, podemos observar, primeiro, que o art. 143 apresentou a obrigatoriedade do Serviço Militar para todos os brasileiros, mas já trabalhando melhor a participação dos alistados em serviços alternativos, sob alegação de imperativo de consciência, por força religiosa, convicção política ou mesmo filosófica. Na constituição anterior, de 1969, apesar das muitas críticas doutrinárias posteriores[12], esse assunto era pouco “flexibilizado”, usando-se uma expressão comum nas teses jurídicas sindicais, como podemos observar a seguir:
“[…] Art. 92. Todos os brasileiros são obrigados ao serviço militar ou a outros encargos necessários à segurança nacional, nos termos e sob as penas da lei.
Parágrafo único. As mulheres e os eclesiásticos ficam isentos do serviço militar em tempo de paz, sujeitos, porém, a outros encargos que a lei lhes atribuir. […]”
Importante atenção deverá ser reservada ao art. 142, diante das limitações que são alvo principal dessa pesquisa. Além das delimitações básicas da estruturação das Forças Armadas e diretrizes que remontam à regulamentação posterior e específica, causa certa espécie à pesquisa o fato do artigo iniciar um processo de limitação, ou mesmo de delimitação das possibilidades de ação do militar.
No início de sua leitura, paira uma dúvida sobre possível excesso de proteção à instituição, em face de eventuais atitudes irregulares dos seus integrantes, mas a iniciativa política vai um pouco além.
O parágrafo segundo do art. 142 estabelece o não cabimento, para o caso de tentativa de ingresso de habeas corpus, em relação a punições disciplinares militares, mesmo sendo um remédio constitucional previsto para sanar irregularidades contra a privação de liberdade de todo cidadão, como visto no art. 5º, inciso LXVIII, desta mesma Carta Magna. Assim, tornou-se pacífico pela doutrina e jurisprudência que não haveria possibilidade deste instituto, em relação ao mérito das punições disciplinares militares, porém o texto constitucional não impede o exame pelo Judiciário dos pressupostos de legalidade.
O parágrafo terceiro deste artigo reserva a proibição do militar sindicalizar-se ou mesmo fazer greve, em seu inciso quarto, demonstrando total discriminação para com a classe, uma vez que é considerado um direito de todo trabalhador, contrariando orientações básicas da própria Declaração Universal dos Direitos Humanos, da Organização das Nações Unidas (ONU), que rege em seu artigo XXIII, inciso 4: “Todo ser humano tem direito a organizar sindicatos e a neles ingressar para proteção de seus interesses”.
O Brasil já possui número considerável de sindicatos regulares, o que pode ser confirmado por simples consulta aos sites eletrônicos brasileiros, relativos a servidores públicos, podendo ser observado no âmbito federal, estadual e municipal, o que confirma a sua utilidade em defesa de interesses de várias categorias de servidores, menos dos militares. Resta a impressão de que os servidores militares estão protegidos, quem sabe, pela ingerência do Ministério da Defesa, de qualquer contratempo aos seus direitos.
Já o direito de greve do funcionário público está previsto na Constituição Federal de 1988, competindo-lhe a oportunidade de exercê-lo sobre os interesses que devam justificar o artifício, na defesa de pleitos da classe. No entanto, o Congresso Nacional não aprovou uma lei que regulamente esse direito. Por conta da demora e interesse, alguns sindicatos de servidores recorreram ao Supremo Tribunal Federal para garantir esse direito.
O Supremo Tribunal Federal decidiu, em 25 out. 2007, no julgamento dos Mandados de Injunção 670, 708 e 712, que a administração pública deve seguir as mesmas normas aplicadas aos trabalhadores da área privada, enquanto o Congresso Nacional não aprova uma lei que regulamente esse direito. A decisão foi tomada no sentido de se utilizar a Lei nº 7.783/89 (Lei de Greve) aplicada à categoria representada pelo sindicato dos requerentes, no caso em questão, mas abrindo esse entendimento a qualquer outra demanda, além de estabelecer condições específicas para o seu exercício[13].
O inciso V, do parágrafo terceiro, deste mesmo artigo 142, estabelece que o militar, enquanto no serviço ativo, não pode se filiar a um partido político, o que também afronta os direitos do cidadão.
É fácil encontrar doutrinador tentando justificar a inclusão de tais limitações à atividade do militar, mas sem o necessário convencimento. Como não há meios de se infiltrar na mente do constituinte, por ocasião da confecção da nossa Carta Magna, rogamos pela paciência do leitor, por apresentarmos, a seguir, suposições acerca de tais normas.
1.3.1 Razões do regime
Nesse exato momento, entramos numa seara que perde um pouco do teor primordial da pesquisa científica, para caminhar, por breves instantes, no campo das suposições, embora ainda que permeadas pela experiência de vida do pesquisador e pela estatística realizada no meio militar.
Em rara oportunidade, foi possível consultar previamente um grupo de integrantes de uma turma de formação do ensino militar, na Escola Preparatória de Cadetes do Ar, integrante ao sistema de ensino e formação de pessoal do Comando da Aeronáutica. Em 1974 ingressaram 342 alunos naquela escola militar, que tem sede em Barbacena/MG, incluindo este aluno e pesquisador. Ao longo dos três anos de internato, boa parte desses alunos foi desligada do curso, por indisciplina, falta de rendimento escolar ou mesmo por vontade própria, mas não perderam os seus laços de respeito, amizade, companheirismo e agradecimento. Dessa forma, após mais de 30 anos, foi retomado contato por meio de site de relacionamento, pela rede mundial de computadores, com a montagem de páginas da “Turma 74”, permitindo troca de idéias, críticas, brincadeiras, encontros, ajudas, notícias e agradecimentos. Na prática, encontram-se adultos em um ambiente descontraído, unindo amigos de todos os pontos do mundo, com origens comuns[14].
Assim, tomado pelo anseio de ver a idéia analisada por aqueles que já passaram ou ainda estavam na atividade militar, lançamos a questão da validade ou necessidade de um sindicato para os militares. Entre as respostas mais sérias, porquanto também se tornou alvo de brincadeiras, notava-se a fragilidade do conhecimento da atuação de um sindicato. Alguns integrantes afirmaram que isso iria quebrar a disciplina da tropa, por permitir que um subordinado vá recorrer ao sindicato, em questões disciplinares, por exemplo, enquanto outros se mostravam favoráveis à idéia, mas sem base mais sólida, e talvez só tomados pela torcida por um colega, ao defender sua idéia, futuramente.
Isso serviu para nos confirmar que há grande desconhecimento da função real, ideológica de um sindicato, até mesmo pela carga negativa que traz o tema, oriundo dos eventos conduzidos pelos sindicatos do ABC paulista, conforme trecho a seguir exposto:
“A região do ABC paulista e, em particular, o município de São Bernardo do Campo possui algumas peculiaridades que a tornam ímpar. Ao mesmo tempo em que há um amplo desenvolvimento industrial e, por essa razão, existe uma grande concentração de trabalhadores nessa região, há, também, um tipo de ação sindical que se diferencia, em muito, das práticas sindicais mais comuns em nosso país. E um dos principais pontos dessa prática que se desenvolveu no ABC paulista, desde os anos 70, se relaciona, de um lado, com a capacidade sindical de dar respostas aos problemas que surgem no cotidiano da produção e, de outro, com sua organização no interior das empresas. “Nos quadros do movimento sindical brasileiro, a luta pela elevação de salários segundo os incrementos de produtividade, pela negociação coletiva sem a mediação do governo, pela organização sindical no interior das unidades fabris, configura uma problemática inédita, que vem sendo incorporada pelos trabalhadores do setor mais moderno do parque industrial brasileiro, a partir dos primeiros anos desta década [1970]. Ela envolve três ordens de questões relacionadas entre si e em torno das quais é possível que se definam novas pautas de ação sindical” (Almeida, 1978, p. 469). Uma primeira questão se relaciona à junção das demandas salariais com reivindicações que dizem respeito às condições de trabalho; a segunda, à tentativa de buscar negociações descentralizadas; e, finalmente, uma preocupação do sindicato mais voltada para o interior da empresa “e mais preocupada em aumentar o controle dos assalariados sobre o processo de trabalho” (Almeida, 1978, p. 469)[15]. “
Dessa forma, acredita-se que haveria motivo, do ponto de vista da segurança pública, para reprimir as ações sindicalistas, naquela época, e isso isolava mais ainda os militares das questões sociais, por serem amplamente utilizados na repressão a qualquer atitude coletiva contrária ao Governo.
Alguns fatores colaboram para a manutenção de controle firme em torno da liberdade política do militar. Acreditamos, diante de mostra da pesquisa realizada, que muitos militares não compreendem o papel de um sindicato, nos pleitos e necessidades de uma categoria de trabalhadores. Na verdade, acreditamos que nem mesmo os trabalhadores comuns brasileiros estariam em condições de entender o papel do sindicato, mas aqueles que são apoiados por boas associações, instituições ou sindicatos sentem tal reflexo, no mínimo, nos seus salários e nas jornadas de trabalho.
A própria formação do militar recebeu influência das épocas ditas revolucionárias, com palavras de ordem contra a ditadura militar, greves de metalúrgicos, atos terroristas, crítica maciça da imprensa e até o medo da sociedade civil.
1.3.2 O Panoptismo
As instituições não são exceção ao modelo baseado no “Panoptismo”. O dispositivo panóptico[16], descrito por Michel Foucault[17] constitui uma “máquina”, idealizada por Bentham no século XVIII, cuja arquitetura é formada por uma torre central e uma construção circular periférica. Nesta área se encontram indivíduos a serem vigiados, isolados em células, formando “uma coleção de individualidades separadas”, o que é muito apropriado para um presídio, por exemplo.
As salas da construção periférica são determinadas por janelas externas, por onde entra a luz, e por janelas internas, frente à torre central. E é justamente essa a eficiência do dispositivo panóptico: “ver sem ser visto”; à torre é possível ver tudo o que acontece no prédio externo, ao passo que este nem sabe se é, ou não, vigiado. “A visibilidade é uma armadilha”. O poder é visível, pois sempre estará lá a torre de vigilância, mas os detentos nunca têm a certeza se há de fato alguém a observá-los. A torre em si será o símbolo do poder imposto. O detento estará impondo a disciplina a si mesmo, independente de alguém na torre.
Esta arquitetura teve seu modelo aperfeiçoado de controles de pestes e leprosos, na Europa do final do século XVII. A identificação, isolamento, exclusão, controle, vigilância, purificação e classificação são atos formadores de uma conduta padronizada, que serviu de base para institutos coletivos de grupos específicos, tais como presídios, manicômios, hospitais, internatos, etc.
Exemplos do panoptismo foucaultiano na sociedade contemporânea são vários. O programa televisivo Big Brother Brasil, da rede Globo, relembra a estrutura de Bentham, do século XVIII – “ver sem ser visto”. Os participantes ficam confinados dentro de uma casa, observados por dezenas de câmeras e milhões de pessoas. Inclusive as relações entre os participantes se assemelham às descritas por Foucault. Os mais disciplinados constroem uma imagem positiva, transmitida para a sociedade externa, que funciona como juíza. Aqueles que transgridem, que se rebelam, são literalmente eliminados. E o programa segue, promovendo seu auto-funcionamento por um processo de seleção.
As próprias salas de aula de hoje seguem alguns ensinamentos deste modelo. A posição do professor, à frente e ligeiramente acima da platéia, permite sua visão geral da sala, impondo o controle, e enaltece sua superioridade hierárquica. Os alunos alinhados em filas têm suas visões alinhadas para a nuca no aluno da frente, em um só sentido, e qualquer movimento de cabeça é bem visível ao professor. A uniformização de roupas e conduta nivela todos os integrantes, que assimilam sua posição inferior como uma regra “natural”. É nesse modelo de autodisciplina que se formam liderados e líderes, nas escolas militares, além de tantas outras instituições mais conservadoras (seminários religiosos, conventos, “reformatórios”).
As escolas militares sempre pregaram o combate ao ambiente de descontrole da situação, aos subversores da ordem, aos terroristas, além de criticar qualquer conduta fora de uma normalidade padronizada, e as formações do Comando da Aeronáutica não poderiam fugir a esse padrão. Não era raro o incentivo para que o grupo de alunos/cadetes procurasse e entregasse algum integrante que tivesse a indesejável conduta de ladrão, subversivo ou homossexual, com o fim de desligá-lo do curso. Esse método mantinha o grupo sob a sensação de vigilância constante.
Durante muitos anos, principalmente no final dos anos sessenta, as organizações militares viviam sob o temor de ataques guerrilheiros, que recebiam influência externa dos frutos da guerra fria, entre o mundo democrático, com o baluarte americano, e o mundo comunista, sob a liderança russa ou chinesa. As escolas militares massificavam a formação acadêmica em torno de conhecer os métodos de expansão do movimento comunista e sua influência em organizações clandestinas dentro do território brasileiro. Essas considerações também foram alvo de comentários de Marshall Berman (1986), em uma das interpretações mais recentes do Manifesto Comunista[18]. Não havia meio mais fértil para as inseguranças organizacionais.
1.3.3 O Movimento revolucionário de 1964
Diversas publicações, artigos, livros e textos foram produzidos para tentar transmitir idéias favoráveis e contrárias, de acordo com seus autores, referentes ao período conturbado pela qual passou o país, no início dos anos 60. O texto que melhor sintetiza o ocorrido, pela didática de acessar links de outros temas, naquele momento foi colhido no site “wikipedia”[19].
“O Golpe Militar de 1964 designa o conjunto de eventos ocorridos em 31de março de 1964 no Brasil, e que culminaram em um golpe de Estado (chamada pelo Estado que se seguiu como uma “Revolução de 1964”) que interrompeu o governo do presidente João Goulart, também conhecido como Jango, que havia sido democraticamente eleito vice-presidente, pelo Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) – nas mesmas eleições que conduziram Jânio Quadros à presidência pela União Democrática Nacional (UDN). Jânio renunciou o mandato no mesmo ano de sua posse (1961) e João Goulart, que deveria assumir a presidência, segundo a Constituição vigente à época, promulgada em 1946, estava em viagem diplomática na República Militar da China. Militantes de direita acusaram Jango, como era conhecido, de ser comunista e o impediram de assumir como mandatário no regime presidencialista. Foi feito um acordo político e o parlamento brasileiro cria o regime parlamentarista, sendo João Goulart chefe de Estado. Em 1963 há um plebiscito e o povo brasileiro votou pela volta do regime presidencialista, e João Goulart finalmente assume a presidência da república com amplos poderes. O Golpe de 1964 submeteu o Brasil a uma ditadura militar que durou até 1985, quando, indiretamente, foi eleito o primeiro presidente civil desde o golpe de 1964, Tancredo Neves.”
Há controvérsias, entre os dois lados da questão, sobre a necessidade da revolução, uma vez que se mostraria necessária para evitar a instalação do comunismo no país, trazendo o desenvolvimento e normalidade ao país, mesmo à custa de aumento da inflação, ou poderia ter sido entendido como um motivo para parte da elite brasileira, somada ao alto escalão da igreja, tomar as rédeas do poder, usando as Forças Armadas como ferramenta, o que também seria bem recebido pelo alto comando militar. O texto que apresenta essa idéia pode ser visto no mesmo endereço, sob o título “Golpe ou Revolução?”, acessado em 28 set. 2008.
Conforme resumos de trechos retirados do site eletrônico http://pt.wikipedia.org/wiki/Anos_de_chumbo, acessado em 02 out. 2008, é possível verificar que os primeiros anos do “governo militar” não foram considerados os mais repressivos às liberdades de manifestação, porquanto ainda tinham a participação de políticos de direita, favoráveis ao movimento que resistiu à instalação de um regime comunista no país. Porém, sob o argumento de que não haveria tempo hábil para permitir as reformas políticas, o novo governo conseguiu prorrogar o prazo para novas eleições presidenciais, até 1967. Este ato contrariou interesses de muitos políticos, até então simpatizantes do regime, que passaram a criticar o governo.
Continua o texto, a apresentar comentários, afirmando que, a partir do segundo governo militar, de Costa e Silva, o país começava a encontrar mais limitação de toda ordem, o que refletiu em mais de 3.500 cassações de políticos. Em julho de 1968 ocorrem as primeiras greves, exigindo medidas mais duras contra manifestações contrárias ao governo, inclusive fechando algumas universidades. Aumentava a participação do Serviço Nacional de Inteligência e do Ministro do Exército. Surge, assim, o AI-5 que permitia ao governo decretar o recesso legislativo e interferir nos entes federados, sem as limitações constitucionais, cassar mandatos eletivos, decretar o confisco de bens de qualquer pessoa com enriquecimento ilícito, e suspender por 10 anos os direitos políticos de qualquer cidadão.
Concluindo seu pensamento, no texto é apresentado que os anos mais repressivos do governo militar, considerados “anos de chumbo”, foram de meados de 1970 até março de 1974, a cargo do General Emílio Garrastazu Médici. O controle da comunicação de massa ditava a ordem do monitoramento dos críticos ao governo. A presidência da República passaria por mais dois oficiais generais, até que, em 1985, o Congresso Nacional aprova medidas que terminavam com os vestígios da ditadura no Brasil.
Após todos esses acontecimentos, vemos que a constituição de 1988 é fruto de toda essa evolução histórica, e a maioria dos constituintes dessa época perseveraram na busca em introduzir mecanismos de proteção aos direitos políticos dos cidadãos, como os incisos vistos no seu artigo 5º. Toda nova ordem política procura mudar a ordem vigente, em busca dos meios que possibilitem o crescimento do Estado. É fácil encontrarmos aqui a proteção a direitos políticos de cidadãos, com ênfase na preocupação em não se permitir a extradição de brasileiros, por exemplo. Há ênfase nas liberdades, nas garantias individuais, nos direitos e respeito a princípios em geral.
O fato de presenciarmos a vedação à sindicalização para o militar não encontra uma lógica racional, no ponto de vista da pesquisa norteadora deste trabalho. Causa surpresa tal limitação, uma vez que um sindicato teria a finalidade principal de fazer valer direitos não disponibilizados aos seus filiados e a sua categoria. Se as Forças Armadas caminham sob o baluarte da correção de atitudes e procedimentos, uma vez que defendem a lei e a ordem, não haveria motivo para evitar interferências de um instituto independente do governo.
Se essa iniciativa surgiu dos constituintes, durante a confecção da Carta Magna, há que se imaginar até mesmo uma influência de militares conservadores, em trabalho parlamentar, pois o Estado de nada teria a se beneficiar ou tomar em prejuízo, com a criação desse tipo de associação sindical. Ou teria? Concluindo este ponto, ou o assunto envolve total desconhecimento de movimento sindical, ou há uma forte questão financeira, por conta de repasse de fundos, que poderiam abastecer um sindicato de militares, a ponto de deixá-lo mais forte do que a própria Força Armada. Talvez a questão seja a insegurança de transferência de poder. Só podemos imaginar isso.
Das surpresas constitucionais conquistadas no artigo 142, a mais constrangedora para o militar, em face até de sua formação moral, é o fato de termos o registro de proibição de se fazer greve. De nada vale a publicação de uma norma, se ela não for viável, possível, capaz de exercer sua finalidade. Fica a falsa impressão de que a proibição de se fazer greve teria força coercitiva de evitar que algum servidor, de fato faça greve.
O doutrinador Alexandre de Moraes explica que o motivo da vedação do art. 142, da Constituição Federal de 1988, estaria reservado “em face das funções a eles (militares) cometidas pela Constituição Federal, relacionadas à tutela da liberdade, da integridade física e da propriedade dos cidadãos”, como pode ser visto no seu livro “Constituição do Brasil Interpretada e Legislação Constitucional”, 2ª ed. – São Paulo, ed. Atlas, 2003, p. 1646. Com todo o devido respeito ao ilustre doutrinador, discordamos da associação da existência da norma, com a proteção das funções atribuídas aos militares.
Tal norma não evitou que servidores militares tenham causado danos irreparáveis ao Controle do Espaço Aéreo brasileiro, com operação em ritmo mais lento que o exigido e até falhas e interrupções na operação de controle, em eventos recentes. Cabe ressaltar que hoje existe a Federação Nacional de Controladores de Vôo, que já exerce certa atividade em prol da categoria, movendo ações que pressionam o governo brasileiro, na posição do Comando da Aeronáutica, por melhores condições de trabalho, em face de inadequação dos equipamentos utilizados em certas regiões brasileiras, ou carga de trabalho inadequado.
Há dificuldades gerenciais nessa questão específica do controlador de vôo brasileiro. Sua profissão é muito desgastante e mal remunerada, pelo simples fato de ser exercida, na maioria esmagadora por militares. O profissional é remunerado pelo seu posto ou graduação, posição hierárquica na carreira, e não pela atividade exercida. Vejamos a seguir parte do relato da pesquisadora Rita de Cássia Araújo, que defendeu dissertação de mestrado[20], na Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP), em 2000, registrado em entrevista, após mais de seis anos de estudo.
“A grande maioria deles tem duplo emprego para complementar o salário da Aeronáutica, que gira em torno de R$ 2 mil por mês. É comum ver controladores trabalhando 15 horas por dia, somando as duas atividades. Muitos dão aulas em escolas de aviação. Só para efeito de comparação, nos Estados Unidos um controlador de vôo ganha em média US$ 7 mil mensais. Na Europa, são 8 mil euros. E, nos dois casos, é inaceitável a realização de trabalhos paralelos. […]”
Mesmo com todas as dificuldades encontradas, e limitações salariais ou operacionais, não é aceitável para a formação militar, o abandono de suas atividades, ainda mais por um possível incitamento à paralisação. Tudo é uma questão de opção feita pela pessoa, ao adotar uma carreira, na busca da sua evolução profissional e aceitação de certas conseqüências e acidentes de percurso. Os acontecimentos poderiam motivar a busca de novos caminhos. Quando não há saída imediata, é importante a busca de meios para expor o pleito da classe, sem incidir na ilegalidade.
Ficamos a imaginar como seria recebida pela população, a proibição do Chefe do Executivo fazer greve, dos parlamentares fazerem greve, de magistrados fazerem greve, etc. Torna-se lógico que não seria pertinente termos tal norma em nosso ordenamento, mesmo porque tais representantes dos poderes da União apresentam formação profissional, técnica e amadurecimento suficientes para garantir uma conduta de efetivo trabalho em prol do país. Nessa lógica de pensamento, resta a dúvida de vedar algo que não seria o normal na conduta do militar. Por que proibir algo que o militar aprende a repudiar, desde seus bancos escolares?
O que faz o militar cumprir e fazer cumprir a lei é sua formação ética, crença nos valores e princípios maiores do país, desprendimento de seus ganhos pessoais em prol da coletividade, e respeito ao seu dever. Não exatamente a norma escrita. Acreditamos que o responsável por tal norma perdeu grande oportunidade de se preocupar em registrar, de fato, os princípios norteadores dos limites da atuação do Estado e as garantias do cidadão brasileiro.
A seguir veremos se é possível identificar exemplos de experiências, em torno de atividades protetivas de direitos sociais de militares, através de modelos de associações civis, em outros países.
1.4 Direito Comparado
Pesquisa realizada através da rede internacional de computadores nos mostra alguns exemplos de países que consagraram a instituição de um sindicato voltado aos servidores militares. Em nosso estudo, foram excluídos os países de origem comunista, como a China e Rússia, que mantêm partidos comunistas muito fortes e possuem sindicatos voltados mais para a prática da política partidária, do que propriamente revendo direitos trabalhistas, o que, aliás, é proibitivo naquela filosofia ainda radicalizada para o poder estatal. Desta forma, sobram alguns modelos democráticos a serem analisados.
Em consulta a um site da internet, específico em estudos de assuntos estratégicos militares, “Online Information of Defense Community”, visto no endereço http://www.dtic.mil/dtic, podem-se encontrar diversos estudos sobre o tema relativo a sindicatos, nos Estados Unidos da América.
De acordo com estudos vistos nesse site, a questão da sindicalização dos militares já era alvo de polêmica nos Estados Unidos, desde 1970, com a preocupação de quebra de disciplina na tropa, diminuição da autoridade militar, fonte dos recursos para o sindicato, sobrecarga no orçamento do governo, etc.
Até hoje, segue em análise um projeto de lei no Congresso Americano, para regularizar a atividade sindical também para os militares. A minoria da população aprova, segundo estudos vistos nesse site de informação, no dia 14 set. 2008, e o Congresso Americano, a Suprema Corte e o Departamento de Defesa ainda têm restrições ao assunto. Mesmo nos EUA, a pergunta dos defensores do sindicalismo militar é a mesma: por que proibir o militar de usufruir de benefícios garantidos pela constituição aos demais servidores federais?
Nesta mesma página, é alvo de comentário que, pelo menos em dois países europeus, a experiência com o sindicato militar apresentou bons resultados, na Noruega e na Alemanha, muito embora a fase alemã fosse herdada da Alemanha Oriental, que já possuía tal sindicato antes da unificação. De qualquer forma, as instituições mantêm a conduta de defender interesses dos militares e de seus familiares, sempre que a legislação específica fere seus direitos fundamentais.
Uma experiência que não se mostra muito positiva seria vista em Portugal, porquanto a calorosa disputa política e “troca de farpas” com o partido comunista permitem comentários jocosos com o sindicalismo de militares, até mesmo avaliando negativamente suas possíveis passeatas. No endereço eletrônico ‹http://www.mwglobal.org/ipsbrasil.net/nota.php?idnews=1032›, acessado em 14 set. 2008, pode-se verificar manifestações da necessidade de uma associação para defesa dos interesses da categoria militar, uma vez em gradual decadência social e política, conforme visto a seguir:
“Passadas três décadas, os militares lusitanos se sentem maltratados pelo sistema democrático por eles instaurado e tutelado durante sua primeira década de existência. Dez anos depois do levante que depôs a ditadura corporativista (1926-1974) de Antonio de Oliveira Salazar-Marcello Caetano, foi dissolvido o chamado Conselho da Revolução do Movimento das Forças Armadas (MFA) e desde então a condição militar foi gradualmente se degradando.”
Nesse mesmo endereço eletrônico, também é possível verificar comentários positivos acerca da atuação de um sindicato militar, em outro país europeu, no seguinte teor:
“O último caso registrado fora de Portugal ocorreu na Holanda em 2003, quando os uniformizados se manifestaram nas ruas em um contexto permitido pela legislação. As associações sindicais dos militares holandeses se opunham a um novo decreto que estabelecia que o pedido de aposentadoria só poderia ser feito aos 58 anos de idade, contra os 54 que estavam em vigor. O caso acabou em um compromisso que fixou em 56 anos o direito à aposentadoria.”
Em conclusão à possibilidade e viabilidade deste instituto, acredita-se que haveria uma fase de adaptação ao Brasil, que não levaria menos de dois mandatos sindicais, mas o país aproveitaria o amadurecimento do assunto, visto que há exemplos ruins e bons no contexto mundial, e pode ser adequado um modelo às necessidades de nossos militares, e à realidade econômica e política.
Se observarmos os modelos adotados no mundo ocidental, podemos verificar que a maioria dos países ainda se baseia nos modelos conservadores, sem associações sindicais que possam defender pleitos específicos dos servidores militares.
As informações noticiadas pela imprensa, rotineiramente, nos mostram um quadro na América do Sul ainda suscetível à participação coercitiva das Forças Armadas, nos destinos políticos da nação. Os governos latinos se apóiam na demonstração de força, principalmente nos países em que a democracia não se solidificou totalmente. Em muitos países da América do Sul fica difícil verificar a participação efetiva e livre de sindicatos de trabalhadores, quanto mais de servidores públicos. Os conflitos envolvendo polícia e trabalhadores são corriqueiros entre os países da América do Sul, de língua espanhola.
A análise dos dados disponíveis do Velho Mundo ocidental, por meio de consulta na internet, nos mostra um sentimento de adaptação das associações, para sedimentar institutos que permitem voz mais ativa da categoria militar. A Europa demonstra mais amadurecimento para tais evoluções, embora encontremos a nação portuguesa com exemplo ainda primário de atuação sindical para os servidores militares.
Mesmo onde consta um rol interessante de estudos, em torno da viabilidade de sindicato para os servidores militares, os Estados Unidos da América demonstram insegurança para tomar plenamente esse rumo social. Na verdade, o que se observa é uma questão de fazer valer a democracia e igualdade de direitos constitucionais para todos os cidadãos, uma vez que todos os servidores federais são amparados por sindicatos, mas ainda há resistências na sua efetivação, muito provavelmente pela questão orçamentária. Nesse ponto, a situação americana é idêntica à brasileira.
A diferença crucial reside no apoio disponibilizado ao militar. As Forças Armadas americanas detêm orçamentos consideráveis para a sua operação e manutenção. Se o militar não percebe salários vultosos, em comparação com a classe média americana, há toda uma estrutura de suporte ao bem estar de sua família e à atividade militar, além de uma fonte orçamentária considerável, para as atividades operacionais, o que mantém o moral da tropa sempre em alto nível.
Só para que se possa ter uma noção de comparação, os militares de carreira norte-americanos têm sempre a opção de morar dentro das bases, onde estão servindo, em casas ou numa espécie de hotel-alojamento. Dentro das bases há todo o tipo de comércio e serviços que se possa imaginar, dentre os quais supermercados e lojas de departamentos. Em nenhum destes estabelecimentos, os quais só se podem freqüentar com a carteira de militar, é cobrado qualquer tipo de imposto. Portanto as mercadorias e serviços são bem mais baratos. Os hospitais estão aparelhados e preparados para prestar todo tipo de tratamento médico e os remédios são gratuitos.
No contexto geral, o que se verifica é que, dentre os países que não vislumbram a adoção imediata do sindicato para a categoria militar, ou não precisam, no momento, ou não têm condições políticas de tal evolução. Onde se enquadraria o Brasil?
Enquanto se torna visível uma mudança de mentalidade em algumas partes do mundo, principalmente a partir da Europa, até o momento, verificamos o Brasil na retaguarda da política administrativa dos seus servidores, fruto de uma constituição introvertida, resistente à absorção de novas teses. Se nada for feito de concreto, asseguramos que alguns prejuízos se tornarão irremediáveis, ou, no mínimo, de grande dificuldade para uma solução espontânea.
2. PREJUÍZOS POTENCIAIS – VISÃO PROSPECTIVA
Nesse momento do trabalho, registramos um exercício de projeção das condições do militar, e conseqüentemente da Força Armada, para um futuro próximo, com base em conhecimento adquirido ao longo de mais de trinta anos de serviço à Força Aérea Brasileira.
Quando falamos de Constituição Federal, logo nos vem à mente a palavra “cidadania”, mesmo porque enxergamos um nacional exercendo seus direitos, convivendo harmoniosamente no seu país. Cidadania compreende a integração do homem na sociedade, o que exige seu acesso a direitos, bens e valores, equiparando-o a todos os iguais.
Se uma classe tem uma missão de superior importância para o país, a própria defesa do território e sua integridade, se esta classe encontra limitações a seus direitos sociais, de forma extremamente desproporcional, e não se visualiza uma solução nem em longo prazo, há que se esperar a dissolução da categoria, ao patamar de meros fantoches, liderados imaginariamente.
A saída de militares das fileiras da Força, para a iniciativa privada, sempre foi considerada uma questão cíclica, que sofre influência do comércio interno brasileiro, e já é tida como administrável pelo Comando da Aeronáutica. Tendo em vista a formação técnica do profissional militar, baseada em boas escolas de formação e forjada em rígida disciplina, acrescida da sua experiência adquirida ao longo da carreira, há forte possibilidade de que alguns profissionais da caserna optem por tentar um vínculo empregatício com empresas que atuem na área de sua maior competência, ou aptidão.
A maioria esmagadora de oficiais e sargentos ingressou voluntariamente nas fileiras das Forças Armadas e deve cumprir um mínimo de 10 anos, após sua formação inicial, para que possa se desligar, sem ter que indenizar a União, mas sem perceber qualquer vantagem salarial. Após 20 anos de serviço, o militar pode tentar se desligar, proporcionalmente, a critério da Administração. Após 30 anos de efetivo serviço, o servidor militar pode solicitar sua passagem para a Reserva Remunerada, que significa a sua aposentadoria.
Só pequena parcela da tropa é formada pelos soldados alistados para o serviço militar obrigatório, que impõe apenas um ano de vínculo com a tropa, mas também não se reveste de grande investimento da Força, para sua manutenção técnica.
Provavelmente o desencanto, desgosto, sentimentos de injustiça, frustrações, baixo nível de incentivo, reduzida atividade operacional, e outras carreiras visualizadas fazem com que um grande número de profissionais não concluam o tempo máximo de suas carreiras, assumindo outro rumo nas suas vidas.
No exemplo específico da Força Aérea, conforme se apresente uma melhora na economia brasileira, o primeiro setor a sentir tal efeito é o de transporte aéreo. Com o incremento da economia, há aumento de circulação de bens, capital e serviços. Como o transporte aéreo é o mais eficiente para o tipo de carga, as empresas aéreas incrementam o uso de suas aeronaves, e mais tripulações são necessárias. Como a formação de pilotos e mecânicos, especializados em aviões e helicópteros, é uma formação expendiosa e demorada, as empresas aéreas se mostram aptas a receber os profissionais oriundos da aviação militar, que se adaptam facilmente à produção, por força da formação ética e disciplinada.
A partir da crise nas operações militares, no início dos anos 90, quando se verificou forte diminuição do orçamento necessário para suportar o emprego da aviação, com queda em gastos com combustível e suprimento para manutenção, afetando o treinamento aéreo e as operações, muito dos militares se viram desmotivados, pela falta de prática no vôo, o que agravava a situação, já debilitada rotineiramente pelo contexto dos baixos salários recebidos e tradicional rigidez nas exigências da vida em caserna.
Notou-se, a partir de 1994, um aumento significativo de requerimentos para realizar concurso público, na área federal ou distrital, o que era prática pouco comum. Sempre existiu uma regra administrativa de que o militar deveria solicitar autorização para realizar concurso público, o que inibia, pela visão contrária de chefes e comandantes, tal prática. Com o descontentamento, diante da rotina de trabalho desgastante, os aviadores com pouca atividade aérea, sem compensação financeira adequada, e tendo que se preocupar com o suporte de uma família, com gastos normais de moradia, vestimentas, educação, alimentação, lazer e atividades esportivas, os servidores militares começaram a “criar coragem”, para manifestar tal interesse, publicamente.
Naquele instante, a partir do momento em que se abria nova porta de saída, a Força começava a deparar com a evasão de profissionais militares, dentre oficiais (nível superior) e graduados (nível técnico), não só para as empresas aéreas comerciais, mas também para órgãos da própria estrutura do Estado, nas vagas no Legislativo ou Judiciário, atraídos por melhores salários, visibilidade de uma carreira, rotinas mais flexíveis de trabalho ou outras facilidades estruturais, como pouca movimentação, moradia em cidades específicas, e outras facilidades.
Caso nenhuma solução, com o devido planejamento em médio e longo prazo, seja efetivado, a saída de militares das Forças Armadas será cada vez mais significativa, e as organizações verão as lacunas de pessoal dos seus efetivos agravadas.
2.1 Representação Política
Os militares não têm representação efetiva dentro das Casas Legislativas. São poucos os representantes parlamentares oriundos ou simpatizantes com a causa da caserna. Pela imprensa de um modo geral, podem-se ouvir manifestações de diversas bancadas (ruralistas, indústria, agricultores, Amazônia, Nordeste, etc.), por ocasião de reportagens conduzidas naquele âmbito específico, mas quanto à manifestação de parlamentares de origem militar, encontramos apenas vozes abafadas, às vezes em discursos isolados ou acalorados, mas sem eco no plenário.
A atividade militar também não encontra reconhecimento no parlamento brasileiro. É possível verificar especificamente no texto da Constituição de 1988, que diversos artigos se preocupam em evitar qualquer chance de nova tomada do poder, pelos militares, e com a confirmação de que não haja deportação de brasileiros.
Até os dias atuais, paira sobre a mente dos parlamentares, o temor de uma interferência militar na direção do país, muito embora os próprios militares não demonstrem encontrar razão para que isso ocorra. A própria estada à frente do governo brasileiro causou mais desgaste à confiança popular nas Forças Armadas, do que benefício no distanciamento com governantes civis incompetentes. É sempre uma máxima o dito popular que alerta ser o político ardiloso uma figura permanente na condução do país, não importando quem esteja à frente.
O que é visto em toda a mídia é que os políticos mais eficazes são aqueles com mais idade, com mais experiência de Casa Legislativa. O ex-Deputado Ulisses Guimarães gostava de falar que o Congresso Nacional seria como um tabuleiro de xadrez e todos os movimentos deveriam ser bem pensados. O militar, salvando-se raríssimas exceções, não tem formação política para atuar eficazmente no meio partidário e político. Sérgio Boechat foi muito feliz ao confirmar essa comparação da prática política com a atividade esportiva, que confirma a necessidade de conhecimento e habilidade[21].
‘Nada se assemelha mais à política que o jogo de xadrez. Começa pela origem. Não se sabe, ao certo, a origem do xadrez. Já foi atribuída a sua invenção aos chineses, aos egípcios, aos persas e até mesmo a Aristóteles e ao Rei Salomão, mas a história não confirma nenhuma dessas lendas. Da mesma forma, em relação à política. Não se sabe quem começou, mas a encontramos em todos os momentos históricos desde os primórdios da humanidade e até mesmo nas páginas bíblicas. Os diálogos de Moisés com o Faraó são belos exemplos de uma negociação política.
O jogo de xadrez exige inteligência e o mesmo ocorre na política, onde os menos inteligentes não se destacam e por isso não passam de meros figurantes. E como temos figurantes no jogo político! No jogo de xadrez as jogadas têm que ser feitas dentro do tempo estabelecido. Na política, também existe um “timing” e quem não o conhece ou não o respeita, ganha o estigma de perdedor.
Tancredo Neves não era um grande administrador, nem estava entre os melhores oradores do Congresso Nacional, mas tinha um “timing” político perfeito e em conseqüência (sic) disso foi quase tudo o que quis ser na política, menos Presidente, porque daquela vez prevaleceu o “timing” divino.
No jogo de xadrez existe uma previsibilidade de jogadas e o bom jogador prevê a jogada do seu oponente e as próprias jogadas com algumas rodadas de antecedência. Na política, também tem que existir essa previsibilidade e isso faz a diferença entre o bom e o mau político.” (Grifou-se).
A pequena participação efetiva de representantes da classe militar, na Casa Legislativa do país, vai dificultar a aprovação de mudanças na própria Constituição Federal brasileira, levando-se em conta o processo de aprovação de uma Emenda Constitucional, em face da necessidade de compor um mínimo de três quintos de votos, em dois turnos, na Câmara e no Senado Federal. Por tudo que já foi levantado nesse trabalho, não se visualiza tal possibilidade, em face da falta de vontade política, desaprovação dos militares mais antigos e ausência de quem possa trabalhar o tema, a favor da categoria, junto aos políticos brasileiros.
2.2 Carreira Militar
O processo de promoção dos oficiais militares, considerados formadores das elites das Forças Armadas, pela sua especialização em liderança e comando, se mostra pautada no critério de “Antiguidade”, o que ocorre dentro de um tempo mínimo passado em cada posto, usado nos primeiros postos do oficial (Tenente e Capitão), por critério de “Merecimento”, para os postos de Major, Tenente-Coronel e Coronel, e sendo efetivada por critério de “Escolha”, a passagem do oficial aos postos de Oficiais-Generais. Esta última promoção é indicada pelo Alto Comando das Forças Armadas e homologada por ato do Chefe do Executivo[22].
Apesar de ser ato já tradicional, sofre a discrição do Alto Comando das Forças Armadas, onde raramente uma sugestão deste escalão é modificada pelo Chefe do Executivo, mas vive sob a desconfiança daqueles que não foram agraciados pela promoção, uma vez que é possível considerar que o processo sofra interferências políticas prévias, nas indicações à missão no exterior, comissões importantes e comandos, além destas promoções ao “generalato”.
Como nesse exemplo, é possível observar que, apesar de ser um procedimento tradicional e discricionário das Forças Armadas, e no caso, da Aeronáutica, por uma assessoria do Alto Comando da Aeronáutica, há sempre um fio de desconhecimento e crítica ao processo, por parte dos demais integrantes, principalmente porque chegam a este filtro muitos oficiais que já atingiram o ápice do treinamento, experiência e formação estratégica, são detentores do excelente conceito funcional e operacional, e aguardam uma oportunidade de passar a integrar a posição de direção da Força. A frustração dos oficiais que não foram contemplados com a escolha ao “generalato” é sempre desgastante para a credibilidade da Organização, apesar de se ter a certeza da sua probabilidade, há a certeza da insatisfação, pelos que não foram agraciados.
A definição da indicação para militares servirem temporariamente em missões no exterior tem sido revestida de forte aspecto financeiro, uma vez que resulta na percepção de salário em moeda americana, segundo valores definidos internacionalmente. A missão no exterior deveria ser considerada como estratégica, uma vez que mantém um oficial representando o Brasil, em diversas nações, pela quase totalidade de países do mundo. Infelizmente, esta finalidade se efetiva raramente, tornando-se mais um oficial de Relações Públicas, do que um diplomata.
O salário de um coronel aviador, que sirva no exterior, em embaixadas, adidâncias ou comissões, com duração de dois anos, está baseado na faixa de U$ 8,000.00 (oito mil dólares) mensais, portanto muito superior ao padrão nacional, e mesmo ao padrão americano médio.
Conforme a condução de sua rotina de vida e gastos durante a missão, o militar em missão no exterior poderá ter economizado numerário suficiente para aquisição de seu imóvel próprio, ao retornar ao Brasil, o que seria muito difícil para um militar que não teve tal oportunidade, com apenas sua remuneração. Essa diferença causa muita insatisfação no seio da tropa. Embora tal oportunidade esteja disponível para todos os militares do mesmo quadro e posto, é notório que aqueles militares que trabalham próximo ao poder decisório da Força partem para a disputa com enorme vantagem.
2.3 Remuneração Militar
A política salarial adotada para os militares sempre foi reflexo de interferência política no Executivo, quando o ideal seria o resultado de receita pública e valorização do profissional, pela sua importância no contexto nacional. Durante a época dos governos militares, os reajustes salariais ocorriam em épocas determinadas, geralmente no começo do ano, mas raramente compensava a inflação oficial do ano anterior, que já sofria influência minimizadora do governo. Estes dados podem ser vistos e analisados nos quadros comparativos disponibilizados nos sites do órgão de pagamento de pessoal do Comando da Aeronáutica[23].
Recentemente, os servidores militares foram contemplados com a benesse do Poder Executivo, materializado em reajustes salariais de forma parcelada. Não cabe uma crítica ostensiva à política do governo brasileiro, pois na nossa sincera opinião, o povo tem o governo que merece e os militares têm o respeito que lhes é devido pelo governo. É uma questão de saber colocar prioridades e necessidades, demonstrando a importância da categoria nos objetivos nacionais. Fora disso, tudo é mera especulação de uma cultura de terceiro mundo, irrigada por discurso populista.
Voltando ao ponto salarial específico, por exemplo, em meados de abril de 2004, o salário líquido de um oficial superior, ou seja, o último posto normal da carreira de um Aviador, correspondia o salário líquido pouco superior a R$ 5.500,00 (cinco mil e quinhentos reais), considerando-se os descontos básicos. Por ocasião desta mesma referência temporal, um co-piloto de helicóptero, em início de carreira, no primeiro mês de salário, em uma empresa comercial de Táxi Aéreo, receberia em torno de R$ 5.200,00 (cinco mil e duzentos reais).
Na ocasião, a legislação vigente obedecia aos parâmetros definidos na Medida Provisória nº 2.215-10, de 31 de agosto de 2001, que dispunha sobre a reestruturação da remuneração dos militares das Forças Armadas, alterando as Leis nº 3.765, de 4 de maio de 1960, e 6.880, de 9 de dezembro de 1980 (Estatuto dos Militares).
Não há motivos para desejar comparar a iniciativa privada, uma vez que esta busca o lucro, incentivando a produção de seus empregados, com o serviço público, que depende da única fonte de receitas oficiais, mas gasta com pessoal de forma heterogênea. Não causa qualquer espécie, o fato de que as arrecadações de impostos sempre aumentem a capacidade orçamentária do Estado, porém não reflitam tal investimento nas despesas de pessoal, como pode ser visto na reportagem abaixo[24], publicada na Folha Online.
“O governo estima para o próximo ano receitas líquidas de R$ 662,3 bilhões, um aumento de 12,5% em relação a 2008. A arrecadação de impostos prevista é de R$ 288,7 bilhões, um aumento de 16,6%. Das contribuições sociais, o governo terá mais R$ 222 bilhões (alta de 10%).
Os impostos de contribuições arrecadados pela Receita Federal, exceto contribuição da Previdência, vão aumentar sua participação no PIB (Produto Interno Bruto), de 15,62% para 16,05% (esse número não mede a carga tributária, que está em mais de 35% do PIB).
Estão previstas ainda R$ 776 bilhões em receitas financeiras e outros R$ 146,5 bilhões para transferências a Estados e municípios.” (Grifou-se).
Acredita-se, ou melhor, sonha-se que o ideal de patamar salarial, para o nível dos oficiais, poderia estar em uma base comparável com gerentes do legislativo e judiciário, mas isso está muito longe da realidade brasileira, uma vez que o Poder Executivo não tem a tradição de ofertar boas remunerações e, quando muito, se utiliza do artifício da nomeação dos cargos em comissão do Grupo – Direção e Assessoramento Superiores – DAS, para permitir certo adicional para as atividades consideradas mais importantes, o que raramente inclui servidores militares.
Mesmo assim, acreditamos que o problema maior está assentado nos salários percebidos pelos graduados, todos de nível médio, porquanto têm obrigações, rotinas, importância na manutenção de aeronaves e condutas semelhantes a todos os militares, necessidade de sustento das suas famílias, educação, alimentação e moradia, como qualquer trabalhador, mas as remunerações estagnaram em faixas salariais que foram consideradas a bem pouco tempo como na faixa de “padrão de miséria”.
O aumento é sempre linear, incidindo sobre o posto mais elevado das Forças Armadas, o Oficial-General, nos moldes previstos na Lei nº 6.880, de 9 de dezembro de 1980, que dispõe sobre o Estatuto dos Militares, modificada por força da Medida Provisória nº 2.215-10, de 31/8/2001[25], que prevê uma proporcionalidade entre os postos e graduações, de forma que o aumento se torna padronizado para todos os níveis, na maioria das vezes em que ocorre, mas não resolve o problema nunca, pois, quando no máximo, recoloca a remuneração próxima à perda inflacionária.
Hoje, um cabo pode estar recebendo pouco mais de R$ 1.500,00, enquanto um oficial general pode estar entre R$ 10.000,00 e R$ 11.000,00 mensais. A posição defendida nesse ponto é de que o General detém muita responsabilidade e poderia atingir um patamar bem superior, próximo, talvez, aos R$ 19.000,00, enquanto o nível técnico não poderia perceber menos do que R$ 3.500,00, o mesmo valor que é parâmetro inicial de várias carreiras da União.
A discriminação salarial demonstra oficial agressão à dignidade, à oportunidade de igualdade de condições, à acessibilidade de bens, valores e serviços, por parte dos servidores militares, diferenciando-o do cidadão comum, o que é protegido pela Constituição Federal, vinculando os atos administrativos, por parte do Estado.
2.4 Condições de Trabalho
Os militares têm à disposição todos os meios materiais e humanos para o desempenho de suas atribuições? Há recursos? Os equipamentos são adequados ao cumprimento da missão? Resta o sentimento de que sua família está residindo adequadamente, com segurança, apoio de saúde, meios para estudo e alimentação?
O art. 142, da Constituição Federal de 1988, prevê que as normas gerais para emprego e preparo das Forças Armadas seriam estabelecidas em lei complementar, e tal determinação está registrada na LC nº 97, de 9/6/1999, com o seguinte teor:
“[…] CAPÍTULO IV – DO PREPARO
Art. 13. Para o cumprimento da destinação constitucional das Forças Armadas, cabe aos Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica o preparo de seus órgãos operativos e de apoio, obedecidas as políticas estabelecidas pelo Ministro da Defesa.
§ 1o O preparo compreende, entre outras, as atividades permanentes de planejamento, organização e articulação, instrução e adestramento, desenvolvimento de doutrina e pesquisas específicas, inteligência e estruturação das Forças Armadas, de sua logística e mobilização. (Incluído pela Lei Complementar nº 117, de 2004). […]
Art. 14. O preparo das Forças Armadas é orientado pelos seguintes parâmetros básicos:
I – permanente eficiência operacional singular e nas diferentes modalidades de emprego interdependentes; […]”
Levando-se em consideração a legislação existente, resta a impressão de que, se a Força Aérea não está pronta a cumprir sua missão, ou há omissão no preparo e falta planejamento, ou é necessário pouco orçamento para a defesa de um país de dimensões continentais. Se há a ousadia de se imaginar que está apta a defender o território, não há como imaginar a maneira que a Força Aérea cumpre sua missão, uma vez que há falta de pessoal e os equipamentos estão sempre obsoletos, pelo menos na maioria dos exemplos.
Há alguns anos atrás, a frota de aeronaves da Força Aérea Brasileira estava baseada em aeronaves das décadas de 60 e 70, com a Aviação de Caça, responsável por defender o Espaço Aéreo brasileiro, voando velhos Mirage franceses, ou F-5 Tiger americanos, um pouco menos velhos. A única fatia da aviação militar que recebia alguma evolução tecnológica, com equipamentos mais modernos, era o transporte de autoridades civis, passageiros e carga.
O Grupo de Transporte Especial, sediado na Base Aérea de Brasília, sempre conseguiu voar mais, a cada ano de operação, devido a sua missão de transportar Ministros e Secretários, independente do partido político à frente do governo brasileiro, enquanto que esquadrões operacionais de “Busca e Salvamento”, ou da “Aviação de Caça”, classificados como “operacionais”, mal conseguiam ter orçamento para custear o treinamento dos seus pilotos, ou para realizar a manutenção das aeronaves, dentro de um parâmetro ideal.
A partir do final dos anos 90, o Comando da Aeronáutica intensificou a modernização e aquisição de aeronaves mais modernas, e hoje mantém alguns projetos desenvolvidos por empresa nacional ou em escala bi-nacional, porém ressente de um efetivo de oficiais em número ou com experiência para o adequado acompanhamento. Colabora para o quadro inadequado de recursos disponíveis o fato de que o Comando da Aeronáutica tem sua missão definida na Constituição Federal de 1988, principalmente no tocante à defesa do Espaço Aéreo, mas não tem os meios materiais para o cumprimento de sua missão, com carência de radares, operadores, pilotos, aeronaves e suprimento.
Mais uma vez o Estado releva a proteção de garantias e direitos fundamentais ao militar, por exagerar na proteção do cumprimento da missão atribuída às Forças Armadas. O servidor militar observa, assim, um tratamento diferenciado, por parte da União, atingindo sua dignidade e igualdade para com outros servidores, o que atenta contra princípios protegidos e seguidos pela Constituição Federal.
Se olharmos friamente para o contexto do servidor militar, sua rotina normal de expediente, tirando-se por média a atividade de uma Base Aérea, assemelha-se a uma grande empresa de transporte aéreo, com suas áreas de manutenção, operação de aeronaves, segurança interna e administração, só que possui uma missão infinitamente mais crítica, com nível de responsabilidade da dimensão do país, por ser incumbido da defesa da pátria, e ser esta a sua área de atuação. Todo o seu encargo é sustentado pelo amor e respeito ao seu país e ao cumprimento da missão, mas não há indício de contrapartida pelo Estado, ou respeito pelo seu papel constitucional.
“O militar está à disposição do Estado 24 horas por dia. Não ganha hora extra. Não escolhe função. Paga imposto de renda descontado em folha de pagamento. Se brigar com o chefe, está se arriscando a ir para a cadeia. Se abandonar o emprego é desertor. Não pode ter outro emprego com carteira assinada e direitos trabalhistas. Paga pela farda que usa. Não pode fazer greve nem manifestação em prol de suas reivindicações e direitos. Não pode negociar salário por acumular funções. Cumpre horário de trabalho rígido.
Os militares são mandados a morar nos mais longínquos e inóspitos lugares do País e vão, sem poder reclamar. O sacrifício de suas famílias com as constantes mudanças de endereço não tem dinheiro que pague. Todos ficam prejudicados: no desempenho escolar, na continuidade de relacionamentos de amizade e namoro, nas tentativas de desenvolver carreira própria, no caso das esposas.
Hoje, os militares estão pagando planos de saúde particular (os que conseguem) porque os hospitais militares estão “desaparelhados” e sem bons profissionais. A população e as tropas aumentaram, mas não foram construídas novas unidades. Gostaríamos muito de saber se, no caso de uma guerra, que Deus nos livre, para onde é que mandarão os militares feridos e que profissionais irão atendê-los. Será que os planos de saúde e os hospitais públicos terão condições de atendê-los e ainda pagar as contas?
Há 20 anos, o salário dos militares dava para pagar as despesas e necessidades básicas de uma família de classe média (em todas as suas diferentes categorias – alta, média, baixa). As esposas trabalhavam para aumentar a renda e proporcionar acesso a uma vida mais confortável, com maiores oportunidades em cultura, lazer e atividades esportivas. Numa sociedade de consumo capitalista, infelizmente, o dinheiro é fundamental para garantir a formação de adultos bem informados, capacitados e cultos. As exceções só confirmam as regras.”[26]
Este texto foi extraído de um arquivo de apresentação de slides, veiculado recentemente através do site de relacionamento da “Turma 74”. Como foi explicado, o seu autor é desconhecido, até mesmo porque ainda há um respeito à rígida legislação militar que pode, a critério do Comando da Aeronáutica, responsabilizar e punir o seu autor, por alguma avaliação de incitamento da tropa.
O texto, apesar de colocar certa emoção, demonstra o nível de insatisfação dos servidores militares, para com a situação de descaso com as necessidades da categoria, assim como das condições de trabalho e de apoio ao profissional. Esta preocupação não demonstra desrespeito para com a Força, uma vez que traduz o sentimento de busca do êxito no cumprimento de sua missão.
3. PROTEÇÃO NECESSÁRIA
Não há sombra de dúvida, com base nas atribuições previstas na Constituição Federal de 1988, e legislação complementar, que as funções exercidas pelas Forças Armadas são específicas e de suma importância para a preservação das instituições brasileiras e para o Estado, como um todo. É fato reconhecido por todos os doutrinadores, que as Forças Armadas necessitam proteção constitucional, e que suas garantias, por vezes, se mostram com tratamento diferenciado do cidadão comum.
Uma vez considerando que os princípios norteadores da atividade militar, exclusivos que são das Forças Armadas, não estariam sendo violados por excesso de precaução política, seria possível imaginar que estariam sendo colocados de forma desproporcional? O zelo estaria justificando as limitações sócio-políticas? Há como permitir a preservação dos direitos e garantias fundamentais, também do militar, trazendo sua identificação política ao encontro do cidadão comum, sem possibilidade de perder o controle da estabilidade interna, sem afetar a disciplina nas Forças Armadas?
3.1 Princípios Fundamentais
É notório e amplamente reconhecido o avanço social da nossa legislação maior, por conta da evolução social apresentada na promulgação da Constituição Federal de 1988. Apesar de ser considerada, ainda, uma legislação pouco receptiva ao direito internacional, talvez por falta de aproximação do Ministério das Relações Exteriores com o Congresso Nacional, já encontramos em nosso ordenamento dispositivos que prevêem a recepção de normas e tratados internacionais, e enaltecem as garantias e direitos fundamentais, como os registros no art. 5º, caput, e §§ 3º e 4º da Carta Magna:
“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: […]
§ 2º – Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.
§ 3º Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004). […]”
O campo dos direitos humanos, que muitas vezes se confundem com direitos fundamentais, é o ramo, dentro dos direitos positivados no Brasil, o mais criticado internacionalmente. Infelizmente, ainda somos uma Nação que pouco esforço despende no sentido de tornar mais igualitária a acessibilidade a bens e direitos, para todos os seus cidadãos.
Os direitos fundamentais cumprem, no dizer de J.J. Canotilho,
“…a função de direitos de defesa dos cidadãos, sob dupla perspectiva: norma de competência negativa para o poder público e o poder de exercer positivamente direitos e exigir omissões”…[27]
A Constituição Federal atribui maior importância a determinados valores, que são registrados e apontados logo no início de seu texto, no artigo 5º, em vários de seus incisos, tendo como alicerces a soberania, a cidadania, a dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa e o pluralismo político.[28] Se observarmos bem, será possível imaginar que muitos fundamentos protegidos na Constituição Federal não são aproveitados plenamente aos servidores militares, apesar do grande avanço, em termos de direitos sociais.
Como já devidamente comentado no início desta pesquisa, o servidor militar se reveste de uma atividade bem específica, detentor que é de uma missão maior, no contexto defensivo do patrimônio brasileiro. Assim, é esperado que o militar tenha uma proteção legal, prevista na Constituição Federal, o que se apresenta, segundo nossa avaliação, com certas restrições políticas, consideradas, no mínimo, desproporcionais para com os direitos auferidos.
A norma é um instrumento limitador da atuação dos indivíduos, sob sua égide. Mesmo o Estado vê seus atos delimitados pela norma constitucional. Aliás, o constitucionalismo moderno surge, ao final do século XVIII, justamente para por fim ao absolutismo reinante, indiscriminadamente, em todas as nações da época[29].
Ao legislar, incorpora-se a capacidade de impor limites ao cidadão e ao Estado, buscando o “dever-ser”, mas tal poder de limitar tem sua própria limitação, que esbarra no núcleo essencial dos direitos fundamentais. O legislador deve assegurar proteção suficiente, no mínimo, a este núcleo, como base dos direitos fundamentais. É o chamado “limite do limite do legislador”.
Vejamos o pensamento reinante, dentre os principais doutrinadores constitucionalistas, que versam sobre o tema.
Segundo interpretação de nossa Carta Magna, as relações entre o Estado e o cidadão obedecem ao princípio da aplicabilidade imediata, quantos aos direitos fundamentais, mudando o foco da subjetividade para a objetividade, uma vez que busca a idéia de valor, saindo do foco do homem para observar o direito em si, in verbis, “…§1º – As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata…”.
Nesse momento da análise, podemos verificar que os direitos fundamentais têm peso, mesmo isolados, no julgamento de lides que encontram o Estado em um dos pólos. Por exemplo, somente com base no devido processo legal, é possível interferir em uma licitação pública. Não se fazem necessários que outros ingredientes estejam presentes. O mesmo seria possível, só com base na moralidade administrativa, por exemplo, por ser um princípio norteador dos atos do administrador público[30].
Quando ocorre a colisão entre dois ou mais direitos fundamentais, o que pode ser observado mesmo de forma aparente, em um caso concreto, haveria preferência de um direito fundamental, em detrimento de outro. Nesses casos, deve-se observar e ponderar sobre a necessidade, adequação e proporcionalidade da adoção de um valor, em relação a outro direito fundamental.[31]
Pode-se, em verdade, limitar um direito fundamental, mas é mandatório preservar o núcleo essencial do princípio colocado em segundo plano, e em última instância, tal essência seria definida no próprio Supremo Tribunal Federal, caso não haja consenso em qualquer fase possível anterior. Apesar de não ser unânime no campo doutrinário, mesmo porque há teorias diferentes para o fundamento do princípio da proporcionalidade, resta majoritário que este se situa no âmbito dos direitos fundamentais.[32]
Partindo da teoria para a prática, o que se observa com os servidores militares, no campo constitucional, do ponto de vista dessa pesquisa, seria a existência de um excesso de zelo pela segurança de suas atribuições, com controle demasiado de suas atividades, ainda fruto da insegurança política histórica. Com toda a certeza, há uma corrente política que prefere manter o servidor militar sob “rédea curta”, na expressão muito utilizada na equitação.
Sem qualquer receio de cometer possível erro de avaliação, pode-se inferir que o legislador, uma vez investido do poder constituinte originário, exerce uma limitação considerável sobre a atuação política da classe militar, garantindo-lhe determinados direitos, mas destinando outras garantias a um segundo plano. Todos os direitos fundamentais se encontram cobertos pelo artigo 5º, da Constituição Federal, em seus diversos incisos, protegendo pessoas naturais e jurídicas, no que couber, e de forma diferente o militar.
Segundo Roberta Carvalho, em seu roteiro, Direito Constitucional, 2008, da editora Fortium, “Todos os incisos do artigo 5º giram em torno de cinco núcleos essenciais: vida, liberdade, segurança, igualdade e propriedade” Observando tais núcleos, é possível verificar que o Estado induz ou permite prejuízo do exercício pleno de cada um desses núcleos essenciais, pelo servidor militar, como foi demonstrado em diversas passagens desta pesquisa.
3.2 Sindicatos e Associações
Independente de trazermos à tona a origem dos sindicatos no Brasil, uma vez que têm recente base legal, e registros históricos datados do final do século XIX[33], a pesquisa buscou exemplos atuais de associações representativas de parcelas importantes do serviço prestado ao cidadão brasileiro.
A associação profissional ou sindical tem seu amparo no artigo 8º, da Constituição Federal, com algumas observações normativas previstas em oito incisos, e o tema é regulamentado nos artigos 511 e seguintes da CLT – Consolidação das Leis do Trabalho, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1/5/1943, que apresenta todas as normas para sua regularização, estrutura e funcionamento.
As associações podem ser constituídas com várias finalidades, como, por exemplo, associações religiosas, científicas, profissionais, esportivas, etc. Os sindicatos só têm as categorias econômicas ou profissionais e, às vezes, na mesma categoria há a associação e o sindicato. A diferença fundamental é que a associação representa seus associados e o sindicato, além de representar seus associados, representa também a categoria, mas ambos são pessoas jurídicas de direito privado.
A título de exemplo, registramos umas das atribuições da associação sindical, prevista nos termos do artigo 513, letra “a”, da Consolidação das Leis do Trabalho:
“São prerrogativas dos sindicatos:
a) representar, perante as autoridades administrativas e judiciárias, os interesses gerais da respectiva categoria ou profissão liberal ou os interesses individuais dos associados relativos à atividade ou profissão exercida; […]”
Acreditamos que muitas iniciativas de se conduzir o engrandecimento de uma classe dependem da definição dos objetivos da instituição que conduzirá o pleito, aliado à participação ativa dos seus filiados. Muitos sindicatos e associações não recebem o devido valor, por causa dessa falta de credibilidade, e podemos observar mais facilmente os problemas envolvendo sindicatos, do que suas vitórias para os trabalhadores.
“A crise partidária caracteriza-se, basicamente, pela incapacidade dos partidos em filtrar as demandas e reclamos sociais e transformá-los em decisões políticas. Conforme já ressaltado, a crescente presença do Estado na ordem econômica e o crescimento da burocracia estatal terminaram por fazer dos partidos meros indicadores de burocratas para a ocupação de cargos de relevância e não mais verdadeiros defensores dos ideais populares pelos quais seus representantes foram eleitos.”[34]
Neste diapasão, tomamos como exemplo de associação que defende os interesses de uma classe, enfrentando os desafios inerentes a sua missão, a AMAGIS/DF – Associação dos Magistrados do Distrito Federal e Territórios. Apesar de possuir uma destinação diferente de um sindicato, faz o trabalho de valorização do filiado, estimulando o seu crescimento.
Podemos verificar a linha mestra de conduta da associação, conforme estipula seu estatuto, uma vez aprovado em assembléia:
“[…] OBJETIVOS
A Associação dos Magistrados do Distrito Federal e Territórios – AMAGIS-DF é uma sociedade civil, sem fins lucrativos, que tem por finalidade principal velar pela dignidade da magistratura, defendendo os interesses dos integrantes da carreira, de qualquer grau de jurisdição, sejam ou não associados.[35] […]”
Com toda certeza, pode haver crítica ao desempenho da associação, o que sempre é esperado em um universo democrático, mas há registro no seu site, do trabalho desenvolvido e das realizações de cada gestão, sofrendo o regramento do voto para formação de cada diretoria, a cada período.
A AMAGIS-DF, no desempenho de uma gestão, atua na realização de congressos relacionados com os problemas jurídicos e judiciários de interesse da carreira da magistratura, se mostra preocupada com uma eficaz administração, mantém e organiza a Escola da Magistratura, órgão interno, vinculado, supervisionado e subordinado à associação.
De acordo com seu estatuto, a associação atua na representação judicial e extrajudicialmente dos seus associados, na defesa de interesses e direitos coletivos ou individuais dos magistrados, garantias e prerrogativas. Pode-se verificar sua atitude de proteção dos direitos de cada filiado, mas há um cunho de aperfeiçoar o desempenho de cada magistrado, principalmente com o espírito de realizar um trabalho preventivo, qualificando a categoria.
Embora não possa ser provado o fato, não há como imaginar que a Associação dos Magistrados possa aprovar uma paralisação de atividades, por qualquer motivo que seja. Em última análise, é possível imaginar que a associação atue mais na preparação e qualificação dos magistrados, até repreendendo atitudes divergentes, do que propriamente protegendo seus filiados em uma redoma inviolável.
É exatamente isso que se espera da atuação de um sindicato ou associação de classe, ainda mais se o seu filiado for um servidor público, em face de buscar, por excelência, a prestação eficaz de serviço ao cidadão. Qualquer atitude que busque o crescimento e qualificação do filiado estará beneficiando a própria administração pública. Em última instância, quem se beneficia é o próprio órgão, e sua estrutura, que vê seu rendimento melhorar, na proporção em que melhoram as condições de trabalho e a preparação de cada servidor.
3.3 Sindireceita – Uma Visão no Serviço Público
Por ocasião da busca de um espaço para realizar o estágio em Direito, deparamo-nos com um convite a participar das atividades conduzidas no Sindireceita – Sindicato dos Analistas-Tributários da Receita Federal do Brasil, com sede na capital federal. Este está sendo um desafio de grande contribuição, uma vez que se registram mais de 2.000 (dois mil) processos, principalmente na área federal, com mais de 14.000 (quatorze mil) filiados, envolvendo pleitos de servidores públicos, o que permite um referencial aos direitos feridos pela classe.
A Receita Federal do Brasil tem sua base laboral em torno das atividades do Auditor Fiscal e do Analista-Tributário. Ambas as classes de servidores têm suas entidades sindicais, porquanto os analistas são oriundos dos antigos Técnicos do Tesouro Nacional, de nível técnico. Atualmente, o analista-tributário continua sendo um servidor público federal, da categoria funcional de nível superior, por força de Medida Provisória, desde 1999, e integrante da Carreira Auditoria da Receita Federal do Brasil.
Por uma questão de disputa pelo poder, frente às atribuições do cargo, os auditores nunca se mostraram satisfeitos com a elevação no nível dos analistas e há, até os dias atuais, uma verdadeira batalha entre as duas alas da estrutura da Receita Federal do Brasil: de um lado a Unafisco (Auditores) e de outro o Sindireceita (Analistas), mais por força de uma espécie de “ciúme funcional” dos auditores.
Hoje a Carreira Auditoria da Receita Federal do Brasil já completou 23 anos. Em 1999, a Medida Provisória 1.915-1 estabeleceu novas regras para o ingresso ao então cargo de Técnico. Naquele momento, só a força deste ato normativo fez com que fosse exigido o diploma para ingresso na carreira. A transformação dessa Medida Provisória em Lei ocorreu em dezembro de 2002, sob o nº 10.593, com o reconhecimento da qualificação da categoria.
As duas categorias possuem mesmo nível de escolaridade, realizam as mesmas atividades, pertencem à mesma Carreira, mas se encontravam em patamares salariais exponencialmente divergentes, quase dobrando o valor do analista, para o auditor. Mesmo a divisão da Carreira em duas representações sindicais é um fato que divide a força da categoria. Na Secretaria da Receita Federal do Brasil, a instituição de uma única e verdadeira Carreira só traria benefícios para a sociedade.
Todos os ganhos dos Analistas-Tributários foram conseqüências da atuação do seu representante sindical, que atua junto a parlamentares, rotineiramente, e mantém reunião com a própria Receita Federal do Brasil, Ministério da Fazenda e órgãos de planejamento do governo, para a busca de objetivos comuns e atalhos para os problemas da categoria.
Atualmente, o sindicado planeja atuar no estudo de apoiar ratificação de convenções e resoluções da OIT – Organização Internacional do Trabalho[36], do interesse da categoria, fazer gestão junto a parlamentares, para tentar aprovar substitutivo de Projeto de Lei, abrindo reexame de matérias, e propor debates com a Receita Federal do Brasil, sobre garantias de negociação.
O que se pretende enaltecer, com a demonstração das realizações deste sindicato, em especial, é o fato de que a direção da associação tem realizado um trabalho longo de valorização do seu filiado, o que deveria ser uma bandeira do próprio órgão, responsável pelo servidor. Se a Receita Federal do Brasil não toma as devidas providências para permitir condições de trabalho mais adequadas, o que resta demonstrado pelas vitórias do sindicato, existe um instituto que assume automaticamente tal papel.
Dessa forma, o servidor nunca se sentirá abandonado, desprotegido em sua missão. Se o Secretário da Receita Federal não pode vestir a camisa de defensor dos direitos do Analista-Tributário, uma vez que é indicado pelo “patrão-maior”, bastará não obstar que o sindicato da categoria tome a iniciativa de negociar isso.
4 ASSOCIAÇÃO SINDICAL MILITAR
Se hoje identificamos inúmeros problemas concretos e potenciais para a classe militar, encontramos também a grave ausência de um instituto que possa buscar a valorização deste servidor. Já ficou demonstrado que o perfil tradicional do militar não permite que se assuma a existência de deficiências na administração das Forças Armadas, o que nos induz a imaginar que uma associação independente possa assumir tal encargo, com certa isenção.
Diante do trágico envolvimento dos militares com os sindicatos brasileiros, normalmente temperados com greves, enfrentamento físico, agressões verbais, danos ao patrimônio, conforme testemunhado ao longo de nossa história, espera-se que haja grande resistência à projeção de um sindicato dos servidores militares, mesmo recebendo só a visão da caserna. Os próprios militares, originados de uma formação mais conservadora, vêem com “maus olhos” a atuação sindical, ainda arraigada do modelo antigo[37], voltado mais para a anunciação de greve, balbúrdia, piquetes e manifestações contrárias ao governo.
Levando-se em consideração a conjuntura política atual e tendo por base a formação tradicional dos servidores militares e suas lideranças, não se visualiza a possibilidade de que emenda constitucional seja proposta, por falta de ambiente político, para alterar pontos cruciais da nossa Constitucional Federal, restituindo direitos sociais da classe militar, ou mesmo que projeto de lei seja apresentado para amenizar tal situação, diante de algum fator conseqüente.
Não há como imaginar a constituição de um “Sindicato dos Militares”, e nem há amparo legal, apesar dos exemplos europeus, mas há considerável chance de que uma associação inicie um trabalho de conscientização e trabalho nas bases políticas.
As Forças Armadas têm boa estrutura de clubes sociais. Partindo do estado do Rio de Janeiro, as três Armas possuem clubes militares tradicionais e bem estruturados, bom corpo de associados, inclusive com advogados, bacharéis, consultores e professores, além de boa capacidade de acesso ao pessoal da ativa e da reserva (aposentados). Historicamente, já ocorreram manifestações políticas de antigos presidentes destas agremiações, diante do que se considerava um atentado à dignidade do militar, por meio de discursos oficiais e ações judiciais.
Em geral, reúnem-se nos clubes antigos comandantes militares em eventos sociais ou mesmo em estudos, debates e cursos de temas nacionais atuais. A experiência desses grupos poderia até ser aproveitada pelas instituições militares, mas, infelizmente, fica somente o respeito aos reservistas que já contribuíram, nas suas oportunidades de atividade. Tudo não passa de boas recordações.
Acredita-se que tais clubes possam iniciar uma estruturação de associações voltadas para o lado dos direitos sociais dos servidores militares, o que pode ser feito a partir dos oficiais, mas refletiria em toda a categoria. A futura “Associação dos Servidores Militares” teria a missão principal de resgatar direitos sociais e políticos usurpados oficialmente, sem justificativa plausível, afetando direitos e garantias de forma desproporcional. Já há um número considerável de militares da Reserva, que são formados em Direito e Ciências Políticas, além de inúmeros casos de candidatos eleitorais, trazendo alguma experiência na área.
A suposta associação pode tomar por base as associações e sindicatos do setor público, principalmente as mais conservadoras, mas terá um desempenho ainda mais comedido, pelo menos de início. O servidor militar, pela formação histórica e missão, já explanadas ao longo do trabalho, é regido, em sua conduta pública, por rígido estatuto disciplinar. Não há espaço, assim, para rompantes e atitudes desmedidas, ao custo de atentar contra a estrutura hierárquica da Força e perder sua credibilidade. Há que se estimular uma participação no sentido de planejar a reintegração do servidor, como cidadão que é, e não um combatente em campanha.
A nova área de atuação é um campo em que o militar não tem grande experiência e precisa do apoio de cientistas políticos, professores e pesquisadores, para decolar na proa correta, auferindo pequenos ajustes na rota, mesmo porque os erros não seriam perdoados, nem pela mídia, nem por políticos de plantão, e nem pelos comandantes militares, de postura mais conservadora.
Em verdade, foi realizada uma consulta à presidência do próprio Sindireceita e a perspectiva é de que seja muito positiva a estruturação dessa associação, mas haverá um intervalo de, talvez, dois mandatos, para que se adquira capacidade e credibilidade, inclusive para realinhar seus objetivos estratégicos. É esperado que o filiado se preocupe de forma mais esfuziante sobre a questão da remuneração, mas deverá aprender que isso será uma conseqüência da sua valorização, como profissional que busca ser, amparado na sua missão constitucional.
A partir desse embrião local, a futura associação deverá ter a capacidade de trabalhar dentro da área política, regional e nacional, pois se vê que este é o caminho de aproximação mais efetivo. O político brasileiro ainda tem seus receios da atividade militar, como uma força potencialmente destrutiva, e não construtiva.
O pensamento que associa as Forças Armadas à destruição, à repressão e à guerra deve rever seus conceitos e procurar aumentar seu conhecimento geral, uma vez que mal consegue traduzir a informação vista no seu aparelho de televisão, que vive sobrecarregado de reportagens sobre todos os conflitos nacionais e internacionais, focando na ação militar, como se fosse a origem e causa. As Forças Armadas não tomam a iniciativa do combate; são vetores que recebem ordem direta do Presidente da República, seu “Comandante-em-Chefe”, sob consulta ao Conselho de Defesa Nacional.
O papel atual de uma Força evolui na mesma proporção que se desenvolve o seu país, sua população. Se não vemos uma possibilidade imediata de invasão por um país agressor, de forma declarada, como nas antigas condutas de guerra, mas temos ciência da invasão silenciosa dos tráficos de animais, plantas, minerais, informações, valores virtuais e até seres humanos.
A Força deve estar pronta a atuar em cooperação com os órgãos responsáveis por regiões e setores vitais para o Brasil. Cremos em uma estrutura militar menos voltada ao volume de soldados, mas procurando a profissionalização dos seus homens, apoiados por tecnologia que potencialize a capacidade de coletar informação e atuar na tomada de decisão e proteção dos valores nacionais.
Cada vez mais, a missão das Forças Armadas estará envolvida em sedimentar e proteger estruturas internas, mantendo uma postura dissuasiva quanto a possíveis “invasões” de setores vitais brasileiros. A tônica seria a profissionalização e tecnologia.
A Força deve conviver com homens mais integrados à vida política da nação, com orientação e discernimento para exercer seus direitos e garantir dos demais cidadãos, valorizando suas obrigações e o cumprimento de sua missão, com a devida responsabilidade. A integração do servidor militar à cidadania plena faz parte de tal evolução. A consciência de seus direitos ampliará seu compromisso para a missão da Força.
“Instituições fracas são um convite a oportunistas de plantão e a retrocessos. A saúde de uma nação depende da higidez das suas instituições. Instituições sólidas como a OAB, a ABI, a CNBB e as Forças Armadas são a garantia e a esperança para a conquista e a manutenção dos princípios e objetivos fundamentais expressos na Carta Magna da nação brasileira.”[38]
Este trecho faz parte de uma das participações de nosso nobre oficial da Força Aérea Brasileira, em diversos cursos de aperfeiçoamento, que cumpre ao longo de sua carreira. Não há aumento de salário, não há, muitas vezes, o reconhecimento público pela sua devoção, mas há a gratificante certeza do dever cumprido, seja na sua dedicação exclusiva, voluntária e permanente, seja na perpetuação das suas idéias, para que outros possam crescer em Paz.
Hoje, o servidor militar tem as necessidades e direitos do homus medius e as obrigações de um herói, quando bastaria o reconhecimento e a valorização do seu trabalho.
CONCLUSÃO
Este trabalho acadêmico de conclusão do curso de Direito, no nível de graduação, teve por objetivo principal estudar as justificativas para o ordenamento maior brasileiro impor desproporcionais limitações à classe militar, no momento em que se identificou a negação de determinados direitos sociais, disponíveis para todos os demais cidadãos brasileiros, o que se faz claramente visível na Constituição Federal de 1988, no que se refere aos militares das Forças Armadas, mesmo como agentes públicos diferenciados. Nunca houve dúvida sobre a discriminação à classe militar; restava saber o motivo e a possibilidade de solução para o problema.
Assim, buscou-se questionar, para tentar solucionar o problema, a criação de uma instituição sindical ou associação de servidores militares, que poderia agir em nome da classe, dentro da legalidade, a fim de diminuir ou eliminar tais limitações políticas e sociais, que prejudicam o cumprimento de sua participação nacional e seu desenvolvimento como pessoa, uma vez que a justificativa doutrinária para tal controle seria sua base na hierarquia e disciplina.
O primeiro capítulo buscou apresentar o que existe atualmente, na legislação brasileira, a partir da Constituição Federal, que reflete a limitação social e política ao servidor militar, com ênfase na identificação de quais direitos seriam relevados na evolução do direito constitucional, as possíveis razões para a existência de tal regime, o motivo da formação rígida militar e o que seria verificado em outros países.
Foi identificada no início da pesquisa de opinião, a origem da razão dessa conduta disciplinar dos servidores militares, chegando a citar as marchas e campanhas de conquista dos exércitos romanos, quando precisavam ocupar, marcar e proteger as novas terras assimiladas, para evitar a invasão dos inimigos. Os jovens soldados aprendiam a obedecer às ordens, sem contestar, sob pena de castigos a chicote, ou mesmo a sentença de morte. Era assim que se tratavam a traição e a insubordinação.
Foi verificada a evolução dos artigos específicos das Forças Armadas, na Constituição Federal, em vista de não ser justificável a limitação de direitos sociais e políticos, logo na promulgação da Constituição “Cidadã”. Os militares sempre tiveram destaque na proteção do território e defesa da pátria, não sendo diferente a partir de 1988.
A partir da evolução de direitos sociais, o que ficou disponibilizado a todos os cidadãos brasileiros, confirmou-se que alguns direitos e garantias fundamentais protegidos constitucionalmente não são proporcionalmente compensados para a classe militar.
Ficou registrado e confirmado que o militar tem, de fato, uma rotina de treinamento e trabalho voltados para seu preparo e uso em combate, o que justifica e até explica a extrapolação de jornadas de trabalho, mas deixam margem à dúvida, quando se refletem em uma espécie de cultura da pobreza e da limitação de meios. Acostumada a poucos recursos, a administração militar aceitou paulatinamente a redução de benefícios que são garantidos por lei.
O tratamento dispensado de forma desproporcional aos militares pode ter sua origem na desconfiança dos velhos políticos em um potencial retorno das Forças Armadas ao poder político, em outro momento de crise, o que explicaria o excesso de proteções a determinadas garantias, direitos individuais e remédios constitucionais. Alguns artigos específicos da nossa Carta Magna demonstram vedação explícita a direitos políticos, excluindo o servidor militar da participação efetiva no cenário brasileiro.
Para sedimentar a arquitetura da pesquisa, foi realizada uma enquete, utilizando-se um site de relacionamento da turma de formação militar da Aeronáutica, para registrar a impressão de centenas de integrantes, quanto à possibilidade de integração de uma associação sindical de servidores militares. O resultado encontrado foi o de desconhecimento dos princípios norteadores e atividades de um sindicato, além de mostrar certa resistência dos militares da ativa.
Justificando tal oposição às mudanças, foi registrado o momento histórico do sindicalismo no Brasil, na década de 1970, em confronto com a tropa militar, já envolta em clima anticomunista. As escolas militares tiveram a mesma técnica de formação do modelo “panóptico”, adotado em diversas instituições que precisavam manter forte controle sobre seus integrantes. Todos esses episódios são conseqüentes à Revolução de 1964, que permitiu a longa duração do governo militar no Brasil, acirrando mais a convivência das classes política e militar.
Em pesquisa de modelos sindicais internacionais, o que pode ser visto no capítulo “Direito Comparado”, foi possível constatar a evolução de alguns países europeus, que permitem a instituição de associações sindicais militares. Em contrapartida, foram descobertos exemplos de países com pouca evolução política, que adotavam ainda algum modelo que se utilizava da pressão da força militar, em apoio ao governo, como ocorre em algumas nações de origem em língua espanhola, aqui na América do Sul. O modelo americano ainda resiste à adoção de sindicatos de militares, mas mantém forte apoio à atividade, com robustos orçamentos e competente suporte, o que sempre minimiza as contrariedades sociais.
O segundo capítulo ficou reservado para registrar que existem de fato problemas na carreira do servidor militar, como existem em todas as demais, só que se apresenta de forma ampliada pelo nível de rigidez, natural na caserna. Essa parte procurou expor a necessidade de se buscar soluções para os inúmeros problemas da carreira, sob o risco de incremento na evasão de bons profissionais para outros empregos públicos ou privados, o que já se mostra acima do normal.
O que de mais importante se fez presente no trabalho foi a constatação de que existem problemas de toda ordem, a serem reavaliados e solucionados, os quais afetam a vida do servidor militar. Apesar de termos problemas comuns a outras categorias, o servidor militar fica refém da estrutura disciplinar rígida de sua corporação, que não permite manifestações e reivindicações, principalmente quando envolve salário, condições de trabalho, carreira, promoções e apoio à família. Se nada puder interferir positivamente no quadro atual, podem ocorrer danos irreparáveis para as Forças Armadas, em futuro próximo.
O terceiro capítulo procurou expor a importância dos direitos e garantias fundamentais e sua desproporcional indisponibilidade para o servidor militar, uma vez que há grande importância na missão atribuída à categoria, existe alto nível de exigência de seu desempenho, mas não lhe são garantidos valores básicos, uma vez que a acessibilidade a bens, serviços e direitos identificam o cidadão.
Com base nos princípios constitucionais de proteção aos bens maiores, que envolvem o ser humano, é possível delinear garantias e direitos básicos que são desproporcionalmente limitados aos militares, sem a devida razão para tal. É fato que as Forças Armadas são o alicerce para a atividade de defesa do território nacional, e não seria imaginável que pudessem fazer greve, por exemplo, por ocasião dessa atividade específica, de sua atribuição constitucional.
Ficou constatado que os doutrinadores e legisladores se “esqueceram”, ao contribuir para o texto constitucional, de que a base da formação do militar reside no respeito ao seu dever cívico, obediência às normas e objetivos nacionais e conduta ética para com seu país. A sua formação é o alicerce de sua conduta e não seriam normas escritas que permitiriam o desvio de suas atribuições. A primeira solução imaginada poderia ser um trabalho de alteração do texto constitucional, o qual dependeria de vontade política de nossos parlamentares e participação dos comandantes militares e do Ministro da Defesa. Essa opção foi rapidamente descartada, pela análise do contexto nacional atual e nível de amadurecimento do político brasileiro.
Com base em experiências nacionais de instituições que estão trabalhando na defesa de interesses de determinadas classes de servidores públicos, foi possível vislumbrar a criação de associações de defesa de servidores, que pudessem iniciar um trabalho de conscientização do militar, em busca de melhores condições sociais e políticas, até mesmo identificando resultados positivos para a Força Armada.
Tendo em vista a grande dificuldade na mudança do texto constitucional para a criação de sindicato dos militares, no que se torna difícil a possibilidade de proposição de Emenda Constitucional, resta a oportunidade de implementar a associação de defesa da categoria, a partir de estruturas de clubes militares já existentes, que tomariam tal iniciativa. O novo modelo de associação deverá atender aos interesses da classe, sem ferir os estatutos militares vigentes, para sedimentar sua credibilidade.
Acadêmico de Direito
O Benefício de Prestação Continuada (BPC), mais conhecido como LOAS (Lei Orgânica da Assistência Social),…
O benefício por incapacidade é uma das principais proteções oferecidas pelo INSS aos trabalhadores que,…
O auxílio-reclusão é um benefício previdenciário concedido aos dependentes de segurados do INSS que se…
A simulação da aposentadoria é uma etapa fundamental para planejar o futuro financeiro de qualquer…
A paridade é um princípio fundamental na legislação previdenciária brasileira, especialmente para servidores públicos. Ela…
A aposentadoria por idade rural é um benefício previdenciário que reconhece as condições diferenciadas enfrentadas…