Resumo: O presente texto aborda o direito previdenciário em seu matiz tributário e processual, sob a perspectiva de que não basta discutir a despesa da Previdência Pública, havendo a necessidade de se pensar sobre a efetividade da arrecadação distribuída solidariamente no meio social.
Palavras-chave: tributos, direito previdenciário, COFINS.
Abstract: This paper addresses the welfare law in its hue and procedural tax, from the perspective of not just discuss the expenditure of Public Welfare, with the need to think about the effectiveness of collections distributed within the social solidarity.
Keywords: taxes, pension rights, COFINS
Em seguida, serão dispostos três pontos polêmicos entre os temas de direito previdenciário tributário que constantemente chegam à Justiça Federal. Note-se que uma eventual posterior consolidação em contrário da jurisprudência não deve extrair a importância deste debate doutrinário.
O primeiro diz respeito à possibilidade de se incluir os imóveis no conceito de mercadoria; e, como tal, fazer incidir a Cofins – Contribuição para Financiamento da Seguridade Social[1], quando da alienação dos mesmos por empresas incorporadoras e congêneres.
O segundo diz respeito à tese da possibilidade de se compensar o remanescente do FINSOCIAL (atual Cofins – Contribuição para Financiamento da Seguridade Social) com parcelas indevidas do PIS – Programa de Integração Social. Note-se que o que se defendia não era a aplicação retroativa da Lei nº. 9250, de 27.12.95 (que alterava a legislação do imposto de renda das pessoas físicas e dava outras providências), mas a tese de que o conceito de espécie, em Direito Tributário, abrange, quando se trata das contribuições especiais, o destino dos valores arrecadados.
O terceiro diz respeito ao instituto da compensação liminar, que não extingue por si a obrigação quando se trata dos tributos lançados por homologação.
Logo, entre as várias interpretações possíveis, escolhi aquelas que apresento mais adiante.
Antes de transcrevê-las, advirto que os textos refletem algumas das minhas decisões (entre 1995 e 1996), sendo necessário situá-las em um momento histórico que precede as consolidações pré-torianas e a instituição da Receita Federal do Brasil.
1. Os imóveis devem ser considerados “mercadorias” para efeito da incidência da COFINS (Incorporadoras).
Normalmente, os argumentos colacionados pelos Impetrantes dos Mandados de Segurança, que se opõem a esta afirmação, podem ser resumidos nestes termos: a) trata-se de pessoa de direito privado, do ramo da construção civil, cujo objetivo social é a construção de edificações para fins de incorporação imobiliária; b) a Autoridade Impetrada vem exigindo da Impetrante o recolhimento da Confins – Contribuição para Financiamento da Seguridade Social; c) esta exação não é devida pela Impetrante, que exerce a atividade de incorporação imobiliária; d) a alíquota e a base de cálculo da Confins – Contribuição para Financiamento da Seguridade Social estão delineadas no art. 2º, da Lei Complementar nº. 70, de 30.12.91, que fixa o índice de 2% (dois por cento) sobre o faturamento mensal, assim considerando a receita bruta das vendas de mercadorias, de mercadorias e serviços e de serviços de qualquer natureza; e) a Impetrante exerce atividade de construção de edificações compostas de unidades autônomas; primeiramente para si, e, posteriormente, repassadas para terceiros; f) a atividade de construção de bens imóveis, para si, e depois o repasse para terceiros, não se inclui no conceito de mercadoria, sendo ilegal a incidência da Confins – Contribuição para Financiamento da Seguridade Social; g) a atividade da Impetrante não pode ser enquadrada como uma venda de mercadoria ou como uma prestação de serviço; h) a Incorporação Imobiliária não é uma prestação de serviços, conforme estabelece a Lei nº. 4.591, de 16.12.64, que dispõe sobre o condomínio em edificações e as incorporações imobiliárias, pois a Impetrante constrói para si própria, e somente depois de concluída a obra é que realiza a venda do bem construído; i) o legislador não pretendeu, implícita ou explicitamente, que a exigência da Confins atingisse a atividade de Incorporação Imobiliária; j) não cabe ao intérprete alterar os conceitos e formas do direito privado; k) não há razão para a exigência da exação, em face da inexistência de fato gerador.
Ao final, rotineiramente se requer o seguinte: a concessão de medida liminar para que a autoridade Impetrada não venha a praticar qualquer ato coativo contra o patrimônio da Impetrante, e para que fique suspensa a exação da Confins – Contribuição para Financiamento da Seguridade Social.
Notificada a Autoridade Coatora (Delegado da Receita Federal) a prestar informações, via de regra, o faz argüindo que: a) os imóveis podem ser, e são, objeto de especulação, devendo, desse modo, entrarem essas especulações no âmbito do direito comercial, igualando-se os imóveis aos bens suscetíveis de comercialização; b) a Lei nº. 4.068, de 09.06.67, declarou como comercial a atividade de construção; c) a Lei Complementar nº. 70/91 estabeleceu, no Parágrafo Único do art. 2º, o que deveria ser excluído da base de cálculo, e, nos artigos 6º e 7º, elencou os casos de isenção; d) a receita da venda de imóveis deve ser enquadrada na base de cálculo da contribuição; e) não se pode dar ao vocábulo “mercadoria” sentido restritivo, pois tudo que se compra e se vende está enquadrado no conceito de mercadoria, inclusive os imóveis; f) a referida Lei Complementar nº. 70/91 foi declarada, por unanimidade, constitucional pelo Eg. Supremo Tribunal Federal.
Diante deste quadro, não será possível abstrair a Ação Declaratória de Constitucionalidade, que possui efeito vinculante relativamente aos demais órgãos do Poder Judiciário (CF/88 – Emenda Constitucional nº. 03/93, art. 102, § 2º).
Neste contexto, importa relatar alguns dos mais destacados argumentos do Exmo. Ministro Moreira Alves, que foi o primeiro a votar: a) não há como vislumbrar que a Constituição vede que a União arrecade os recursos da Confins, já que eles são repassados às áreas a que se destinam à saúde, previdência e ação social; b)no tocante à questão da anterioridade, é improcedente esta argumentação, pois a Confins é regida pelo artigo 195, § 6º da Constituição, que diz que a contribuição prevista neste artigo poderá entrar em vigor em 90 dias depois da publicação da lei.
Diante destas ponderações, venho afirmando que o fenômeno da mercantilização dos bens imóveis, já de há muito, é uma realidade jurídica, não sendo a semântica de uma palavra (mercadoria), um caminho seguro para a interpretação adequada da norma.
No caso dos incorporadores de imóveis, a própria Lei nº. 4.591/64, que dispõe sobre as incorporações imobiliárias, já admitia que estas empresas, quando insolváveis, estivessem sujeitas à falência (art. 43), instituto caracteristicamente mercantil, o que significa dizer que a incorporação imobiliária encontrava-se equiparada às atividades de comércio, cujo objeto não é outro senão o de operar com mercadorias. Enfim, dentro da orientação da lei supramencionada, os imóveis são equiparados às mercadorias.
Assim se fez porque como mercadoria se entende todos os bens que se sujeitem à atividade de comércio. No caso, é inegável, no próprio objeto da empresa (construção e repasse das unidades construídas para terceiros), que a atividade comercial ocorre em função da própria natureza da incorporadora, que exige a especulação direta com o bem.
Enfim, desconsiderar que os imóveis atualmente também podem ser objeto de especulação mercantil, e com isto integrar o conceito de mercadoria, é desconhecer a realidade vigente e querer se firmar em um tempo onde esta atividade não existia.
Reforçando o meu entendimento, passo a elencar o que se segue:
a) o Acórdão unânime da 2ª Seção do TRF-1ª Região, diz “in verbis”:
“EMENTA: COFINS. LC 70/91. EMPRESAS CONSTRUTORAS. IMÓVEIS. COMERCIALIZAÇÃO.
1. O conceito de mercadoria para fins tributários não se restringe às coisas móveis, albergando, também, os imóveis que, tendo valor econômico, possam ser objeto de comércio.
2. Neste sentido, as empresas voltadas para a construção e comercialização de imóveis sujeitam-se à incidência da COFINS, seja como prestadoras de serviço ou porque vendem mercadorias.
3. Precedentes da 2ª Seção – MMSS 94.01.31862-0/DF e 95.01.06991-5/DF.
4. Segurança denegada.
(Ac. un da 2ª Seção do TRF-1ª Região, MS nº 95.01.11294-2/DF, Rel. JUIZ FERNANDO GONÇALVES, DJU 02.10.95, p. 66.433)” (GRIFEI);
b) a afirmação do jurista José Xavier Carvalho de Mendonça (2003:209), quando o mesmo fez registrar que a exclusão da compra e venda de imóveis do elenco dos atos de comércio não mais se justificava, já à época dos seus comentários. Ora, esta opinião do festejado jurisconsulto se deu entre a década de 20 e o início da década de 30;
c) a severa discordância de Pontes de Miranda (apud CALMON, 2006), que não admitia “a pré-exclusão dos bens imóveis” do conceito de mercadoria, atribuindo esta posição a um inexplicável romanismo tardio
d) os pareceres ministeriais, onde se argumentava, em linhas gerais, que:
Não se poderia negar, atualmente, que os bens imóveis podem ser objeto de especulação mercantil. Nossa realidade não permite mais desconsiderar o fenômeno da mercantilização de imóveis.
Percebe-se a evolução do conceito de mercadoria. Outrora, referia-se, tão somente, às coisas móveis que fossem objeto de comércio. Modernamente, devido a multiplicação das grandes metrópoles e incrementação da indústria de construção civil, estende-se a conceituação aos bens imóveis. Haja vista o surgimento dos negócios imobiliários especulativos.
Além de ser, de direito, uma sociedade comercial, ela, de fato, realiza atividade comercial, na medida em que seu objetivo é a venda de imóveis.
Pode-se ainda asseverar, que, com o advento da Lei nº 4068/62, as empresas de construção passaram a ser comerciais.
Assim, não é por tratar-se de bem imóvel, que será excluído do conceito de mercadoria, e muito menos, que não será caracterizada a atividade mercantil. Logo, deverá incidir sobre estas operações a COFINS.
Com este mesmo entendimento, encontra-se na Revista dos Tribunais – Cadernos de Direito Tributário e Finanças Públicas, ano 1, nº. 4, julho a setembro de 1993, o Parecer do Ilustre Professor Vittorio Cassone, que, por sua grande lucidez sobre o tema, exigiria uma breve transcrição:
`Em conclusão, pela conjugação dos princípios constitucionais que norteiam as contribuições sociais destinadas à Seguridade Social (para custeio da saúde, previdência e assistência), e dos arts. 1º e 2º da LC 70/91, e da evolução doutrinária, legislativa e jurisprudencial quanto ao alargamento do conceito das empresas comerciais (e, via de conseqüência, de “mercadorias”), e, até da tendência do STF quanto às várias contribuições sociais, as empresas imobiliárias e outras da mesma natureza, que operam com imóveis com fim especulativo, aspecto que dá margem à interpretação ampliativa (não confundir com extensiva) ao significado de mercadoria, são contribuintes da COFINS.
Por tudo isto, venho julgando improcedente este tipo de Ação.
02. Não seria juridicamente possível a compensação entre o excedente do FINSOCIAL com o PIS (conclusão que antecede a instituição da Receita Federal do Brasil pela L. n. 11.457, publicada no DOU de 16.03.2007).
Normalmente, os argumentos colacionados pelos Impetrantes podem ser resumidos nestes termos: a) pretende valer-se da compensação de valores do FINSOCIAL, oriundos de pagamentos realizados acima da alíquota de 0,5%, com os débitos vincendos, relativos à contribuição social COFINS e ao PIS; b) utilizou, para o dimensionamento do crédito relativo ao FINSOCIAL, os mesmos índices de atualização praticados pela Justiça Federal; c) o Eg. STF, no julgamento do Recurso Extraordinário nº. 150.764-1/120, prolatou, por maioria de votos, a inconstitucionalidade do FINSOCIAL; d) o FINSOCIAL tem a mesma espécie que a COFINS e o PIS, satisfazendo os parâmetro legais exigidos para a compensação estabelecida no art. 66 da Lei nº 8383/91; e) a Instrução Normativa nº. 67/26.05.92, reconhecendo o princípio da correção monetária, estabeleceu restrição ilegal, ao dispor que não se aplicaria a correção monetária a períodos anteriores a 01.01.92. Esta Instrução Normativa fere a Súmula nº. 46, do ex-TFR; f) a autoridade Impetrada (Delegado da Receita Federal) vem se negando a fornecer a certidão negativa de débitos.
Ao final, rotineiramente, requer-se o seguinte: a) a concessão de medida liminar para: a.I) que a Impetrante proceda ao lançamento dos valores do FINSOCIAL, pagos indevidamente, com débitos da COFINS e do PIS, vencidos, já compensados, permitindo-se a utilização dos mesmos índices de atualização monetária atribuídos à União Federal na cobrança de seus créditos; a.II) que as autoridades coatoras se abstenham de adotar contra a Impetrante quaisquer medidas coativas ou punitivas que a impeçam de efetuar compensações na forma do contido no art. 66, § 1º, da Lei nº 8383/91, sem prejuízo da atividade fiscalizadora tendente a verificar a exatidão das compensações nos moldes descritos, a fim de que possam ser homologados os correspondentes lançamentos, determinando-se que a Autoridade Coatora forneça a CND (Certidão Negativa de Débito); b) a concessão da segurança definitiva.
Discute-se, portanto, a compensação do que foi pago a maior referente à contribuição para o FINSOCIAL com o pagamento da contribuição para o COFINS e para o PIS.
Verifica-se, via de regra, nas cópias dos Contratos Sociais das Impetrantes, que estas têm por objeto a prática de atividades de natureza industrial e mercantil (ou outras atividades que não impliquem em prestação de serviços).
Portanto, parece necessário que se faça uma rápida alusão à classificação dos atos de comércio.
Sobre este assunto, saliento a classificação de um dos nossos maiores juristas, que foi José Xavier Carvalho de Mendonça (Cf. 2003:215 / 216).
É o que se fará a seguir.
Para este jurista, os atos de comércio deveriam ser divididos em três categorias:
a) ato de comércio por natureza, que é aquele onde a atividade de intermediação exsurge com todo o vigor. O ponto central deste gênero de ato é a existência imediata de especulação direta com o bem;
b) ato de comércio por dependência, por conexão, por conexidade ou acessório, que é aquele que adota em seu conteúdo bens necessários à realização da atividade mercantil-especulativa. É o caso dos móveis e imóveis utilizados como instrumento para o desenvolvimento da atividade de comércio;
c) ato de comércio por força de lei, que é aquele, como o próprio nome indica, ao qual a lei atribui a qualidade de mercantil. É o caso das operações com letra de câmbio e nota promissória, dos contratos das sociedades por ações etc.
Desta classificação, pode-se concluir que as Impetrantes normalmente adotam como atividade principal a prática de atos de comércio por natureza, havendo os serviços por elas prestados de serem enquadrados na categoria dos atos de comércio por dependência ou por conexão, porquanto realizados com o objetivo de viabilizar a atividade mercantil – especulativa
Dito isto, passo a reproduzir o meu entendimento a respeito do FINSOCIAL incidente sobre as empresas comerciais, que foi extinto pela Lei Complementar nº. 70/91.
Logo, nesta parte, o que virá disposto a seguir já se encontrava assente na Jurisprudência.
No entanto, antes de apresentar a posição do STF e o entendimento sumulado do Tribunal Regional Federal – 5ª Região, será tomado de empréstimo um valioso resumo sobre o assunto, da lavra do saudoso Dr. PETRÔNIO MARANHÃO GOMES DE SÁ, anterior Juiz Federal Titular da Vara que titularizava ao escrever originalmente este artigo:
“Assim, inicialmente, comporta registrar que o FINSOCIAL foi criado pelo DL 1940/82, tendo como destinação custear investimentos de caráter assistencial em alimentação, habitação popular, saúde, educação e amparo ao pequeno agricultor (art. 1º) Tinha duas alíquotas: 0,5% sobre a receita bruta das empresas públicas e privadas que realizassem venda de mercadorias, bem como instituições financeiras e sociedades seguradoras; e de 5% para as empresas públicas e privadas que se dedicassem à venda de serviços, sendo que, nesta última hipótese, a base de cálculo seria o valor do Imposto sobre a Renda devido.
Posteriormente, a Lei nº. 7611/87 alterou a destinação dos recursos do FINSOCIAL, para incluir custeio com investimentos na área da justiça. Ainda no mesmo ano de 1987, o DL 2397 inovou a incidência do FINSOCIAL no tocante às sociedades legalmente regulamentadas e ampliou sua alíquota em 0,1% (um décimo por cento). Logo em seguida, o DL 2413/89 destinou esse 0,1% para financiamento da reforma agrária. E o DL 2463/89 mais uma vez alterou a destinação dos recursos do FINSOCIAL, desta feita para aplicação em programas, projetos e atividades de saúde, previdência e assistência social. Também fixou, em definitivo, a alíquota de 0,6, revogando a destinação prevista no DL 2413/89. Vale anotar que esse último DL, o de nº 2464, foi rejeitado expressamente pelo Decreto Legislativo nº 77, de 15.12.89, publicado em 20.12.89. Entretanto, em 15.12.89, foram publicadas as Leis 7689 e 7690, sendo que a primeira, em seu art. 9º, fazia remissão ao art. 195, I, da CF. Posteriormente, foram os arts. 28 da Lei 7738/89, art. 7º da Lei 7787/89, art. 1º da Lei 7894/89 e art. 1º da Lei 8147/90, que vieram alterar o art. 9º da Lei 7689/88.”
Portanto, a legislação, como facilmente se pode observar, é uma seqüência de idas e vindas legislativas.
No entanto, seguindo o critério de obediência ao Texto Constitucional, veio a Jurisprudência a fixar o seu entendimento, que foi o seguinte.
O STF, TP, no Recurso Extraordinário nº. 150764-1, Pernambuco, Recorrente: União Federal; Recorrida: Empresa Distribuidora Vivacqua de Bebidas Ltda., assim se pronunciou:
“Contribuição Social- Parâmetros – Normas de Regência- FINSOCIAL – Balizamento temporal. A teor do disposto no artigo 195 da Constituição Federal, incumbe à Sociedade, como um todo, financiar, de forma direta e indireta, nos termos da lei, a seguridade social, atribuindo-se aos empregadores a participação mediante bases de incidência próprias – folha de salários, o faturamento e o lucro. Em norma de natureza constitucional transitória, emprestou-se ao FINSOCIAL características de contribuição, jungindo-se a imperatividade das regras insertas no Decreto-Lei nº 1940/82 com as alterações ocorridas até a promulgação da Carta de 1988, ao espaço de tempo relativo à edição da lei prevista no referido artigo. Conflita com as disposições constitucionais – artigos do corpo permanente da Carta e 56 do Ato das Disposições Transitórias – preceito de lei que, a título de viabilizar o texto constitucional, toma empréstimo, por simples remissão, a disciplina do FINSOCIAL. Incompatibilidade manifesta do artigo 9º da Lei nº 7689/88 com o Diploma Fundamental, no que discrepa do contexto constitucional.”
O Eg. Tribunal Regional Federal – 5ª R. sumulou a matéria.
Este é o texto da sua Súmula nº. 06 (pub. DJU, 14.10.93, Seção II, p. 43516):
“Subsiste, até a vigência e eficácia da Lei Complementar nº. 70/91 a cobrança do FINSOCIAL com base no Decreto-Lei nº. 1940/82, sendo inconstitucionais as alterações introduzidas pela Lei nº. 7.787/89, ressalvada a situação das empresas prestadoras de serviços.”
Considerando estes pressupostos, vinha decidindo, liminarmente, autorizar a compensação apenas na hipótese de existirem créditos líquidos e certos do sujeito passivo contra a Fazenda Pública.
Portanto, poderia ser apressado realizar compensações do excedente inconstitucional do FINSOCIAL com parcelas a serem devidas da COFINS e do PIS, dado que as mesmas variam em função do faturamento, que não é líquido e certo.
Mais: a L. nº. 8383/91 apenas autorizava a compensação entre tributos e contribuições da mesma espécie.
O conceito de espécie, para efeito de compensação, há de ser entendido de maneira restritiva; ou seja, de acordo com a afetação constitucional.
Entre as contribuições, o critério a ser adotado é exatamente este: o da finalidade.
Prima facie, parecia-me indiscutível que o substrato normativo da COFINS (CF/88, art. 195, inc. I – faturamento) não se confundia com o do PIS (CF/88, art. 239). Afora o fato de que a afetação constitucional dos produtos arrecadados é distinta. Sendo incabível a compensação de tributos com destinações orçamentárias diversas
Admitir a compensação, indistintamente, entre estas espécies tributárias é defender interpretação extensiva em favor de uma modalidade de extinção do crédito tributário que seguramente não é a normal.
Ora, o pagamento é que é a modalidade normal de extinção do crédito tributário. Todas as demais, portanto, merecem interpretação restritiva.
Mais do que isto, pois, se não tem o contribuinte a faculdade de optar, entre os seus débitos vencidos, sobre aquele que pretende pagar (CTN, art. 163), nenhuma razão se teria para lhe atribuir o direito de optar entre o que deve ser compensado.
A idéia-base que vinha defendendo é a de que a compensação da COFINS, acaso possível, deve ser realizada com a contribuição que foi por ela sucedida (FINSOCIAL), preservando as mesmas características.
O mesmo raciocínio, no entanto, não pode ser reproduzido quando se trata do PIS, cujos amparos constitucionais são nitidamente diversos, como há pouco ficou demonstrado (CF/88, art. 195, inc. I – faturamento; art. 239).
Frise-se: se o contribuinte não tem a faculdade de optar, entre os seus débitos, sobre aquele que pretende pagar (CTN, art. 163), não encontro razão para lhe atribuir o direito de escolher entre o que deve ser compensado.
Creio mesmo que a interpretação extensiva das hipóteses de compensação termina por implicar no emprego da eqüidade como uma forma de dispensa do pagamento do tributo devido, o que é vedado por lei (CTN, art. 108, § 2º).
Portanto, restava discutir a possibilidade de compensação entre a COFINS e o havido como excedente a título de FINSOCIAL.
Sobre este assunto, já me manifestei dizendo que se demonstra assente na Jurisprudência o entendimento a respeito do excedente de inconstitucionalidade do FINSOCIAL, havendo inúmeras Empresas que já levantaram por Alvarás percentual viciado. Portanto, tenho o entendimento de que o valor indevido pago a maior pode ser compensado com as quantias relativas à COFINS, pois me parece indiscutível que esta contribuição possui a mesma natureza do antigo FINSOCIAL, não sendo senão a sua sucessora.
03. Não é satisfativa a liminar que autoriza a compensação entre o excedente do FINSOCIAL e a COFINS (texto anterior à Lei Complementar n. 104/10.01.2002, que apenas autoriza a compensação após o trânsito em julgado, afirmando, no art. 170-A, do Código Tributário Nacional: É vedada a compensação mediante o aproveitamento de tributo, objeto de contestação judicial pelo sujeito passivo, antes do trânsito em julgado da respectiva decisão judicial).
Como exemplo do que digo, aponto:
a) o pronunciamento do Juiz Relator, à época Vice Presidente do Eg. Tribunal Regional Federal da 5ª Região, Dr. LÁZARO GUIMARÃES, que afirmou: `A L. nº 8383/91, art. 66, criou nova modalidade de compensação, daí a aparência do direito líquido e certo invocado pela impetrante, atingido pelo ato omissivo do impetrado. O perigo de lesão decorre do óbice à utilização da forma abreviada de compensação, com imediato prêmio financeiro. Assim, defiro a liminar para anterior a compensação, ressalvada a possibilidade de fiscalização pelos órgãos competentes. ` (DJU 17.10.94, Seção II, p. 58942);
b) o pronunciamento do Juiz Relator, Dr. RIDALVO COSTA, que afirmou: `(…) entendia, antes, que a liminar que autoriza a compensação de tributos tinha natureza satisfativa, haja vista ser a compensação de créditos forma de extinção das obrigações. Todavia, o Eg. Plenário desta Corte tem-se manifestado favoravelmente à tese segundo a qual a liminar em exame não é satisfativa, vez que a compensação, nos termos do art. 66, da L. nº 8383/91, não extingue o crédito tributário, não se confundindo com a compensação, nos termos em que a palavra é tradicionalmente empregada. Neste sentido, manifestou-se o eminente Juiz CASTRO MEIRA, no AGR em MS nº 43.399 – PE:’ No que tange ao perigo de dano, parece-me também inexistente. Como enfatizou o Juiz HUGO MACHADO, trata-se de tributo em que o lançamento se procede por homologação. Desse modo, o crédito tributário somente se aperfeiçoa, em caráter definitivo, de forma explícita, com a manifestação da autoridade competente concordando com os atos praticados pelo contribuinte, ou, de modo implícito, pelo decurso do qüinqüênio legal. Não há, assim, o perigo de produzir-se a imediata extinção do crédito tributário, que fica submetido à condição resolutiva.` (DJU 22.09.94, Seção II, p. 53394).’
Além do mais, merecem ser consideradas as palavras do saudoso Juiz PETRÚCIO FERREIRA, em favor da suspensão da exigibilidade do crédito tributário, dizendo sobre a importância da liminar que assegura o próprio objeto da ação, pois, em sendo a mesma julgada procedente, não estaria a Autora obrigada a recorrer à repetição de indébito (DJU 14.09.94, Seção II, p. 51106);
Adotando o que aqui vem sendo exposto, compreendo fundamentada a liminar que autorizava a compensação da COFINS apenas com o excedente inconstitucional do FINSOCIAL.
Isto porque, com o natural respeito aos que pensam o contrário, considero inadequada uma interpretação que estenda ainda mais a abrangência do instituto da compensação em matéria tributária. Inclusive porque há toda uma larga reflexão doutrinária em torno do art. 1017, CC, que não deve ad limine ser afastada.
Neste diapasão, merecem ser lembradas as palavras de J. M. CARVALHO SANTOS (1994:308). O que se transcreve a seguir diz respeito ao caráter nitidamente excepcional que se encontra na compensação de créditos tributários. “In verbis”:
“Visa-se impedir, em suma, que fiquem paralisadas as frentes de renda com que conta a administração pública para satisfazer as suas necessidades, que são também as da comunhão.
As contribuições fiscais são para o Estado o que os alimentos são para o homem. Elementos essenciais para a própria manutenção.”
Ainda aqui, tenho a dizer que é uma verdade apenas parcial a de que o Fisco possa recuperar os valores não recolhidos em virtude de uma eventual suspensão, porquanto, admitindo a hipótese de ser descabida a pretensão formulada, o dinheiro que não ingressou nos cofres públicos já teria provocado todo um aprofundamento nas gritantes carências que cada vez mais se alinham no setor da seguridade social (saúde, previdência, assistência aos desvalidos).
Em suma: considerando o que foi dito, venho negando liminares em favor da compensação tributária entre exações que possuem substratos normativos claramente diferenciados.
Por isto, venho concedendo a segurança apenas no que diz respeito à compensação da COFINS até o limite do crédito excedente do FINSOCIAL, o que não impede a possibilidade de fiscalização pelos órgãos competentes.
Portanto, mesmo após decorrido um certo período desde que formei esta convicção, continuo a admitir como válidos os argumentos que nela foram esposados.
Acrescento, contudo, que não basta admitir a possibilidade da compensação, pois é também fundamental se determinar a atualização dos valores compensados.
Sobre isto, registro que quanto à compensação e os seus indexadores, diz a Lei nº. 8.383/30.12. 91, em seu art. 66:
“Art. 66. Nos casos de pagamento indevido ou a maior de tributos e contribuições federais, inclusive previdenciárias, mesmo quando resultantes de reforma, anulação, revogação ou rescisão de decisão condenatória, o contribuinte poderá efetuar a compensação desse valor no recolhimento de importância correspondente a períodos subseqüentes.
§1º. A compensação só poderá ser efetuada entre tributos e contribuições da mesma espécie.
§2º. É facultado ao contribuinte optar pelo pedido de restituição.
§3º. A compensação ou restituição será efetuada pelo valor do imposto ou contribuição corrigido monetariamente com base na variação da UFIR.”
Diante deste dispositivo de lei, e ratificando o até aqui transcrito, é que continuo a analisar a possibilidade de compensação da COFINS com o FINSOCIAL.
Como foi visto, a legislação permitia que tributos e contribuições federais fossem compensados com outros da mesma espécie.
Logo, não parece difícil retirar a conclusão de que é cabível a compensação do que foi pago indevidamente a título de FINSOCIAL com a COFINS, vencida ou vincenda.
De igual modo, quanto à questão da correção monetária do crédito do contribuinte pelo que foi pago indevidamente, entendo que haverá de sofrer atualização monetária integral, sob pena de o Fisco obter um indevido enriquecimento à revelia das garantias individuais conquistadas em nosso Estado Democrático de Direito.
Além disto, o texto da lei não permite dúvidas ao determinar a correção monetária com base na variação da UFIR.
Ainda quanto à correção monetária, é de ser destacado que tudo aquilo que foi pago indevidamente haverá de ser corrigido desde o momento do pagamento indevido.
Isto porque desadequada é a adoção de tratamento que não consagre a isonomia entre o Fisco e o contribuinte.
Os créditos e os débitos do Fisco têm de ser submetidos aos mesmos indexadores econômicos.
É de absoluta improcedência admitir-se como juridicamente válido que a correção do indébito se dê apenas a partir de janeiro de 1992, quando foi criada a UFIR.
Logo, não deve ter eficácia jurídica a Instrução Normativa nº. 67/92-Ministério da Economia, Fazenda e Planejamento (Dispõe sobre a compensação de recolhimento ou pagamento indevido ou a maior, pelo Departamento da Receita Federal), que determina a correção apenas a partir deste período.
Enfim, considero que o adequado seria julgar parcialmente procedente este tipo de ação (compensação entre o excedente do FINSOCIAL com a COFINS e o PIS), concedendo a segurança pleiteada, pelos fundamentos acima expendidos, para determinar a compensação dos valores recolhidos indevidamente do FINSOCIAL apenas com as parcelas da COFINS, vencidas ou vincendas, operando-se a correção monetária pelos mesmos índices que são adotados em favor da Fazenda Nacional, desde o pagamento indevido até a efetiva compensação (princípio da isonomia).
Como os assuntos aqui tratados ainda são polêmicos, pareceria possível dizer que o mais prudente seria evitá-los. Ocorre que só os enfrentando é que se tornará viável atingir raciocínios mais completos, e com uma força de convencimento maior.
Note-se que, como quase tudo em Direito, existem teses opostas supedaneadas em lições proferidas pela mais abalizada doutrina e jurisprudência, de modo que não pretendo alçar as minhas conclusões a uma situação de imodificabilidade.
Pois, bem ao contrário, o que objetivo é aprofundar ainda mais o debate.
Portanto, estou entre aqueles que entendem que só a mais ampla discussão de temas deste jaez, inclusive na esfera judicial (nas diversas instâncias), é que permite o regular cumprimento do princípio constitucional do contraditório.
Em seguida, colaciono as minhas conclusões:
a) vai longe o tempo onde apenas se comercializava bens móveis;
b) a lei que restringia a compensação de tributos (Lei nº 9250/95), ao proclamar a mesma destinação constitucional como requisito para a compensação, detém caráter meramente interpretativo, não retroagindo os seus efeitos; mas apenas colhendo a interpretação mais razoável do art. 66, Lei nº 8383/91;
c) a compensação liminar, diante de tributos lançados por homologação, não extingue o crédito; pois a extinção fica ao encargo da homologação futura – explícita ou implícita (contudo, vide posterior edição da Lei Complementar n. 104/10.01.2001, que apenas autoriza a compensação tributária após o trânsito em julgado).
É como concluo.
Doutor e Mestre pela Universidade Federal de Pernambuco. Pós-Doutorado. Juiz Federal Titular da 6ª Vara/PE, havendo composto a Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais em Brasília (2003-2007). Desembargador Federal em exercício no TRF da 5ª Região. Professor Titular da Universidade Católica do Estado de Pernambuco. Ex-Procurador Judicial do Município do Recife, Ex-Procurador Judicial do Estado de Pernambuco, Ex-Procurador Federal
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