A Responsabilidade Civil das Instituições Financeiras por Danos Ambientais Resultante de Projetos por ela Financiados

Raimunda Daiana Castro da Silva[1]

Chandrélin Cardoso[2]

Resumo: O artigo buscou apresentar sobre a possibilidade de responsabilização civil das  instituições financeiras por danos ambientais resultantes de projetos por elas financiados. Para a realização desta pesquisa, fez-se estudo bibliográfico exploratório de caráter qualitativo. Diante disso, foi possível perceber que por se tratar de um bem difuso, os poluidores indiretos que no caso são as instituições financeiras, também respondem por danos ambientais ocasionados pelos projetos que estas financiam, através da Responsabilidade Civil Objetiva pautada na Teoria do Risco, que aduz sobre a obrigação de reparar o dano independentemente de culpa, nos casos em que a lei já especifica bem como a atividade que normalmente é realizada pelo causador do dano provocar, por sua natureza, riscos para os direitos alheios.

Palavras-chave: Responsabilidade Civil; Danos Ambientais; Instituições Financeiras; Teoria do Risco.

 

 THE CIVIL LIABILITY OF THE FINANCIAL INSTITUTIONS FOR ENVIRONMENTAL DAMAGES RESULTING FROM PROJECTS THEREOF

Abstract: The article sought to present on the possibility of civil liability of financial institutions for environmental damages resulting from projects financed by them. For the accomplishment of this research, a qualitative exploratory bibliographic study was made. In view of this, it was possible to perceive that because it is a diffuse good, the indirect polluters, which in this case are the financial institutions, also respond for environmental damage caused by the projects they finance, through Objective Civil Liability based on Risk Theory, which it refers to the obligation to repair the damage independently of fault, in cases in which the law already specifies as well as the activity that is normally carried out by the person causing the damage, by its nature, risks to the rights of others.

Keywords: Civil Liability; Environmental Damages; Financial Institutions; Risk Theory.

 

Sumário: Introdução; 1 Responsabilidade Civil Das Instituições Financiadoras De Projetos Que Resultam Em Danos Ambientais; 1.1 A Responsabilidade Civil; 1.2 As Instituições Financeiras; 2 A Responsabilização Civil Dos Bancos Por Dano Ambiental E A Politica Nacional Do Meio Ambiente; 2.1 Dano Ambiental; 2.2 O Banco Como Poluidor Indireto; 3 Responsabilidade Objetiva Dos Bancos Por Dano Ambiental; Considerações Finais; Referências

 

INTRODUÇÃO

As constantes transformações da economia voltada ao consumo em excesso fazem com que empresas mantenham um ritmo desenfreado de exploração do meio ambiente.  Diante dessa séria problemática que assola o meio ambiente, que é um direito fundamental e difuso resguardado pela Constituição Federal de 1988 (CF/88) em seu art. 225, surge a importância de proteger os recursos naturais contra os danos a ele causado.

Com o mundo cada vez mais globalizado, a sociedade e o equilíbrio ecológico ficam vulneráveis a diversas atividades com alto potencial lesivo. É nesse sentido que o art. 170, VI da CF/88 funda a ordem econômica na defesa do meio ambiente, além de que o mesmo diploma legal delega o dever de cuidado a todos, inclusive aos bancos, atuando como controladores ambientais em face do meio ambiente ecologicamente equilibrado.

Fato é que com a violação a esse bem jurídico, nasce o dever de repará-lo e consequentemente a responsabilidade civil por danos ambientais. Conforme anuncia Stoco (2004, p. 150) a responsabilidade civil é o instituto de direito civil que teve maior desenvolvimento nos últimos 100 anos, evoluindo da culpa para o risco.

Demostrado isso, o presente artigo estudo analisou a responsabilidade civil das instituições financeiras por dano ambiental resultante de projetos por ela financiados, através de uma pesquisa bibliográfica exploratória de caráter qualitativo.

 

1 RESPONSABILIDADE CIVIL DAS INSTITUIÇÕES FINANCIADORAS DE PROJETOS QUE RESULTAM EM DANOS AMBIENTAIS

1.1 A RESPONSABILIDADE CIVIL

Numa análise da história nota-se que o homem sempre procurou meios para inibir seu próprio prejuízo provocado por terceiros, seja com leis retributivas do dano causado, por exemplo: lei de Talião, ou com penas desproporcionais e desumanas como se observa na obra clássica de Michel Foucault – Vigiar e Punir (1975).

Nesse sentido, Chaves, Rosenvald e Netto (2014, p. 38) discorrem que “De fato, nas primeiras formas organizadas de sociedade, bem como nas civilizações pré-romanas a origem do instituto está calcada na concepção de vingança privada, forma por certo rudimentar, mas de ponto de vista humana como lídima reação pessoal contra o mal sofrido. É dessa visão do delito que parte o próprio Direito Romano, que toma tal manifestação natural e como premissa espontânea para permiti-la ou excluí-la quando sem justificativa. Trata-se da pena de Talião, na qual se encontram traços na Lei das XII Tábuas.”

O sistema de eterna movimentação da classe humana e a necessidade de se resguardar ou ser indenizado por um dano sofrido fez com que surgisse o instituto da Responsabilização, que, segundo Christiano Chaves (2014, p. 40), “é a base integradora da ética e do direito, é o limiar entre as condutas, consequências e responsabilidades advindas do comportamento. A partir da responsabilização que se objetiva e formaliza os conceitos de liberdade e regulação”.

A Responsabilidade Civil é a área que visa responsabilizar um indivíduo por um dano que cometeu, segundo Stolze (apud Dias 2017 p.853 e 854), “toda manifestação da atividade humana traz em si o problema da responsabilidade”, ou seja, a todo ato humano se tem uma responsabilização, pode ser na esfera moral e/ou jurídica, se esse causou algum dano.

Stolze (2017, p. 854) afirma que “Responsabilidade, para o Direito, nada mais é, portanto, que uma obrigação derivada – um dever jurídico sucessivo – de assumir as consequências jurídicas de um fato, consequências essas que podem variar (reparação dos danos, e/ou punição pessoal do agente lesionante) de acordo com os interesses lesados.”

Segundo Chaves, Rosenvald e Netto (2014, p. 43) “a responsabilidade civil é a obrigação de reparar danos que infringimos por nossa culpa e, em certos casos determinados pela lei.” Em suma a Responsabilidade Civil é obrigação de responder e arcar pelos danos provocados ou causados por um agente.

É importante ressaltar as atribuições da Responsabilidade Civil, como explica Pablo Stolze (2017), vai além da sanção imposta no contrato ou na lei, ela tem três principais funções; a primeira é de retornar ao status quo ante, voltar para o estado primário, porém existem danos que não permitem que isso aconteça, a exemplo de danos drásticos ambientais (analisados mais adiante).

A segunda se trata da punição do agente, com o objetivo de ressarcir o dano causado (indenização ou compensação), como diz Pablo Stolze (2017, p. 869) “a prestação imposta ao ofensor, também, gera um efeito punitivo pela ausência de cautela na prática de seus atos, persuadindo-o a não mais lesionar”. Por último há uma função socioeducativa, com o fim de evitar que condutas danosas possam se repetir na sociedade.

É importante salientar que a responsabilização não está vinculada apenas a pessoa física, mas, também, a pessoas jurídicas. Faz-se necessário observar que para essa responsabilização ter repercussão no âmbito jurídico será necessário compor alguns requisitos como: A conduta, o dano, o nexo causal e a culpa para alguns casos.

 

1.2 AS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS

Dentro da atual modernidade observa-se cada vez mais a movimentação em volta das instituições financeiras que são definidas conforme o artigo 1° da Lei 7.492 de 1986 que dispõe: “Art. 1º Considera-se instituição financeira, para efeito desta lei, a pessoa jurídica de direito público ou privado, que tenha como atividade principal ou acessória, cumulativamente ou não, a captação, intermediação ou aplicação de recursos financeiros (Vetado) de terceiros, em moeda nacional ou estrangeira, ou a custódia, emissão, distribuição, negociação, intermediação ou administração de valores mobiliários.” (BRASIL, on-line)

Na definição legal encontram-se os bancos, as sociedades de créditos, cooperativas de créditos dentre outras. Cabe analisar que a principal Instituição Financeira são os bancos, seja público, privado ou de economia mista. Principalmente devido as suas funções como bem explica o Professor Carlos Alberto Bittar (2011 p. 33).Os bancos exercem duas categorias de atividades, uma essencial à sua função precípua (de exercício do crédito), outra de prestação de serviços (função acessória e complementar). Dentro da primeira, compete-lhes, como empresas comerciais recolher e distribuir capitais (operações passivas e ativas), realizando negócios os mais variados, como aceitação de depósitos de dinheiro, simples ou com correção; emissão de títulos de crédito; abertura de crédito; antecipação e desconto bancários e outros. No âmbito da prestação de serviços – denominados “serviços bancários” – situam-se, dentre outras, as operações de custódia e administração de bens; compra e venda de bens; realização de pagamentos, inclusive de tributos; transferência de numerário, inclusive para outras localidades e para o exterior.”

Nota-se que a atividade principal está ligada ao dia-a-dia da população civil, tanto para operacionar questões simples como para realizar grandes empréstimos a pessoas jurídicas ou físicas. Atualmente a tecnologia e os novos meios de prestação de serviço tem facilitado o crescimento em grande escala das agências bancárias, ou seja, amplia-se essa esfera de atuação graças às inovações tecnológicas, segundo Carlos Alberto Bittar (2011).

O Sistema nacional financeiro carrega consigo o encargo de zelar e promover o desenvolvimento equilibrado do País, principalmente no que tange os direitos da coletividade como respalda o art. 192 da Constituição Federal de 1988 (CF/88): “Art. 192 O sistema financeiro nacional, estruturado de forma a promover o desenvolvimento equilibrado do País e a servir aos interesses da coletividade, em todas as partes que o compõem, abrangendo as cooperativas de crédito, será regulado por leis complementares que disporão, inclusive, sobre a participação do capital estrangeiro nas instituições que o integram.” (BRASIL, on-line).

Com o grande crescimento à responsabilização civil bancária ganhou mais importância no ordenamento jurídico. Pois, são consideradas pessoas jurídicas os bancos e as outras instituições financeiras, recaindo, assim o dever de arcar com os danos por elas provocados.

Nas palavras de Pablo Stolze, independentemente de ser pessoa jurídica de direito público ou privado, “as pessoas jurídicas, mesmo não tendo a existência ontológica das pessoas naturais, respondem, com seu patrimônio, por todos os atos ilícitos que praticarem, através de seus representantes. (2017, p. 953)”.

A doutrina, como Pablo Stolze, Chistiano Chaves e Maria Helena Diniz, e os Tribunais Superiores já são pacíficos em relação à responsabilização bancária por danos causados por elas. Essa decisão ganhou mais força devido a Responsabilização Objetiva, ao código do consumidor e muitas análises feitas nas relações entre cliente e banco o que configurou na sua responsabilização.

Porém, os serviços bancários não se limitam ao atendimento e a prestação de atividades aos clientes, mas a uma gama de outros afazeres, como empréstimos, financiamentos, questões administrativas entre outros.

Com as inúmeras atividades prestadas novos riscos começaram a surgir na sociedade. Como observa o professor Carlos Alberto Bittar (2011, p. 33): “Riscos novos vêm assumindo os bancos frente a essa diversificação e à multifária gama de novas tarefas administrativas por ela impostas, exigindo-lhes a manutenção de extenso corpo funcional e a utilização crescente de computação em um complexo esquema de operação, de proporções gigantescas.”.

Os novos riscos que se entranham na sociedade dinâmica e mutacional fazem com que o Direito e seus ramos tentem acompanhar o dinamismo com o fim de proteger, garantir direitos e evitar que danos ocorram e com a Responsabilidade Civil passa a ser peça fundamental essas finalidades.

 

2 A RESPONSABILIZAÇÃO CIVIL DOS BANCOS POR DANO AMBIENTAL E A POLITICA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE

Os inúmeros ataques ao meio ambiente no último século, com o crescimento do capitalismo e consequentemente o aumento do consumo, fez com que alguns países se reunissem para objetivar soluções, ideias para a preservação ambiental e a diminuição dos danos já causados ou as respectivas indenizações. Como exemplo se tem a ECO-92, Rio+20 e outros tratados internacionais ratificados pelo Brasil e diversos Países.

Os direitos ambientais surgiram como uma proteção ao meio ambiente, ou seja, é o campo do Direito que visa, através de normas e leis, proteger um dos bens jurídicos mais importantes da humanidade: o meio ambiente como dispõe Édis Milaré (2009).

Anterior a Constituição Federal de 1988 (CF/88) surge em 1981, a Política Nacional do Meio Ambiente (PNMA), Lei 6.938, que trouxe conceitos importantes para entender o que é meio ambiente, quem são os poluidores e também acerca da responsabilização por danos causados ao meio ambiente. A instituição dessa política é fundamentada principalmente na dignidade da pessoa humana, conforme anuncia o art. 2° da referida lei.

O direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado faz parte da terceira geração dos direitos fundamentais que diz respeito à essência do ser humano, fundado no sentimento de fraternidade e solidariedade. Esse por sua vez, pela primeira vez ganha respaldo constitucional e está elencado no art. 225 da CF/88, aponta que: “Art. 225 todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.” (BRASIL, on-line)

Além disso, foi publicada a Lei 7.347/1985 com o objetivo de regulamentar as responsabilizações civis públicas por danos causados ao meio ambiente dentre outros. No artigo primeiro é possível verificar o cuidado do legislador que possibilita no texto legal a busca da responsabilidade do que causou algum dano ambiental por danos morais e patrimoniais ao meio ambiente (art. 1° da Lei 7.347 de 2011).

Nota-se que a preocupação do legislador não era apenas em conceder direitos fundamentais de proteção para o meio ambiente, mas garantias para que se efetivassem. Tais medidas protetivas que visam diminuir os danos causados, por poluição, desmatamento entre outros, foram adotadas por grandes áreas do Direito, como a medida tomada no ramo do Direito Civil que efetivou a Responsabilidade Civil no que tange a proteção ao meio ambiente segundo Vasconcellos e Benjamin (2011).

Diante disso, se extrai que o direito ao meio ambiente é difuso, não permite identificar quantas pessoas são titulares. Para afirmar isso Paulo Afonso Machado (2007, p. 118) discorre que “O meio ambiente é um bem coletivo de desfrute individual e geral ao mesmo tempo. O direito ao meio ambiente é de cada pessoa, mas não só dela, sendo ao mesmo tempo “transindividual”. Por isso, o direito ao meio ambiente entra na categoria de interesse difuso, não se esgotando numa só pessoa, mas se espraiando para uma coletividade indeterminada.”

Com todo esse aparato normativo, é sabido que o direito ambiental é regido por alguns princípios, como o da precaução, proteção, poluidor-pagador e outros, e é através da transgressão destes que surge a responsabilização ambiental por danos causados ao meio ambiente com o intuito de preservar o meio ambiente e reparar os danos a ele causados.

Nesse sentido, é preciso esclarecer que meio ambiente é o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas conforme aduz a Lei 6.938/81. E seu conteúdo normativo tem por finalidade: proteger e regular a exploração dos recursos do meio ambiente, possibilitando sua utilização sustentável e duradoura, punindo os danos causados ao meio ambiente de acordo com HOCHMAN (2016, s.p on-line).

 

2.1 DANO AMBIENTAL

Embora a legislação não elabora sua definição legal e se limita a degradação da qualidade ambiental e poluição, é preciso esclarecer o que é dano ambiental. Definir dano ambiental é complicado tendo em vista a infinidade e complexidade que é o meio ambiente.

De modo geral, José Rubens Morato Leite (2003) o define como alterações nocivas, indesejáveis e efeitos que tais alterações provocam na saúde das pessoas e de seus interesses. Para Édis Milaré (2001) dano ambiental é a lesão aos recursos ambientais, com consequente degradação do equilíbrio ecológico e da qualidade de vida.

Partindo dessas acepções, é possível entender que dano ambiental é aquilo que provoca desequilíbrio ao meio ambiente e de modo consequente afetará a vida de toda uma coletividade incontável ou não, a depender a extensão do dano, refletindo na sua dignidade.

 

2.2 O BANCO COMO POLUIDOR INDIRETO

Para efeitos de responsabilização civil ambiental é preciso identificar os protagonistas do dano. É preciso destacar a figura do poluidor, no mesmo conteúdo normativo supramencionado no art. 3°, IV “poluidor é a pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável, direta ou indiretamente, por atividade causadora de degradação ambiental.” É válido ressaltar que o texto constitucional também discorre sobre em seu art. 225 §3° “as condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados”.

Para elucidar isso Mirra (2017, p. 02) afirma que “A partir dessa definição de poluidor ou degradador da LPNMA (Lei de Política Nacional do Meio Ambiente), o STJ passou a entender como viável a responsabilização civil de todos aqueles que, de alguma forma, direta ou indiretamente, realizam condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, ampliando, sem dúvida, o espectro dos sujeitos responsáveis por danos ambientais; sejam pessoas físicas, sejam pessoas jurídicas, e no tocante às pessoas jurídicas, sejam de direito privado, sejam de direito público.”

As Instituições Financeiras, principalmente os bancos com as cessões de crédito, acabam por colaborar indiretamente nos danos causados por determinada empresa que fez o empréstimo.

É dentro dessa perspectiva que as instituições financeiras se enquadram como causadoras de danos ambientais em projetos que financiam e consequentemente imputar a responsabilização a elas. Nos artigos acima citados, a figura do poluidor é qualificada como pessoa física ou jurídica que direta ou indiretamente colabora para ocorrência da degradação. Acerca disso, Benjamin (1998) anuncia que são responsáveis tanto o poluidor que diretamente causa o dano como os poluidores que indiretamente contribuem seja facilitando o viabilizando, como pode ser o caso dos bancos.

Nesse aspecto, vislumbra-se que a PNMA instituiu uma responsabilização a todos aqueles que agem como agente poluidor. Através disso, desperta-se ao fato de que o banco não se limita apenas ao financiamento, a parte burocrática, exigências de licenças para liberação do montante é preciso fiscalizar, afinal precisa comprimir seu papel constitucional de “preservar e defender o meio ambiente ecologicamente equilibrado, essencial à sadia qualidade de vida” conforme o Art. 225 da Constituição Federal de 1988, e quando não observado esse dever pode ser responsabilizado civilmente.

Farias e Bim (2017) aludem que não é somente no direito ambiental que é possível responsabilizar indiretamente causadores de danos, dentro do direito civil também é possível, o que a doutrina denomina de responsabilidade por fato de outrem, chegando a propugnar que sua nomenclatura seja alterada para responsabilidade por fato próprio decorrente do dever de vigilância. Com efeito, a imputação à terceiro da responsabilidade por fato de outrem não é arbitrária e indiscriminada.  É preciso que o responsável indireto esteja vinculado juridicamente ao autor do ilícito para resultar-lhe dessa condição um dever de guarda, de vigilância ou de custódia.

A partir disso, se entende que a instituição financiadora assume a função de cuidar, obrigando-se também a conter os riscos inerentes a atividade financiada. “A responsabilização indireta do poluidor consiste em internalizar o dever de cuidado em terceiro alheio à relação de causalidade, ampliando o número de pessoas e instituições obrigadas a controlar a produção dos riscos conforme.” (SAMPAIO 2013, p. 26).

A jurisprudência do STJ caminha para a aceitação da possibilidade de responsabilização dos bancos por financiamentos que geraram dano ambiental. Discorre, também, que estes permanecem com a obrigação de fiscalizar, seguir todos os critérios ditados pela lei e colaborar para a diminuição dos danos.

Esse entendimento tem seu fundamento no art. 12, parágrafo único e no art. 14 §3°, da Lei de Política Nacional do Meio Ambiente que expõe sobre as entidades e órgãos de financiamento e incentivos que deverão ter licenciamento a partir do cumprimento de requisitos expressos trazidos pelo Conselho nacional do Meio Ambiente – CONAMA.

Observa-se no mesmo texto legal em seu parágrafo único a responsabilidade das entidades citadas no caput de realizar obras e aderir equipamento destinado para o controle das degradações ambientais. Ademais, a responsabilização fica clara no art. 14 em que alude das penalidades que cairão sobre àqueles que não cumprirem as medidas necessárias para a preservação ambiental. E, no parágrafo terceiro evidencia de forma expressa as consequências para as autoridades financeiras ou administrativas que concederam benefícios ou incentivos financeiros para atividades que geraram dano ao meio ambiente.

Dessa forma Álvaro Luiz Valery Mirra (2017, p.4) aduz “Com essas disposições em lei vislumbra-se a possibilidade de aumentar os agentes responsabilizados por degradação ambiental, viabilizando, inclusive, a responsabilização civil das instituições financeiras que concedem crédito ou financiamento para atividades efetiva ou potencialmente lesivas ao meio ambiente.”

Essa possibilidade já é adotada por parte da doutrina como Paulo Affonso Leme Machado e Alexandre Lima Raslan.

 

3 RESPONSABILIDADE OBJETIVA DOS BANCOS POR DANO AMBIENTAL

Com o avanço da responsabilização civil e com a força doutrinária acerca da teoria do risco, focando, especialmente, em quem deve reparar os danos e não investigar quem os causaram é que se amplia a responsabilidade civil objetiva, afastando o elemento subjetivo e se preocupando, principalmente, em reparar as perdas olhando sob o ponto de vista do fato causador do prejuízo ao bem jurídico tutelado, no caso, o meio ambiente. Para sustentar essa ideia, Andrade (2003, p. 112) infere que “responsabilidade civil por danos ao meio ambiente é, talvez, um dos mais recentes exemplos de hipóteses de responsabilidade civil por risco”.

Essa não é regra adotada pelo Código Civil brasileiro, entretanto, o art. 927 dispõe sobre os requisitos para se aplicar a responsabilidade objetiva, como já analisado anteriormente. É necessário destacar que este diploma legal descreve no parágrafo único do artigo referenciado que: “Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem”.

Ao dizer “atividade normalmente desenvolvida” o legislador faz referência a todos aqueles que exerçam com regularidade determinada atividade potencialmente nociva ou danosa aos direitos de terceiros, com a finalidade de auferir proveito, muitas vezes de natureza econômica.

Lucarelli (1994) aponta que o movimento ambientalista reivindicou a apreciação da teoria objetiva para os danos ecológicos, houve o rompimento da necessidade de provar a culpa que dependia de complexas perícias por parte dos agredidos e dos defensores da causa ambiental e, consequentemente, impondo à lide a inversão do ônus da prova.

O artigo 14 § 1° da PNMA fundamenta ainda mais a desnecessidade da apreciação a culpa quando o bem jurídico violado for o meio ambiente, assim: “[…] é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade. O Ministério Público da União e dos Estados terá legitimidade para propor ação de responsabilidade civil e criminal, por danos causados ao meio ambiente.” (grifo nosso)

É possível alegar que a responsabilidade de reparar o dano que gera uma violação ao meio ambiente independe de culpa. Mirra (2017, p. 01) aborda que “Entre outros aspectos, vale mencionar que o regime específico da responsabilidade civil ambiental está fundado na responsabilidade objetiva do degradador do meio ambiente, ou seja, responsabilidade que independe da culpa do agente, fundada no simples risco ou no simples fato da atividade causadora do dano ambiental.”

Visto que para instituir a reparação não é necessário analisar a culpa, a teoria do risco adotada na responsabilidade objetiva por danos ambientais é a Teoria do Risco Integral, suas repercussões são bem mais graves do que outras, pois não haverá a investigação se houve culpa, a licitude da conduta e da atividade também não importaram para esse instituto, pois o mero potencial lesivo da atividade realizada pode gerar danos a terceiros. Não há possibilidade de se usar as excludentes de ilicitude, como força maior ou caso fortuito conforme Pablo Stolze, (2017).

Como explica Milaré (2009, p. 964) “O interesse público, que é a base do Direito Ambiental, encontra na responsabilidade civil objetiva uma forma de convivência com a atividade particular, em geral voltada para o lucro. […] em outras palavras, com a teoria do risco integral, o poluidor, na perspectiva de uma sociedade solidarista, contribui – nem sempre de maneira voluntária – para com a reparação do dano ambiental, ainda que presentes quaisquer das clássicas excludentes da responsabilidade ou cláusula de não-indenizar. É o poluidor assumindo todo o risco que sua atividade acarreta: o simples fato de existir a atividade produz o dever de reparar, uma vez provada a conexão causal entre a tida atividade e o dano dela advindo. Segundo esse sistema, só haverá exoneração de responsabilidade quando: (a) o dano não existir; (b) o dano não guardar relação de causalidade com a atividade da qual emergiu o risco.”

É preciso apenas que haja a atividade degradadora, sendo irrelevante discutir se houve culpa ou não do agente. Comprovada tal atividade e seu alto potencial lesivo, não há a possibilidade de se eximir da responsabilidade sobre o argumento de que não degradou diretamente, apenas concedeu o financiamento à empresa degradante, de nada adiantará, pois decorre de lei essa obrigação de indenizar como um poluidor indireto.

Além disso, a resolução n. 4327/2014 do BACEN, consolidou ao definir as diretrizes para implementação de Política de Responsabilidade Socioambiental por instituições financeiras. Segundo o art. 3° § 1° a Política da Responsabilidade Socioambiental (PRSA) atua sob a seguinte égide de governança: I – implementar as ações no âmbito da PRSA; II – monitorar o cumprimento das ações estabelecidas na PRSA; III – avaliar a efetividade das ações implementadas; IV – verificar a adequação do gerenciamento do risco socioambiental estabelecido na PRSA; V – identificar eventuais deficiências na implementação das ações.”

Assim, a resolução assume que as instituições financeiras estão propensas ao risco socioambiental, objetivando diminuir não somente o dano ambiental, mas sobretudo as perdas relativas a imagem, jurídicas e de receita.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A pesquisa realizada no corpo desse artigo demonstrou a importância e relevância que o Meio Ambiente ganhou nas últimas cinco décadas no Ordenamento Jurídico Brasileiro, com leis antes da promulgação da Constituição Federal de 1988, e depois da mesma até sua incorporação no texto da Carta Magna.

No entanto, com os diversos danos frequentes e a evolução crescente da sociedade, foi necessário mais garantias ambientais, possibilitadas através da Responsabilidade Civil Objetiva pautada na Teoria do Dano Integral. A discussão atual se pauta na possibilidade de existir uma responsabilização por um financiamento, feito por bancos, que gerou danos ao meio ambiente.

Notou-se na pesquisa que há a possibilidade para doutrina majoritária e que a jurisprudência vem se posicionando em favor da responsabilização, também, das empresas jurídicas ou públicas que de alguma forma concorreram para os danos. A tamanha importância que o meio ambiente tem para a coletividade que intensifica essa busca por preservar e reparar quando necessário, por ser um direito coletivo é obrigação de todos zelarem por ele.

 

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VASCONCELLOS E BENJAMIN, Antonio Herman. Ambiental. 5 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011.

 

 

[1] Bacharelanda do curso de Direito do Centro Universitário São Francisco de Barreiras – UNIFASB. Endereço eletrônico: daianacastro17@hotmail.com.

[2] Professora especialista do curso de Direito da Faculdade São Francisco de Barreiras (FASB),, e-mail: chandrelincr@gmail.com.

Âmbito Jurídico

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