Responsabilidade civil dos notários e registradores

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1. INTRODUÇÃO


O estudo da temática responsabilidade civil é bastante complexo, exigindo-se a análise detida de cada caso específico, sendo inúmeras as situações encontradas na jurisprudência.


Por sua vez, os serviços notariais e de registro possuem uma relevante função social, uma vez que são destinados a garantir a publicidade, autenticidade, segurança e eficácia dos atos jurídicos, conforme disposto no art. 1°, da Lei n° 8.935/1994.


Assim, a análise da Responsabilidade Civil dos Notários e dos Registradores torna-se ainda mais densa ao conjugar as duas matérias acima referidas, ganhando, portanto, relevo e importância.  


Como será demonstrado no estudo, o cerne da questão será determinar a natureza jurídica dos titulares de serviços notariais e de registro, já que a partir daí serão extraídas as conclusões do presente estudo. 


2. NOTÁRIOS E REGISTRADORES


Considerando que a Constituição Federal está no ápice do ordenamento jurídico, qualquer estudo a ser desenvolvido deve partir das normas e princípios contidos na mesma.


O art. 236, da Carta Magna, prevê que:


“Art. 236. Os serviços notariais e de registro são exercidos em caráter privado, por delegação do Poder Público.


§ 1º – Lei regulará as atividades, disciplinará a responsabilidade civil e criminal dos notários, dos oficiais de registro e de seus prepostos, e definirá a fiscalização de seus atos pelo Poder Judiciário.


§ 2º – Lei federal estabelecerá normas gerais para fixação de emolumentos relativos aos atos praticados pelos serviços notariais e de registro.


§ 3º – O ingresso na atividade notarial e de registro depende de concurso público de provas e títulos, não se permitindo que qualquer serventia fique vaga, sem abertura de concurso de provimento ou de remoção, por mais de seis meses.”


A lei a que o art. 236, da CF faz referência é a Lei n° 8.935/1994, que regulamentou os serviços notariais e de registro. Segundo o art. 3°, da citada lei, notário, ou tabelião, e oficial de registro, ou registrador, são profissionais do direito, dotados de fé pública, a quem é delegado o exercício da atividade notarial e de registro.


Portanto, os notários e registradores são profissionais dotados de fé pública, dependendo o seu ingresso de aprovação em concurso público de provas e títulos, remunerados por emolumentos cuja fixação decorre dos parâmetros estabelecidos em lei federal, sujeitos à fiscalização do Poder Judiciário e exercentes de função pública delegada.


Por todas essas características podemos enquadrar os notários e registradores como agentes públicos, que são, segundo o doutrinador José dos Santos Carvalho Filho: “… o conjunto de pessoas que, a qualquer título, exercem uma função pública como prepostos do Estado. Essa função, é mister que se diga, pode ser remunerada ou gratuita, definitiva ou transitória, política ou jurídica. O que é certo é que, quando atuam no mundo jurídico, tais agentes estão de alguma forma vinculados ao Poder Público. Como se sabe, o Estado só se faz presente através das pessoas físicas que em seu nome manifestam determinada vontade, e é por isso que essa manifestação volitiva acaba por ser imputada ao próprio Estado. São todas essas pessoas físicas que constituem os agentes públicos.”¹


Para melhor compreensão dos agentes públicos a doutrina dividi essa categoria em agrupamentos de acordo com os fatores de semelhança que os aproxima. Dessa forma, classificam os agentes públicos em agentes políticos, particulares em colaboração com a Administração e servidores públicos, existindo, é claro, na doutrina, variação na nomenclatura e no número de agrupamentos.


Os agentes políticos são os formadores da vontade superior do Estado, possuindo funções de direção e orientação previstas na Constituição. Em regra, o desempenho de suas funções é transitório e sua investidura ocorre por meio de eleição, desempenhando, assim, um mandato.


Para Celso Antonio Bandeira de Mello2 são agentes políticos apenas o Presidente da República, os Governadores, os Prefeitos e os auxiliares imediatos dos Chefes do Poder Executivo (Ministros e Secretários das diversas pastas), os Senadores, os Deputados e os Vereadores. Contudo, há doutrinadores que conferem um sentido mais lato ao termo, de forma a incluir os Magistrados, membros do Ministério Público e membros do Tribunal de Contas.


Os servidores públicos são as pessoas físicas que possuem relação de trabalho de natureza profissional com o Estado e com as entidades da Administração Indireta, de caráter não eventual, mediante remuneração e com vínculo de dependência.


Já os particulares em colaboração com a Administração são pessoas que exercem função pública, mesmo que em determinadas situações em caráter temporário, sem perderem sua condição de particulares, com ou sem remuneração, sendo alheios ao ente estatal.


Analisando as características de cada agrupamento podemos concluir que os notários e registradores são agentes públicos da espécie particulares em colaboração com a Administração conforme sustentam os juristas Celso Antonio Bandeira de Mello, Maria Sylvia Zanella Di Pietro e José dos Santos Carvalho Filho:


“Na tipologia em apreço reconhecem-se:


[…]


d) concessionários e permissionários de serviços públicos, bem como os delegados de função ou ofício público, quais os titulares de serventias da Justiça não oficializadas, como é o caso dos notários, ex vi do art. 236 da Constituição…”3 [grifo nosso]


“1. delegação do Poder Público, como se dá com os empregados das empresas concessionárias e permissionárias de serviços públicos, os que exercem serviços notariais e de registro (art. 236 da Constituição), os leiloeiros, tradutores e intérpretes públicos; eles exercem função pública, em seu próprio nome, sem vínculo empregatício, porém sob fiscalização do Poder Público. A remuneração que recebe não é paga pelos cofres públicos mas pelos terceiros usuários do serviço;”4 [grifo nosso]


“Clássico exemplo desses agentes são os jurados, as pessoas convocadas para serviços eleitorais, como os mesários e os integrantes de juntas apuradoras, e os comissários de menores voluntários. São também considerados agentes particulares colaboradores os titulares de ofícios de notas e de registro não oficializados (art. 236, CF) e os concessionários e permissionários de serviços públicos.”5 [grifo nosso]


Para extirpar qualquer dúvida acerca da matéria, o Superior Tribunal de Justiça ao analisar a questão da aplicabilidade ou não da aposentadoria compulsória aos notários e registradores, confirmou a qualidade de particulares em colaboração com o Poder Público desses agentes, conforme segue:


“RECURSO ORDINÁRIO – MANDADO DE SEGURANÇA – CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO – NOTÁRIOS E REGISTRADORES – APOSENTADORIA COMPULSÓRIA – 70 ANOS DE IDADE – ART. 40, § 1º, II DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL –  EC Nº 20/98 – INAPLICABILIDADE – PRECEDENTES – RECURSO PROVIDO.


1. A Emenda Constitucional n.º 20/98, que alterou o art. 40 da Constituição Federal, disciplina que a norma referente à aposentadoria compulsória pelo implemento de idade somente é destinada aos servidores em sentido estrito, não estando abarcados neste preceito os notários e registradores, que se consideram agentes públicos, apenas, na condição de particulares em colaboração com o poder público. Precedentes do Supremo Tribunal Federal.


2. Recurso provido.” (STJ – Processo: 200501123770, Órgão Julgador: Sexta Turma, Data da decisão: 11/10/2005, Documento: STJ000723302, DJ DATA:04/12/2006, PÁGINA:376, Relator Paulo Medina). [grifo nosso]


3. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO


A responsabilidade civil do Estado rege-se por regime próprio em compatibilidade com as características da posição jurídica do ente estatal. Nesse contexto, resta configurada a responsabilidade extracontratual do Estado quando o comportamento omissivo ou comissivo do agente do Estado gera algum dano a terceiro.


Cabe destacar que a responsabilidade é do Estado, pessoa jurídica, no desempenho de suas funções administrativas, jurisdicionais e legislativas. Portanto, é equivocado falar em responsabilidade da Administração Pública já que esta não é dotada de personalidade jurídica. Contudo, a responsabilidade em relação aos Poderes Legislativo e Judiciário incide em casos reservados, observando a maior incidência nas ações e omissões dos agentes da Administração Pública.


Observando a evolução da responsabilidade civil, constata-se que ao longo dos anos ocorreu uma ampliação da proteção conferida aos particulares. Isso porque, partiu-se da Teoria da Irresponsabilidade, passando pela Teoria da Responsabilidade com culpa (Teoria Civilista da Culpa) até chegar às Teorias Publicistas que defendem a responsabilidade objetiva do Estado.


Dentre as Teorias Publicistas, quais sejam, Teoria da Culpa Administrativa (culpa no serviço ou culpa anônima do serviço), Teoria do Risco Administrativo e Teoria do Risco Integral, o Brasil adotou a Teoria do Risco Administrativo. Essa teoria parte do pressuposto de por ser o Estado mais poderoso do que os administrados, possuindo maior gama de prerrogativas, deveria responder pelo risco que suas numerosas atividades necessariamente geram. O outro fundamento dessa responsabilidade é o princípio da repartição dos encargos. Quando o Estado arca com os prejuízos da vítima, na verdade não seria o pagar direto, mas sim cada um dos integrantes da sociedade que contribuem com o valor indenizatório, sociedade essa que é a beneficiária dos poderes e prerrogativas conferidas ao Estado.


Na Constituição Federal essa matéria vem regulada pelo art. 37, §6°, in verbis:


“§ 6º – As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.”


Do texto acima verificam-se duas relações distintas. A relação do Estado com o lesado gera a responsabilidade objetiva. Já a relação do Estado com seu agente gera a responsabilidade subjetiva. Assim, o Estado responde perante o lesado independente de dolo ou culpa, tendo, por sua vez, o ente estatal direito de regresso contra seu agente quando esse agir com dolo e culpa.


Os elementos necessários para a configuração da responsabilidade civil é a ocorrência do fato administrativo (conduta comissiva ou omissiva), dano e o nexo causal entre o fato administrativo e o dano.


Esse fato administrativo deve decorrer da atuação ou omissão dos agentes das pessoas jurídicas de direito público (União, Estado, Distrito Federal, Municípios, Autarquia e Fundação) ou das pessoas de direito privado prestadoras de serviços públicos (Empresa Pública, Sociedade de Economia Mista, Concessionárias e Permissionárias de serviços públicos).


Por sua vez o termo agentes do estado se referi à categoria agentes públicos, que, conforme visto, engloba os agrupamentos agentes políticos, servidores e particulares em colaboração. É o que ensina José dos Santos Carvalho Filho:


“O termo agente tem sentido amplo, não se confundindo com o termo servidor.


[…]


Diante disso, são agentes do Estado os membros dos poderes da República, os servidores administrativos, os agentes sem vínculo típico de trabalho, os agentes colaboradores sem remuneração, enfim todos aqueles que, de alguma forma, estejam juridicamente vinculados ao Estado. Se, em sua atuação, causam dano a terceiros, provocam a responsabilidade civil do Estado.”6


4. RESPONSABILIDADE CIVIL DOS NOTÁRIOS E DOS REGISTRADORES


A responsabilidade civil dos notários e dos registradores foi disciplinada no art. 22, da Lei n° 8.935/1994, in verbis:


“Art. 22. Os notários e oficiais de registro responderão pelos danos que eles e seus prepostos causem a terceiros, na prática de atos próprios da serventia, assegurado aos primeiros direito de regresso no caso de dolo ou culpa dos prepostos.”


A interpretação literal do artigo acima resulta na conclusão que a responsabilidade dos notários e dos registradores seria objetiva, tendo direito de regresso contra seus prepostos quando atuarem com dolo ou culpa. Assim, segundo essa interpretação, os titulares de serventia responderiam pelo dano causado a terceiro em qualquer hipótese, independente de dolo ou culpa.


Contudo, como visto anteriormente, diante da supremacia da Constituição Federal no ordenamento jurídico, para que as leis e os atos editados pelo poder público não sejam extirpados do sistema, por meio da declaração de inconstitucionalidade, deverá ser feita uma interpretação conforme a Constituição, conforme adverte Alexandre de Moraes7.


Nesse sentido, considerando o teor do art. 37, §6°, da Constituição Federal, e considerando a qualidade de agente público dos notários e registradores, resta evidente a responsabilidade do Estado pelos danos causados a terceiros pelos serviços delegados notariais e registrais.


Portanto, nesses casos, na relação Estado e lesado a responsabilidade será objetiva. Já na relação Estado e notários e registradores a responsabilidade será subjetiva, ou seja, para que haja a responsabilização dos titulares das serventias é necessária a verificação do dolo ou culpa. Contudo, há, ainda, a relação do agente público delegado e seus prepostos. Quanto ao tema, prevê o art. 20, da Lei n° 8.935/1994, in verbis:


“Art. 20. Os notários e os oficiais de registro poderão, para o desempenho de suas funções, contratar escreventes, dentre eles escolhendo os substitutos, e auxiliares como empregados, com remuneração livremente ajustada e sob o regime da legislação do trabalho.”


Portanto, poderão os notários e os registradores contratar empregados para que os auxiliem no desempenho de suas funções. Essa relação, por expressa determinação legal, será regida pelo Direito do Trabalho.


A responsabilidade dos empregadores por ações ou omissões de seus empregados é regulada pelo Código Civil, nos arts. 932 e 933:


“Art. 932. São também responsáveis pela reparação civil:


[…]


III – o empregador ou comitente, por seus empregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele;


[…]


Art. 933. As pessoas indicadas nos incisos I a V do artigo antecedente, ainda que não haja culpa de sua parte, responderão pelos atos praticados pelos terceiros ali referidos.”


Destarte, dos artigos acima infere-se que o Código Civil estabeleceu a responsabilidade objetiva dos empregadores pelos atos e omissões praticados por seus empregados. Segundo Carlos Roberto Gonçalves, para que o lesado possa responsabilizar o empregador por ato de preposto, deverá comprovar três requisitos:


“1º) qualidade de empregado, serviçal ou preposto, do causador do dano (prova de que o dano foi causado por preposto);


2º) conduta culposa (dolo ou culpa stricto sensu) do preposto;


3º) que o ato lesivo tenha sido praticado no exercício da função que lhe competia, ou em razão dela.”8


Dessa forma, uma vez responsabilizado o Estado, este terá direito de regresso contra os notários e registradores em decorrência de atuação culposa sua ou de seus prepostos. No último caso, ou seja, quando a conduta culposa for praticada por preposto do titular da serventia, terão os notários e registradores direito de regresso em face de seu empregado.


Quanto ao sujeito passivo da lide, o entendimento majoritário é no sentido de que o lesado pode propor a ação em face do Estado, do titular da serventia ou dos prepostos, observando-se as condições e os requisitos exigidos por cada um para sua responsabilização. Assim, se dirigir a ação em face do Estado estará dispensando da comprovação do dolo ou da culpa. Contudo, se a ação for proposta em face do titular da serventia ou de seu preposto, obrigatória será a demonstração da culpa ou dolo.


Corroborando o entendimento de que o Estado responde objetivamente pelos danos causados a terceiros pela conduta dos notários e registradores ou seus prepostos, quando na prestação dos serviços delegados, segue jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:


ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO PELOS DANOS CAUSADOS PELOS TITULARES DE SERVENTIAS EXTRAJUDICIAIS NÃO-OFICIALIZADAS.


1. Já na vigência da Constituição de 1969, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal afirmava que “os titulares de ofícios de Justiça e de notas, quer do foro judicial, quer do foro extrajudicial (e, portanto, também os tabeliães), eram servidores públicos e por seus atos praticados nessa qualidade respondia o Estado, com base no artigo 107, pelos danos por eles causados a terceiros, embora esse dispositivo constitucional não impedisse que a vítima do dano, se preferisse, acionasse diretamente o servidor público com fundamento no artigo 159 do Código Civil” (RE 116.662/PR, 1ª Turma, Min. Moreira Alves, DJ de 16.10.1998). Tal orientação foi reiterada após a promulgação da Carta de 1988 (por todos, do AgRg RE 209.354/PR, 2ª Turma, Min. Carlos Velloso, DJ de 16.04.1999).


2. No caso concreto, portanto, deve ser reconhecida a legitimidade do Estado de Goiás para figurar no pólo passivo da ação de indenização por danos causados por titular de serventia extrajudicial não-oficializada.


3. Recurso especial provido, com a determinação do retorno dos autos ao Tribunal de origem, para que aprecie as demais questões suscitadas na apelação.” (STJ – Processo: 200201664084, Órgão Julgador: Primeira Turma, Data da decisão: 03/03/2005, Documento: STJ000597866, DJ DATA:21/03/2005, Página:218, Relator: TEORI ALBINO ZAVASCKI). [grifo nosso]


Necessário destacar que a responsabilidade por dano causado na prestação de serviços notariais e registrais é pessoal do titular da serventia que praticou o ato, não podendo ser responsabilizado o titular sucessor na serventia, conforme jurisprudência a seguir transcrita:


“RESPONSABILIDADE CIVIL. NOTÁRIO. LEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO DE PERNAMBUCO PELOS DANOS CAUSADOS PELO TITULAR DE SERVENTIA EXTRAJUDICIAL NÃO-OFICIALIZADA. PRECEDENTES.


A responsabilidade civil por dano causado a particular por ato  de oficial do Registro de Imóveis é pessoal, não podendo o seu sucessor, atual titular da serventia, responder pelo ato ilícito praticado pelo sucedido, antigo titular. Precedentes. Recurso especial provido.” (STJ – Processo: 200401361747, Órgão Julgador: Terceira Turma, Data da decisão: 23/05/2006, Documento: STJ000721635, DJ DATA: 27/11/2006, Página:278, Relator: Castro Filho). [grifo nosso]


 observando-se os requisitos e condiso de dolo ou culpa, poderregadoso danos causados a terceiros pelos servi de prerrogativas,


5. DENUNCIAÇÃO DA LIDE


A denunciação da lide é espécie de intervenção de terceiro constituindo ação regressiva de garantia intentada nos próprios autos do processo pelo autor ou pelo réu, encontrando-se regulada nos arts. 70 a 76, do Código de Processo Civil.


O caso em análise encontra-se disciplinado no art. 70, III, do CPC, in verbis:


“Art. 70. A denunciação da lide é obrigatória: 


[…]


III – àquele que estiver obrigado, pela lei ou pelo contrato, a indenizar, em ação regressiva, o prejuízo do que perder a demanda.”


Na doutrina há a discussão sob a possibilidade de se utilizar a denunciação da lide na hipótese de responsabilidade civil do Estado.


Há doutrinadores que entendem que nesses casos a denunciação da lide é obrigatória. Entendimento diverso é daqueles que defendem a denunciação como facultativa, ou seja, mesmo que o Estado não faça a denunciação, o processo será válido, podendo, ainda, o Estado exercitar seu direito de regresso posteriormente em ação autônoma.


Por fim, defendem alguns que no caso de responsabilidade estatal inaplicável seria o art. 70, III, do CPC, por ser aplicável somente nos casos normais de responsabilidade civil. Isso porque, os fundamentos dos pedidos seriam diversos. O pedido da vítima estaria fundamentado na responsabilidade objetiva do Estado, enquanto o pedido do Estado na denunciação da lide na responsabilidade subjetiva do agente. O outro argumento seria de que a utilização da denunciação acabaria com o benefício concedido ao lesado pela Carta Magna de não ter que discutir no processo a existência de culpa. Assim, a vítima teria que aguardar o conflito do Estado com seu agente fundado na comprovação da culpa que por norma constitucional estaria dispensada.


Apesar das divergências expostas, a jurisprudência pátria vem se firmando no sentido de que é possível a denunciação da lide nos casos de responsabilidade civil do Estado, sendo esta facultativa. Nesse sentido segue jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:


“PROCESSUAL CIVIL. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO. DENUNCIAÇÃO Á LIDE. ART. 70, INC. III, CPC. RECURSO ESPECIAL. APLICAÇÃO DA SÚMULA N. 83/STJ.


I – A jurisprudência deste Tribunal Superior se encontra assentada no entendimento de que “nas ações de indenização fundadas na responsabilidade civil objetiva do Estado (CF/88, art. 37, § 6º), não é obrigatória a denunciação da lide do agente público supostamente responsável pelo ato lesivo (CPC, art. 70, III)”. (REsp n. 521434/TO, Rel. Min. DENISE ARRUDA, DJ de 08.06.2006).


II – Aplicação da Súmula n. 83/STJ a obstaculizar o recurso especial.


III – Agravo regimental desprovido.” (STJ – Processo: 200601964925, Órgão Julgador: Primeira Turma, Data da decisão: 01/03/2007, Documento: STJ000738340, DJ DATA:26/03/2007 Página:213, Relator: FRANCISCO FALCÃO). [grifo nosso]


Aplicando esse entendimento o Estado poderá denunciar à lide o titular de serventia no caso de atuação culposa deste ou de seu preposto. De igual forma, o notário ou registrador também poderá denunciar à lide seu preposto que tenha praticado conduta culposa.


6. CONCLUSÕES


Ante as considerações tecidas, conclui-se que os notários e registradores são agentes públicos, classificados na categoria de particulares em colaboração com a Administração.


Quanto à responsabilidade civil do Estado, o Brasil adotou a Teoria do Risco Administrativo, sendo assim, a responsabilidade objetiva.


Mais a mais, considerando que os titulares das serventias são agentes públicos, o Estado responderá objetivamente pelos danos causados pelos titulares da serventia e seus prepostos, quando na prestação dos serviços delegados. Caberá, contudo, ao Estado o direito de regresso quando os notários, registradores e seus prepostos praticarem condutas dolosas ou culposas. De igual forma, terá o titular da serventia ação regressiva em face de seus empregados quando estes atuarem culposamente. Assim, constante-se que a responsabilidade dos titulares de serventias e de seus prepostos é subjetiva.


Conforme destacado, a responsabilidade é pessoal do titular da serventia que praticou o ato, não devendo, assim, ser responsabilizado o titular sucessor na serventia.


No tocante ao sujeito passivo da lide o lesado poderá ingressar com a ação de reparação em face do Estado, titular da serventia ou de empregado deste, conforme o caso.


Já o direito de regresso poderá ser manejado por via de denunciação da lide ou por meio de ação autônoma.


 


Referências

CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de direito processual civil. 14. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2006, v.1.

CENEVIVA, Walter. Lei dos registros públicos comentada. 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2001.

FILHO, José dos Santos Carvalho. Manual de direito administrativo. 11. ed. rev. amp. e atual. Rio de Janeiro: Lumen Júris, 2004.

FILHO, Manoel Gonçalves Ferreira. Curso de direito constitucional. 30. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2003.

FILHO, Roberval Rocha Filho. Principais julgamentos do Superior Tribunal de Justiça. Bahia: Podivm, 2007.

FILHO, Roberval Rocha Filho. Principais julgamentos do Supremo Tribunal Federal. Bahia: Podivm, 2007.

GONÇALVES, Carlos Alberto. Direito civil brasileiro: responsabilidade civil. 2. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007, v.4.

MACHADO, Costa. Código de processo civil interpretado: artigo por artigo, parágrafo por parágrafo. 6. ed. rev. e atual. São Paulo: Manole, 2007.

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 28. ed. atual. São Paulo: Malheiros, 2003.

MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 16. ed. rev. e  atual. São Paulo: Malheiros, 2003.

PIETRO, Maria Sylvia Zanella Di. Direito administrativo. 16. ed. São Paulo: Atlas, 2003.

 

Notas

[1] FILHO, José dos Santos Carvalho. Manual de direito administrativo. 11. ed. rev. amp. e atual. Rio de Janeiro: Lumen Júris, 2004, p. 483.

[2] MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 16. ed. rev. e  atual. São Paulo: Malheiros, 2003, p.229/230.

[3] MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 16. ed. rev. e  atual. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 232/233.

[4] PIETRO, Maria Sylvia Zanella Di. Direito administrativo. 16. ed. São Paulo: Atlas, 2003, p.437.

[5] FILHO, José dos Santos Carvalho. Manual de direito administrativo. 11. ed. rev. amp. e atual. Rio de Janeiro: Lumen Júris, 2004, p. 485.

[6] FILHO, José dos Santos Carvalho. Manual de direito administrativo. 11. ed. rev. amp. e atual. Rio de Janeiro: Lumen Júris, 2004, p. 453.

[7] MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. 19. ed. atual. São Paulo: Atlas, 2006, p.11/14.

[8] GONÇALVES, Carlos Alberto. Direito civil brasileiro: responsabilidade civil. 2. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007, v.4.


Informações Sobre o Autor

Luiziany Albano Scherrer

Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Espírito Santo – UFES.
Pós-Graduada em Ciências Jurídicas pela Universidade Candido Mendes – UCAM, em convênio com o Instituto a Vez do Mestre – IAVM e o DIEX.
Servidora Pública Federal.


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