Uma Breve Análise Acerca dos Alimentos Gravídicos

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Resumo: Este artigo tem como objetivo fazer uma breve análise acerca dos alimentos gravídicos. O tema ora exposto foi escolhido por ser atual e muito relevante no mundo jurídico tendo em vista que a Lei n 11.804 com vigência desde o dia 05 de novembro de 2008 efetivamente veio assegurar uma maior proteção à vida e ao desenvolvimento saudável do nascituro disciplinando o direito a alimentos da mulher gestante com o intuito de proteger a gestação e garantir o nascimento seguro da criança. A nova lei permite que mesmo sem vínculos conjugais o pedido de alimentos poderá ser formulado pela mulher grávida desde o momento da concepção com fundamento apenas em meros indícios da paternidade os quais serão apreciados pelo Juiz. Os princípios que norteiam tal instituto atendem a Declaração dos Direitos da Criança promulgada pela Assembleia Geral da ONU que destaca a necessidade de haver proteção legal para a criança mesmo antes de seu nascimento. É preciso que se dê efetividade ao princípio da paternidade responsável tendo em vista que a obrigação do suposto pai de prestar alimentos ao nascituro está revestida de interesse social assim como de caráter e dever moral ou financeiro e deve ser dada desde o momento da concepção. Em decorrência de haver em nosso país um elevado índice de crianças cuja paternidade é desconhecida se faz necessário defender através de uma análise crítica o direito que assiste à mulher gestante de reivindicar alimentos em favor do nascituro.

Sumário: Introdução. Conceituação dos Alimentos. Alimentos no Código Civil. Personalidade Civil do Nascituro. Nascituro e a Necessidade de Reivindicar Alimentos. Nascituro e o Direito à Vida. Estatuto da Criança e do Adolescente e a Dignidade Humana. A Ação de Alimentos gravídicos. A Concessão dos Alimentos e Aplicação do Binômio Necessidade/Possibilidade. Legitimidade da gestante para representar o nascituro. Paternidade responsável desde a concepção. Considerações Finais. Referências.

Introdução

A obrigação de prestar alimentos, mais do que um dever moral de prestação de socorro e solidariedade, aos que necessitam de alimentos, transformou-se ao longo do tempo em uma exigência jurídica de assistência.

Os alimentos se revestem de relevante interesse social, e contribuem para a integridade da pessoa, sua formação, sobrevivência e conservação, como direitos assecuratórios à personalidade, à dignidade e à cidadania, direitos estes fundamentais, assegurados na Carta Magna de 1988.

É evidente, que o direito aos alimentos tem por objetivo, assegurar ao credor, sua própria subsistência, no que se refere aos alimentos propriamente ditos, à saúde, à educação, ao lazer, dentre outras necessidades básicas.

Com o propósito de proteger a vida do nascituro desde o momento da concepção, o legislador pátrio editou a Lei n. 11.804/08, a qual garante o direito à mulher gestante de pedir ao suposto pai alimentos para o nascituro, bastando para isso a demonstração de meros indícios da paternidade, pois o artigo 5º da Constituição Federal destaca o direito à vida como direito fundamental, amparando-o em todas as suas dimensões, quer sob a forma extra ou intra-uterina, viabilizando assim, o manejo de instrumentos de tutelá-lo em sua integridade.

Mesmo antes da existência da referida lei, a jurisprudência do Tribunal de justiça do Rio Grande do Sul já entendia cabível a fixação de alimentos ao nascituro:

“ALIMENTOS EM FAVOR DE NASCITURO. Havendo indícios da paternidade, não negando o agravante contatos sexuais à época da concepção, impositiva a manutenção dos alimentos à mãe no montante de meio salário mínimo para suprir suas necessidades e também as do infante que acaba de nascer (grifo meu). Não afasta tal direito o ingresso da ação de investigação de paternidade cumulada com alimentos. Agravo desprovido.” (SEGREDO DE JUSTIÇA) (Agravo de Instrumento Nº 70018406652, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Maria Berenice Dias, Julgado em 11/04/2007)

“AGRAVO DE INSTRUMENTO. ALIMENTOS PROVISÓRIOS. NASCITURO. CABIMENTO. PRELIMINAR. A decisão que fixa os alimentos provisórios em prol do nascituro, sem por fim a demanda, desafia agravo de instrumento e não apelação. O agravante não nega o relacionamento amoroso mantido com a representante do nascituro, tampouco que tenha mantido relação sexual com ela à época da concepção. Alegação de dúvida sobre a paternidade não infirma o disposto no art. 2º do CC quanto à proteção aos direitos do nascituro. Precedentes. Preliminar rejeitada. Recurso desprovido.” (Agravo de Instrumento Nº 70021002514, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: José Ataídes Siqueira Trindade, Julgado em 15/10/2007)

Os direitos que versam sobre o início da personalidade civil foram tiveram mais destaque e ganharam repercussão com o advento da Constituição da República Federativa do Brasil, promulgada 1988. Esses direitos ganharam tamanha notoriedade em decorrência do princípio da dignidade da pessoa humana, considerado pelo ordenamento jurídico brasileiro como valor fundamental e supremo, tanto para o ser já concebido como para o que ainda está pra nascer.

O atual Código Civil brasileiro determina que a personalidade civil seja atribuída a partir do nascimento com vida, entretanto, assegurada desde a concepção os direitos do nascituro. (art. 2º do Código Civil de 2002).

Ocorre que, ainda, é ponto controvertido no ordenamento jurídico brasileiro o momento em que se dá início à vida humana. O grande desafio para o legislador é definir o termo exato em que o indivíduo adquire personalidade civil, ou seja, se a partir do nascimento com vida ou desde o momento da concepção, considerando que na legislação civil brasileira há várias teorias que se posicionam de forma divergente sobre o tema, bem como sobre os direitos que a ela são assegurados.

Nesse contexto, percebe-se que são restringidos ao nascituro uma infinidade de direitos, tais como os direitos da personalidade, que, segundo o Código Civil de 2002,  o qual adota a teoria natalista, não lhes devem ser conferidos os direitos da personalidade, vez que ele não é reconhecido como sujeito de direitos. (ALMEIDA, 2000, p.380).

Diante de tantos questionamentos acerca do tema ora apresentado, surgem teorias que têm outro entendimento. A teoria natalista, acima citada, e a teoria da personalidade condicional, reconhecem direitos ao indivíduo que nasce com vida, não incluindo, portanto, o nascituro. Essas duas teorias possuem algumas peculiaridades que as diferenciam, mas nenhuma delas reconhece o nascituro como sujeito de direitos.

Ao contrário dessas duas teorias mencionadas, existe a teoria concepcionista que entende que os direitos da personalidade devem ser conferidos desde o momento da concepção e, portanto, afirma que o nascituro é um sujeito de direitos, devendo lhes ser assegurados tais direitos. (ALMEIDA, 2000, p.380).

Os direitos da personalidade poderão ser conferidos ao nascituro, considerando que a teoria concepcionista o reconhece como sujeito de direitos, conferindo-lhe a atribuição de personalidade civil. (ALMEIDA, 2000, p.381).

Muito embora o Código Civil brasileiro adote a teoria natalista, que menos assegura direitos ao nascituro, de outro lado, a doutrina e jurisprudência têm reconhecido e estendido os direitos da personalidade civil a ele, adeptos da teoria concepcionista, a qual põe a salvo os direitos do nascituro desde o momento da concepção.

O presente trabalho monográfico tem como objetivo demonstrar que o nascituro é um ser humano e, como tal, deve ser reconhecido como sujeito de direitos, devendo possuir tantos direitos quantos sejam concedidos pelos direitos da personalidade. Dentre eles: o direito à vida, aos alimentos, à dignidade etc.

O Estado brasileiro deve garantir com absoluta prioridade os direitos do nascituro, da criança e do adolescente, conforme previsto na Carta Magna.  Garantir que o ser humano mesmo antes do nascimento, ainda na concepção, tenha direito a alimentos, nada mais é do que tutelar a vida humana em sua plenitude, posto que de nada adiantaria salvaguardar os direitos do nascituro, caso não fosse possibilitado o direito do feto crescer e se desenvolver de modo saudável.

Conceituação dos alimentos

O ser humano, desde o nascimento até sua morte, necessita de amparo dos seus semelhantes e de bens necessários ou essenciais para sua sobrevivência. Nesse rol, realça-se a necessidade de alimentos. Desse modo, alimento em seu termo vulgar pode ser entendido como tudo aquilo necessário à sua subsistência. Acrescente-se a essa noção o conceito de obrigação que tem uma pessoa de fornecer esses alimentos a outra e chega-se facilmente à noção jurídica. No entanto, no Direito a compreensão do termo é mais ampla, pois a palavra, além de abranger os alimentos propriamente ditos, deve referir-se também à satisfação de outras necessidades essenciais da vida em sociedade.  (VENOSA, 2006, p.375).

Alimentos, segundo Orlando Gomes (2000, p.427), são prestações para a satisfação das necessidades vitais de quem não pode provê-las por si. Tem por finalidade fornecer a um parente, cônjuge ou companheiro o necessário à sua subsistência. Já para Roberto Senise Lisboa (2010, p.48) os alimentos: “são as necessidades para a subsistência humana.”

Todo indivíduo tem direito à subsistência. Primordialmente, pelo trabalho, cujo exercício livre é assegurado constitucionalmente (Constituição de 1988, art. 5º, XIII), integra o desenvolvimento nacional segundo o princípio de sua valorização como um direito social (Constituição Federal do Brasil, arts. 6º e 9º).

Quem não pode promover a sua subsistência, nem por isso é deixado à própria sorte. A sociedade há de propiciar-lhe sobrevivência através de meios e órgãos estatais ou particulares. Ao poder público compete desenvolver assistência social e estimular o seguro, tomando as medidas defensivas adequadas.

 A Constituição de 1988 determinou em seu art. 229 que “os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, enquanto os filhos maiores têm o dever de ajudar e ampara os pais na velhice, carência ou enfermidade”.

 O vocábulo “alimentos” tem, todavia, conotação muito mais ampla do que na linguagem comum, não se limitando ao necessário para o sustento de uma pessoa. Nele se compreende não só a obrigação de prestá-los, como também o conteúdo da obrigação a ser prestada. A aludida expressão tem, no campo do direito, uma acepção técnica de larga abrangência, compreendendo não só o indispensável ao sustento, como também o necessário à manutenção social e moral do alimentando.

Levando-se em conta a conceituação doutrinária acima mencionada, e o sentido da Lei nº. 11.804/2008, que disciplinou os alimentos em favor do nascituro, pode-se conceituar essa modalidade denominada de alimentos gravídicos, como sendo os necessários ou essenciais ao desenvolvimento regular e saudável do feto, a fim de que este venha a nascer com vida. Nesse aspecto realça-se a necessidade de alimentos desde a concepção, necessitando o ser humano, com base no princípio da dignidade da pessoa humana, de amparo de seus semelhantes e de bens indispensáveis para sua subsistência.

Para Silvio de Salvo Venosa (2010, p. 355): “o termo alimentos em sua conotação vulgar, pode ser entendido como sendo tudo aquilo necessário para sua sobrevivência”. A essa noção acrescente o direito da obrigação que uma pessoa tem de prestar alimentos a outra.

O Código Civil, no capitulo específico (arts. 1.694 a 1.710), não se preocupou em definir alimentos. Porém, no art. 1.920 aborda o conteúdo legal de alimentos quando se refere ao legado nos seguintes termos: “o legado de alimentos abrange o sustento, a cura, o vestuário e a casa enquanto o legatário viver, além da educação, se ele for menor.”

Assim, alimentos, na linguagem jurídica, possuem sentido bem mais amplo do que o comum, compreendendo, além da alimentação, também o que for necessário à moradia, vestuário, assistência médica e instrução. Os alimentos, assim, se traduzem em prestações periódicas fornecidas a alguém para suprir essas necessidades e assegura sua subsistência. (VENOSA, 2010, p.356).

Alimentos no código civil

O Código Civil de 2002, ao tratar dos alimentos, nos artigos 1.694 a 1.710, disciplina a abrangência da prestação alimentícia, a reciprocidade da obrigação entre pais e filhos, que compõe a responsabilidade dos que devem cumprir com o dever alimentar, com os parâmetros que devem ser observados dentro do binômio possibilidade/ necessidade, assim como a responsabilidade dos pais de forma geral, quer sejam conviventes, separados ou divorciados, quer sejam ascendentes ou descendentes.

Todos os temas do direito de família comportam uma enorme repercussão pragmática. Um dos mais importantes, sem a menor sombra de dúvidas, é a questão dos alimentos, destinatária de um subtítulo especifico (III) do titulo II (“Do Direito Patrimonial”) do livro IV (“Do Direito de Família”) do Vigente Código Civil brasileiro e objeto de diversas demandas judiciais. (STOLZE e PAMOPLONA, 2011, p. 673).

Na obrigação legal de alimentos incluem-se particularidades marcantes, importando apenas aquelas atinentes à irrenunciabilidade, imprescritibilidade, intransmissibilidade e a imprescritibilidade do direito. Outras características merecem ser elencadas, como a impenhorabilidade e a incompensabilidade do crédito alimentar; reciprocidade decorrente da relação de parentesco e do dever de muita assistência ; a inalienabilidade do direito; e a impossibilidade serem restituídos alimentos já ministrados, ainda que seja posteriormente denegada a continuidade do pensamento. (OLIVEIRA FILHO, p. 06).

Destoando do entendimento da Súmula 379 do Supremo Tribunal Federal, o entendimento doutrinário e jurisprudencial sempre considerou irrenunciáveis os alimentos derivados da relação de parentesco. Hoje ainda a discussão não se encerra na esteira do que dispõe o art. 1.707 do Código Civil. A legislação revogada (art. 404 da Lei, 3.071/16), continha vedação assemelhada, ora repetida no texto vigente, o que não invalida o posicionamento de antes.

A irrenunciabilidade, na dicção da lei civil vigente (art.1.707) como princípio de ordem pública, atém-se como defendido aos alimentos derivados do parentesco. No entanto, consoante emerge do dispositivo legal, a indisponibilidade alcança apenas o direito, porquanto no dizer de Bertoldo Mateus de Oliveira Filho (p.8): “o interessado, terá o arbítrio de o não exercer, pois sempre prevalece a regra invitio datur beneficium, ou seja, a ninguém se pode impor o dever de solicitar alimentos”.   

Já a intrasmissibilidade da obrigação alimentar, hipoteticamente incontroversa em face do art. 402 do antigo Código Civil, aparenta agora confrontar-se com o que dispõe o art. 1.700 da Lei 10.406/2002. Sendo o direito a alimentos personalíssimo, sempre pareceu lógico que o óbito de que os prestava ou recebia implicava a extinção do encargo.

A imprescritibilidade da obrigação alimentar é reconhecida de forma unânime pela doutrina e jurisprudência, vez que o disposto no art. 206, § 2º do Código Civil atinge unicamente as parcelas fixadas ou convencionadas da verba alimentar, tanto que há muito dispôs o art. 23 da Lei n º 5.478/68 que o fenômeno alcança as prestações mensais e não o direito.

O crédito alimentar tem a garantia da incompensabilidade, o que significa que o incumbido da assistência material não pode opor-se, para dedução reclamada a titulo de pensão, o fornecimento in natura de gêneros alimentícios ou, ainda, o custeio de despesas que não integram a obrigação juridicamente estruturada.

A personalidade civil do nascituro

A personalidade é um atributo jurídico. Todo homem, atualmente, tem aptidão para desempenhar na sociedade um papel jurídico, como sujeitos de direitos e obrigações. Sua personalidade é institucionalizada num complexo de regras declaratórias das condições de sua atividade jurídica e dos limites a que deve circunscrever. O conhecimento dessas normas interessa a todo o Direito Privado, porque se dirige à pessoa humana considerada em sua opinião para agir juridicamente.  Mas não só o homem tem personalidade, tem-na também outros grupos de indivíduos, constituídos na forma da lei, entre eles o nascituro. (GOMES, 2010, p. 107).

Ao tratar do assunto, Clóvis Beviláqua (1999, p.81) afirma que:

“A personalidade jurídica tem por base a personalidade psíquica, somente no sentido de que, sem essa última o homem não poderia ter elevado até a concepção da primeira. Mas conceito jurídico e psicológico não se confundem. Certamente o individuo vê na sua personalidade jurídica a projeção de sua personalidade psíquica, ou, antes, um outro campo que Lea se afirma, dilatando-se ou adquirindo novas qualidades. Todavia na personalidade jurídica intervém um elemento, a ordem jurídica, do qual ela depende essencialmente, do qual recebe a existência, a forma e a força ativa. Assim a personalidade jurídica é mais do que um processo superior da atividade psíquica; é uma criação social, exigida pela necessidade de pôr em movimento o aparelho jurídico, e que, portanto, é modelado pela ordem jurídica”.

A existência da personalidade coincide, normalmente, com a duração da vida humana. Começa com o nascimento e termina com a morte. Mas o ordenamento jurídico admite personalidade em hipóteses nas quais a coincidência não se verifica.  O processo técnico empregado para esse fim é o da ficção. Ao lado da personalidade real, verdadeira, autêntica, admite-se a personalidade fictícia, artificial presumida. (GOMES, 2010, p. 109).

São casos de personalidade fictícia, a do nascituro; a do ausente; a da pessoa cuja possibilidade de vir a existir é admitida para a aquisição de direitos. (GOMES, 2010, p. 109).

A lei assegura direitos ao nascituro, se nascer com vida. Não tem personalidade, mas, desde a concepção, é como se tivesse. A incerteza quanto à morte de alguém leva à presunção de sua inexistência, se concorrem certas circunstâncias. Pode estar vivo, mas a lei o presume morto. O direito toma em consideração mera eventualidade, qual seja: a de um ser vir a existir, não estando sequer concebido, como no caso do fideicomisso, em proveito do concepturus. (GOMES, 2010, p. 109).

Estas ficções atribuem personalidade porque reconhecem, nos beneficiados, a aptidão para ter direitos, mas é logicamente absurdo admitir a condição de pessoa  natural a quem ainda não nasceu ou já morreu. Trata-se de construção técnica destinada a certos fins. Dilata-se o termo inicial e final da vida humana, para que sejam protegidos certos interesses.

São de grande importância as regras atinentes à determinação do começo da personalidade, especialmente para os fins de sucessão “mortis causa” e de qualificação da nacionalidade. Daí o interesse de fixar o momento exato em que começa a personalidade. (GOMES, 2010, p. 109).

A personalidade civil do homem começa do nascimento com vida. Não basta o nascimento. É preciso que o concebido nasça vivo. O natimorto não adquire personalidade. Entende-se que alguém nasceu com vida quando respirou. Se viveu ou não é questão que só se resolve mediante perícia médico-legal. (GOMES, 2010, p. 109).

Algumas legislações exigem outro requisito, a viabilidade do recém-nascido, isto é, a possibilidade fisiológica, que pressupõe a existência essencial ao corpo humano a tendência para abandonar essa exigência difunde-se nos códigos mais novos.

Como visto, desde a concepção asseguram-se direitos ao nascituro equiparado, que é a pessoa, no seu interesse. Perdura no Direito moderno a regra de que o nascituro pode ser reconhecido pelo pai, bem como adquirir bens por sucessão hereditária ou em razão de doação. (GOMES, 2010, p. 110).

A personalidade termina com a morte real ou presumida. Só a morte natural, põe termo à personalidade. A morte civil, outrora admitida foi banida das legislações. (GOMES, 2010, p. 110)

Pelo nosso direito, portanto, antes do nascimento com vida não há personalidade. Mas a lei cuida, em dadas circunstancias de proteger e resguardar os interesses do nascituro. Situações existem, na verdade, em que se reconhece a existência de um direito potencial ao ente concebido que abrange: a curatela do nascituro (art. 1.779 e art. 1780 do Código Civil); a admissibilidade de ser constituído herdeiro ou legatário o concebido (art. 1.799 do Código Civil). Mas nesse caso não se pode falar em “pessoa” do nascituro, pois resguarda os seus interesses equipara-se à doação à prole eventual de determinado casal (art.546 do Código Civil).

Segundo o entendimento de Maria Helena Diniz (2007, p.185):

“Na vida intra-uterina, tem o nascituro personalidade jurídica formal, no que atine aos direitos personalíssimos e os da personalidade, passando a ter personalidade jurídica material, alcançando os direitos patrimoniais, que permaneciam em estado potencial, somente com nascimento com vida. Se nascer com vida, adquire personalidade jurídica material, mas se tal não ocorrer, nenhum direito matrimonial terá.

Já no dizer de Caio Mário da Silva Pereira (2010, p. 186):

“A personalidade, como atributo da pessoa humana esta a ela indissoluvelmente ligada. Sua duração é a da vida. Desde que vive e enquanto vive, o homem é dotado de personalidade. O problema de seu início fala de perto à indagação de quando tem começo a existência do ser humano, confundindo-se numa só a resposta a ambas as perguntas.”

Apesar de ainda haver grande discussão sobre a teoria atinente a personalidade jurídica do nascituro, seja da teoria natalista, ou da concepcionista, percebe-se que ambas defendem que o nascituro tem direito a vida e não a mera expectativa.  Embora a teoria concepcionaista seja a mais moderna, já era abraçada por alguns doutrinadores como Teixeira de Freitas e Clóvis Bevilaqua, estendendo-se até modernos autores como Silmara Chinelato, ao sustentar que o nascituro teria a personalidade jurídica desde a concepção, inclusive, para efeitos patrimoniais. A teoria concepcionista faz com que o nascimento com vida retroaja com eficácia jurídica desde a sua concepção, fazendo com que o nascituro tenha personalidade jurídica desde a concepção. (ALMEIDA, 2000, p.380).

Sobre o tema já decidiu o Tribunal de Justiça do Estado de Sergipe:

“APELAÇÃO CÍVEL – SEGURO OBRIGATÓRIO – DPVAT – MULHER GRÁVIDA DE 34 SEMANAS ATROPELADA – MORTE DO NASCITURO OCORRIDA EM VIA PÚBLICA – RUA PERCILIO ANDRADE NO MUNICÍPIO DE ITABAIANA – CORREÇÃO MONETÁRIA A PARTIR DO SINISTRO – SENTENÇA MANUTENIDA – APELO CONHECIDO E IMPROVIDO. O nascituro, provido de personalidade jurídica desde o momento da concepção (grifo meu), está coberto pelo seguro DPVAT, visto que seu bem-estar é assegurado pelo ordenamento pátrio. É devido o pagamento da indenização no caso de interrupção da gravidez e morte causadas por acidente de trânsito.” (APELAÇÃO CÍVEL Nº 0967/2010, 2ª VARA CIVEL DE ITABAIANA, Tribunal de Justiça do Estado de Sergipe, DES. OSÓRIO DE ARAUJO RAMOS FILHO, RELATOR, Julgado em 17/05/2010)                        

Nascituro e a necessidade de reivindicar alimentos

Matéria que tem despertado o interesse dos juristas com repercussão nos Tribunais é a que acode a indagação de o nascituro ter direitos. Em estrita análise do art.2º, § 4º, do Código Civil, a resposta seria negativa, uma vez que por este preceito a personalidade começa com o nascimento com vida, e o nascituro, não tendo personalidade, não teria legitimidade para pleiteá-los. À vista de outros conceitos, a matéria merece ponderação. (PEREIRA, 2007, p. 515).

Se a lei põe a salvo os direitos do nascituro desde a concepção, é de se considerar que o seu principal direito consiste no “direito à própria vida” e esta seria comprometida se à mãe fossem recusados os recursos primários à sobrevivência do ente em formação em seu ventre.

Nesse sentido Pontes de Miranda (1979, p. 215), comenta que “a obrigação alimentar pode começar antes de nascer, pois existem despesas que tecnicamente à proteção do concebido e o direito seria inferior se acaso recusasse atendimento a tais relações inter-humanas, solidamente fundadas em exigências da pediatria”.

Silmara J.A Chinelato e Almeida reconhece que são devidos ao nascituro os alimentos em sentido lato -“alimentos civis”- para que possa nutrir-se e desenvolver-se com normalidade, objetivando o nascimento com vida. Inclui-se aos alimentos a assistência médico cirúrgica, pré-natal em sua inteireza, que abrange as técnicas especiais (transfusão de sangue nos casos de eristroblastose fetal, amniocentese, ultra-sonografia) cirurgias realizadas em fetos, cada vez com mais freqüência, alcançando, ainda, as despesas com o parto.

Nesse aspecto, o art. 8º do ECA (Lei nº 8.069) assegura à gestante o atendimento pré-natal pelo SUS – Sistema Único de Saúde – nas 40 semanas correspondentes à gravidez . São assegurados, também, “os diferentes níveis de atendimento, segundo critérios médico específicos, obedecendo aos princípios da regionalização e hierarquização do Sistema” (§1º do art. 8º do ECA).

Nascituro e o direito à vida

No Brasil, desde o final do século XIX já havia uma grande tendência em proteger o nascituro. É decorrência disso a promulgação da Lei do Ventre Livre em 28 de setembro de 1871 e o Anteprojeto do Código Civil de 1916 de Clovis Bevilácqua. Apesar do esforço do ilustre escritor, o ordenamento jurídico brasileiro adotou a teoria Natalista, considerando a personalidade civil apenas a partir do nascimento com vida, entretanto, resguarda os direitos do nascituro desde a sua concepção.

Fazendo-se uma leitura do art. 2º do Código Civil de 2002, na primeira parte postula o início da personalidade civil do homem a partir do nascimento com vida, já na segunda parte aceita e reconhece os direitos do nascituro.

Podemos então dizer que o Código Civil faz a fusão das duas correntes teóricas: Natalista e Concepcionista. Uma vez que o legislador menciona expressamente os “direitos do nascituro” e ao mesmo tempo dispõe que só há personalidade a partir do nascimento com vida, ele incorre em um verdadeiro paradoxo tremendo. . (PEREIRA, 2007, p. 515).

Só se pode falar em direitos quando se referir a um ser dotado de personalidade os termos da lei. Se a própria Lei Civil fala explicitamente nos “direitos do nascituro” certamente confere a ele personalidade. Caso contrário mencionaria apenas “uma mera expectativa de direitos”.

Fazendo-se uma análise do Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei 9.069/90, percebe-se que tal estatuto garante e assegura prioridade absoluta às crianças e adolescentes. A lei supramencionada define como criança a pessoa até 12 anos incompletos (art. 2º), incluindo nesse contexto a figura do nascituro.

Essa afirmativa pode ser amplamente extraída da leitura do art. 7º da Lei acima referida:

“A criança e o adolescente têm direito a proteção à vida e à saúde, mediante a efetivação de políticas sociais públicas que permitam o nascimento e o desenvolvimento sadio e harmonioso, em condições dignas de existência.”    

Tendo em vista a leitura do referido artigo, o qual menciona expressamente a garantia de um nascimento e desenvolvimento sadios, pode-se afirmar com convicção que ele assegura direitos ao nascituro.

 Dando continuidade a essa linha de raciocínio, o art. 8º do Estatuto da Criança e do Adolescente assegura à mulher o apoio necessário durante a gestação, com claro objetivo de resguardar à vida do nascituro. É através de um real acompanhamento pré-natal que será possível um desenvolvimento saudável do feto. A norma tem por verdadeiro destinatário o filho que estar por nascer e não a mãe gestante, senão vejamos: “É assegurado à gestante, através do Sistema Único de Saúde, o atendimento pré e perinatal.”

É interessante destacar que o Estatuto da Criança e do Adolescente teve como base o anteprojeto da Convenção Internacional dos Direitos da Criança (ONU), que entende por criança todo ser humano menor de 12 anos de idade. Ainda se faz necessário citar a Convenção Interamericana dos Direitos Humanos – Pacto São José da Costa Rica, promulgada em 1969 e já ratificada pelo Brasil. Ela proclama em seu art. 4º que:

“Toda pessoa tem o direito de que se respeite sua vida. Esse direito deve ser protegido pela lei e, em geral, desde o momento da concepção. Ninguém pode ser privado da vida arbitrariamente.”

O texto do artigo acima citado postula, indubitavelmente, que o nascituro deve ter os seus direitos resguardados, não deixando qualquer incerteza que ele é um ser humano, especialmente por ter sido gerado por seres humanos. Portanto, é pessoa e merece ter todos os direitos inerentes a essa condição.

Conforme estabelecido no Pacto de São José da Costa Rica, os estados-membros promulgaram o respeito aos direitos fundamentais da pessoa humana, sem qualquer distinção, e se obrigam a observar todas as garantias previstas na Convenção.

Os direitos humanos devem ser condição indispensável para todos os demais direitos. O ordenamento jurídico pátrio deve ser interpretado sob a ótica dos direitos humanos, e não obstante tenha adotado a teoria Natalista, por outro lado, mesmo que de forma mitigada, também assegurou os direitos do nascituro, consagrando-o como ser em formação, e protegendo o seu direito à vida.

Estatuto da criança e do adolescente e a dignidade da pessoa humana

O Estatuto da Criança e do Adolescente – Lei n. 8.069/90 – tem como objetivo precípuo a proteção integral da criança. O referido Estatuto trouxe como uma de suas inovações a atribuição de sujeito de direitos para a criança. O que não existia com a lei anterior, a Lei do Menor, que supostamente defendia o menor, tratando-o, na verdade, como um objeto. (ALMEIDA, 2000, p.381).

Assim com o Estatuto, a criança passou a ser considerada verdadeiramente como pessoa, no sentido de ter seus direitos reconhecidos pela sociedade, podendo, inclusive ter vontade diante de situações do cotidiano.

No rol desses direitos se incluem os direitos à vida, saúde, liberdade, respeito, dignidade, ambiente familiar propício, dentre tantos outros.

O Estatuto da Criança e do Adolescente prevê em seu art. 26, o que segue:

“Os filhos havidos fora do casamento poderão ser reconhecidos pelos pais, conjunta ou separadamente, no próprio termo de nascimento, por testamento, mediante escritura ou outro documento público, qualquer que seja a origem da filiação”.

O reconhecimento pode preceder o nascimento do filho ou suceder-lhe ao falecimento, se deixar descendentes.

O referido dispositivo reconhece o direito de ajuizar a ação de investigação de paternidade, sendo que é direito personalíssimo o reconhecimento do estado de filiação e, como tal, irrenunciável.

Quando se diz criança, esse termo engloba os indivíduos que se encontram em uma faixa etária de até doze anos não completados. Não se percebe, entretanto, nenhuma referência com relação ao nascituro que, a partir de uma análise objetiva, encontra-se dentro desse limite.

Frente a essa omissão, a depender da teoria adotada a respeito do início da personalidade do nascituro, vislumbram-se algumas situações. Sob a perspectiva das correntes natalista e da personalidade condicional, o nascituro não seria beneficiado com os direitos concedidos pelo Estatuto da Criança e do Adolescente. Paradoxalmente, ao sob o ponto de vista da corrente concepcionista, o nascituro teria sim os direitos resguardados pelo referido Estatuto.

É importante ressaltar que o Brasil adotou tratados internacionais, tais como a Convenção sobre os Direitos da Criança, que são reconhecidos como atos normativos infraconstitucionais, demonstrando que o conceito de criança, para fins jurídicos no Brasil, não abarca apenas aqueles que já nasceram, como também todos os seres humanos, inclusive os que ainda estão por nascer.

Ora, a partir dessa perspectiva contida no ordenamento jurídico brasileiro, não há como deixar o nascituro fora desse rol de beneficiários dos direitos concedidos pela lei n. 8.036/90. Os nascituros já são considerados seres humanos, pois já possuem a chamada vida intra-uterina.

A partir da análise, conclui-se, portanto, que a proteção integral dada à criança, também incluiu os nascituros, como sendo seus destinatários.

A ação de alimentos

A ação de alimentos é o meio técnico de reclamá-los. Ela se inaugura com uma audiência de conciliação (Lei nº. 968 de 10 de dezembro de 1949), conciliando o juiz os litigantes a que se componham sobre o direito e sobre o montante dos alimentos. A ação tem rito especial e sumário, regulado na Lei nº 5. 478 de 25 de julho.

Na forma do art. 100 do Código de Processo Civil, o foro competente para a ação de alimentos é o do domicílio do alimentando, mantendo-se a mesma regra para a oferta de alimentos por parte do devedor.

Na falta de entendimento, o juiz fixará, em apreciação sumária dos fatos, a importância com que o reclamante contribuirá para a mantença do reclamante na pendência da lide, partindo do pressuposto da necessidade de obter desde logo o indispensável à subsistência. São os alimentos provisionais que se destinam a assegurar ao necessitado os recursos necessários para se manter na pendência da lide. (PEREIRA, 2010, p.653).

A ação de alimentos disciplinada pela Lei 5.478/68 tem rito procedimental sumário especial, mais célere que o sumário, uma espécie de sumaríssimo, como é o dos Juizados Especiais, e destina-se àqueles casos que não precisa provar a legitimação ativa do alimentando. O sentido da referida Lei é compatível com a Lei dos alimentos gravídicos, tendo em vista que o alimentando desta última é o nascituro, sendo a este atribuído a legitimidade ativa para pleitear alimentos, por intermédio da representação de sua genitora. (VENOSA, 2010, p.386).

Desse modo, a ação especial de alimentos vem sendo aplicada há mais de três décadas, sendo fundada em prova pré-constituída da obrigação, aplicada com aceitação desde a sua promulgação. Trata-se, portanto, de ação que compete a uma pessoa para exigir de outra, em razão do parentesco, casamento ou união estável, os recursos de que necessita para subsistência na impossibilidade de prover por si próprio. A ação pode ser ajuizada pelo interessado, por seu representante legal, que na ação de alimentos gravídicos é a mulher gestante, e pelo Ministério Público. Cabe ao Ministério Público intentar a ação em defesa dos menores de 18 anos, sempre que se fizer necessário nos termos do art. 201, III do Estatuto da Criança e do Adolescente. (VENOSA, 2010, p.386).

Disposição fundamental na Lei da ação de alimentos é a que permite ao juiz fixar desde logo alimentos provisórios, salvo se o autor declarar expressamente que deles não necessita. Será designada audiência, com prazo razoável para que o réu possa apresentar contestação. A lei permite que o juiz oficie o empregador do réu, ou responsável pela repartição, se for funcionário público para que informe até a data da audiência, quanto percebe de vencimentos. (VENOSA, 2010, p.386).

O art. 19 da Lei de alimentos permite que o magistrado tome todas as medidas possíveis para a satisfação dos alimentos, como também coloca a disposição do credor várias modalidades de execução, facilitando assim a satisfação do crédito alimentar.

A concessão dos alimentos e a aplicação do binômio necessidade/possibilidade

Os alimentos devem ser prestados por aquele que os forneça sem desfalque do necessário ao próprio sustento. O alimentante os prestará sem desfalque do necessário ao próprio sustento. Não encontra amparo legal que a prestação de alimentos vá reduzi-lo a condições precárias, ou lhe imponha sacrifício para a condição social. Daí se dizer que tanto se exime de prestá-los aquele que não o pode fazer sem sacrifício de sua própria subsistência, quanto àquele que se porá em risco de sacrificá-la se vier a dá-los. (PEREIRA, 2007, p.498).

Se o alimentante não os puder fornecê-los na razão de seu próprio sustento, prestá-los-á dentro daqueles limites, cumprindo ao alimentante reclamar de outros parentes a complementação. (PEREIRA, 2007, p.498).

Os alimentos hão de ter, na devida conta, as condições pessoais e sociais do alimentante e do alimentado, ou seja, serão fixados na proporção das necessidades do reclamante e dos recursos do reclamado. Não tem cabimento exigi-los além do que o credor precisa, pelo simples fato de ser o devedor dotado de altas posses; nem pode ser este compelido a prestá-los com sacrifício próprio ou da sua família, pelo fato de o reclamante os estimar muito alto, ou revelar necessidades maiores, conforme estabelece o (§ 1ºdo art.1.964) do Código Civil Brasileiro.

Sobre o tema vejamos as seguintes decisões do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul e do Tribunal de Justiça do Distrito Federal:

“Ementa: AGRAVO DE INSTRUMENTO. DECISÃO MONOCRÁTICA. ALIMENTOS PROVISÓRIOS. PEDIDO DE MAJORAÇÃO. BINÔMIO NECESSIDADE/POSSIBILIDADE. Os alimentos, ainda que provisórios, devem ser fixados de acordo com o binômio necessidade de quem pede e possibilidade de quem paga (grifo meu). Assim, inexistindo qualquer alegação ou comprovação das possibilidades devem ser fixados alimentos em valor moderado, sob pena de se estipular obrigação além da capacidade financeira do alimentante. NEGADO. PROVIMENTO AO AGRAVO DE INSTRUMENTO”. (Agravo de Instrumento Nº 70043103019, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Alzir Felippe Schmitz, Julgado em 01/06/2011).

“Ementa: CIVIL E FAMÍLIA. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE ALIMENTOS GRAVÍDICOS. NASCIMENTO. CONVERSÃO EM PENSIONAMENTO. OBSERVÂNCIA DO BINÔMIO NECESSIDADE/POSSIBILIDADE.  Na determinação do quantum relativo à verba alimentar é preciso sopesar o binômio insculpido no artigo 1.694, § 1º, do Código Civil, que diz respeito, de um lado, à necessidade do alimentando e, de outro, à capacidade do alimentante, cumprindo observar, ademais, que a pessoa obrigada a prestar alimentos deve fazê-lo sem sacrifício da própria subsistência. (grifo meu).  Deve ser mantido o percentual da verba alimentar fixada, quando se observa que houve a correta ponderação entre a necessidade reclamada e a possibilidade do reclamado. RECURSO DESPROVIDO.” (Apelação Cível Nº 20090910260082APC, 3ª Turma Cível, Tribunal de Justiça do DF, Relator: Mario-Zam Belmiro, julgado em 13/04/2011).

Os alimentos constituem em dever para o alimentante. Uma vez apurados os seus requisitos, o parente da classe e do grau indicado legalmente tem de supri-los. Mas se pela força das circunstâncias, mais de um parente os tiver de fornecer, cada um responde pela sua parte (obrigação cumulativa), de vez que não impera no caso o princípio da solidariedade, nem se encontra na lei fundamento para se hierarquizar o débito alimentar, estabelecendo-se uma ordem preferencial que o credor dos alimentos deva necessariamente seguir. (PEREIRA, 2007, p.499).

A faculdade concedida ao necessitado de alimentos cria-lhe um direito de natureza especial. É um dever a que não se pode esquivar o parente, cônjuge ou companheiro a ele sujeito. E neste sentido, o caráter é de ordem publica. Dada a sua finalidade de atender às exigências da vida, não é renunciável. É, contudo lícito, deixar de exercê-lo, tendo em vista que não se concedem benefícios a quem não os quer. (PEREIRA, 2007, p.501).

XI. A legitimidade da gestante para representar o nascituro.

Uma considerável parcela da jurisprudência tem reconhecido a legitimidade processual do nascituro, representado pela mãe para propor a ação de alimentos, ou ação de investigação de paternidade com pedidos de alimentos. Mesmo a corrente que franquia ao nascituro o acesso ao judiciário, impõe-lhe, porém, como requisito, a demonstração do vínculo de paternidade, como exige o art. 2º da (Lei n. 5.478 de 25/07/1968. (GONÇALVES, 2011, p. 575).

A Lei n. 11.804, de 05 de novembro de 2008, que regulou os alimentos gravídicos, veio resolver esse problema, conferindo legitimidade ativa à própria gestante para a propositura da ação de alimentos. O objetivo da referida lei, em última análise, é proporcionar um nascimento com dignidade ao ser concebido. (GONÇALVES, 2011, p. 575).

Alimentos gravídicos, segundo o artigo 2º da citada Lei, são os destinados a cobrir as despesas adicionais do período de gravidez e que sejam dela decorrentes da concepção ao parto. Compreende, inclusive, as referentes à

“alimentação especial, assistência médica e psicológica, exames complementares, internações, parto, e demais prescrições preventivas e terapêuticas a juízo do médico, além de outras que o juiz considerar pertinentes.”

Dispõe o artigo 1º da Lei dos Alimentos Gravídicos: “Esta Lei disciplina o direito a alimentos da mulher gestante e a forma como será exercido.” A legitimidade para propor a ação de alimentos gravídicos, é, portanto, da mulher gestante, independentemente de qualquer vínculo dela com o suposto pai. Basta a existência de indícios de paternidade, para que o juiz fixe os alimentos gravídicos, que perdurarão até o nascimento da criança (art. 6º). Ao fazê-lo o juiz sopesara as necessidades da parte autora e a possibilidade da parte ré. 

Sobre o tema vejamos a decisão da justiça gaúcha:

“Ementa: AGRAVO DE INSTRUMENTO. ALIMENTOS PROVISÓRIOS. NASCITURO. CABIMENTO. PRELIMINAR. A decisão que fixa os alimentos provisórios em prol do nascituro, sem por fim a demanda, desafia agravo de instrumento e não apelação. O agravante não nega o relacionamento amoroso mantido com a representante do nascituro (grifo meu), tampouco que tenha mantido relação sexual com ela à época da concepção. Alegação de dúvida sobre a paternidade não infirma o disposto no art. 2º do CC quanto à proteção aos direitos do nascituro. Precedentes. Preliminar rejeitada. Recurso desprovido”. (Agravo de Instrumento Nº 70021002514, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: José Ataídes Siqueira Trindade, Julgado em 15/10/2007)

A legitimidade passiva foi atribuída exclusivamente ao suposto pai, não se estendendo a outros parentes do nascituro. Compete à gestante o ônus de provar a necessidade de alimentos. O suposto pai não é obrigado a arcar com todas as despesas decorrentes da gravidez, pois o parágrafo único do art. 2º da lei em apreço dispõe que:

“Os alimentos de que trata este artigo refere-se à parte das despesas que deverá ser custeadas pelo suposto pai, considerando-se também a contribuição que deverá ser dada pela mulher grávida, na proporção dos recursos de ambos.”

Já o parágrafo único do art. 6º da referida Lei preceitua que:

“Após o nascimento com vida, os alimentos gravídicos, ficam convertidos em pensão alimentícia em favor do menor, até que uma das partes solicite sua revisão ou exoneração.”

 Quando o filho nascer, os alimentos gravídicos mudam de natureza, converte-se em favor do filho, apesar de o encargo do poder familiar ter parâmetro diverso, pois deve garantir ao credor o direito de desfrutar da mesma condição social do devedor.

A propósito, comenta Calos Roberto Gonçalves:

“Convém desde logo adiantar que a singela conversão dos alimentos ditada pelo parágrafo único do art. 6º da Lei 11.804/2011, é com o devido respeito, equivocada. É um erro proporcionar alimentos durante a gestação na perspectiva do padrão econômico-financeiro que se projeta para um momento posterior ao nascimento com vida, assim como é um equivoco supor que os parâmetros de fixação dos alimentos durante a gestação bastem ou que sejam adequados para o momento posterior.” (GONÇALVES, 2011, p. 576).

Mais adiante, aduz o mencionado autor que em termos estritamente processuais é de se duvidar do objeto do processo, ou seja, que o pedido, à luz da causa de pedir, possa ao mesmo tempo abranger alimentos devidos em função da gravidez e os alimentos devidos para o momento.  (GONÇALVES, 2011, p.576).

Como o modelo processual brasileiro é do tipo rígido, com fases bem marcadas e sujeitas a preclusões, inclusive, atingem os atos postulatórios e determinam a chamada estabilização da demanda (CPC arts. 264 e 269), não parece possível simplesmente permitir que, a partir nascimento, sejam alterados os fatos constitutivos da pretensão e também o pedido. Por outro lado, não parece possível formular pedidos com preceitos internos, não se sabendo, ainda, concretamente, quais as reais necessidades de alguém que sequer nasceu com vida, porque isso tornaria inepta a inicial ou prejudicaria a defesa. (GONÇALVES, 2011, p.576).

Com base na Lei de alimentos gravídicos o juiz poderá estabelecer um valor de pensão alimentícia para a gestante antes mesmo do nascimento do filho, e atendendo o critério da proporcionalidade o suposto pai estará obrigado a prestar os alimentos. Mas a referida ação não tem o objetivo de criar vínculo definitivo de paternidade, pois quando do nascimento do filho o suposto pai poderá pedir a exoneração dos alimentos, caso seja comprovado através da realização de exame DNA que não é o responsável pela paternidade. (GONÇALVES, 2011, p.576)

Levando-se em conta que as verbas alimentares não podem ultrapassar o conteúdo da Lei 11.804/2008, cujo objetivo é a tutela dos direitos do nascituro e da gestante, para que o valor dos alimentos abranja outras despesas como educação, alimentação e saúde, é essencial a propositura de outra ação, seja apenas de alimentos ou de investigação de paternidade cumulada com alimentos, na qual se permitirá a ampla discussão da paternidade, realizando-se inclusive, os exames periciais pertinentes. Ademais, cumpre ressaltar que a mãe, na ação de alimentos gravídicos, no que tange os alimentos devidos a partir do nascimento, figura como substituto processual de seu filho, defendendo em nome próprio interesse alheio, e como se sabe, a substituição processual só é cabível nos casos expressos em lei, de modo que ela não poderá pleitear outras verbas que não aquelas outras compreendidas na Lei nº 11.804/2008. (GONÇALVES, 2011, p.577).

Carlos Roberto Gonçalves aponta que:

“O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul examinando o preenchimento dos requisitos para obtenção dos alimentos gravídicos, ab initio, decidiu que, nos casos sub judice, foram levados aos autos “elementos suficientes acerca de um namoro existente entre as partes. A agravante demonstra a coabitação com o agravado em período compatível com a concepção (contrato de locação e comprovante de residência). Além disso, há fotos das partes datadas de abril de 2008, o que vem ao encontro da tese da autora. A gravidez de C…, esta comprovada pelo exame de sangue de fls. 22. Ainda que não se trate de provas cabais acerca da paternidade do agravado, não se pode negar que há indícios suficientes para corroborar com a versão da autora. Quanto ao valor a título de alimentos, a regra permanece a mesma prevista no art. 1694 do Código de Processo Civil, no sentido de serem fixados de acordo com as necessidades do alimentando e a possibilidade do alimentante. Nessa hipótese, havendo notícia de que o pai seja funcionário de uma empresa, fixa os alimentos gravídicos no montante de 15% de seus vencimentos”.   (GONÇALVES, 2011, p.578).

Observa-se que o Tribunal não seguiu a praxe de fixar alimentos provisórios em 30% dos ganhos do alimentante, arbitrando em apenas 15%, uma vez que o parágrafo único do artigo 2º da Lei 11.804/2008, recomenda que, além do futuro pai a mulher grávida também dê a sua contribuição para o pagamento das despesas com a gestação, na “proporção dos recursos de ambos.” (GONÇALVES, 2011, p.578).

A petição inicial da ação de alimentos gravídicos deve vir instruída com a comprovação da gravidez e dos indícios da paternidade do réu, por exemplo, com cartas, emails, ou outro documento em que o suposto pai admite a paternidade; comprovação de hospedagem do casal em hotel, pousada, ou motel, no período da concepção. Também poderá ser instruída a peça processual com fotografias que comprovem o relacionamento amoroso do casal no período da concepção. O juiz não pode determinar a realização de exame de DNA, por meio da coleta de meio amniótico, em caso negativo de paternidade, porque pode colocar em risco a vida da criança, além de retardar o andamento do feito. Todavia, após o nascimento com vida, o vínculo provisório da paternidade pode ser desconstituído mediante ação de exoneração de alimentos, com a realização do referido exame. (GONÇALVES, 2011, p.578). 

Sobre o tema o Tribunal de justiça do Rio Grande do Sul proferiu a seguinte decisão:

“Ementa: AGRAVO DE INSTRUMENTO. ALIMENTOS GRAVÍDICOS. AUSÊNCIA DE PROVAS DA PATERNIDADE. POSSIBILIDADE. A situação posta ao amparo da lei que garante os alimentos gravídicos, por si só, já traz circunstâncias de difícil comprovação, quando se está em sede de provimento liminar. É patente a dificuldade que existe na produção da prova da paternidade enquanto a criança ainda não é nascida. Fica difícil para a mãe, de plano, mostrar que tem um bom direito. Mostrar que o filho que ela carrega é do homem que está sendo demandado. Por isso, em casos nos quais se pedem alimentos gravídicos, algumas regras que norteiam a fixação de alimentos devem ser analisadas com um tanto de parcimônia. É necessário flexibilizar-se certas exigências, as quais seriam mais rígidas em casos de alimentos de pessoa já nascida. Não se pode exigir que a mãe, de plano, comprove a paternidade de uma criança que está com poucos meses de gestação. Por outro lado, não há como negar a necessidade da mãe de manter acompanhamento médico da criança, fazer exame pré-natal, e outros procedimentos que visam ao bom desenvolvimento do filho e que demandam certos gastos. Por isso, no impasse entre a dúvida pelo suposto pai e a necessidade da mãe e do filho, o primeiro deve ser superado em favor do segundo. É mais razoável reconhecer contra o alegado pai um "dever provisório " e lhe impor uma obrigação também provisória, com vistas à garantia de um melhor desenvolvimento do filho, do que o contrário. Nesse contexto, apesar da completa ausência de provas acerca da paternidade os alimentos vão fixados em 30% do salário mínimo. AGRAVO PARCIALMENTE PROVIDO. EM MONOCRÁTICA. (SEGREDO DE JUSTIÇA) _ DECISÃO MONOCRÁTICA_” (Agravo de Instrumento Nº 70032990913, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Rui Portanova, Julgado em 30/10/2009).

 Preceituava o art. 9º do projeto de lei que resultou na citada Lei n. 11.804/2008 que:

“Em caso de resultado negativo do exame pericial de paternidade, o autor responderá, objetivamente, pelos danos materiais e morais causados no réu.”

O dispositivo supracitado foi vetado, uma vez que afrontava o princípio constitucional do acesso à justiça, prevendo a obrigação da mulher gestante de indenizar o suposto pai pelo simples fato de havê-lo acionado judicialmente. (GONÇALVES, 2011, p.579).

Muito embora tenha sido afastada a responsabilidade objetiva da autora da ação, resta a possibilidade de ser ela responsabilizada com base no art. 186 do Código Civil, que exige para tanto, como regra geral, prova do dolo ou da culpa em sentido estrito do causador do dano. O problema é que neste caso qualquer grau de culpa, mesmo a levíssima, pode ser considerada pelo julgador e gerar como conseqüência o medo na mulher grávida para propor a ação de alimentos gravídicos, para não correr o risco de, no caso de insucesso da empreitada, vir a ser condenada a indenizar o suposto pai. (GONÇALVES, 2011, p.579). 

Não se pode ser rigoroso na apreciação da conduta da mulher gestante, sob pena de se criar uma excessiva restrição ao direito de postular em juízo, o que constituiria um perigoso risco para quem se dispusessem a exercê-lo. Deve-se aplicar o mesmo critério para o caso de oposição de má-fé, de impedimentos ao casamento, somente a culpa que revele uma total ausência de cautelas mínimas por parte da mulher pode justificar sua responsabilização, afastando-se as hipóteses de culpa levíssima e até mesmo da culpa leve. Somente o dolo ou culpa grave serviriam de fundamento para a sentença condenatória. (GONÇALVES, 2011, p.579). 

Julgada improcedente a ação de alimentos, descabe a ação de repetição de indébito por parte do suposto pai, relativa aos pagamentos efetuados em virtude do princípio da irrepetibilidade dos alimentos. (GONÇALVES, 2011, p.579).

Está pacificado na jurisprudência de nossos tribunais que os alimentos, uma vez pagos, não serão restituídos desde que o credor esteja agindo de boa-fé. Nesse sentido:

“Ementa: CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. VERBAS DE NATUREZA ALIMENTAR PERCEBIDAS DE BOA-FÉ. IRREPETIBILIDADE. São irrepetíveis as verbas de natureza alimentar recebidas de boa-fé (grifo meu), não escapando de tal compreensão os subsídios auferidos pelo Vice-Prefeito ou a remuneração a ele paga, quando do exercício, cumulativamente, do cargo de Secretário Municipal, máxime quando não proclamada inconstitucionalidade da lei local e nem sendo ele o ordenador da despesa.” (Apelação Cível Nº 70038258091, Vigésima Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Armínio José Abreu Lima da Rosa, Julgado em 15/09/2010).

Paternidade responsável desde a concepção

É preciso que se dê efetividade ao princípio da paternidade responsável considerando que foi eleita pelo legislador constituinte de 1988, como prioridade absoluta, a proteção integral às crianças e adolescentes, delegando não só à família, mas também à sociedade e ao próprio Estado, o compromisso pela formação do cidadão.

“Art. 227 da CF. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.”

A proteção ao nascituro também encontra guarida na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:

“RECURSO ESPECIAL. DIREITO SECURITÁRIO. SEGURO DPVAT. ATROPELAMENTO DE MULHER GRÁVIDA. MORTE DO FETO. DIREITO À INDENIZAÇÃO. INTERPRETAÇÃO DA LEI Nº 6194/74. Atropelamento de mulher grávida, quando trafegava de bicicleta por via pública, acarretando a morte do feto quatro dias depois com trinta e cinco semanas de gestação. Reconhecimento do direito dos pais de receberem a indenização por danos pessoais, prevista na legislação regulamentadora do seguro DPVAT, em face da morte do feto. Proteção conferida pelo sistema jurídico à vida intra-uterina, desde a concepção, com fundamento no princípio da dignidade da pessoa humana (grifo meu). Interpretação sistemático-teleológica do conceito de danos pessoais previsto na Lei nº 6.194/74 (arts. 3º e 4º). Recurso especial provido, vencido o relator, julgando-se procedente o pedido.” (REsp 1120676/SC, Rel. Ministro MASSAMI UYEDA, Rel. p/ Acórdão Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em 07/12/2010, DJe 04/02/2011)

O reconhecimento da paternidade na ação de alimentos gravídicos se faz necessário como requisito à imposição da obrigação ao réu. O filho tem direito à identidade e à proteção integral. Ele precisa viver com dignidade e necessita de alimentos e de cuidados especiais, mesmo antes de nascer, pois durante a vida ultra-uterina a mãe tem que se submeter a exames pré-natais e o parto gera despesas, ainda que feito pelo SUS. Durante a gravidez a gestante precisa de roupas especiais e alimentação adequada, além do que tem sua capacidade laboral reduzida durante a gestação e após o nascimento do filho. Seus ganhos também ficam reduzidos durante o período da licença-maternidade. (DIAS, 2009, p. 578). 

Senão vejamos decisão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul:

“Ementa: AGRAVO DE INSTRUMENTO. UNIÃO ESTÁVEL. ALIMENTOS GRAVÍDICOS. NECESSIDADES PRESUMIDAS. ART. 6° DA LEI N° 11.804/2008. PLANO DE SAÚDE CUSTEADO PELO EX-COMPANHEIRO EM BENEFÍCIO DA GESTANTE. REDUÇÃO DO VALOR ARBITRADO NA ORIGEM. Demonstrada a convivência das partes em união estável no período em que a ex-companheira engravidou, e considerando serem presumidas as despesas daí advindas, é cabível a fixação de alimentos gravídicos. Tendo em vista que o recorrente custeia o plano de saúde à genitora, que certamente cobre parte dos gastos, mostra-se excessivo o quantum fixado na origem, motivo por que cabível sua redução, em atenção ao binômio necessidade/possibilidade. AGRAVO DE INSTRUMENTO PARCIALMENTE PROVIDO.” (Agravo de Instrumento Nº 70042266502, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ricardo Moreira Lins Pastl, Julgado em 09/06/2011)

Pode, porém, acontecer que a paternidade venha a ser afastada após a instrução do feito. Para esta hipótese, o Projeto da Lei dos alimentos gravídicos, aprovado pelo Congresso Nacional, estabelecia em seu art. 10 que a responsabilidade  do autor por danos morais e materiais era objetiva, e deveria ser liquidada nos próprios autos.

Tal artigo, como outros, foi vetado, veto este prestigiado por alguns comentaristas do projeto de Lei acima citado, como Maria Berenice Dias (2009, p.587):

“Esta possibilidade cria perigoso antecedente. Abre espaço a que, toda ação desacolhida, rejeitada ou extinta confira direitos indenizatórios ao réu. Ou seja, a improcedência de qualquer demanda autoriza pretensão por danos morais e materiais. Trata-se de flagrante afronta ao principio constitucional do acesso à justiça, dogma norteador do estado democrático de direito.”

De forma salutar foram afastados dispositivos do projeto que um novo e moroso procedimento, o que não se justificava em face da existência da Lei de alimentos. (DIAS, 2009, p.588).

 De outra forma entende-se que o veto não retira a responsabilidade civil decorrente da iniciativa impropriamente direcionada de quem não é o pai.

Mesmo sem previsão na lei, a responsabilidade existe pelo direito comum (direito civil), e sendo a autora a gestante, em face dela deverá ser direcionada a ação (não contra o menor), prejuízo causado, ainda que ausente dolo, ou mesmo má-fé. (DIAS, 2009, p.588).

Considerações finais

Decerto que a Lei 11.804/08, que instituiu os alimentos gravídicos, foi inserida no ordenamento jurídico brasileiro como um grande mecanismo jurídico de proteção à gestante e, especialmente ao nascituro, na medida em que a este assegurou direitos fundamentais desde o momento da concepção, como o direito à vida, à dignidade e a alimentos para que possa ele se desenvolver e nascer com dignidade.

Independentemente da gravidez da gestante ser viável ou não, ela necessita de cuidados especiais, o que enseja dispêndio financeiro, devendo o suposto pai contribuir na medida de sua possibilidade para com as despesas durante o período de gestação.

O próprio art. 2o da Lei 11.804/08 dispõe de forma clara e objetiva sobre o que compreende os alimentos gravídicos, descrevendo os como valores suficientes para cobrir as despesas adicionais do período de gravidez e que sejam dela decorrentes, da concepção ao parto, inclusive referente à alimentação especial, assistência médica e psicológica, exames complementares, internações, parto e demais prescrições preventivas e terapêuticas indispensáveis.

Esses gastos ocorrerão de qualquer forma, não sendo adequado que a gestante arque com sua totalidade, motivo pelo qual é medida justa que haja compartilhamento dessas despesas com aquele que viria a ser o pai da criança.

A jurisprudência pátria tem se manifestado no sentido de que o suposto pai do nascituro está obrigado arcar com as despesas decorrentes da gravidez juntamente com a gestante na medida de suas possibilidades.

A referida lei preencheu uma lacuna que há muito tempo existia em nosso ordenamento jurídico, que deixava a gestante sem proteção legal adequada, pois enquanto não houvesse o reconhecimento da paternidade pelo suposto pai, ficava ela desamparada, uma vez que não havia lei especifica que tutelasse seu direito de pedir alimentos ao suposto pai, em favor o nascituro. Além disso, o reconhecimento da paternidade só era obtido, na maioria vezes, após uma interminável e desgastante batalha judicial.

Verifica-se que a garantia dos alimentos gravídicos representa um grande avanço na busca de uma paternidade responsável, com o compartilhamento das responsabilidades entre o pai e a mãe, desde o momento da concepção até o nascimento, ou seja, desde o momento que há vida humana, gerada por vontade e atos de ambos os genitores.

A Lei dos alimentos gravídicos, sem dúvida, veio garantir uma maior proteção ao nascituro, bem como assegurar às mulheres gestantes o direito a uma gestação saudável. Para que isso acontecesse, foi preciso a edição de tal lei, a qual impõe ao suposto pai, com fundamento em meros indícios da paternidade, o dever de prestar assistência financeira à gestante, a fim de que esta possa desenvolver uma gravidez com segurança, garantindo-se o direito à vida do nascituro com dignidade.

Percebe-se que os indícios de paternidades são frágeis, entretanto, o convencimento do magistrado deve ser cauteloso, pois mesmo que tais indícios não sejam fundamentados de forma sólida, e sendo evidenciada a necessidade da genitora, não será acolhido seu pedido caso não constate o mínimo de veracidade nas alegações de tais indícios.

O nascituro possui personalidade jurídica e é notório que apesar de a lei de alimentos gravídicos deixar claro que são alimentos para a mulher gestante, de forma subsidiária o nascituro goza de tais benefícios, visto que a gestação saudável é diretamente ligada ao nascituro. A teoria concepcionista, além de ser uma corrente majoritária, a cada dia é reconhecida com a mais plausível, pois o nascituro já possui um enorme reconhecimento no ordenamento jurídico.

Diante de toda pesquisa doutrinária, jurisprudencial e legal realizada no decorrer desse trabalho, pode-se concluir que a nova lei dos alimentos gravídicos, de cunho social de grande relevância, busca dar um maior amparo à mulher grávida, para que no decorrer da gestação até o nascimento do bebê não fique desprotegida. Para tanto, basta apenas que sejam demonstrados indícios de paternidade, a fim de que o magistrado possa deferir os alimentos em seu nome, uma vez que ela é a legitima representante do nascituro.

Mais do que a obrigação de prestar alimentos prevalece o dever de conceder a qualquer pessoa uma vida digna, com valores sociais e familiares respeitados, considerando que a Constituição Federal de 1988, no caput do seu art. 5º, elevou o direito à vida à categoria de direito fundamental, de modo que passou a ampará-la em todas as suas formas, seja ela extra-uterina ou intra-uterina, pois de nada adiantaria colocar a salvo os direitos do nascituro se não lhe fosse garantido o direito básico e fundamental de nascer e viver.

Referências
ALMEIDA, Silmara J. Chinelato. Tutela civil do nascituro. São Paulo: Saraiva, 2000.
BRASIL. Lei 11.804 de 05 de novembro de 2008. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2008/Lei/L11804.htm> Acesso em 10/01/2011.
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Informações Sobre o Autor

André de Jesus Santana

Possui graduação em Direito pela Faculdade Sergipana FASER 2011. É aluno pós-graduando em Direito infanto-juvenil no Ambiente Escolar pela Universidade Federal de Sergipe UFS


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