Caminhando pela História Geral do Direito Penal

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Nei Adecir Pinto Lopes[1]

Masséias Moreira Papalia[2]

Carina Deolinda da Silva Lopes[3]

Franceli Bianquin Grigoletto Papalia[4]

Marcelo de Souza Machado[5]

Resumo: O presente estudo visa refletir a respeito da evolução histórica do direito penal, visando proporcionar a possibilidade de conhecer ainda mais como se deu as perspectivas penalistas durante as épocas de desenvolvimento brasileiro. Apresentamos essa evolução sistemática através de uma pesquisa bibliográfica, observando a linha do tempo do direito penal desde os romanos, direito canônico, escolas penais até o Brasil em seus aspectos evolutivos do direito penal até a atualidade, finalizamos o artigo com uma análise do direito penal contemporâneo a partir da visão das jurisprudências dos Tribunais brasileiros, possibilitando conhecer um pouco mais inclusive do garantismo penal. Concluímos que existe uma evolução extraordinária no meio da estruturação penal, passando de um direito pesado e absurdamente violento, para um direito penal, que ao menos em termos teóricos, visa a ressocialização do apenado e a garantia de seus direitos.

Palavras-chaves: Direito penal. Evolução. História.

 

Abstract: The present study aims to reflect on the historical evolution of criminal law, aiming to provide the possibility to know even more how the penal perspectives occurred during the times of Brazilian development. We present this systematic evolution through a bibliographic search, observing the criminal law timeline from the Romans, canon law, penal schools to Brazil in its evolutionary aspects of criminal law until today, we conclude the article with an analysis of criminal law contemporary from the point of view of the jurisprudence of the Brazilian Courts, making it possible to know a little more including the criminal guarantee. We conclude that there is an extraordinary evolution in the midst of penal structuring, moving from a heavy and absurdly violent right to a criminal law, which, at least in theoretical terms, aims at the re-socialization of the convict and the guarantee of his rights.

Keywords: Criminal law. Evolution. History.

 

 Sumário: Introdução. 1. História do direito penal sua evolução histórica. 1.1. Direito penal romano.1.2. Direito penal germânico. 1.3 Direito penal canônico. 1.4. Direito penal humanitário. 2.Escolas penais. 2.1. A escola clássica. 2.2. A escola positiva. 2.3. A escola alemã. 2.4. A terza scuola. 3. História do direito penal brasileiro. 3.1. Período colonial. 3.2. Código criminal do império. 3.3. Período republicano. 3.4. Reformas contemporâneas: direito penal mínimo e garantismo penal. Conclusão. Referências Bibliográficas.

 

Introdução

Dada a importância que o Direito Penal possui no meio social, para que se consiga observar essa visão de forma ainda mais completa é interessante que possamos estudar a linha evolutiva da ciência.

Iniciamos tratando do direito penal romano buscando verificar na história do direito penal sua evolução histórica, possibilitamos a análise do Direito penal germânico, do Direito penal canônico, do Direito penal humanitário.

As escolas penais também estão sendo englobadas neste estudo, possibilitando as considerações gerais sobre a escola clássica, escola positiva, escola alemã e a terza scuola.

Em um terceiro momento, mais próximo de nosso conhecimento jurídico, estudamos a história do direito penal brasileiro, compreendendo o estudo do período colonial do Código criminal do império, bem como do período republicano e ainda verificar as reformas contemporâneas: direito penal mínimo e garantismo penal.

Ao final busca-se conhecer melhor a linha de evolução histórica do direito penal desde seus primórdios até as reformas atuais, possibilitando agregar ao conjunto jurídico a fim de perceber que o direito penal vem buscando construir possibilidades de melhoramento da sua função perante aqueles que sofrem diretamente seus reflexos.

 

  1. História do direito penal, sua evolução histórica

Embora o direito penal tenha sua origem vinculada a própria organização do homem em sociedade, não se pode considerar a existência de normas penais sistematizadas em tempos primitivos. Neste tempo primitivo não estava ligada a uma questão de justiça, mas sim de vingança, onde se dividiam em três classes: vingança divina, vingança privada e vingança pública.

A vingança divina estava relacionada com crenças e misticismos, acreditavam que fenômenos da natureza se tratavam de castigo das divindades, assim quando um membro do grupo descumpria regras, acreditavam que estariam desrespeitando os ídolos, era punido pelo próprio grupo, a base de suas atitudes era a satisfação divina.

A vingança privada baseava-se em que, uma vez cometido o crime a punição partia da própria vítima ou pessoas ligadas ao seu grupo social, geralmente tal punição atingia outros indivíduos. Devido a evolução social chegamos ao código de Hamurabi trazendo a regra de talião, onde a ideia de punição passou a ser de igualar a ofensa, embora essa evolução não evitou penas cruéis e desumanas. Por fim o direito hebreu houve uma nova evolução nas penas, onde Moisés por sua vez buscava a mitigação da resposta punitiva e a eliminação da pena capital.

A vingança pública relata o fortalecimento do estado, para que se declare competente as autoridades, ficando legitimada a intervenção do estado para solução dos conflitos sociais com a aplicação das penas públicas. Sendo o estado aqui soberano na atribuição das penas, mesmo com essa intervenção as penas não deixaram de ser cruéis, muitas das vezes atingindo até mesmo os descendentes do culpado.

 

1.1 Direito penal romano

Como não poderia ser diferente na época de Roma o Direito Penal também teve seu período e sua importância. Da mesma forma que outras sociedade, Roma também viveu a fase da vingança (privada, divina até chegar a vingança pública), separando, a exemplo dos gregos, o Direito Religioso, conforme o autor Rogério Sanches Cunha:

 

Dividiu os delitos em públicos (crimina publica), violadores dos interesses coletivos (exemplo: crimes funcionais, homicídios), punidos pela jus publicun com penas públicas, e privados (delicta privata), lesando somente interesses particulares (exemplo: patrimônio), punidos pelo jus civile com penas privadas. Nos primórdios de Roma existia uma forma particular de direito, onde o pater famílias dispunha de amplos poderes sobre seus familiares e escravos, aplicando as punições como lhe conviesse. A forma de expressão e imposição de punições era ainda baseada na atuação militar imposta pelos imperadores e pelo coercitio, uma espécie de juiz. (2020, p.49-50 )

 

Já na época da República (509 a. C.), surge a Lex Valeria onde as condenações passaram a ser decididas pelo indicium Populi, um julgamento popular feito em praças públicas. Com o fim da República:

 

são elaboradas outras leis penais, como as denominadas leges Corneliae (82-80 a. C- baseadas no nome de seu autor, Cornelio Sila). Além delas surgem as leges Juliae, de César e Augusto. A estrutura de imposição da justiça altera-se em Roma a partir de então. A vingança privada não mais existe. O Estado se ocupa dos julgamentos penais, com exceção das questões disciplinares domésticas que continuam sendo dominadas pelo pater famílias mas não mais de forma ilimitada. Os comícios e julgamentos populares dão lugar a tribunais permanentes que realizam inquéritos presididos por magistrados. São as chamadas questiones perpetuae. A acusação não é papel do Estado, mas feita por qualquer cidadão que leva a questão para o tribunal. A pena capital é praticamente extinta, e as reprimendas devem estar previamente cominadas, assim como os delitos (origina-se daí o princípio da reserva legal). (CUNHA, 2020, p. 50)

 

Como se percebe foi evidenciado a mudança dos julgamentos me praça pública, para julgamentos em Tribunais, sendo que no século III d. C., no império de Augusto, altera-se novamente a forma de atuação do Direito Penal Romano com a substituição da acusação privada por uma acusação formal estatal. (CUNHA, 2020, p. 50). Neste período, surge em Roma os chamados “crimes extraordinários”, tratados de forma diferenciada dos ilícitos particulares, ocorre o ressurgimento das penas capitais, que já não eram mais praticadas até o imperador Adriano (117-138 d. C.). Nessa mesma época há o direito a fase recursal, proibição de tortura e a pena passa a ter uma função pública.

Desse período outro ponto importante surge que é a diferenciação entre culpa e dolo, sendo culpa definida como “violação não premeditada da norma penal, ainda, da falta voluntária, mas não intencional, de diligência, para evitar um fato delituoso.” (NETTO, 2019, p. 210).

Já dolo é entendido como “vontade deliberada e consciente ou da livre determinação do agente na prática do delito. É o elemento moral da infração”. (NETTO, 2019, p. 228).

Sendo assim o que as diferencia é que na primeira não se atenta ao resultado de intenção de prejudicar o que está devidamente ligado ao dolo.

Vale ressaltar, que no Direito Romano temos a presença da codificação pela Lei das XII Tábuas, a qual se trata da primeira codificação, para a maioria da doutrina. Cabe referir que esta lei foi elaborada pelos Decênviros (dez juristas) encarregados de pesquisar as fontes gregas e elaborar a lei, estas, por sua vez, tiveram grande importância nessa codificação pelas inovações que trouxeram, como por exemplo, a distinção entre direito público e privado.

 

1.2 Direito penal germânico

Considerado pela doutrina como Direito Penal da Transição, o Direito Germânico deu sua para a evolução do Direito Penal, segundo (CUNHA, 2020, p.50), nessa época a pena mais grave a “Frieldlosigkeit, extremamente peculiar e não mais vista em outros ordenamentos, em razão da qual o delinquente, quando sua infração ofendia os interesses da comunidade, perdia seu direito fundamental a vida. Podendo qualquer cidadão matá-lo.” Tal período é marcado por questões importantes, como sendo:

 

Um direito composto apenas pelo caráter consuetudinário e não por leis escritas. Os bárbaros que compuseram os povos germânicos trouxeram para Europa ocidental seus costumes, tradições, religiões e também o sistema jurídico. Seu período inicial foi marcado por um sistema punitivo de caráter religioso. A perda da paz, representada pela expulsão do infrator do seu meio social e sua consequente morte, marcou seguramente a prática punitiva das primeiras épocas do povo germânico. Também a vingança, já citada, marcou presença. Com o fim das invasões e consolidação das regiões ocupadas, a vingança de sangue dá lugar à composição voluntária ou compulsória. A pena de paz admite um preço a ser pago pelo infrator. O Direito Penal Germânico, a partir de então, se transforma num sistema de sanções de características acentuadamente patrimoniais. (BRASIL ESCOLA).

 

Quando a infração atingia apenas uma pessoa ou família, o direito penal germânico fomentava o restabelecimento da paz social por via da reparação, admitindo, também a vingança de sangue (faida) (CUNHA, 2020, p. 50). Nesse período surgem três tipos de penas baseadas, sendo elas:

 

Wehrgeld, que consistia no pagamento de uma indenização, mas principalmente na submissão do infrator, obrigado a dar o seu trabalho em favor da vítima ou de seu grupo; Busse, uma verdadeira pena de multa, paga ao ofendido, para se livrar da vingança privada (uns a entendem como pena aplicável ao caso de pequenas infrações; outros, como espécie dos quais as penas do item 3 são gênero); Friedensgeld ou Fredum, consistente no pagamento ao soberano de uma soma em dinheiro pela violação da paz. (BRASIL ESCOLA).

 

Segundo ainda AGUIAR (2016), no Direito Germânico era admitido a “Lei de Talião e, conforme o delito cometido, utilizavam a força para resolver questões criminais. Eram admitidas também as ordálias ou juízos de Deus (provas de água fervendo, ferro em brasa, etc.), assim como os duelos judiciários, onde o vencedor era proclamado inocente.”

Observa-se em tais penas o caráter pecuniário, que constituíram o sistema repressivo dos povos germânicos, não deixando de praticar a pena de morte e as demais penas em geral, como as mutilações.

 

1.3 Direito penal canônico

O Código Penal Canônico, foi promulgado, em 27 de maio de 1917, pelo Papa Bento XV, o primeiro Código de Direito Canônico “O Corpus iuris canonici”. Após aproximadamente vinte anos de trabalho e compondo-se de sete livros, surgiu o atual Código de Direito Canônico, Esse Código foi revogado, em 1983, pelo novo texto aprovado pelo Papa João Paulo II, que orientou o Direito Canônico à mentalidade hodierna e às novas necessidades. Sendo promulgado em 25 de janeiro de 1983. Atualmente em vigor, é a lei central da Igreja Latina.

O Corpus iuris canonici era formado pela consolidação das seguintes coleções canônicas: o “Decreto”, de Graciano (1140); as “Decretais”, de Gregório IX (1234); o “Sexto”, de Bonifácio VIII (1298); as “Clementinas”, de Clemente V (1314); e as “Extravagantes”, de João XXII (1319)2 . As primeiras edições privadas do Corpus são do início do século XVI, mas a versão oficial é de 1582 e vigorou até 1917 com complementos do ius novissimum. As disposições penais estão esparsas pelo Decretum Gratiani e parecem concentradas no livro V do Decretalium Gregorii Papae IX (ou simplesmente Liber extra) que formam o eixo do direito canônico da época. Neles estavam previstos delitos contra a religião, crimes comuns contra a pessoa e contra a propriedade, além de crimes próprios dos clérigos.

As disposições processuais penais do Código pio-beneditino encontram-se no Título XIX, da Seção II, do Livro IV e contam com 27 cânones. A mais interessante previsão do Código de Direito Canônico de 1917 em matéria de processo penal vem a seguir: o instituto da inquisição, espécie de antecedente do brasileiríssimo inquérito policial. O cânone 1.939 estabelece que “se o delito não é nem notório nem completamente certo”, mas há notícia de sua ocorrência por rumores e voz pública, denúncia ou qualquer outro meio, antes da citação de alguém para responder pelo delito, deve haver previamente uma “inquisição especial para verificar se a imputação se apoia em algum fundamento e qual seja este”. O Direito Canônico tem origem disciplinar, sendo sua fonte mais antiga os Libri penitenciasses. Em face da crescente influência da igreja sob o governo civil, o Direito Canônico foi aos poucos estendendo-se à pessoas não sujeitas à disciplina religiosa, desde que se tratasse de fatos da natureza espiritual. A influência do direito canônico foi benéfica. Trouxe a humanização, embora politicamente a sua luta metódica visasse obter o predomínio do papado sobre o poder temporal para proteger os interesses religiosos de dominação. A penitenciária é de inspiração nitidamente eclesiástica. Opôs-se também o Direito Canônico às ordálias e duelo judiciários e procurou introduzir as penas privativas de liberdade, substituindo as penas patrimoniais, para possibilitar o arrependimento e a emenda do réu. Pregava cumprimento da pena em claustro ou cubículos. Defendeu a igreja a mitigação das penas. Os tribunais eclesiásticos nunca aplicavam a pena de morte, entregando o réu que deveria sofrê-la aos tribunais seculares. Parece certo que em seu ulterior desenvolvimento, afirmou-se a maior severidade dos tribunais eclesiásticos, especialmente com a Inquisição, que fez largo emprego da tortura, escrevendo negra página na história do Direito Penal.

O Direito apresenta-se onde existe vida em sociedade e, sendo a Igreja uma organização onde as relações sociais entre seus seguidores são manifestadas veementemente das mais variadas maneiras, necessário fez-se o nascimento de um ordenamento jurídico específico para atender aos anseios humanos e divinos, nos moldes essenciais da própria criação daquela instituição.

 

1.4 Direito penal humanitário

Foi no fim do século XVII, com a propagação dos ideais iluministas que ocorreu a conscientização quanto às barbaridades que vinham acontecendo em relação a penalização criminal, ocorrendo maior atenção para a proteção da liberdade individual em face do arbítrio judiciário e para o banimento das torturas, com forte ensejo em sentimentos de piedade, e respeito ao ser humano. Através do pensamento humanitário e iluminista o Direito Penal, a concepção do crime e de delinquente sofrem grande influência, sendo que:

 

Marco para o Direito Penal é a obra de Hugo Grotius De iuri belli ac pacis, de 1625, que impõe a pena um fundamento racional. Estas concepções foram posteriormente desenvolvidas durante os séculos XVII e XVIII por jus naturalistas que buscavam fundamentar na razão a existência do Estado, em contraposição ao que era colocado pelo Direito Romano e principalmente pelo Direito Canônico. Entendiam a pena não como retribuição, mas como uma finalidade comum para a sociedade. (CUNHA, 2020, p.  52)

 

Entre os pioneiros as época está Beccaria, sendo ele impar na história para a modificação do Direito Penal, sendo que:

 

César de Bonesana, o Marques de Beccaria, saiu em defesa dos desafortunados e dos desfavorecidos em sua obra Dei Delitti e Delle Pene (“Dos delitos e das penas”), de 1764. Opôs-se às técnicas utilizadas até então pela justiça, era contra a prática da tortura como meio de produção de prova e por fim combateu o sistema presidiário das masmorras. Foi um verdadeiro grito contra o individualismo. Baseou-se na Teoria do Contrato Social, investiu contra a pena capital, com o argumento de que, apesar do homem ceder parte de sua liberdade ao Bem Comum, não poderia ser privado de todos os seus direitos e a ninguém seria conferido o poder de matá-lo. (AGUIAR, 2016).

 

Outras figuras importantes surgiram na época John Howard considerado por muitos como o pai da Ciência Penitenciária e Jeremias Bentham que tratou da Teoria das Penas e das Recompensas.

 

  1. Escolas penais

As escolas penais apresentam várias doutrinas, entendendo seu momento histórico-político investigaram intuitos como crime, o delinquente e a pena, por muitas vezes pode-se observar pensamentos divergentes acerca de aspectos ou conceitos relevantes dentro de uma mesma escola penal.

 

2.1 A escola clássica

A escola clássica, surge ainda na idade moderna pensadores fundamentais para construção da escola clássica e do estudo dos crimes, influenciando em muito a concepção incipiente da criminologia, ainda nesta época surge Jeremy Benthan que discutia a questão da utilidade da pena, definindo-a como um sacrifício necessário para a salvação comum, sendo então a pena a prevenção para novos delitos cometidos.

Ainda na idade moderna Filangieri altera tal entendimento dizendo que a pena não poderia ter somente a função intimidativa para novos delitos, mas no sentido de prevenção e defesa social. Na Alemanha no mesmo período nasce uma nova corrente de filósofos que traz outras diretrizes para a discussão. Um dos mais importantes foi Immanuel Kant trazendo em seu discurso a ideia de que se a lei foi vulnerada se faz necessária a consequência, a pena, onde está deverá ser igual ao mal do delito em razão do talião, princípio de equivalência.

Na Itália o destaque desta escola foi Francesco Carrara, fundamenta-se no direito natural que a sociedade, a autoridade e o direito derivam de uma lei eterna, ordem provinda de deus, onde se prevê a possibilidade de proibir e castigar, deve o estado dosar sua necessidade.

 

2.2 A escola positiva

A escola positiva sob um olhar criminológico surge quando a criminalidade é crescente na sociedade, a ideia de que a escola naturalista iria conter o aumento da criminalidade apenas com a utilização de penas como utilidade social não foi suficiente, era necessário o restabelecimento da ordem social sob o aumento da criminalidade.

Buscando uma explicação científica sob as ingerências sociais da vida das pessoas, surge então a criminologia sociológica, o grande nome desta escola foi o matemático e estatístico belga Adolphe Quetelet.

Resumo das distinções entre a Escola Clássica e a Escola Positivista Antes de analisarmos as demais escolas (as chamadas escolas intermediárias ou ecléticas, já que se limitaram em criar variações ou conciliações das duas escolas mais importantes estudadas em linhas anteriores), vale destacarmos resumidamente as principais diferenças entre as já estudadas Escola Clássica e Escola Positivista: Escola Clássica Escola Positivista Crimes é um ente jurídico, pois consiste na violação de um direito. Decorre de fatores naturais e sociais. Delinquente É um ser livre que pratica o delito por escolha moral, alheia a fatores externos (livre-arbítrio). Não é dotado de livre-arbítrio; é um ser anormal sob as óticas biológica e psíquica. Pena É forma de prevenção de novos crimes. Funda-se na defesa social; deve ser indeterminada (base: periculosidade). Principais nomes Cesare Bonesana (Marquês de Beccaria), Francesco Carrara e Giovani Carmignani Cesare Lombroso, Enrico Ferri e Rafaelle Garófa.

 

2.3 A escola alemã

O principal nome da escola alemã foi Franz Von Liszt , que defendeu uma pesquisa sobre as causas da criminalidade para que a função da pena pudesse ser estruturada e fosse possível, por conseguinte, saber como lidar com o criminoso, seu pensamento traduzido era que as questões sociais eram as causas da criminalidade, fundou então a escola sociológica criminal. A função da pena seria o “combate ao crime como fenômeno“.

 

2.4 A terza scuola

A esta escola o crime era novamente estudado, de forma que a ideia da responsabilidade moral, mas, como Von Liszt distinguia os imputáveis dos inimputáveis e excluía o livre arbítrio, o crime para a terza scuola era um fenômeno individual e social.

 

  1. História do direito penal brasileiro

No início da colonização vigoravam as Ordenações Afonsinas, o mesmo regime jurídico vigente em Portugal, de caráter religioso, influenciadas também pelo direito romano. Em 1514 foram revogadas pelas Ordenações Manuelinas, mantendo a base das precursoras, não definindo tipo ou quantidade de pena, ato discricionário do juiz. Foram substituídas pela compilação de D. Duarte Nunes Leão (também denominada Código de D. Sebastião ou Código Sebastiânico), reunindo leis até então separadas e de difícil interpretação e conhecimento por parte dos cidadãos. A compilação deu lugar às Ordenações Filipinas, vigorando por mais de duzentos anos, sendo seu marco inicial o século XVII. O Código Filipino fundamentava-se nos preceitos religiosos. O Direito era confundido com moral e religião, punindo-se com rigor os hereges, apóstatas, feiticeiros e benzedores. As penas eram cruéis e desumanas, tendo como fim principal infundir o temor pelo castigo.

Após a proclamação da independência e a promulgação da Constituição de 1824, foi elaborado o Código Criminal do Império, fomentando um direito penal protetivo e humanitário, permitindo a individualização da pena, criando agravantes e atenuantes, estabelecendo julgamento especial para menores de 14 anos. A pena de morte, ainda presente, ficou praticamente limitada para coibir crimes praticados pelos escravos. Misturando Direito com Religião, tipificou como crime ofensas à crença oficial do Estado.

Diante dos fatores aplicados aos estudos dentro das ciências criminais, podemos considerar que as leis e os costumes em que o Brasil hoje possui através da sua história jurídica e que estes foram trazidos pela sociedade portuguesa, juntamente com outros elementos da vida política e social pré-organizados. A legislação portuguesa eram mais severas e extravagantes, isso olhando por uma ótica atual da realidade política, esta modalidade severa e extravagante exprimia o velho Direito das nações da Europa, e é nessa legislação que vem se apoiar a ordem jurídica nacional, diante da vida social, política e econômica, dentro da colônia, e nos centros de colonização, pois estes formaram como núcleos estáveis de vida civilizada, assim dando início à história da nossa cultura.

O Brasil conquista sua independência em relação a Portugal no dia 07 de setembro de 1822, sendo que devido a sua independência o Brasil não tinha como redigir da noite para o dia um novo ordenamento jurídico, sendo que através disso e por força de lei de 20 de outubro de 1823, foi decidido que seriam conservadas as Ordenações filipinas, para que em um momento oportuno viesse a surgir um código nacional. D. Pedro I no dia 16 de dezembro de 1830 sancionou o Código Criminal do Brasil, sendo que esta sanção foi dada pela influência da Escola Clássica, pois esta fixava aos princípios do livre arbítrio e da moral, fato este afirmado que não existe criminoso sem a litigância de má fé, ou seja sem o conhecimento do mal e nem a intenção de não praticá-lo. Em seguida à proclamação da República (1890), sancionou-se o Código Criminal da República. Atento às restrições impostas pela Constituição de 1891 (proibição da pena de morte e prisão de caráter perpétuo), o Código Republicano permitia as penas de prisão, banimento (de natureza temporária, evitando sanção de caráter perpétuo) e suspensão de direitos, instalando o regime penitenciário de caráter correcional.

É evidente, diante do que foi tratado até o momento a respeito da história do Direito Penal, que os sistemas de punição evoluíram de forma a tornar, tanto quanto possível, mais humana a execução da lei penal, evitando que os agentes criminosos sejam submetidos a punições que extrapolem as efetivas finalidades da pena. Isso não significa, obviamente, que os ordenamentos jurídicos modernos estejam imunes à influência das disposições que os antecederam; ao contrário, invariável e acertadamente absorvem postulados estabelecidos há séculos, milênios até, ainda aptos a contribuir para que o Direito cumpra sua função essencial de manter a ordem na sociedade.

 

3.1 Período colonial

O direito penal no Brasil desde os tempos dos indígenas, o qual era um direito consuetudinário onde cada localidade indígena possuía suas regras. Mas, coma chegada dos portugueses no Brasil, as ordenações do reino de Portugal foi o primeiro direito penal positivado aqui, ou seja, as primeiras referências do nosso ordenamento penal configuram através do direito penal português, que vigoram por vários séculos, podemos apontar as seguintes ordenações: Afonsinas de 1446-1521, Manuelinas de 1521-1603 e as Filipinas de 1603-1830.

 

3.2 Código criminal do império

O Código Criminal do Império do Brasil foi sancionado pela lei de 16 de dezembro de 1830, substituindo o livro V das Ordenações Filipinas (1603), codificação penal portuguesa que continuou em vigor depois da Independência (1822), seguindo determinação da Assembleia Nacional Constituinte de 1823. A Constituição do Império do Brasil, de 1824, determinou que “organizar-se-á o quanto antes um Código Civil, e Criminal, fundado nas sólidas bases da justiça e equidade” (BRASIL. Constituição (1824), art. 179, parágrafo 18). No entanto, se a monarquia brasileira não conseguiu elaborar seu Código Civil, que foi sancionado apenas no período republicano, em 1916, o mesmo não ocorreu com a codificação penal.

Em 1829, a comissão mista do Senado e da Câmara encarregada de examinar os dois projetos de código criminal apresentados em 1827 pelos deputados José Clemente Pereira e Bernardo Pereira de Vasconcelos, recomendou o deste último, justificando a adoção de uma obra não perfeita, mas necessária e útil se comparada à legislação em vigor. O Código Criminal possuía quatro partes – dos crimes e das penas; dos crimes públicos, dos crimes particulares e dos crimes policiais – sendo composta cada uma por títulos, capítulos e seções. O documento determinava que nenhum crime fosse punido com penas que não estivessem estabelecidas nas leis conforme a gradação de máximo, médio e mínimo, em razão das possíveis atenuantes ou agravantes (Código Criminal, art. 33). Foram definidos como criminosos (autores) aqueles que cometiam, constrangiam ou mandavam alguém cometer crimes. Não haveria crime ou delito, palavras sinônimas neste código, sem uma lei anterior que o qualificasse (Código Criminal, art. 1º). Os menores de quatorze anos foram isentos de responsabilidade penal (Código Criminal, art. 10), mas se ficasse provado que haviam cometido crime ou delito, agindo com discernimento, seriam encerrados nas casas de correção, sendo que o período de reclusão não poderia ser estendido após o réu completar dezessete anos (Código Criminal, art. 13).

A aplicação generalizada da pena de prisão, a partir do século XIX, foi fruto do ideário iluminista, dado o caráter igualitário da penalidade de confiscar um direito comum, a liberdade, de todos os que haviam sido elevados à categoria de cidadãos, sua aplicação é prevista nos quatro títulos da parte segunda do Código de 1830, que tratou dos crimes públicos contra a existência política do Império, o exercício dos poderes políticos, o livre gozo dos direitos políticos dos cidadãos e a segurança interna. Nesses casos, a pena de prisão simples impunha aos réus “a reclusão nas prisões públicas pelo tempo marcado nas sentenças” (art. 47), mas podia ser acrescida da obrigação do trabalho, quando os condenados eram obrigados a se ocuparem diariamente do “que lhes for destinado dentro do recinto das prisões na conformidade das sentenças e dos regulamentos policiais das mesmas prisões” (art. 46). Enquanto a pena de prisão com trabalho não pudesse ser cumprida, o próprio texto do código prescreveu sua comutação pela de prisão simples. Nos casos em que esse recurso foi aplicado, o período da pena de prisão devia ser acrescido do tempo correspondente à sexta parte do estipulado para o cumprimento da pena de prisão com trabalho (art. 49). Seguindo uma filosofia jurídica liberal que não estava consolidada nem nos países europeus, o Código de 1830 adotou o conceito de culpabilidade, que passava a ser centrado no ato criminoso e não na pessoa do infrator (justiça retributiva), com a punição proporcional ao delito cometido; de acordo com a orientação do direito clássico, a Constituição de 1824 aboliu “os açoites, a tortura, a marca de ferro quente e todas as demais penas cruéis” (BRASIL. Constituição (1824), art. 179, parágrafo 19). O Código de 1830 também eliminou as mutilações e os castigos corporais, mas manteve as penas de açoites, aplicada exclusivamente aos escravos, as de morte e de galés. O artigo 60 estipulou que “se o réu for escravo, e incorrer em pena, que não seja a capital ou de galés, será condenado na de açoites, e depois de os sofrer, será entregue a seu senhor, que se obrigará a trazê-lo com um ferro, pelo tempo, e maneira que o Juiz designar”.

A discussão no parlamento em torno da inclusão no Código das penas de morte e de galés gerou intensos debates no último ano da primeira legislatura (1826-1829). O parecer da comissão mista do Senado e da Câmara desejou suprimir a pena de morte devido à inutilidade de sua aplicação, mas ressaltou que no estágio em que se encontrava a população do Brasil, cuja educação primária não era generalizada, sua manutenção era uma triste necessidade. O primeiro código brasileiro foi discutido e aprovado durante o conturbado período do Primeiro Reinado (1822-1831), onde ocorreram confrontos entre os que eram favoráveis à independência do país, com a manutenção da unidade territorial em torno do governo do Rio de Janeiro, e as províncias que permaneceram fiéis às Cortes de Lisboa, como Bahia, Grão-Pará, Piauí e Cisplatina, onde ocorreram as chamadas guerras de independência (1822-1824). A dissolução da Assembleia Constituinte pelo imperador em 1823 e a outorga da Constituição de 1824, que instituiu um Executivo forte e centralizado, levavam em si a ideia de que a construção do novo país incluía a manutenção da unidade territorial do império com o governo centralizado no Rio de Janeiro, o seu reconhecimento em nível internacional e a definição de suas fronteiras, especialmente no extremo onde ocorria a Guerra Cisplatina (1825-1828).

No entanto, em diversas províncias tais medidas foram seguidas por manifestações e revoltas, de cunho federativo e republicano, geradas pela insatisfação com o papel preponderante que a Corte ganhava no cenário político nacional, em detrimentos dos poderes locais.

 

3.3 Período republicano

Com a proclamação da República, em 1889, fez-se necessária uma reformulação em nosso direito positivo, sendo Estefan e Gonçalves (2015, p. 77):

 

O Brasil já se consolidara como nação, não mais dependendo da Igreja Católica, justificando-se a separação entre Estado e Igreja. Mudara a forma de governo. A escravatura fora abolida, o que tornava sem sentido as disposições que conferiram tratamento penal diferenciado a escravos e homens livres.  As alterações, contudo, vieram rápido demais, sem a necessária reflexão e maturação; tanto assim que o Código Penal foi alvo das mais ácidas (e justas) críticas.

A celeridade imprimida em sua elaboração, aliada a falta de debate de ideias, ocasionou uma série de defeitos no código de 1890. Reflexo maior das falhas (numerosas para alguns) foi o fato de que, tão logo entrara em vigor, iniciaram-se as tentativas de formulá-lo, dentre as quais merecem destaque o projeto de João Vieira de Araújo, o de Galdino Siqueira e o do desembargador Virgílio de Sá Pereira.

O então projeto de Código Penal da República foi convertido em lei de 11 de outubro de 1890, por força do decreto nº 847. Estruturava-se em quatro livros: a) Livro I: Dos Crimes e das Penas; b) Livro II: Dos Crimes em Espécie; c) Livro III: Das Contravenções em Espécie; e d) Livro IV: Disposições Gerais.

 

Cabe ressaltar que o tempo da elaboração do “Código Republicano”, realizavam-se esforços na Itália para ditar um Código Penal unitário, e o Código de 1889, que possuíam como espírito clássico, que se plasmava em muitos de seus dispositivos, influenciou decisivamente a reforma brasileira. A Escola Clássica foi, então, sua fonte suprema de inspiração, o que se percebia na estrita proporcionalidade entre delito e pena e em sua determinação quase absoluta. (ESTEFAM, GONÇALVES, 2015, p. 77).

Na sequência do desenvolvimento do Direito Penal brasileiro a Consolidação das Leis Penais, elaborada pelo desembargador Vicente Piragibe, apresentou uma compilação do texto do Código Penal de 1890, não se tratando de uma nova legislação penal. No período em apreço cabe salientar que:

 

Em 1980 foi instituída uma comissão para a elaboração de um anteprojeto de lei de reforma da Parte Geral do Código Penal de 1940, presidida por Francisco de Assis Toledo e constituída por Francisco Serrano Neves, Miguel Reale Junior, Renê Ariel Dotti, Ricardo Antunes Andreucci, Rogério Lauria Trucci e Helio Fonseca. A comissão, que apoiou seu trabalho no princípio do nullum crimen sine culpa e na idéia de reformulação do elenco tradicional das penas. (CAVALCANTE, 2007).

 

Entre as mudanças que foram introduzidas no direito penal brasileiro, cabe elencar:

 

A reformulação do instituto do erro, adotando-se a distinção entre erro de tipo e erro de proibição como excludentes da culpabilidade.  A norma especial referente aos crimes qualificados pelo resultado para excluir-se a responsabilidade objetiva. A reformulação do capítulo referente ao concurso de agentes para resolver o problema do desvio subjetivo entre os participantes do crime. A extinção da divisão entre penas principais e acessórias e a criação das penas alternativas(restritivas de direito) para os crimes de menor gravidade. A criação da chamada multa reparatória. O abandono do sistema duplo-binário da medidas de segurança e a exclusão da presunção de periculosidade. (CAVALCANTE, 2007).

 

Com o passar do tempo o código penal de 1940 (Decreto-Lei nº2.484, de 07.12.1940), elaborado na vigência da Constituição de 1937 (“Polaca”), sendo que:

 

À época, o Ministro da Justiça Francisco Campos determinou ao jurista Alcântara Machado a tarefa de preparar um projeto de Código Penal, o qual foi concluído em abril de 1940. Seu trabalho foi revisto por uma comissão integrada por Nelson Hungria, Narcélio de Queiroz, Vieira Braga e Roberto Lyra, sob a presidência do Ministro Francisco Campos. (ESTEFAM, GONÇALVES, 2015, p. 78-79).

 

Em 1984, ocorreu nova Reforma na legislação criminal brasileira o que resultou na modificação da Parte Geral, funcionando como uma tentativa de adaptar o Código aos ideais vigentes, bem como de “conferir às penas criminais o papel de ressocialização (cujo principal instrumento foi o sistema progressivo de cumprimento da pena privativa de liberdade)”. A comissão responsável pela elaboração do projeto que resultou na lei nº 7.209/84, “a reforma penal, presentemente, como em outras épocas, decorreu de uma exigência histórica. Transformando-se a sociedade, mudam-se certas regras de comportamento (…)” (ESTEFAM, GONÇALVES, 2015, p. 79).

A filosofia que se buscou imprimir ao Direito Penal, foi a de punir, mas ao mesmo tempo de ressocializar o apenado, ao passo que até o momento, muito pouco resultado se observa, perante a realidade carcerária e do trabalho do Poder Judiciário em si.

 

3.4 Reformas contemporâneas: direito penal mínimo e garantismo penal

O direito penal mínimo É uma corrente doutrinária que disciplina que a privação de liberdade deve ser imposta apenas nos casos em que há risco social efetivo, a qual vem ganhando forma na jurisprudência, como segue:

 

APELAÇÃO CRIMINAL. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. AMEAÇA. PROVA INSUFICIENTE. SENTENÇA CONDENATÓRIA REFORMADA. Fato denunciado típico de incidência da Lei 11.340/2006, porquanto, em tese, praticado no âmbito da violência doméstica. Impossibilidade de aplicação do princípio da intervenção mínima ou do direito penal mínimo, diante da relevância do fato, tendo a vítima buscado providências perante à autoridade e também dado o caráter público e incondicionado da ação penal. Nos delitos praticados no âmbito da violência doméstica, em que pese a palavra da vítima merecer especial relevância, em face da forma como os delitos são habitualmente perpetrados, sem a presença de testemunhas, deve haver outros elementos, no contexto, a indicar a ocorrência dos fatos. No caso concreto, ainda que a apalavra da vítima tenha sido firme, coerente e reiterada ao longo da persecução penal, o depoimento do réu segue a mesma linha em todas as fases do processo, negando a prática dos fatos de forma firme e reiterada, não havendo qualquer elemento concreto a corroborar com suas declarações. Prova insuficiente, sendo o caso de aplicação do princípio do in dubio pro reo. Réu absolvido. RECURSO PROVIDO.(Apelação-Crime, Nº 70078736931, Terceira Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ingo Wolfgang Sarlet, Julgado em: 26-09-2018).

 

APELAÇÃO CRIMINAL. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. LESÕES CORPORAIS LEVES. AMEAÇA. DESOBEDIÊNCIA PROVA SUFICIENTE PARA MANUTENÇÃO DA CONDENAÇÃO PELO DELITO DE LESÕES CORPORAIS. DELITO DE AMEAÇA E DESOBEDIÊNCIA ATÍPICOS. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA. Nos casos de violência doméstica a palavra da vítima merece especial relevância, em face da forma como os delitos são habitualmente perpetrados, sem a presença de testemunhas. No caso concreto, o relato da ofendida mostrou-se firme e coerente em todas as fases da persecução penal, demonstrando que o acusado efetivamente lhe agrediu, causando-lhe as lesões descritas nos autos de exame de corpo de delito realizado. Impossibilidade de desclassificação do delito para vias de fato, em razão da demonstração, através do laudo pericial de exame de corpo de delito, de que a vítima ficou efetivamente lesionada. Impossibilidade de aplicação do princípio da intervenção mínima ou do direito penal mínimo, diante da relevância do fato, tendo a vítima buscado providências perante à autoridade e também dado o caráter público e incondicionado da ação penal. Em relação ao delito de ameaça, em que pese a palavra da vítima merecer especial relevância, em face da forma como os delitos são habitualmente perpetrados, sem a presença de testemunhas, deve haver outros elementos, no contexto, a indicar a ocorrência dos fatos. Além disso, o fato denunciado como ameaça, além de genérico, não está diretamente dirigido à vítima, tendo a mesma somente compreendido que a publicação feita pelo réu em rede social seria a ela dirigida. Fato atípico. Desobediência. Não constitui crime de desobediência o descumprimento de medida protetiva quando a Lei 11.340/06 prevê outras sanções suficientes a coibir tal descumprimento de forma a garantir a efetiva proteção da mulher. Precedentes desta Corte. Absolvição pelos delitos de ameaça e desobediência que se impõe, nos termos do artigo 386, inciso III, do Código de Processo Penal. RECURSO DEFENSIVO PARCIALMENTE PROVIDO. (Apelação Crime, Nº 70077772374, Terceira Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ingo Wolfgang Sarlet, Julgado em: 15-08-2018)

 

Da mesma forma são as decisões do STJ quando trata do direito penal mínimo:

 

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. INOBSERVÂNCIA AO ART. 200 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. INOVAÇÃO RECURSAL. IMPOSSIBILIDADE. CRIME AMBIENTAL. EXTRAÇÃO DE AREIA SEM A COMPETENTE AUTORIZAÇÃO. APONTADA OFENSA AO ART. 55, CAPUT, DA LEI N.º 9.605/1998. PLEITO DEFENSIVO DE ABSOLVIÇÃO POR ATIPICIDADE MATERIAL DA CONDUTA DENUNCIADA. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. DIREITO PENAL MÍNIMO. INAPLICABILIDADE. REITERAÇÃO COTIDIANA DA CONDUTA DELITIVA DO AGENTE EM LOCAL OBJETO DE PROJETOS DE REVITALIZAÇÃO. CONSTATAÇÃO DE SIGNIFICANTE POTENCIAL LESIVO AO ECOSSISTEMA DA REGIÃO. DEVER DE DEFESA E PRESERVAÇÃO DO PODER PÚBLICO AO MEIO AMBIENTE ECOLOGICAMENTE EQUILIBRADO PARA AS PRESENTES E FUTURAS GERAÇÕES. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. REVERSÃO DO JULGADO. SÚMULA N.º 7/STJ. PROSSEGUIMENTO DO FEITO MANTIDO PARA FINS DE PROPOSTA DO SURSIS PROCESSUAL. AGRAVO REGIMENTAL PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESSA EXTENSÃO, DESPROVIDO. 1. Não merece conhecimento a ventilada inobservância ao art. 200 do CPP, apenas formulada na via do regimental, haja vista que não pode o recorrente, sob pena de ultraje aos princípios da dialeticidade e do devido processo legal, ampliar – seja para complementar ou suplementar – a extensão objetiva em que interposto o originário recurso especial – in casu, adstrito à invocada contrariedade ao art. 55 da Lei n.º 9.605/1998 -, e tangenciado pelos efeitos devolutivo iterativo e pela preclusão consumativa, por constituir nítida e vedada inovação recursal. 2. É cediço que a aplicação do princípio da insignificância, à luz dos vetores da fragmentariedade e da subsidiariedade, está condicionada, objetiva e cumulativamente, à mínima ofensividade da conduta; a nenhuma periculosidade social da ação; ao reduzido grau de reprovabilidade do comportamento e à inexpressividade da lesão jurídica provocada, balizas que não se harmonizam ao caso em tela. 3. Segundo o Pretório Excelso, “para se afirmar que a insignificância pode conduzir à atipicidade é indispensável, portanto, averiguar a adequação da conduta do agente em seu sentido social amplo, a fim de apurar se o fato imputado […] tem ou não relevância penal. Esse contexto social ampliado certamente comporta, também, um juízo sobre a contumácia da conduta do agente” (RHC 118.014/ES, Rel. Ministro GILMAR MENDES, Rel. p/ acórdão Ministro TEORI ZAVASKI, SEGUNDA TURMA, DJ-e 12.11.2013). 4. Conforme apurado pelo Tribunal local, o próprio réu admitiu em juízo que a conduta na qual foi flagrado não representou evento isolado em sua vida, pois, à época, a praticava cotidianamente, fazendo da extração e comércio de areia o seu meio de vida. Assim, tais atos isolados, quando somados de forma habitual, representam significante potencial lesivo ao ecossistema da região, de modo que deixar de puni-las, além de incentivar a prática do ilícito, significaria negligenciar o cogente dever público de proteção ao meio ambiente. 5. Nesse contexto, não se mostram presentes os requisitos da conduta social minimamente ofensiva; do reduzido grau de reprovabilidade do comportamento denunciado e da lesão jurídica inexpressiva, os quais autorizariam a aplicação do aspirado crime bagatelar. 6. A desconstituição do julgado, com o afã absolutório de reconhecer-se a atipicidade material da conduta denunciada, não encontra guarida na via eleita, visto que seria necessário a esta Corte o revolvimento do contexto fático-probatório, providência incabível, conforme inteligência do enunciado n.º 7 da Súmula do STJ. 7. Agravo regimental parcialmente conhecido e, nessa extensão, desprovido. (AgRg no AREsp 1433301/RS, Rel. Ministra LAURITA VAZ, SEXTA TURMA, julgado em 05/03/2020, DJe 16/03/2020).

 

HABEAS CORPUS. LATROCÍNIO (CP, ART. 157, § 3º). CONDENAÇÃO EM SEGUNDO GRAU FUNDADA EM RECONHECIMENTO DO RÉU POR EMAIL E POR FOTOGRAFIA, NA FASE INQUISITORIAL, E EM RECONHECIMENTO PESSOAL EM JUÍZO, DEPENDENTE E DERIVADO DO ELEMENTO INFORMATIVO EIVADO DE IRREGULARIDADE. NÃO OBSERVÂNCIA DO ART. 226 DO CPP. AUSÊNCIA DE PROVA VÁLIDA PARA A CONDENAÇÃO. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO. 1. O reconhecimento fotográfico, como meio de prova, é apto para identificar o réu e fixar a autoria delitiva somente quando corroborado por outras provas, colhidas sob o crivo do contraditório. 2. A identificação do acusado por meio de fotografia enviada ao e-mail da vítima foi realizado sem a observância das regras procedimentais do art. 226 do CPP e se constituiu na única prova judicializada que deu lastro à condenação em segundo grau de jurisdição. 3. Ainda que produzida sob o crivo do contraditório, não é possível emprestar credibilidade e força probatória à confirmação, em juízo, de reconhecimento formal eivado de irregularidades. Se extirpado tal elemento informativo, não seria possível nem sequer denunciar o paciente, pois não foi colhido nenhum outro indício de sua participação no latrocínio. 4. Consoante registro do Juiz de primeiro grau, a conduta de policiais militares, que, no afã de solucionar crime praticado contra membro da corporação, enviaram às vítimas, por correspondência eletrônica, a foto do paciente obtida durante a investigação de outro delito, acrescida da errônea informação de que ele teria praticado conduta semelhante, viciou o reconhecimento inquisitorial e, como consequência, a prova judicial dele decorrente, imprestável para sanar a dúvida sobre a autoria delitiva, principalmente ante o registro, na sentença absolutória, de que o réu, na data dos fatos, não possuía as características físicas descritas no boletim de ocorrência e não fora reconhecido por outra testemunha ocular do latrocínio. 5. Sob a égide de um processo penal de cariz garantista, que nada mais significa do que concebê-lo como atividade estatal sujeita a permanente avaliação de conformidade com a Constituição – O direito processual penal não é outra coisa senão Direito constitucional aplicado”, dizia-o W. Hassemer – busca-se uma verdade processual em que a reconstrução histórica dos fatos objeto do juízo se vincula a regras precisas, que assegurem às partes maior controle sobre a atividade jurisdicional. 6. Não é despiciendo lembrar que, em um modelo assim construído e manejado, no qual sobrelevam princípios e garantias voltadas à proteção do indivíduo contra eventuais abusos estatais que interfiram em sua liberdade, dúvidas relevantes no espírito do julgador hão de merecer solução favorável ao réu (favor rei). Afinal, “A certeza perseguida pelo direito penal máximo está em que nenhum culpado fique impune, à custa da incerteza de que também algum inocente possa ser punido. A certeza perseguida pelo direito penal mínimo está, ao contrário, em que nenhum inocente seja punido à custa da incerteza de que também algum culpado possa ficar impune” (L. Ferrajoli). 7. Habeas corpus não conhecido. Ordem concedida, de ofício, para restabelecer a sentença absolutória do paciente e ordenar sua soltura, salvo se por outro título judicial estiver preso. (HC 335.956/SP, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 15/12/2015, DJe 02/02/2016).

 

O garantismo Penal relaciona-se há um aglomerado de teorias penais e processuais penais, as quais consistem em uma proteção naquilo que se encontra positivado, ou seja, escrito no ordenamento jurídico, estando estritamente ligado ao conceito de Estado de Direito, tendo o intuito de delimitar e impedir as injustiças, os excessos do Estado. Desta forma, entende-se por Garantismo Penal a busca pela defesa dos ideais descritos em lei por meio de uma intervenção mínima do Estado.

 

Conclusão

Observa-se que não se pode deixar de verificar que a evolução do pensamento humano e, consequentemente da sociedade, que vem acompanhada da evolução do Direito.

É importante ressaltar que esta ciência existe também para regulamentar a vida em sociedade, mas principalmente para refletir em seus membros o pensamento vigente em cada uma das épocas históricas, de forma que seu estudo possibilita também o entendimento do tratamento que precisa ser desenvolvido em razão dos delitos e das penas.

Como se observa da evolução histórica, as regulamentações penais nasceram para regulamentar através das “vinganças”, as leis penais foram evoluindo até chegarmos ao que hoje conhecemos como Direito Penal, um sistema de leis que busca não somente punir o agente criminoso da sociedade, mas, também almeja trazer maior segurança ao convívio social, mas ressocializá-lo a fim de que o mesmo posso voltar a conviver em sociedade.

Apesar de muitos entenderem que isso é utópico, as leis penais refletem os pensamentos contemporâneos, motivo pelo qual a natureza das leis penais e das penas devem ser almejados e alcançado por todos aqueles que operam o Direito, por mais que muitos das vezes contrários as convicções pessoais, porque o interesse da maioria deve sempre sobrepor o interesse pessoal, uma vez que este é um dos fundamentos do Direito moderno.

 

Referências Bibliográficas

AGUIAR, Leonardo. Evolução Histórica do Direito Penal. Disponível em: https://leonardoaaaguiar.jusbrasil.com.br/artigos/324823933/evolucao-historica-do-direito-penal. Acesso em 10 de abril de 2020.

 

BRASIL ESCOLA. A história e as ideias do direito penal. Disponível em: https://monografias.brasilescola.uol.com.br/direito/a-historia-as-ideias-direito-penal.htm. Acesso em 08 de abril de 2020.

 

CAVALCANTE, Karla Karênina Andrade Carlos.  Evolução histórica do direito penal. Disponível em: https://ambitojuridico.com.br/cadernos/direito-penal/evolucao-historica-do-direito-penal/. Acesso em 09 de abril de 2020.

 

CUNHA. Rogério Sanches. Manual de Direito Penal. Volume único. 8ª Ed. Salvador: Editora Juspodivm, 2020.

 

ESTAVAM, André, e GONÇALVES, Victor Eduardo Rios. Direito Penal Esquematizado, parte geral. 4ª Ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2015.

 

NETTO, José Oliveira. Dicionário Jurídico. 7. Ed. São Paulo: EDIJUR, 2019.

 

TJRS. Apelação-Crime, Nº 70078736931, Terceira Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ingo Wolfgang Sarlet, Julgado em: 26-09-2018.

Disponível em https://www.tjrs.jus.br/site/busca-solr/index.html?aba=jurisprudencia. Acesso em 09 de abril de 2020.

 

TJRS. Apelação Crime, Nº 70077772374, Terceira Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ingo Wolfgang Sarlet, Julgado em: 15-08-2018. Disponível em https://www.tjrs.jus.br/site/busca-solr/index.html?aba=jurisprudencia. Acesso em 09 de abril de 2020.

 

STJ. AgRg no AREsp 1433301/RS, Rel. Ministra Laurita Vaz, Sexta Turma, julgado em 05/03/2020, DJe 16/03/2020.Disponível em http://www.stj.jus.br/sites/portalp/Sob-edida/Advogado/Jurisprudencia/Pesquisa-de-Jurisprudencia. Acesso em 09 de abril de 2020.

 

STJ. HC 335.956/SP, Rel. Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 15/12/2015, DJe 02/02/2016. Disponível em: http://www.stj.jus.br/sites/portalp/Sob-edida/Advogado/Jurisprudencia/Pesquisa-de-Jurisprudencia. Acesso em 09 de abril de 2020.

 

[1] Acadêmico de Direito da Antonio Meneghette Faculdade.

[2] Acadêmico de Direito da Antonio Meneghette Faculdade.

[3] Doutoranda em Direitos Humanos pela UNIJUI, mestre em direito pela URI, advogada. E-mail: [email protected].

[4] Mestranda em Educação pela UFSM, juíza leiga, advogada. E-mail: [email protected]

[5] Acadêmico de Direito da Antonio Meneghette Faculdade.

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