Eutanásia e Legislação Penal

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Resumo: O presente trabalho tem por objetivo fazer uma abordagem sobre o instituto da eutanásia, sendo um tema pouco conhecido e igualmente pouco divulgado, embora seja uma prática constante em nosso país. O referido tema sempre existiu desde que a humanidade caminha sobre a terra. Contudo, veio ganhando novos contornos, tipos, e, sobretudo, voltado à tona diante de várias práticas mostradas em telejornais, internet e demais veículos de comunicação.Tem o intuito de analisar o ato de promover a morte antes do que seria de esperar, por motivo de compaixão e diante de um sofrimento penoso e insuportável do qual se sabe que não haverá cura. Por fim aborda-se como o direito penal enxerga a eutanásia e qual o tratamento dispensado àqueles que tal instituto praticam.

Palavras-chave: Eutanásia. Morte. Ordenamento Jurídico. Homicídio. Legislação comparada.

Sumário: Introdução. 1. Do instituto da eutanásia. 1.1 Morte: processo natural e inevitável. 1.2 Eutanásia: conceito, tipos e origem. 2.  Eutanásia e o ordenamento jurídico pátrio. 2.1 Aspectos penais. 2.2 Eutanásia e o direito comparado: Holanda, Bélgica, Luxemburgo, Uruguai. Conclusão.

Introdução

Inicialmente é de bom tom asseverar que o termo eutanásia é relativamente simples nos termos atuais, sendo sua etimologia simples. Em virtude de sua curiosa e sugestiva etimologia, outras alcunhas são-lhe atribuídas: morte serena, morte tranquila, morte digna.

O referido tema sempre existiu, ou seja, desde que a humanidade caminha sobre a terra, tal instituto é existente, tendo ganhado novos contornos, tipos, e, sobretudo, voltado à tona diante de várias práticas mostradas em telejornais, internet e demais veículos de comunicação.

Assim, o presente estudo mostra de forma simples e objetiva, um assunto que vem ganhando espaço cada vez maior no panorama social atual, devido à sua característica polêmica e à divisão de opiniões referentes à legalização da eutanásia no Brasil. Tem o intuito de analisar o ato de promover a morte antes do que seria de esperar, por motivo de compaixão e diante de um sofrimento penoso e insuportável do qual se sabe que não haverá cura.

Demonstrar a relevância da manifestação de vontade do paciente terminal é um meio de não negar atenção à realidade destas pessoas, um meio de compreender a liberdade com base na responsabilidade que esta escolha acarreta. Será abordado conceito da eutanásia e todas as suas formas, especificando as características de cada uma delas, detalhando o que faz com que sejam diferentes umas das outras e qual a importância desta diferenciação. Procura tratar o posicionamento das maiores religiões mundiais (budismo, judaísmo, islamismo, cristianismo e espiritismo). O primeiro capítulo aborda os conceitos de eutanásia, expressão que significa na íntegra a ação médica intencional de apressar ou provocar a morte, com exclusiva finalidade benevolente, de pessoa que se encontre em situação considerada irreversível e incurável, consoante os padrões médicos vigentes, e que padeça de intensos sofrimentos físicos e psíquicos. Analisará todos os conceitos decorrentes do termo eutanásia para que se possa fazer distinção entre cada um deles, como por exemplo. O terceiro capítulo analisa a diferenciação entre Bioética e Biodireito, ramos novos na ciência jurídica, com enfoque na visão do Estado acerca de tal tema, de como a lei encara o referido instituto, trazendo uma breve análise da eutanásia no cenário jurídico brasileiro, e suas tentativas de legalização, sendo certo que hoje no Brasil, a morte doce (eutanásia), a morte de alguém para evitar o sofrimento é, em regra, crime, não sendo apenas, de acordo com a doutrina, a eutanásia passiva (ortotanásia) em que um médico deixa de fornecer um tratamento que de forma artificial iria prolongar a vida da pessoa.

1. Do instituto da eutanásia

1.1. Morte: processo natural e inevitável

Para Sá (2005, p. 61) “morrer é parte integral da vida, tão natural e previsível quanto nascer. É inevitável. Todos morrem um dia, é apenas uma questão de tempo”. Assim, a morte é a única certeza de quem vive. Ante a esse fato seria natural que as pessoas pensassem mais nela, a aceitassem e se preparassem mais, e não a vissem como um fato de dor, mas sim como um fato natural de finalidade. Não é o que acontece, ao menos em sua grande maioria, sendo a morte vista como um acontecimento cercado de angústia e agonia. Vive-se como se ela não existisse, sendo certo que ela está presente, é real, levando pessoas conhecidas e desconhecidas, pobres e ricos, individual ou coletivamente.

Dentre todas as questões afetas ao ser humano, a única certeza que todos têm é acerca da morte, ou seja, a certeza de que a vida é finita e esse fenômeno chamado morte chega para todos, independentemente de cor, posição social, credo etc. Vive-se como se ela não existisse, embora esteja presente em cada momento vivido, levando pessoas conhecidas e desconhecidas. Diante dessa realidade, seria natural que o ser humano a enxergasse como um processo natural de finitude, e não como um instituto de dor, cercado de agonia e angústia, o que de fato acontece com a maioria dos seres humanos. Nesse sentido preleciona Escudeiro (2008, p. 25):

“Só temos uma certeza na vida. Por mais que criemos expectativas na vida sobre determinadas coisas, adivinhemos situações porvir, profetizemos acontecimentos, a única coisa certa e inevitável em nosso tempo vivido nesse mundo é a morte.”

A partir do momento em que nascemos estamos “condenados” a morrer porque somos seres finitos e mortais, sendo isso uma realidade imutável: nascemos, crescemos, desenvolvemo-nos, envelhecemos e por fim morremos, nem sempre nessa ordem, uma vez que a morte pode nos acometer a qualquer momento. Nesse sentido Lemos aduz que “não há dúvidas de que nascemos para morrer. Assim, ao longo da vida corporal, vamos descobrindo que, em nossa passagem terrena, somos personagens de uma história com início, meio e fim. Garrido preleciona que a morte não é algo distante. Desde o momento em que nascemos, sabemos que teremos que morrer. A sepultura é a casa comum de todos os mortais. Desta forma, de tudo que o homem possa ter certeza na vida, a morte é a única e verdadeira delas, não passando o resto de meras conjecturas funestas. Corrêa (2008, p. 07) preleciona dizendo que “a morte se faz presente ao longo das etapas de nossas vidas de muitas e variadas maneiras, não só na velhice ou na doença”.

Nessa linha de entendimento Esslinger (2004, p. 75) aduz que “embora os avanços científicos e tecnológicos tenham ampliado a expectativa de vida, a morte continua em nossa existência como um fato inexorável”. A palavra morte tem sua origem etimológica no latim, mors. Nada mais é do que o fato jurídico caracterizado no termo da existência humana da pessoa, tendo como consequência imediata a extinção da personalidade e dos direitos e obrigações personalíssimos. Contudo, a morte não pode ser vista apenas sob o prisma jurídico. Vista sob o prisma médico, dentro da tanatologia (ramo da medicina legal que estuda a morte e o morto), embasado na Resolução nº. 1.408/97 do Conselho Federam de Medicina, a morte se dá, pelo menos, quando da parada total e irreversível das atividades cerebrais (encefálicas), para fins de retirada de órgãos e tecidos com o fim de transplantes. Segundo a medicina, ainda, é difícil precisar o momento exato da morte, pois ela não é um fato instantâneo, antes sendo um processo de fenômenos gradativos processados nos mais variados órgãos e nos sistemas de manutenção da vida.

Entretanto, a vida é um dom precioso, devendo ser festejada. Para que seja festejada, contudo, é necessário que a compreenda como um dom extraordinário, fora do comum, saboreada, que vale a pena ser compartilhada. Que a vida é um dom precioso ninguém discute, tanto que o ordenamento jurídico pátrio a tutela, a protege, sendo que a ninguém é dado dispor da própria vida, devendo o homem viver com a maior dignidade possível, até que sua morte natural ocorra. Não se deve apressar esse processo, antes, deve-se deixar que a natureza se encarregue desse processo. A vida é um bem, um direito humano fundamental, consagrado em muitos textos legais ao longo da história. A Declaração francesa dos Direitos do Homem e do Cidadão (de 26 de agosto de 1789) diz que a vida é inalienável e sagrada. O Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (de 16 de dezembro de 1966) determina que o direito à vida nasce com o ser humano, não podendo ninguém dela ser arbitrariamente privado. A Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica) traz que toda pessoa tem direito de que sua vida seja respeitada, devendo esse direito ser amparado pela lei, desde sua concepção.

Em termos de Brasil, nossa nação ratificou todos esses documentos acima. Já no que tange ao nosso direito interno (nossas leis internas), muitas delas protegem a vida. A Carta Política do Império de 1824 e a Constituição da República de 1891, em seus artigos 179 e 72, respectivamente, protegiam todos os direitos civis e políticos, dentre eles a vida.  Igual sorte trouxe a Constituição da República de 1932 (que substituiu a de 1891) ao proclamar a inviolabilidade da vida, o que fez também a Constituição de 1937, em seu artigo 122. A Carta Magna de 1946, indo mais além, assegura a inviolabilidade dos direitos referentes à vida, não somente aos brasileiros, mas também a todos os estrangeiros residentes no Brasil. A Constituição de 1967 trazia a mesma proteção que a de 1946. E, por fim, a atual Constituição Federal, em seu artigo 5º, caput, diz que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida.

Contudo, em situações extremas de enfermidades, quando a vida já não se torna mais viável, não mais havendo recursos médicos capazes de reverter a situação, traduzindo um verdadeiro cenário de angústia e dor, o homem, querendo abreviar seu sofrimento, vê na morte sua única válvula de escape. Assim, todos os dias, no mundo, pessoas racionais possuem o desejo de morrer, sendo certo que por vezes, pedem a outras pessoas que as matem. Assim, agora algo que era ignorado (a morte), se traduz em uma fonte de esperança como alívio de todo sofrimento. O que era indesejado agora se torna o mais vital dos desejos. O que era esquecido, agora vive no imaginário e no mundo do querer daquele que não mais deseja o sofrimento, vendo na morte a única esperança de alívio.

Nesse sentido preleciona Ron (1997, p. 96):

“Evidentemente, o desejo de morte é o oposto do desejo de vida. Assim como o desejo de vida se baseia no desejo de prazer e felicidade, o desejo de morte se baseia no desejo de escapar à dor e ao mal. Não há dúvida de que as pessoas doentes e às portas da morte, quando cometem suicídio, são motivadas pelo desejo de escapar à dor e ao sofrimento físicos.”

Bem asseverou o autor em suas linhas, uma vez que as pessoas que desejam a morte por conte de extremado sofrimento gerado por enfermidades, na realidade, em uma sede de reflexão aprofundada, parecem não querer a morte, mas sim o alívio de suas dores, vendo na morte o único remédio. Caso contrário, ante a possibilidade de cura, certamente a desejariam.

1.2. Eutanásia: conceito, tipos e origem.

Em situações de dor e sofrimento, diante de enfermidades graves e irreversíveis, quando a vida não traz nada mais ao homem do que um demasiado sofrimento e desesperança pela cura, que surge entre outros institutos a eutanásia como a abreviação do processo de morrer de um enfermo, por ação ou não ação, com o objetivo último de aliviar um grande e insuportável sofrimento. Imperioso se faz conceituar o instituto nesse momento. Primeiramente conceitua-se eutanásia como morte serena, sem sofrimento. Prática sem amparo legal, pela qual se busca abreviar, sem dor ou sofrimento, a vida de um enfermo incurável e terminal. O fato é que em seu conceito clássico a eutanásia nada mais é do que retirar a vida de alguém, ainda que por questões humanitárias para a pessoa ou sociedade, no caso de deficientes, pessoas idosas ou enfermas incuráveis.

Desta forma, com já narrado acima, a eutanásia nada mais é do que um processo onde se abrevia a vida de um paciente enfermo gravemente, sem perspectiva de melhora, irreversível aos olhos da medicina, ou seja, diante da gravidade do quadro do paciente, a medicina está de mãos atadas, nada podendo fazer.

A eutanásia é ação médica intencional de apressar ou provocar a morte com única finalidade de terminar com o sofrimento de um paciente gravemente enfermo, em condição irreversível e incurável.

Para melhor compreensão do instituto, Barroso (2010) aduz:

“Compreende-se que a eutanásia é a ação médica intencional de apressar ou provocar a morte – com exclusiva finalidade benevolente – de pessoa que se encontre em situação considerada irreversível e incurável, consoante os padrões médicos vigentes, e que padeça de intensos sofrimentos físicos e psíquicos.”

Alguns bioeticistas e os juristas consideram a eutanásia como um suicídio realizado com ajuda do médico, em situações em que o paciente quer morrer, mas, por incapacidade física, não consegue realizar, sozinho, o seu desejo.

Cumpre esclarecer que a expressão eutanásia, por muito tempo, foi utilizada de forma abrangente, genérica e ampla, abrangendo as condutas comissivas e omissivas, em pacientes que se encontravam, embora doentes, em situações diferentes. Hoje se tem um conceito de eutanásia bastante estreito, compreendendo apenas a forma ativa aplicada por médicos a doentes terminais, cuja morte é questão de curto tempo. Essa ação médica é intencional no sentido de suprimir a vida do paciente porque não se teria, em tese, mais o que fazer por ele, estando, portanto, desenganado pela medicina.

Deve haver uma ação de um médico especialista de maneira controlada, que atua diretamente para causar a morte do paciente, como, por exemplo, administra a dose letal de um remédio. Os médicos que assim agem caminham não contramão da tradição hipocrática atesta que os médicos bem como os profissionais da saúde, no contexto geral, dediquem-se à proteção e preservação da vida. A eutanásia não pode ser aceita moral e eticamente como um ato médico, pois assim sendo, todos os médicos terão a tarefa de causar a morte, quando se depararem com pacientes desenganados pela medicina.

A Associação Mundial de Medicina considera a eutanásia um procedimento inadequado do ponto de vista médico. Imperioso neste momento trazermos a diferença da eutanásia para alguns outros institutos, para que confusões não sejam geradas. A que se falar na existência da ortotanásia, que é diferente da eutanásia, sendo instituto afim, contudo, cuida também do paciente terminal em estado de sofrimento, sendo traduzido por Ziemann (2014, p. 210) da seguinte maneira:

“A ortotanásia difere das demais formas de eutanásia porque, nesta modalidade, não há interrupção da vida e nem o prolongamento desta por meio de uma terceira pessoa. Para alguns autores, a ortotanásia não seria uma forma de eutanásia, mas um instituto afim. Na ortotanásia, o paciente segue o curso normal da doença até seu último momento, mas recebendo cuidados médicos para evitar ou conter as dores até que a morte chegue de forma natural.”

A expressão ortotanásia, então, nada mais é do que não antecipar a morte de alguém, não adiantar o processo morte de forma abusiva, antes, deixar a morte ocorrer em seu tempo certo, apenas suspendendo os meios artificiais utilizados para o prolongamento da vida. Não há razões plausíveis e justificáveis para que se faça confusão entre os institutos. Já em um enfoque jurídico, o instituto da ortotanásia é definida por vários juristas em nosso país, entre eles Diniz (2009, p. 78) que assim define:

“É o ato de deixar morrer em seu tempo certo, sem abreviação ou prolongamento desproporcionado, mediante a suspensão de uma medida vital ou desligamento de máquinas sofisticadas, que substituem e controlam órgãos que entram em disfuncionamento.”

Perceptível é então que não há ação médica, direta e incisiva no sentido de causar a morte como ocorre na eutanásia. Para que não haja maiores confusões entre os institutos eutanásia e ortotanásia Pithan (2004, p. 47) preleciona que:

“Uma nova terminologia tem sido adotada, afim de evitar as ambiguidades que o uso do termo eutanásia proporciona: fala-se hoje em ortotanásia e distanásia. Eutanásia é o termo tradicionalmente conhecido, originado do grego significando boa (eu) morte (thánatos). Já as duas outras palavras são neologismos recentes, também retirados do grego: a ortotanásia significa morte apropriada, correta, no tempo certo, sem cortes bruscos nem prolongamentos desproporcionais do processo de morrer.”

Como se percebe, a ortotanásia é instituto que tal como a eutanásia, tenta evitar a dor e o sofrimento do paciente terminal por uma grave enfermidade, sendo esta incurável. Contudo, difere desta, uma vez que na eutanásia se procede à retirada da vida do paciente, ao passo que na ortotanásia, não há retirada da vida, mas também não há tratamento no sentido de buscar a cura, mas tão somente trata-se no sentido e aliviar as dores e o sofrimento do paciente, em uma espera pela morte. Em suma, ortotanásia é deixar que o paciente siga seu caminho natural para a morte sem aumentar-lhe a vida de forma artificial, ou seja, apenas o acompanhamento para que a morte seja menos sofrível possível e de forma natural. Savioli (2007, p. 110) “assevera que ortotanásia é a morte em que há respeito do bem estar global da pessoa, garantindo dignidade nos momentos que lhe restam de vida”.

Não se pode também deixar de trazer ensinamento nesse presente trabalho sobre outro instituto assemelhado, a saber, a distanásia, para que não haja confusão com a eutanásia. Em um conceito atual sobre o instituto, a distanásia traduz-se como o comportamento médico que consiste no uso de procedimentos terapêuticos do que o efeito é mais nocivo do que o mal a curar, ou inútil, porque a cura é impossível, e o benefício esperado é menor que os inconvenientes previsíveis. Pessini (2007, p. 330) enxerga a distanásia “como uma ação, intervenção ou um procedimento médico que não atinge o objetivo de beneficiar a pessoa em fase terminal e que prolonga inútil e sofridamente o processo do morrer, procurando distanciar a morte”. Como visto, a distanásia não se confunde com a eutanásia, pois ao passo que esta retira a vida, aquela, prolonga a vida, em um processo contra a morte, aduzindo Lopes (2006, p. 283) que “ela ocorre quando a causa é uma doença incurável e que evolui lentamente para a morte”.

Concatenando as ideias sobre eutanásia, ortotanásia e distanásia (não querendo ser repetitivo) resume-se da seguinte maneira: a primeira é uma conduta, sem sombra de dúvidas, que busca a morte mais cedo do que se espera. A segunda, é a suspensão de meios medicamentosos ou artificias de manutenção da vida quando em um quadro irreversível, considerado em morte encefálica, em estado vegetativo se encontra o paciente. A terceira, nada mais é do que o tratamento insistente, desnecessário e prolongado de um paciente terminal de um paciente insolvável, onde se mostra inútil e fútil o tratamento.

Por derradeiro deve-se falar ainda da existência da eutanásia social, mais conhecida como mistanásia, que nada mais é do que a morte miserável antes da hora provocada por erro médico ou má-prática, não se confundindo com a eutanásia propriamente dita. Pessini e Barchifontaine (2007, p. 378) asseveram que “a morte social acontece muito antes da morte física, é uma espécie de eutanásia social, que muitos vivenciam como pior que a própria morte física”.

A utilização do termo eutanásia pode ser ambíguo, assumindo diferentes significados e interpretações. Por isso é importante salientar que devido à complexidade das questões que envolvem tal instituto não é possível formular uma teoria clara sobre a eutanásia que venha a abranger todos os casos. Contudo, estudiosos fazem algumas distinções úteis, que servem para solucionar controvérsias que fatalmente surgem dada a complexidade do instituto, mas que são distinções reconhecidas de modo geral. O problema é que cada um têm posições diferentes, sendo exatamente o que diz Holland (2008, p. 126) ao dizer que “uma das razões da problematicidade do debate sobre a eutanásia é que as pessoas têm em mente diferentes posições no continuum, que representam diferentes tipos de eutanásia”.

Antes de adentrar nos tipos de eutanásia, importante é destacar as palavras de Soares e Piñeiro (2006, p. 126) ao dizerem que “a eutanásia sofre várias adjetivações que nada mais traduzem do que particularizar o abreviamento da vida de alguém”. É imprescindível destacar a importância acerca dessas classificações a seguir expostas, para que eventuais e possíveis discussões que envolvam o presente tema possam ser bem analisadas. Analisar tais conceitos se torna vital, uma vez que através deles pode-se entender melhor o posicionamento adotada para cada questão que venha a surgir. Uma das razões pelas quais é importante conceituar os tipos de eutanásia advém do fato de que as pessoas têm em mente diferentes posições, que representam diferentes tipos de eutanásia.

Primeiramente devemos classifica-la quanto ao tipo de ação. Nesta seara, um primeiro tipo de eutanásia é a ativa que nada mais é do que o ato intencional de matar por compaixão, ou seja, é o ato de retirar a vida do gravemente enfermo e em estado de sofrimento agudo, justificado, moralmente, por um fim misericordioso, envolvendo medidas específicas para causar a morte de um paciente. Sá (2005, p. 39) preleciona que “a intenção de realizar a eutanásia pode gerar uma ação, daí tem-se a ‘eutanásia ativa’”. Outros termos são utilizados para classificar essa modalidade de eutanásia, como por exemplo, benemortásia ou sanícidio, sendo visto como nada além de um homicídio, onde o sentimento de piedade é o fator fundamental para antecipar a morte do doente, a pedido próprio ou de seus familiares, em face da incurabilidade de sua moléstia. A insuportabilidade do sofrimento, bem como a inutilidade dos tratamentos dispensados, são outros fatores decisivos para a tomada de tal decisão, que uma vez tomada, emprega-se, em regra, recursos farmacológicos, por ser prática indolor, atendendo à ideia de morte sem sofrimento.

Não resta dúvidas de que é a ação que causa ou acelera a morte do paciente para abreviar-lhe o sofrimento que lhe é insuportável, verificando-se quando o profissional da saúde age diretamente visando provocar a morte do paciente por motivos de misericórdia. Em sentido diametralmente oposto à eutanásia ativa, tem-se a eutanásia passiva ou indireta, que é uma ação que de forma deliberada desencadeia a morte do enfermo, consistente na supressão ou retirada de um vital tratamento e não gravoso, mas necessário para a manutenção da vida. Na realidade dos fatos, trata-se de uma omissão, e não uma ação. Evans (1999, p. 150) assevera que “atos de omissão são denominados eutanásia passiva, ou deixar morrer”. Hintermeyeraduz (2006, p. 74) que “a eutanásia indireta é qualificada de passiva quando a morte deriva da interrupção ou da redução de cuidados necessários à manutenção da vida”.

Não se mostra forçoso traduzir a eutanásia passiva como mero exercício regular da medicina. Por isso, entendendo o médico que a morte é inevitável, podendo diagnosticar essa inevitabilidade pela evolução da própria moléstia, seria facultado a esse profissional, suspender todo o tratamento que está sendo administrado, pois este apenas tem o condão de prolongar o sofrimento, não trazer a cura. Desta forma, na eutanásia passiva, a interrupção do tratamento médico com fito a antecipar o processo morte, omitem-se ou se suspendem condutas médicas que antes eram indicadas, como por exemplo, a interrupção de dosagem de medicamentos, uma vez que estes não surjam mais efeitos. Nesse sentido, Clotet, Feijó e Oliveira (2005, p. 75) trazem o seguinte exemplo:

“Quando não se inicia ou se interrompe uma ação médica e a consequência é a morte do paciente. Por exemplo: paciente com câncer e múltiplas metástases cerebrais que não responde mais a tratamento clínico, desenvolve insuficiência respiratória e decide-se por não ser encaminhado para Unidade de Tratamento Intensivo para suporte respiratório invasivo. Neste momento decide-se, igualmente, interromper os antibióticos que estava utilizando para uma infecção respiratória.”

Percebe-se que a eutanásia passiva, chamada ainda de negativa, não se trata, na realidade, de uma ação médica, antes, trata-se de uma omissão médica, isto é, a não mais aplicação de tratamentos ou terapias, as quais poderiam prolongar a vida da pessoa enferma, como por exemplo, não aplicar ou até mesmo desconectar o respirador artificial num paciente sem expectativas de vida.A morte do paciente nesse contexto ocorre dentro de uma situação de terminalidade, ou porque não se inicia uma ação médica ou porque se suspende, interrompe uma medida médica já adotada, com o objetivo de minorar o sofrimento e não lutar contra a morte, que neste caso é certa, inevitável. A interrupção dos tratamentos, neste caso, como já visto, não apressa a morte, antes a traz na hora certa, sendo naturalmente esperada. Bom exemplo disso é o paciente com câncer terminal que é transferido do Centro de Tratamento Intensivo (CTI), já inconsciente, para sua casa, mediante autorização de seus familiares. Vê-se que não há provocação de sua morte, apenas segue a cadeia de causalidade, não mais interrompida por atos médicos. O exemplo por excelência é a morte por desligamento dos aparelhos que mantém o paciente em vida.

Embora se trate de uma diferenciação feita pela maioria dos estudiosos da eutanásia, importante destacar que a eutanásia ativa e a passiva, para alguns, não são diferentes, sendo exatamente o pensamento de Palmer (1999, p. 58) ao dizer que “a eutanásia ativa e a passiva são a mesma coisa”, uma vez que em ambas existe o processo morte. Além do mais, não há necessidade para tais, o que não concordo, dessa diferenciação, pois eutanásia seria qualquer forma de supressão da vida, antecipando a morte, que deviria chegar em seu tempo naturalmente certo e, sobretudo, esbarrando no campo da moral, não há diferença entre alcançar a morte com conduta comissiva ou omissiva.

Tem-se ainda a eutanásia de duplo efeito, ocorrendo quando a morte é acelerada, como consequência inevitável e indireta das ações médicas executadas visando alívio da dor e do sofrimento desse paciente terminal. Fundamenta-se na proporcionalidade dos maus e bons resultados. Quando se inicia um tratamento como intenção de minorar os sintomas que causam dor e sofrimento e dele advém um aceleramento da morte que já está em processo. Pacientes terminais com câncer, por exemplo, podem receber analgésicos para sedar a dor e ansiolíticos para controlar a ansiedade. Contudo, essas drogas podem impedir que sejam eliminadas secreções na árvore respiratória, o que torna mais propenso o paciente a contração de uma infecção respiratória. Vê-se que a morte não é o objetivo, mas sim o alívio das dores. Mas é efeito secundário e inevitável dessa intervenção médica. Rego, Palácios e Siqueira-Batista (2009, p. 110) trazem como exemplo de eutanásia de duplo efeito o “emprego de morfina para controle da dor, gerando secundariamente, depressão respiratória e óbito”.

Quanto ao consentimento do paciente, temos a eutanásia voluntária, a involuntária e a não-voluntária, que em última análise, visa estabelecer a responsabilidade do agente, a saber, do médico. Eutanásia voluntária é aquela que implica um querer atual ou prévio de pôr fim a própria vida, ou seja, a morte é provocada atendendo a uma vontade do paciente. Assim, o enfermo terminal ou incurável decide por pedir ajuda a um terceiro, no caso, geralmente médico, que lhe aplique um remédio mortal para aliviar-lhe seu sofrimento. Em suma, a eutanásia voluntária descrevia situações em que o paciente consciente e deliberadamente solicitava a morte.

Assim, o que melhor define essa modalidade de eutanásia é a manifestação consciente do paciente, pela forma de como e, quando será administrado o tempo que lhe resta, sendo de suma importância frisar que, para alguns defensores dessa modalidade de eutanásia, a vontade do paciente deve ser respeitada, sendo exatamente o que preleciona Pessini (2004, p. 192) afirma que:

“O argumento moral para a legislação sobre a eutanásia voluntária parece basear-se principalmente no apelo ao princípio de autonomia, ou seja, visto que as pessoas têm direito moral de tomar decisões a respeito de sua vida, a lei deve respeitar esse direito e não colocar obstáculos às formas de suas decisões de pôr fim à vida com auxílio de outrem”.

A eutanásia involuntária também deve ser mencionada, como sendo aquela em que a vida do paciente é retirada sem o seu consentimento, ou porque não lhe fora perguntado, ou tendo perguntado, não houve seu consentimento para tanto. Esse tipo de eutanásia, como visto, ocorre quanto “o ato é realizado contra a vontade do enfermo, o que, em linhas gerais, pode ser igualado a homicídio”. Soares e Piñheiro (2006, p. 125) afirmam que “na involuntária, induz-se a morte de alguém, sem que esta tenha manifestado seu desejo quanto à morte”. A eutanásia involuntária fora praticada na como questões de política na medicina nazista, é um ato de retirada da vida dos pacientes contra sua vontade.

Já a eutanásia não-voluntária, a seu turno, é aquela que descrevia situações em que o paciente estava incapacitado para tomar decisões e não tinha feito nenhum pedido, ou seja, em nenhum momento o paciente manifestou vontade, expressa ou tácita, pelo desejo à morte. Esse tipo de eutanásia causa a morte, em geral de pessoas, sem capacidade para tomar decisões e sem expresso desejo. Assim, nota-se que a eutanásia pode ser praticada com ou sem o consentimento do paciente, sendo uma forma clara, em qualquer dessas expressões, uma forma de retirada da vida de quem sofre com um mal incurável e quer aliviar-se.

Nesse mesmo sentido prelecionam Jonsen, Siegler e Winslade (2012, p. 154):

“A eutanásia voluntária descrevia situações em que o paciente consciente e deliberadamente solicitava a morte. A eutanásia não voluntária descrevia situações em que o paciente estava incapacitado para tomar decisões e não tinha feito nenhum pedido. A eutanásia involuntária descrevia situações em que os pacientes eram mortos contra sua vontade”.

Nessa gama de tipos de eutanásia, destaca-se a eutanásia eugênica, caracterizada como meio de reduzir a pesada carga, para a sociedade, daqueles pacientes com deficiências físicas e psíquicas graves. Prega na verdade, a eliminação simples, pura e cruel dos psicopatas, alcoólatras, criminosos pervertidos e inválidos. Argumentam ainda o impedimento da propagação de tais problemas, buscando na realidade um aperfeiçoamento racial.

A eutanásia eugênica está totalmente distante da verdadeira eutanásia, que consiste na boa morte, aquela que é dada por um médico a um paciente terminal e incurável, visando o fim de seu sofrimento. O objetivo da eutanásia eugênica é a melhoria da raça humana, como ocorreu durante o nazismo, com o holocausto, e não com o alívio do sofrimento daquele que está gravemente enfermo e sofrendo.

Por fim, deve-se falar de uma prática, o suicídio assistido, que assemelha-se à eutanásia, mas certo de não ser a mesma coisa, já que é apenas uma prática assemelhada. Na eutanásia o médico age ou se omite, e desta ação ou omissão a morte surge. Já no suicídio assistido, não se depende de um terceiro para que ela ocorra, antes, é uma consequência de uma ação do próprio paciente, sendo este orientado, auxiliado ou simplesmente observado.Embora o suicídio assistido aproxima-se da eutanásia, não é um sinônimo. O que os diferencia é quem realiza o ato, no caso da eutanásia o pedido é feito para que alguém execute a ação que vai levar a morte. No suicídio assistido é o próprio paciente quem realiza o ato, embora necessite de ajuda para fazê-lo, e nisto difere do suicídio, em que esta ajuda não é solicitada. De acordo com os preceitos da bioética não há diferenças morais entre causar a morte ativamente ou assisti-la.

A expressão eutanásia é composta por dois termos gregos (eu = bom e thanatos = morte), cujo significado é morte boa ou homicídio piedoso. O termo ‘eutanásia’ foi utilizado a muito tempo pelo historiador latino Suetônio, no século II d.C., para descrever a morte tranquila do imperador Augusto que a teve da forma que sempre desejou. Posteriormente, em 1623, época do Renascimento, Francis Bacon, em sua obra História vitae et mortis, emprega o termo eutanásia em seu significado mais próximo do atual, não se relacionando apenas ao sentido etimológico grego, mas possuindo a ideia de “prestar atenção em como o moribundo deixa a vida mais fácil e silenciosamente”, passando a questão a tomar cunho filosófico. Ele defendia que a eutanásia podia ser praticada por médicos quando não mais dispusessem meios curativos. Acreditava que a função do médico é curar bem como aliviar as dores e o sofrimento, não somente quando tal alívio conduzisse à cura, mas também a uma morte calma, tranquila e fácil. Em um campo de precisão, somente no século XVII, com Tomás Morus e Roger Bacon, é que a expressão eutanásia ganha significado que faz referência ao ato de pôr fim à vida de um paciente terminal em estado de sofrimento.

2. Eutanásia e o ordenamento jurídico pátrio

2.1. Aspectos penais

O ordenamento jurídico brasileiro (conjunto de leis) possui vários ramos tais como: direito civil, direito administrativo, direito constitucional, direito do trabalho, direito processual penal e cível, direito penal, entre outros, cada um com suas matérias específicas, formando apenas um único sistema, que determina normas que devem ser seguidas.

Fiuza (2010 p. 23) aduz que:

“A divisão do direito em ramos nada mais serve para orientar o estudioso, o qual poderá examinar as normas e instituições jurídicas reunidas em grupos. Mas, de fato, o Direito é um só. Todas as suas normas, princípios e instituições devem inter-relacionar-se de forma harmônica, formando um só sistema.”

Assim, certo é que todos os ramos jurídicos acima expostos, formam um único direito, um único sistema, do qual o direito penal é integrante. Assim, no que tange especificamente ao direito penal, esse ao lado dos demais ramos do direito, é um instrumento de controle social, visando conservar a paz e harmonia entre os membros dessa dita sociedade. Assim, o direito penal está, dentro do sistema, como um instrumento de pacificação social.

Hassemer (2077, p. 112) preleciona:

“Ao se querer descrever a posição do Direito Penal e as suas tarefas (ou seja, praticar a teoria do Direito Penal), então o conceito do controle social pode servir como relevo. A posição do Sistema de Direito Penal se encontra no campo de controle social, o Sistema de Direito Penal é uma de suas partes”

Assim, nesta ceara de controle da sociedade, cumpre esclarecer que é justamente o direito penal o ramo jurídico responsável por selecionar condutas e incriminá-las, ou seja, quando o Estado não quer que os membros dessa sociedade pratique determinada conduta, justamente porque essa conduta retira o equilibro social bem como quebra a sua harmonia, Ele (Estado), através da lei, incrimina essa conduta. Assim, nasce um crime. Nos dizeres de Pacheco Filho e Vilmar (2012, p. 29) “trata-se de uma lei nova que incrimina determinada conduta que até então não era criminosa”. Colabora com esse entendimento Estefam (2015, p. 231) ao afirmar que “a novatio legis incriminadora, por fim, é a que passa a definir o fato como penalmente ilícito. Em outras palavras, uma conduta penalmente atípica passa a ser definida como crime ou contravenção”.

Essa nova lei que vem incriminar condutas possui dois preceitos: um primário e um secundário. Segundo Netto (2013, p. 80) “o preceito primário descreve com clareza a infração penal e o secundário representa a cominação em abstrata e individualiza a respectiva sanção”. Como exemplo podemos extrair do Código Penal o artigo 155 (furto), onde temos o preceito primário – subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel – e o secundário – Pena – reclusão, de um a quatro anos, e multa.

Importante asseverar que esse processo estatal de incriminar condutas antes consideradas lícitas, se dá através de lei (como já dito acima), ou seja, somente a lei pode criar crimes e cominar sanções (punições) para aqueles que cometerem essa conduta, antes lícita, porém agora ilícita. É o chamado princípio da legalidade. Isso se deve ao fato de que além de o direito penal ser um ramo jurídico incriminador, ele é também é o responsável pela tutela (proteção) dos bens jurídicos mais valiosos e dos direitos fundamentais para a vida comum em sociedade, como, por exemplo, proteger o direito à vida e à liberdade. Desta forma, o indivíduo que praticar essas condutas incriminadas, estará violando a lei penal, passível de ser punido, uma vez que ao violar a dita lei, nasce para o Estado o direito/dever de perseguir esse sujeito com intenção de processá-lo, julgá-lo e, sendo considerado culpado, aplicar-lhe a respectiva sanção que também está prevista na lei penal. Desta forma, aquele que viola a lei penal, gera para si uma responsabilidade penal.

Galvão (s/a, p. 152) aduz:

“A responsabilidade penal pressupõe sempre a violação da norma protetivo-afirmativa do bem jurídico, que é subjacente a um tipo penal incriminador. O tipo incriminador descreve a conduta delitiva e não se confunde com a norma jurídica. A norma jurídica fundamenta a elaboração do preceito incriminador-descritivo e coloca-se em sentido contrário ao comportamento descrito.”

No que se refere especificamente ao tema do presente capítulo, os códigos penais brasileiros nunca dispensaram tratamento específico à eutanásia. O Código Penal de 1830 nada dispunha sobre a eutanásia. Contudo, aplicava pena ao crime de auxílio ao suicídio.

Imperioso dizer que há diferença entre o suicídio assistido e a eutanásia. Nos dizeres de Kovács (2003, p. 196):

“O que diferencia a eutanásia do suicídio assistido é quem realiza o ato, no caso da eutanásia o pedido é feito para que alguém execute a ação que vai levar à morte; no suicídio assistido é o próprio paciente que realiza o ato, embora necessite de ajuda para realiza-lo, e nisto difere do suicídio, em que esta ajuda não é solicitada”.

A seu turno o Código Penal de 1890, determinava no seu artigo 299 a cominação de pena de prisão por dois a seis anos, para aquele que induzisse ou moralmente ajudasse alguém a suicidar-se. Sorte melhor não trouxe o atual e vigente código penal de 1940, que basicamente manteve as disposições de lei anterior, ou seja, dos demais códigos. Gozzo e Ligiera (2012, p. 172) atestam que “no Brasil não há tipo específico para a eutanásia. O Código Penal brasileiro não faz referência à eutanásia”. Desta feita, por falta de previsão legal, ou seja, por falta de uma lei incriminando a eutanásia, tal tarefa ficou à cargo dos doutrinadores, a cargo dos estudiosos em direito, para que assim, pudesse definir o tratamento a ser dispensado ao instituto da eutanásia. Segundo a melhor doutrina, para o direito brasileiro, a eutanásia é vista como crime.

Importante salientar que em nosso ordenamento jurídico não há um tipo específico definindo a conduta da eutanásia, como demonstrado anteriormente. Isso não significa que a referida prática seja legalizada no Brasil. Quem pratica tal conduta responderá criminalmente como incurso no artigo 121, § 1º, pelo artigo 122 ou pelo artigo 135, todos do Código Penal vigente, a depender do caso.

O que se faz na realidade, é moldar a conduta daquele que comete a eutanásia, em algumas de suas modalidades, a algum tipo penal já existente na legislação, mais precisamente ao auxílio ao suicídio (artigo 122 do código penal), ao homicídio privilegiado (artigo 121, § 1º do código penal) ou à omissão de socorro (artigo 135 do código penal) como forma de suprir essa lacuna. Na sua imensa maioria, é taxado como crime de homicídio a prática da eutanásia. Rego (2009, p. 111) aduz que “de modo análoga ao previsto para o aborto, o Código Penal brasileiro penaliza a eutanásia por entendê-la como homicídio (crime contra a vida); de acordo com seu artigo 121, é crime matar alguém”.

Martelli (2007, p. 45) aduz que:

“No Brasil, o atual Código Penal, não especifica o crime de eutanásia, o médico que tira a vida do seu paciente por compaixão, comete o homicídio simples tipificado no art. 121, sujeito a pena de 6 a 20 anos de reclusão, ferindo ainda o princípio da inviolabilidade do direito à vida assegurado pela Constituição Federal.”

Nessa seara de entendimento, é de solar clareza que aquele que comete a eutanásia, procedendo à retirada da vida de alguém, comete crime de homicídio. Conduto, ela será considerada um como homicídio privilegiado, onde pela presença do motivo de compaixão e/ou piedade do agente que comete a eutanásia, é o que leva o agente a cometer o crime. Por esse motivo o legislador entende ser necessário uma redução na pena desse agente.

Cabette (2012, p. 10) ensina que:

“Qualquer pessoa pode ser vítima de homicídio, conforme acima mencionado, inclusive não importando o grau de vitalidade. Tanto o ser humano saudável como o moribundo podem ser vítimas de homicídio. No atual estágio do ordenamento jurídico brasileiro a chamada “eutanásia” configura cri- me de homicídio. O máximo que pode ocorrer em casos que tais é o reconhecimento de uma redução de pena devido à configuração do chamado “homicídio privilegiado” (art. 121, § 1o, CP).”

Jesus (2001, p. 10) preleciona que “a eutanásia é disciplinada como causa de diminuição de pena, dado o sujeito agir por compaixão, a pedido da vítima, imputável e maior, para abreviar-lhe sofrimento físico insuportável, em razão de doença grave”. Que é visto como homicídio já se percebe, contudo, várias são as nomenclaturas utilizadas ao se fazer referência à prática da eutanásia além do homicídio, entre elas homicídio piedoso, compassivo, médico, caritativo ou consensual.

Nesse sentido Costa Júnior (2013, p. 76-77) assevera:

“Parece meio claro nas decisões judiciais que o que for identificado como eutanásia, mesmo como o forte preceito moral que vem por trás da atitude, acaba por se caracterizar um homicídio privilegiado, ou seja, um homicídio que será punido com uma pena menor, mas ainda sim um homicídio haverá. O preceito moral, quando acontece, pode ser uma atenuante, mas nunca será uma excludente da ilicitude, ou seja, não se excluirá o crime que houve, apenas diminui a pena”.

Não nega-se ser a eutanásia crime. Não importa o motivo do agente que a pratica. Ainda que o fator motivador daquele que pratica o referido instituto seja a piedade, a compaixão, e não se tenha a intenção primeiro de retirar a vida, mas acabar com o sofrimento do doente, será e de fato é crime, existindo apenas nesses fatores o condão de atenuar a reprimenda (sanção), e jamais afastar ou excluir o crime.

De suma importância asseverar que o consentimento do paciente terminal, não afasta a incidência do crime, uma vez que seu consentimento é do ponto de vista jurídico completamente irrelevante, não sendo uma causa autorizadora. Assim, a eutanásia é vista como um fato ilícito (contrário à lei), não podendo se construir uma causa que venha excluir essa ilicitude fundada no consentimento do paciente. Não tem o condão de validar a conduta do médico que retira a vida do paciente enfermo e terminal, o consentimento deste. Não se exclui o crime. Ainda que haja expresso consentimento, livre e consciente por parte do doente, continua a conduta do médico incriminada.

A questão que divide hoje a opinião dos juristas, médicos, estudiosos da matéria e da própria sociedade é: deve-se legalizar ou não a prática da eutanásia? Diante disso, lançam-se à mesa os mais variados argumentos. Como se verá nas linhas que seguirão, há acesa polêmica envolvendo a questão. A questão está à mesa. Não é uma questão de fácil solução, uma vez que tratando-se de irrenunciabilidade e inviolabilidade do direito à vida, profundas divergências irão surgir acerca de condutas que venham abreviar a vida com objetivo de aliviar seu sofrimento. Enxergaremos verdadeira uma rota de colisão entre a proteção do direito à vida e o respeito à autônima da vontade.Passemos aos argumentos dos defensores e dos contrários à legalização.

De um lado militam os defensores da eutanásia, lançando os mais variados argumentos.

Ramos (2003, p. 119) aduz:

“Os casos comprovadamente incuráveis devem ter a benevolência da lei”, pois “a própria Igreja [Católica] admite a eutanásia indireta” (teoria do duplo efeito), e, também porque a “fome, a miséria e a falta de assistência social e previdenciária matam mais atrozmente do que a eutanásia”. Ou, ainda, porque “a vida de uma pessoa que está sofrendo de uma doença mortal tornou-se inútil a ela, à sua família e à sociedade”, razão pela qual se justifica moralmente pôr termo à sua própria vida, quer sozinha, quer com auxílio de outros”.

Os marcos justificadores para os que advogam pela legalização da eutanásia são os medos: do sofrimento no momento de morrer (com sufocamentos, muita dor, tubos por todo o corpo, etc.); da degeneração do corpo, sendo vista por seus entes queridos; do abandono e da solidão na hora da morte; do não desejo ao respeito de morrer; da dependência para atividades cotidianas ante a impossibilidade de praticá-las. Dentre todos os argumentos, o mais importante de todos, que deve ser levado em consideração para fins de legalização da eutanásia, segundo seus defensores, seguramente é o princípio da autonomia da vontade, uma vez que as pessoas têm direito, moralmente falando, de tomarem decisões sobre suas próprias vidas, sendo certo que a lei deveria respeitar esse direito.

No contexto médico-paciente deve-se conferir valor à vontade do paciente. Este deixa de ser mero objeto de intervenções médicas e passa a constituir-se em sujeito de direitos, ser humano dotado de razão e vontade própria, por isso, capaz de decidir conscientemente, a respeito de todo e qualquer procedimento médico que lhe será ministrado. Essa autonomia é uma propriedade que tem a vontade de ser para ela mesmo sua lei, ou seja, ela deve ser respeitada e pronto.

Soares e Piñeiro (2006, p. 85) aduzem que:

“A autonomia da vontade é aquela propriedade que tem a vontade de ser para ela mesma sua lei (independentemente da natureza dos objetos do querer). O princípio da autonomia é, portanto, optar sempre de tal maneira que a vontade possa considerar as máximas que determinam sua escolha como leis universais”.

Deve-se levar em consideração ainda, que para os defensores da eutanásia e, pugnantes por sua legalização, morrer com dignidade é um direito que deve ser reconhecido a quem pede. No campo da ética e da área jurídica, alguns acadêmicos são a favor da legalização de todas as formas de eutanásia voluntária. Para eles a questão central não é como a morte ocorre, mas sim como se toma a decisão. Para eles não há diferença entre desligar um aparelho que sustenta a vida e aplicar, por exemplo, uma injeção letal. Em defesa da legalização, seus adeptos ainda trazem mais alguns argumentos, tais como incurabilidade, sofrimento insuportável e inutilidade (desconstruiremos tais argumentos mais a frente).

Legalizar a eutanásia é muito mais do que simplesmente permitir que abrevie a vida de um doente enfermo gravemente. A questão que se impõe é a consideração do adeus a essa vida com a maior dignidade possível. Conduto, essa dignidade na hora de morrer ultrapassa as fronteiras da relação médico hospitalar, invadindo o campo sócio-político-relacional. Todos os dias nos emocionamos casos dramáticos veiculados na mídia, anunciando o direito a uma morte digna, sem sofrimento, o que nos parece ser um ideal a ser conquistado. Mas isso não nos parece aceitável, uma vez que todos os dias morrem pessoas vítimas de acidentes terríveis, e, sobretudo, morrem em decorrência das péssimas condições de vida em nosso contexto social. Assim, morrer com dignidade passa pelo campo do viver com dignidade, e não pela mera questão de sobrevivência. É possível dar uma morte digna a quem nunca teve uma vida digna?

A legalização da eutanásia, em nosso sentir, vai contra nossa natureza que luta pela vida, viola a dignidade humana, impede a possibilidade de curas milagrosas, os doentes críticos poderiam facilmente desistir da vida se a eutanásia fosse uma opção e, por fim, poderia levar a abusos terríveis. Além do mais, tanto o enfermo quanto o médico, diante da morte inevitável, devem conformar-se com os meios normais que a medicina oferta. Não se pode qualificar a morte digna como uma morte sem dor. A dor faz parte da vida humana, nos acompanhando desde o nascimento, passando pelas doenças da vida até a morte. A dor é uma constante na biografia da vida. A dignidade nasce da grandeza de quem enfrenta a dor, e não de quem clama pela morte.Nos posicionamos veementemente contra a prática da eutanásia. Nosso ordenamento jurídico não deve acatar a sorrateira tese de que pela autonomia da vontade, a pessoa tendo livre disposição sobre seu corpo, pode deliberar por fim em sua vida, se valendo do auxílio de terceiros quando solicitados.

Por sua vez, no campo médico o art. 41 do Código de Ética Medica – Resolução 1.931/2009 –, do Conselho Federal Medicina, situado no capítulo inerente às relações do médico com pacientes e familiares, proíbe expressamente a abreviação da vida do enfermo, ainda que a pedido deste ou do seu representante legal. Mas, em respeito à dignidade da pessoa humana, o médico não pode utilizar no tratamento meios terapêuticos ou diagnósticos inúteis ou desnecessários, capazes de atentar ainda mais contra a debilitada condição do portador de doença incurável e em estado terminal. Não se pode admitir que se transforme em morte uma agonia, mesmo que dolorosa e intensa, outorgando a alguém o direito de antecipar uma morte, como forma generosa de afastar a dor bem como o sofrimento. Não se pode ofertar ao médico (à própria medicina) uma sina tão ruim e triste. O sofrimento, a agonia e mesmo a dor intensa, não podem ser fundamentos para constituir um mecanismo para aferir a gravidade de um mal com fito a determinar questões de vida ou morte.

Os que lançam mão dos argumentos da incurabilidade, sofrimento insuportável e inutilidade, o faz de forma superficial. Primeiro, a incurabilidade é apenas um prognóstico médico, uma presunção, portanto, duvidosa, repleta de probabilidade, mas desprovida de certeza, até mesmo porque houve na história da humanidade doenças que eram consideradas incuráveis, e hoje não mais são. Segundo, a dor faz parte da essência do homem, o sofrimento não é termômetro para tomada de decisões desse porte. Terceiro, rotular alguém como inútil por conta de uma enfermidade incurável é cruel e desumano, pois não se pode admitir que seja alguém assim enxergado, quando viveu, amou, contribuiu, e que não mais reúne condições físicas ou psíquicas.

Em suma, a eutanásia no Brasil não está legalizada, continuando a ser punida por outros tipos penais, como já visto anteriormente. Por fim, deve-se trazer à baila o entendimento, já que tratamos neste trabalho sobre a morte, mesmo que de forma indireta, de que no Brasil apenas a Eutanásia é considerada crime, sendo que a ortotanásia não é considerada uma infração penal.

Em 2006, o Conselho Federal de Medicina (CFM) firmou posicionamento favorável à prática da ortotanásia. Salienta-se que a ortotanásia não tem objetivo de abreviar a vida ou adiar a morte do paciente, mas de garantir o bem estar do enfermo. O Conselho Federal de Medicina esclareceu que não está convalidando a prática da eutanásia, mas sim da ortotanásia, já que a eutanásia significa a antecipação da morte de pacientes cujo quadro clínico é considerado irreversível.

2.2. Eutanásia e o direito comparado: Holanda, Bélgica, Luxemburgo, Uruguai

Inicialmente, é importante aduzir que as diversas legislações estrangeiras vêm nos últimos tempos se preocupando com o tema da eutanásia em seus respectivos códigos. Desta forma, analisando a eutanásia em um contexto internacional, percebe-se que o entendimento legislativo, doutrinário ejurisprudêncial, acerca da eutanásia, varia de país para país, podendo ser um fato atípico (não considerado crime), causa de diminuição de pena ou até mesmo a possibilidade de não aplicação de pena pelo instituto do perdão judicial. Cada país trata o referido instituto segundo seu ordenamento jurídico interno.

Um dos primeiros países, a legalizar a eutanásia foi a Holanda. A legalização da eutanásia no referido país, que se deu em abril do ano de 2001, estimulou a discussão sobre a descriminalização dessa prática em outros países do mundo.Ressalta-se que também foi legalizada na Holanda o suicídio assistido. Essa legalização na Holanda é apoiada amplamente tanto pelo público geral quanto pelos médicos holandeses. Apenas uma faixa de 10% são contrários à legalização, que diga-se de passagem, como já afirmado acima, já está legalizada. Mais de 50% dos médicos da Holanda assistiram suicídios e tiraram ativamente a vida de muitos pacientes. Imperioso asseverar que a legalização da eutanásia e do suicídio assistido aplicam-se somente aos médicos.

Assim, não houve um aumento significativo nos índices de morte na Holanda por conta da legalização dos institutos da eutanásia bem como do suicídio medicamente assistido, ao contrário do que se temia por aqueles contrários a tais legalizações. Ressalta-se que não é simples a prática da eutanásia na Holanda, pois a Associação Médica Holandesa estabeleceu diretrizes, quais sejam: 1) a decisão também deve ser decisão do paciente. 2) a solicitação do paciente de suicídio medicamente assistido/eutanásia deve ser voluntária. O médico não pode sugerir o suicídio/eutanásia como uma opção. 3) O paciente deve ter um entendimento claro e correto da situação médica e do prognóstico. 4) O paciente deve estar passando por um sofrimento interminável e insuportável, mas não necessita estar na fase final. 5) O médico e o paciente devem concluir que não há outra alternativa aceitável para o paciente. 6) Um segundo médico, independente do primeiro, deve ser consultado e deve examinar o paciente e confirmar que as condições foram atendidas. 7) O médico deve abreviar com a vida do paciente de maneira medicamente apropriada.

Já no ano de 2002, no mês de maio, mais precisamente, a Bélgica seguiu o exemplo da Holanda, quando o Parlamento Belga aprovou uma lei permitindo aos médicos abreviarem a vida dos pacientes que se encontravam nas condições semelhantes às adotadas pela legislação da Holanda. Na Bélgica o médico pode praticar a eutanásia desde que atendidas as seguintes condições: quando o paciente consente com a intervenção, quando está sofrendo uma dor constante e insuportável, física ou psicológica e está na fase final. Vale ressaltar, que a legalização da eutanásia na Bélgica, deve ser realizada única e exclusivamente por médico habilitado e autorizado para tanto, como já timidamente alegado acima. Além das condições fáticas acima expostas, deve-se seguir os procedimentos formais expressamente exigidos pelo artigo 3º da referida lei, tendo sido criada, para tanto, uma Comissão Federal de Controle e de Avaliação (art. 6º).

Ressalta-se que o processo legislativo de legalização da eutanásia na Bélgica galopou velozmente, uma vez que esse processo fora iniciado no ano de 1999, no mês de novembro, tendo a referida lei sido aprovada em 28 de maio de 2002, entrando em vigor em 23 de setembro do mesmo ano. Não havia nesse país nenhuma jurisprudência relevante sobre o tema da eutanásia, o que trazia grande insegurança para os médicos que praticavam tal conduta, pois não sabiam ao certo que era sua situação frente à justiça.

Lima (2014, p. 150) preleciona que “a Bélgica adotou um passo a mais ao estabelecer em sua legislação nacional o seguinte: aborto e eutanásia não equivalem aos crimes de homicídio ou lesão corporal grave”. Em Luxemburgo, a legalização da eutanásia foi um tanto quanto conturbada. Em 2008, o Grão-Duque de Luxemburgo, Henri de Luxemburgo, renunciou após receber a notícia de que o Parlamento luxemburguês, em fevereiro, aprovou um texto tornando o país a terceira nação da União Europeia a legalizar a eutanásia após Holanda e Bélgica, nessa ordem.

Na Austrália, em seu territórios nortes, no ano de 1996 foi aprovada uma lei que admitia a prática da eutanásia. Contudo, poucos meses após essa lei fora revogada, sendo, portanto, proibida a prática da eutanásia em todo o território australiano. Descendo para o continente americano, temos países que legalizaram a eutanásia. No que diz respeito ao Uruguai, esta foi uma das primeiras nações a legislar sobre o tema da eutanásia. No ano de 1934, no dia 29 de junho, o governo uruguaio promulgou a lei 9.414, facultando ao médico que comete a eutanásia o perdão judicial, pois este agiu por razões humanitárias, facilitando a morte de um paciente. Assim se infere de referida lei em seu artigo 37:Del homicidio piadoso: Los Jueces tiene la facultad de exonerar de castigo al sujeto de antecedentes honorables, autor de un homicidio, efectuado por móviles de piedad, mediante súplicas reiteradas de la víctima.

Pessini (2004, p. 275) aduz que “na América Latina, desde 1934, o Uruguai já admite a impunidade legal quando se caracteriza o denominado ‘homicídio piedoso’”. Assim, percebe-se que o Uruguai não legalizou expressamente a eutanásia, todavia, permite ao juiz, após análise do caso concreto, decidir por isentar de pena o agente (médico) que abrevia a vida de um paciente terminal. É uma hipótese em que é facultado ao juiz a exoneração do castigo a quem realizou este tipo de procedimento, desde que preencha três condições: ter o agente antecedentes honráveis, ser realizado o ato por motivos piedosos e a vítima ter feito reiteradas súplicas.

Por fim, importante esclarecer que não foi feita uma abordagem sobre a eutanásia dentro de todas as legislações existentes no planeta, mas apenas de algumas, para que sirva de exemplo, e que traga a certeza de que é um tema recorrente a nível mundial.

Conclusão

No presente trabalho, prestou-se um breve estudo sobre o instituto da eutanásia, apresentando um breve resumo de sua origem, conceito e tipos. Através da pesquisa foi observado que vários são os tipos de eutanásia, sendo todos, no fim das contas, uma forma de abreviar a vida ou antecipar a morte de um paciente gravemente enfermo e em estado terminal.

Destacou-se ainda como o direito penal enxerga tal instituto e como dispensa tratamento a todos os que cometem essa prática. Viu-se argumentos contrários e a favor da legalização da eutanásia no Brasil, ficando certo que hoje ainda é visto como crime de homicídio privilegiado.

Por fim analisou-se a eutanásia no cenário internacional, buscando compreender como alguns países, especificamente a Holanda, Bélgica, Luxemburgo e o Uruguai tratam o referido tema.

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Informações Sobre o Autor

Fabiano da Silva Abreu

Advogado, Professor do Curso de Graduação em Direito da Faculdade Santo Antônio de Pádua (RJ); Mestrando em Ciências da Religião pela Faculdade Unida de Vitória – ES; Pós Graduado em Ciências Penais pela Universidade Anhanguera-Uniderp; Pós Graduado em Formação de Professores para o Ensino Superior Jurídico pela Universidade Anhanguera-Uniderp; Bacharel em direito pela Universidade Iguaçu


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