Aplicabilidade dos tratados internacionais de meio ambiente no ordenamento brasileiro

Inicialmente[1], cabe dizer que Tratado é um termo genérico, que tem como espécies as Convenções, as Recomendações, os Pactos, os Acordos, os Protocolos, assim, a existência de um vocábulo que englobe todos os atos internacionais, facilita o estudo de seu caráter.


O Tratado vem definido no art. 2º, nº. I, alínea a, da Convenção de Viena, de 1969 – “Acordo internacional celebrado por escrito entre Estados  e regulado pelo direito internacional, constante de um instrumento único ou em dois ou mais instrumentos conexos, e qualquer que seja a sua denominação particular”. 


Leciona SCHMIDT e FREITAS (2004), que os tratados, elaborados na forma escrita, podem ser celebrados tanto entre Estados quanto entre organismos internacionais. 


Ao falar da hierarquia dos tratados internacionais de meio ambiente, assevera Caroline Assunta SCHMIDT e Mariana Almeida Passos de FREITAS (2004), que este é certamente um dos mais polêmicos temas no que diz respeito aos tratados internacionais, pois muitos autores defendem o primado do direito internacional sobre o direito interno, alguns inclusive entendendo ser o tratado norma constitucional, ou até mesmo supraconstitucional. 


Entretanto, conforme doutrina as autoras acima, o entendimento sobre este assunto foi firmado pelo Supremo  Tribunal  Federal,  quando  do  julgamento  do  Recurso  Extraordinário 80.004 de 1977, ou seja, de que os tratados internacionais estão em paridade com as leis federais, estando no mesmo nível hierárquico. Conseqüentemente,  aplica-se  o  princípio  de  que  a  norma  posterior  revoga  a  norma  anterior com  ela  incompatível,  podendo  tanto  um  tratado  revogar  uma  lei  federal, quanto a lei federal revogar um tratado. Isto decorre do próprio sistema dualista adotado pelo Brasil. Uma vez que o tratado deve ser incorporado através de  um  decreto  para  surtir  efeitos,  ele  se  iguala  a  uma  lei  federal.


Porém, outros autores defendem o primado da norma internacional sobre a interna, especialmente os tratados de direitos humanos. E, através deste entendimento, uma vez que o Estado está vinculado pelo tratado, ele só pode descumpri-lo se houver denúncia[2], que é a forma própria de revogação de um tratado. 


Para SGARBOSSA (2005), no Brasil, existe uma tendência em situar as normas internacionais no mesmo plano hierárquico que as normas infraconstitucionais, conferindo, em geral, o mesmo grau hierárquico de lei ordinária às normas internacionais. Tal entendimento é predominante, quer na doutrina, quer nos pretórios, equiparando-se as normas internacionais à lei ordinária e submetendo ambas à Constituição Federal. Ocorre que tais questionamentos devem ser analisados cum granus salis, especialmente no que se refere à hierarquia. Senão vejamos: o constituinte originário, após o extenso rol de direitos e garantias fundamentais, constantes do art. 5º da Carta Magna, estabeleceu, nos parágrafos 1º e 2º do mesmo artigo, que:


§ 1º. As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata.


§ 2º. Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte[3].


Já, a partir da Emenda Constitucional nº. 45, de 08.12.2004:


Art. 5º.


(…)


§ 3º, – Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às Emendas Constitucionais (acrescentado pela Emenda Constitucional nº. 45, de 08.12.2004)[4].


Nos termos do art. 1°, 1 e art. 3°, a, b e c, da Convenção 155 da OIT, as proposições relativas à segurança, à higiene e ao meio ambiente de trabalho se aplicam a todas as áreas de atividade econômica, inclusive a administração pública, e o termo trabalhadores abrange todas as pessoas empregadas, incluindo os funcionários públicos. Verbis:


Artigo 1


1. A presente Convenção aplica-se a todas as áreas de atividade econômica.


Artigo 3


Para os fins da presente Convenção:


a) a expressão “áreas de atividade econômica” abrange todas as áreas em que existam trabalhadores empregados, inclusive a administração pública;


b) o termo “trabalhadores” abrange todas as pessoas empregadas, incluindo os funcionários públicos;


c) a expressão “local de trabalho” abrange todos os lugares onde os trabalhadores devem permanecer ou onde têm que comparecer, e que esteja sob o controle, direto ou indireto, do empregador;


d) o termo “regulamentos” abrange todas as disposições às quais a autoridade ou as autoridades competentes tiverem dado força de lei;


e) o termo “saúde”, com relação ao trabalho, abrange não só a ausência de afecção ou de doenças, mas também os elementos físicos e mentais que afetam a saúde e estão diretamente relacionados com a segurança e a higiene no trabalho.


Destacamos também, que nos termos do art. 11, do Protocolo Adicional à Convenção Americana sobre Direitos Humanos em Matéria de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais – “Protocolo de San Salvador” (1988), em relação ao Direito a um Meio Ambiente Sadio:


1 – Toda pessoa tem direito a viver num meio ambiente sadio e contar com serviços públicos básicos.


2 – Os Estados-partes promoverão a proteção, preservação e melhoria do meio ambiente.  


Foi por meio da Declaração de Estocolmo, em 1972,  que  o  meio ambiente sadio foi elevado ao nível de direito fundamental do ser humano. Isso se demonstra ao se verificar o que dispõe a citada Declaração, logo em seu Princípio n. 1; in verbis:


“O homem tem o direito fundamental à liberdade, à igualdade e ao desfrute de condições de vida adequada em um meio, cuja qualidade lhe permita levar uma vida digna e gozar de bem-estar, e tem a solene obrigação de proteger e melhorar esse meio para as gerações presentes e futuras”.


 
Notas:

[1] Jair Teixeira dos Reis, Auditor Fiscal do Trabalho, Prof. De Direito do Trabalho, Ciência Política e Teoria Geral do Estado, Licitações e Contratos, Direito Empresarial, Doutorando em Direito pela Universidade Lusíada de Lisboa – Portugal, autor do livro – Resumo de Direito Ambiental, publicado em 2006, pela Edito ora – Impetus, http://www.editoraimpetus.com.br e diversos livros pela Juruá editora, http://www.jurua.com.br .

[2] Denúncia é um ato unilateral através do qual um Estado manifesta sua vontade de deixar de ser parte de um tratado internacional. É feita pela forma escrita através de notificação, carta ou instrumento, dirigida ao depositário, que fará a comunicação às demais partes.

[3] Numa interpretação sistemática do texto contido nos dois parágrafos supra, da lavra do constituinte originário, repise-se, verifica-se que o § 2º consubstancia uma espécie de cláusula geral aberta de recepção dos tratados internacionais que contenham direitos e garantias fundamentais pela Constituição da República – utilizando-se a expressão de Flávia PIOVESAN (2000) -, sendo que tais disposições, por força da norma contida no § 1º, têm aplicação imediata. É do magistério da autora o seguinte excerto:  “Ao efetuar tal incorporação, a Carta está a atribuir aos direitos internacionais uma hierarquia especial e diferenciada, qual seja, a hierarquia de norma constitucional. Os direitos enunciados nos tratados de direitos humanos de que o Brasil é parte integram, portanto, o elenco dos direitos constitucionalmente consagrados.”

[4] Assim sendo, o entendimento esposado por esta moderna doutrina entendia que existem dois regimes jurídicos em matéria de instrumentos internacionais no Brasil: o regime jurídico comum, para os tratados em geral, cujo status hierárquico é igual ao das leis ordinárias, e o regime jurídico especial e próprio dos tratados em matéria de direitos humanos, cujo status hierárquico é equiparado ao de normas constitucionais, devido às disposições constantes dos parágrafos 1º e 2º do art. 5º da Constituição da República.  Isto porque, ao afirmar o referido parágrafo que têm status de emenda à Constituição apenas e tão somente os instrumentos internacionais aprovados em ambas as Casas do Legislativo Federal, por maioria de 3/5, em dois turnos – mesmos requisitos formais do processo legislativo das Emendas à Constituição -, determina, contrario sensu, que os tratados internacionais que não forem aprovados mediante tal procedimento, mesmo versando sobre direitos humanos, terão o nível hierárquico de mera lei ordinária (SGARBOSSA, 2005).


Informações Sobre o Autor

Jair Teixeira dos Reis

Professor Universitário. Auditor Fiscal do Trabalho. Autor das seguintes obras: Manual de Rescisão de Contrato de Trabalho. 4 ed. Editora LTr, 2011 e Manual Prático de Direito do Trabalho. 3 ed. Editora LTr, 2011.


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