A função social da propriedade intelectual

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Sumário: 1. Aspectos introdutórios; 2. O conflito de princípios; 3. Análise
de tratados que o Brasil é signatário; 4. Uma nova visão versus modelo em vigor;
5. Apreciação de caso; 6. Considerações finais; 7. Bibliografia.

Resumo: Trata-se de um trabalho que analisa o contexto atual da
propriedade intelectual, com ênfase direta aos programas de computador. É feita
uma análise da legislação nacional, de tratados e declarações que o Brasil é
signatário, os quais versam sobre o tema. Este trabalho tem a pretensão de
expressar uma tendência mundial relativa à necessidade de reformulação das leis
que tratam sobre o direito autoral, e apresenta alternativas ligadas
diretamente aos meios de acesso ao conhecimento por via da informática. 

Palavras-chave: Propriedade intelectual, função social da propriedade
intelectual, proteção a obras literárias e artísticas, programas de computador.

1. Aspectos introdutórios

Muito nos instigou este tema, pois a própria Constituição
Federal preceitua no seu art. 5º no inciso XXVII, que a propriedade intelectual
é garantida aos autores, mas no inciso XXIII dispõe que toda propriedade deve
ter função social. Neste ponto é necessária a reflexão quanto ao que seria a
função social de uma propriedade intelectual, haja vista que a comercialização
de obras literárias, inclusas nestas, os programas de computador e, as
artísticas, apenas buscam a difusão do conhecimento e da cultura por intermédio
do lucro. Entretanto, o direito a educação é princípio basilar de nossa Carta
Magna, exposto nos arts. 6º, 205 e 206, inciso II. Ainda assim persiste outra
incógnita! Como os desenvolvimentos intelectuais fomentados pela necessidade de
lucro para a sua perpetuação poderiam interagir com as necessidades sociais e manter
o seu caráter financeiro?    Sobre estas
questões, principalmente as relativas à função social de programas
computacionais, que decidimos traçar uma linha análoga que tenha abrangência
sobre as necessidades sociais e financeiras que beneficiem os autores, a
difusão de suas obras, o acesso ao conhecimento e, por conseguinte, as benesses
que podem gerar para a efetividade dos direitos fundamentais em nossa
sociedade.

2. O conflito de princípios

Sabemos que o direito autoral deve ser respeitado conforme
versa a Constituição Federal, mas existem limites para todos os princípios
constitucionais, quando este afete o maior de todos os princípios: o da dignidade
da pessoa humana. Um ser social que não teve acesso aos meios educacionais
nunca será um cidadão por completo, estará sempre à margem da sociedade, tendo
sua dignidade humana suprimida. Neste ponto, devemos analisar a função social
da propriedade intelectual, que mesmo protegida pelo ordenamento jurídico, deve
sim cumprir um papel social para o desenvolvimento intelectual de todos os
cidadãos. No entanto, raramente isto ocorre, principalmente quando tratamos de
educação digital.

3. Análise de tratados que o Brasil é
signatário

A Declaração dos Direitos Humanos em seu art. XXVII
preconiza que:

“1. Toda pessoa tem o direito de participar livremente da vida
cultural da comunidade, de fruir as artes e de participar do processo
científico e de seus benefícios. 2. Toda pessoa tem direito à proteção dos
interesses morais e materiais decorrentes de qualquer produção científica,
literária ou artística da qual seja autor.”

Aparentemente, pode-se acreditar que existe um conflito
nestes preceitos encontrados no mesmo artigo. Em nosso entendimento, trata-se
de uma cláusula geral, pois foi criada pelo legislador da declaração, para que
no momento de recepção pelo ordenamento jurídico de cada país, o legislador
nacional pudesse criar dispositivos para salvaguardar a propriedade intelectual
e, também, ditar uma função social a mesma. Desse modo, resta garantido um
ambiente sadio para o amplo desenvolvimento de novas produções científicas,
obras literárias e artísticas, por intermédio da concessão de lucro aos
autores. 

 No ano de 2007, o
Brasil quebrou a patente de remédios para AIDS, pois, o laboratório que a
detinha não aceitou acordo com o governo quanto a um preço justo. O que poucos
sabem está relacionado ao embasamento internacional que permitiu que o nosso
país agisse desta forma sem sofrer retaliações internacionais, pois é notório
que as grandes corporações farmacêuticas instaladas no Brasil são, via de regra,
estrangeiras.

 O Brasil, como signatário
do tratado de Trips da OMC, buscou neste instrumento, com fulcro no art. 31, abaixo
transcrito, a exceção que abriu o referido precedente:

“Outro Uso sem Autorização do
Titular

Quando a legislação de um Membro permite outro uso do objeto da
patente sem a autorização de seu titular, inclusive o uso pelo Governo ou por
terceiros autorizados pelo governo, as seguintes disposições serão respeitadas:

[…] (b) esse uso só poderá ser permitido se o usuário proposto
tiver previamente buscado obter autorização do titular, em termos e condições
comerciais razoáveis, e que esses esforços não tenham sido bem sucedidos num
prazo razoável. Essa condição pode ser dispensada por um Membro em caso de
emergência nacional ou outras circunstâncias de extrema urgência ou em casos de
uso público não-comercial. No caso de uso público não-comercial, quando o
Governo ou o contratante sabe ou tem base demonstrável para saber, sem proceder
a uma busca, que uma patente vigente é ou será usada pelo ou para o Governo, o
titular será prontamente informado; […]”

O mesmo tratado acima mencionado preconiza os direitos
autorais relativos aos programas de computadores. Sendo que em seu art. 10º,
dita:

“Programas de Computador e Compilações de Dados”.

1. Programas de computador, em código fonte ou objeto, serão
protegidos como obras literárias pela Convenção de Berna (1971).

2. As compilações de dados ou de outro material, legíveis por
máquina ou em outra forma, que em função da seleção ou da disposição de seu
conteúdo constituam criações intelectuais, deverão ser protegidas como tal.
Essa proteção, que não se estenderá aos dados ou ao material em si, se dará sem
prejuízo de qualquer direito autoral subsistente nesses dados ou material.”

Como os programas computacionais se difundiram rapidamente
apenas nas últimas décadas, visto que, o caráter pessoal e comercial da
utilização computacional não era difundido na sociedade, a Convenção de Berna
na sua revisão de 1971 (Paris), ainda não englobava a garantia de propriedade
intelectual sobre esta modalidade de produção. Por este motivo, existe a
referência da Trips da OMC, aos preceitos encontrados na Convenção de Berna, que
em seu art. 1º declara que: “Os países a que se aplica a presente Convenção constituem-se em
União para a proteção dos direitos dos autores sobre as suas obras literárias e
artísticas”.

4. Uma nova visão versus modelo em
vigor

Por outro lado, na atualidade, existe uma comunidade de
desenvolvedores de software chamada open-source,
que trabalham para criar programas similares, tendo o direito autoral
protegido, mas tangido formalmente pela necessidade de gratuidade na
disseminação de suas cópias. Como exemplo, o sistema operacional Linux e suas diversas
edições.

As empresas, em sua ampla maioria, operam seus sistemas em ambiente Windows
desenvolvido pela Microsoft Corporation. Sendo que, os fundamentos dos sistemas
operacionais aqui mencionados são infinitamente incompatíveis. Por exemplo, um
programa desenvolvido para a plataforma Microsoft não roda em ambiente Linux
e vice-versa. Este contexto, leva a uma total reserva de mercado no que tange o
conhecimento, pois diversas instituições educacionais públicas se utilizam de
sistemas gratuitos ou desembolsam milhares de reais/ano para usar as licenças dos
softwares pagos. Este ciclo vicioso é infinitamente prejudicial à sociedade,
visto que o poder público paga as licenças para ensinar aos cidadãos. E estes, pagam
as licenças para poderem operar em suas residências, ou seja, a propriedade
intelectual é beneficiada em ambos os casos. É extremamente importante que o
poder público interceda nestes casos de forma a obrigar estas empresas a doarem
às instituições de ensino cópias de seus softwares ou mesmo que abram os códigos-fontes
de seus programas para que similares sejam criados.

5. Apreciação de caso

Caso assim ocorreu recentemente na União Européia, no qual a
Microsoft foi condenada à multa de 470 milhões de euros por abuso de poder
dominante[1].
Visto que, detêm mais de 90% do mercado de sistemas operacionais, não existindo
contra partida social por parte da empresa e, ainda, não havendo o acesso as
suas linhas de comando que norteiam o sistema operativo. Sendo assim, a
Microsoft foi condenada pelo Tribunal de Primeira Instância das Comunidades
Européias, com a alegação de que:

as empresas
dominantes devem assegurar que os produtos concorrentes funcionem de forma
adequada com os seus produtos, ou seja, abertura de código-fonte para a criação
de similares
.[2]

6. Considerações finais

O ordenamento jurídico, tem o dever de nortear/interceder
nesta reserva de mercado que desequilibra a difusão do conhecimento em relação
às classes sociais e seus respectivos poderes de consumo. Se, mesmo assim, os
acordos não forem efetivados, que seja exigida a quebra dos códigos fontes
destes programas para que desenvolvedores livres criem espécies de “genéricos”,
e estes, possam a vir ser utilizados tanto pelas instituições públicas de
ensino, quanto pela parcela da sociedade de menor poder aquisitivo.

Ainda assim, existe uma imensurável gama de programas
efetivamente caros para o cidadão comum, utilizados exclusivamente em ambientes
corporativos. O Estado, quando cumpre o seu papel de formador educacional,
deveria ser eximido do pagamento de licenças para utilização destes programas,
pois, além de formar trabalhadores capacitados em operá-los, ainda exerce
função indireta de difusor da criação protegida pela legislação.

Conclusivamente, podemos entender que a propriedade
intelectual e seus benefícios materiais e morais são um direito inerente ao
desenvolvedor. Em contra partida, em face da existência dos direitos e
garantias fundamentais e dos princípios constitucionais, acreditamos que deva
ser considerado o direito à educação em nome do princípio da dignidade humana,
direito fundamental tanto quanto o direito da propriedade. Por este motivo, a
função social da propriedade não deve ser uma norma pragmática de nossa
Constituição Federal. Deve sim, ir ao encontro dos anseios sociais, garantindo
o bem-estar de todos e o desenvolvimento das potencialidades dos cidadãos.

 

Bibliografia

BRASIL. Constituição Federal do Brasil, 1988. Texto consolidado até a
Emenda Constitucional nº. 52 de 08 de março de 2006.

BRASIL. Lei Federal 9609 de 19 de Fevereiro de 1998. Dispõe sobre a
proteção da propriedade intelectual de programa de computador, sua
comercialização no País, e dá outras providências.

BRASIL. Lei federal 9610 de 19 de Fevereiro de 1998. Altera, atualiza e
consolida a legislação sobre direitos autorais e dá outras providências.

MARAQUECHE. 12 de abril de 1994. Acordo TRIPS ou acordo ADPIC. Acordo sobre aspectos dos direitos de
propriedade intelectual relacionados ao comércio.

ONU. Declaração Universal dos Direitos Humanos, 10 de dezembro de 1948.

PARIS. Convenção de Berna para a Proteção das Obras Literárias e Artísticas.
(Revisão de Paris, 1971).

PARLAMENTO EUROPEU. Acesso em 10/05/2008 às 05h02min horas.
Disponível em: http://www.europarl.europa.eu/news/public/story_page/049-10524-260-09-38-909-20070920STO10523-2007-17-09-2007/default_pt.htm


Informações Sobre o Autor

Ricardo de Oliveira Pinto

Estudante de Direito.


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