Controle de constitucionalidade difuso no brasil e alguns de seus aspectos polêmicos

Resumo: O presente artigo trata do controle de constitucionalidade das leis e atos normativos, particularmente do controle difuso no Brasil e alguns de seus aspectos polêmicos: da natureza da atribuição cometida ao Senado de promover a suspensão da lei declarada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal; e da questionada compatibilidade da ação civil pública como instrumento de controle.
Palavras-chave: Controle de constitucionalidade – Controle difuso – Supremo Tribunal Federal – Senado – Ação civil pública.
Sumário: 1 Introdução. 2 Fundamentos. 3 Inconstitucionalidade – espécies e sistemas de controle.  3.1 Inconstitucionalidade Formal e Material. 3.2 Inconstitucionalidade Total e Parcial. 3.3 Inconstitucionalidade Originária e Superveniente. 3.4 Inconstitucionalidade por Ação e por Omissão. 3.5 Controle Preventivo e Repressivo. 3.6 Controle Político e Jurisdicional. 3.7 Controle Difuso, Concentrado e Misto. 4 Sistema de controle no brasil. 5 Controle difuso. 5.1 Breves Considerações Históricas. 5.2 O Controle em si. 5.2.1 Cláusula de reserva de plenário. 5.2.2 Efeitos. 5.2.3 Recurso extraordinário. 6 Alguns aspectos polêmicos. 6.1 A Suspensão da Lei Declarada Inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal – Vinculação ou Discricionariedade do Senado?  6.2 A Questionada Compatibilidade da Ação Civil Pública como Instrumento de Controle de Constitucionalidade por Via de Exceção. 7 Conclusão. Referências Bibliográficas.
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1 Introdução

O controle de constitucionalidade das leis e atos normativos constitui um dos temas mais fascinantes da atualidade, pois diz com a liberdade dos indivíduos, com as garantias e direitos fundamentais do ser humano, representando a única forma realmente eficaz de garantia do Estado de Direito e de seus valores.

Através dele se torna possível avaliar a compatibilidade das normas infraconstitucionais com o Texto Maior, preservando e aprimorando o sistema, seja pelo afastamento das normas incompatíveis, seja pela vinculação a uma interpretação adequada, de forma a resguardar e fortalecer a legitimidade da Constituição como Lei Fundamental.

A temática é deveras abrangente, de modo que este estudo se restringe a tratar do sistema de controle de constitucionalidade da espécie difuso, versando mais precisamente sobre o sistema difuso de controle no Brasil e alguns de seus aspectos mais polêmicos: da obrigatoriedade ou não de o Senado editar resolução quando noticiado pelo Supremo Tribunal Federal de inconstitucionalidade declarada por decisão definitiva deste Tribunal; e da questionada compatibilidade da Ação Civil Pública como instrumento de controle de constitucionalidade por via de exceção.

O intuito do trabalho mais do que o de fornecer uma visão ampla do instituto é o de chamar à discussão questões importantes, apontar as nuanças da doutrina, pareceres e controvérsias, a fim de proporcionar ao leitor uma base crítica de reflexão sobre assuntos de incontestável relevância e atualidade.

Embora a abordagem dos tópicos seja bastante sucinta, as anotações são interessantes e contam com remissão de doutrina e jurisprudência de excelente conteúdo, o que permite ao leitor eventualmente interessado complementar seus estudos.

2 Fundamentos

O controle de constitucionalidade fundamenta-se na supremacia e na rigidez da Constituição. Visa primordialmente, preservar os fundamentos basilares do Estado de Direito e garantir a unidade do sistema, através do expurgo das normas infraconstitucionais que se apresentem incompatíveis com as regras e princípios constantes da Lei Maior.

A supremacia da Constituição importa no reconhecimento da Carta Constitucional como Lei Fundamental do Estado, elaborada pelo Poder Constituinte Originário, e expressão da vontade social, figurando como o texto inicial e fundante da ordem jurídica, dotado de posição hierárquica superior às demais normas componentes do ordenamento.

Pressupõe, assim, um sistema de escalonamento normativo, ou seja, a hierarquia das leis e a adoção de Constituição escrita e rígida, além da existência de ao menos um órgão incumbido de exercer esse controle.

A rigidez funciona como uma espécie de consagração da superioridade da norma constitucional na pirâmide normativa, e importa na impossibilidade de alteração do texto constitucional por norma ordinária, demandando um procedimento mais dificultoso para modificação do Texto Maior que somente se autoriza mediante processo legislativo especial e qualificado, limitado e regulado pela própria Constituição[1].

O controle de constitucionalidade assim se justifica pela necessidade de se manter a compatibilidade da legislação de nível inferior com as normas constitucionais, que funcionam como normas supra-legais a garantir que a vontade do Poder Constituinte Originário não seja alterada pela vontade do legislador ordinário, preservando os valores e princípios fundamentais adotados pelo Estado, assegurando estabilidade e segurança jurídica.

3 Inconsticionalidade – Espécies e sistemas de controle[2]

A inconstitucionalidade reside na incompatibilidade da lei ou ato normativo com as regras e princípios da Constituição. Pode se manifestar expressa ou implicitamente, conforme contrarie preceitos expressos no texto constitucional ou mesmo outros extraídos do espírito do referido diploma, considerados preceitos constitucionais implícitos. Tanto num quanto noutro caso a lei ou ato normativo argüido como inconstitucional é passível de controle.

3.1 Inconstitucionalidade Formal e Material

O vício da inconstitucionalidade pode decorrer tanto de inadequação do conteúdo da norma inferior com os preceitos da Carta Maior, quando a inconstitucionalidade é dita material, quanto em razão de inobservância de qualquer dos requisitos pertinentes ao procedimento de elaboração da norma, quando a inconstitucionalidade se dá por vício formal.

A inconstitucionalidade formal é verificada sob dois aspectos: objetivo e subjetivo. O primeiro, diz respeito ao procedimento de elaboração da lei ou ato normativo infraconstitucional, enquanto submetido às normas constitucionais de processo legislativo, bem como ao seu status na escala hierárquico-normativa. Assim, se a Constituição exige regulação de determinada matéria através de lei complementar, e diferente disso é editada uma lei ordinária, esta será inconstitucional por vício formal objetivo. Quanto ao aspecto subjetivo, este se relaciona com a competência do órgão ou agente que criou a norma ou teve a iniciativa de propô-la, que deverá observar sempre as diretrizes da Constituição, sob pena de caracterizar um vício de competência a dar ensejo à inconstitucionalidade por vício formal subjetivo.

Já a inconstitucionalidade material refere-se ao próprio conteúdo da norma quando em desacordo com os princípios e regras da Constituição.

3.2 Inconstitucionalidade Total e Parcial

A inconstitucionalidade pode ser total ou parcial. É total quando toda a lei é inconstitucional, o que ocorre geralmente em casos de irregularidade formal. É parcial, quando uma ou algumas normas nesta lei são inconstitucionais, o que se verifica mais comumente nas hipóteses de vício material ou de conteúdo. No último caso, a lei permanece válida, com exceção da norma eivada de vício.

3.3 Inconstitucionalidade Originária e Superveniente

A incompatibilidade da norma infraconstitucional com a Carta Maior ainda pode ser classificada como originária ou superveniente.

Ela é originária, quando o vício da inconstitucionalidade macula a norma desde a sua origem; e superveniente, quando essa incompatibilidade surge num momento futuro, posterior a sua entrada em vigor, como na hipótese de emenda constitucional que traga disposição que torne inconciliável a norma inferior até então compatível com a Lei Fundamental.

3.4 Inconstitucionalidade por Ação e por Omissão

Regra geral, a inconstitucionalidade se dá por ação, na produção normativa em desacordo com a Constituição, assim, nasce normalmente de um ato positivo, um agir, um fazer… Entretanto, pode se verificar também por omissão, em razão da inércia do Poder Público. Ocorre quando a Constituição determina a prática de um ato que tenha conteúdo normativo dentro de um determinado prazo, e o órgão que deveria praticar o ato se omite. É o não agir, a inércia, o comportamento negativo que deflagra a inconstitucionalidade.

A idéia de inconstitucionalidade por omissão partiu do reconhecimento de que não só a ação do Poder Público pode evidenciar incompatibilidade com a Lei Maior, como a sua inação, especialmente de ordem legislativa, uma vez que a edição de normas regulamentadoras infraconstitucionais, não raro, representa condição essencial à concretização de alguns preceitos constitucionais (normas de eficácia limitada).

Ressalte-se, contudo, que a omissão legislativa, para efeitos de omissão inconstitucional, não resulta do simples dever geral de legislar, mas, como ensina Clèmerson Merlin Clève, da existência de uma “lacuna inconstitucional”, isto é, deve representar o descumprimento de um dever constitucional de agir ou de uma exigência de legislar constitucionalmente estabelecida.[3]

3.5 Controle Preventivo e Repressivo

Com relação ao momento de ocorrência da supervisão de constitucionalidade, o controle pode se dar preventivamente sobre o projeto de lei, quando o objetivo é o de impedir a inserção no ordenamento jurídico de uma lei contrária à Constituição; ou de forma repressiva sobre ato normativo perfeito e vigente, a fim de expurgar do ordenamento jurídico a norma inconstitucional. O controle repressivo também recebe a denominação de controle sucessivo ou a posteriori.

3.6 Controle Político e Jurisdicional

Quanto ao órgão responsável pelo controle da constitucionalidade das leis, este se divide em político e jurisdicional. Considera-se controle político, o exercido por órgãos do Poder Legislativo ou do Executivo, bem como o controle efetuado por órgãos distintos dos três poderes, como o Conselho Constitucional francês.[4] Jurisdicional, por sua vez, é o controle feito por qualquer juiz ou tribunal, geralmente efetuado a posteriori, e nas hipóteses de controle concentrado, normalmente centralizado no órgão de cúpula do Poder Judiciário.

3.7 Controle Difuso, Concentrado e Misto

Relativamente ao número de órgãos, o controle de constitucionalidade compreende basicamente três tipos de sistema: o difuso, que é deferido a qualquer juiz ou tribunal, de forma que coincide sempre com o controle jurisdicional; o sistema concentrado, deferido a órgão único, por vezes distinto do Judiciário, de modo que pode consistir em um controle político; e o sistema misto.

O sistema de controle difuso, também denominado descentralizado, por via de exceção ou indireto, tem espeque no caso Madison versus Marbury (1803) julgado pelo juiz Marshall da Suprema Corte norte-americana. Por esse sistema a inconstitucionalidade é apreciada diante de casos concretos, como questão prejudicial ao julgamento do mérito, competindo a qualquer juiz ou tribunal se posicionar a respeito, podendo reconhecer a inconstitucionalidade da lei ou ato normativo argüido de vício, porém sempre incidenter tantum, pois o objeto principal da ação, nestes casos, não é a declaração de inconstitucionalidade, mas a relação jurídica instaurada entre autor e réu.

Já o sistema de controle concentrado, abstrato ou por via de ação, é mais recente, surge com a Constituição Austríaca de 1920, por idealização de Hans Kelsen. Trata-se de método de controle centralizado, presidido por órgão único, que nem sempre é componente do Poder Judiciário. Tal sistema se caracteriza pela análise da lei em tese, abstratamente considerada, onde a discussão acerca da questão constitucional constitui o próprio objeto da ação. Esta espécie de controle inicialmente adotada na Áustria hoje constitui o sistema de preferência dos países europeus, tendo sido adotado com pequenas variações por países como Alemanha, Itália e Espanha.[5]

Quanto ao sistema misto, é aquele em que algumas espécies normativas são submetidas a um controle político, outras a um controle jurisdicional. Também é considerado misto o sistema no qual se admitem ambas as modalidades de controle – difuso e concentrado.

4 Sistema de controle no brasil

No Brasil o controle de constitucionalidade é repressivo e jurisdicional, não obstante também haja previsão do controle preventivo jurisdicional, na hipótese de argüição de vício formal no processo legislativo, por iniciativa parlamentar[6]; bem como do controle preventivo político, exercido tanto pelo Legislativo através de suas comissões (Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado e Comissão de Constituição, Justiça e Redação da Câmara dos Deputados), como do Executivo, por ocasião da sanção ou veto presidencial.

O sistema de controle é misto, compreendendo: o controle difuso, mediante a discussão da inconstitucionalidade como questão incidental em qualquer ação, e no caso de omissão legislativa, por intermédio de mandado de injunção[7]; e o controle concentrado, via ação de inconstitucionalidade direta genérica, por omissão e interventiva (quando federal), ação declaratória de constitucionalidade e argüição de descumprimento de preceito fundamental.

No controle difuso a iniciativa cabe a qualquer interessado, e a competência a qualquer juízo. No controle concentrado a legitimação é mais restrita, previamente determinada pelo texto constitucional, e a competência originária é exclusiva do Supremo Tribunal Federal.

Em razão da ampliação do rol de legitimados à propositura da Ação Direta de Inconstitucionalidade pela Constituição Federal de 1988, e da criação da Ação Declaratória de Constitucionalidade pela EC 03/93, alguns doutrinadores afirmam a proeminência do sistema concentrado de controle.

5. Controle Difuso

5.1 Breves Considerações Históricas

A origem histórica do controle de constitucionalidade difuso coincide com a origem histórica da própria concepção judiciária do controle de constitucionalidade das leis.[8]

Surgiu nos Estados Unidos da América em 1803 com a famosa decisão da Suprema Corte norte-americana sobre o caso Madison vs. Marbury[9], na qual o Tribunal se manifestou com absoluta clareza e precisão sobre a questão da hierarquia das leis e da supremacia da constituição, asseverando caber ao Judiciário corrigir eventual incompatibilidade das normas inferiores com a Lei Maior, invalidando-as, argumentando que ainda que aquela Corte não detivesse características legislativas, cabia-lhe certamente zelar pela Lei Fundamental do País, afinal, não se poderia admitir que a vontade do constituinte originário fosse suprimida pela vontade do legislador ordinário.

Forte na superioridade das normas constitucionais, o Chief Justice Marshall, relator na ocasião, afirmava que se o Congresso e o Presidente, aos quais competia a tarefa de edição e validação das normas, não haviam atentado para a incompatibilidade da norma com a Constituição, caberia então ao Poder Judiciário, na análise de cada caso concreto que lhes fosse submetido, refutar a norma contrária à Constituição, pois se sobrepunha ao confronto temporal o confronto hierárquico, e em face da superioridade do diploma constitucional, não haveria outra solução que não decidir-se pela invalidação da norma inferior ante a inconstitucionalidade verificada.

Nascia assim, o controle de constitucionalidade das leis e atos normativos, originalmente, como se vê, na modalidade difusa, conquanto admitia a apreciação acerca da compatibilidade das normas ordinárias em face da Constituição por qualquer juiz ou tribunal.[10]

O controle difuso foi também o primeiro método de controle de constitucionalidade adotado no Brasil e consta do ordenamento nacional desde a Constituição de 1891, embora tenha sido instalado de forma efetiva somente em 1894, por conta da Lei federal n° 221, que previa a competência ampla de juízes e tribunais para apreciarem a validade das leis e atos normativos perante os casos concretos, permitindo que deixassem de aplicá-las quando as entendessem contrárias à Constituição.

Com algumas implementações, o controle difuso permaneceu em todas as nossas constituições subseqüentes como sistema exclusivo, pois somente a partir de 1965 o sistema passou a ser qualificado como misto, devido à inclusão do controle do tipo concentrado. [11]

5.2 O Controle em si

Como já referido, o controle difuso se caracteriza pela permissão a qualquer juiz ou tribunal de mediante um caso concreto, manifestar-se acerca de eventual incompatibilidade de lei ou ato normativo com a Constituição Federal. A inconstitucionalidade nestes casos é decidida de forma incidental, como questão prejudicial, indispensável ao julgamento do mérito.

Destarte, pela via de exceção, a inconstitucionalidade geralmente aparece como fundamento do pedido, questão subjacente da qual depende o deslinde do caso, subsumido de uma forma ou de outra à prévia análise da compatibilidade ou não de dispositivo infraconstitucional pretensamente contrário a Lei Maior.[12]

Em razão da análise da constitucionalidade ser procedida incidenter tantun e ter por objeto uma situação jurídica concreta, diferentemente do que ocorre no controle concentrado onde a decisão do tribunal produz efeitos erga omnes e vinculantes, na via difusa esses efeitos só se operam “inter partes”, de modo que a lei ou ato permanecem válidos e obrigatórios em relação a terceiros.

Assim, a finalidade do controle difuso, a priori, não é a de retirar a norma eivada de vício do ordenamento jurídico, mas antes disso, a de possibilitar a defesa de direitos subjetivos prejudicados em face de normativo inconstitucional.

Pelo sistema brasileiro, a via de defesa pode ser utilizada tanto por meio de ações ordinárias, quanto por intermédio de ações constitucionais, como o hábeas corpus e o mandado de segurança[13]. O controle pode ser exercido por qualquer juiz ou tribunal, e pelo Supremo Tribunal Federal via recurso extraordinário, hipótese em que há a possibilidade de ampliação dos efeitos da decisão.

5.2.1 Cláusula de reserva de plenário

Com o fito de garantir maior segurança jurídica e estabilidade às questões decididas em sede de controle de constitucionalidade, desde a Carta de 1934, exige-se quorum especial para a declaração de inconstitucionalidade realizada pelos tribunais.

Na Constituição de 1988 essa regra vem prevista no artigo 97, in verbis: “Somente pelo voto da maioria absoluta de seus membros ou dos membros do respectivo órgão especial, poderão os tribunais declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público”.

Trata-se da chamada “cláusula de reserva de plenário”[14], que uma vez inobservada implica em nulidade absoluta da decisão judicial colegiada. [15]

Contudo deve ser observado, que ainda que num primeiro momento a regra do artigo 97 possa dar a entender que a declaração de inconstitucionalidade é de competência exclusiva dos tribunais, não é esta a correta exegese do dispositivo. Como bem adverte Ronaldo Poletti[16], a exigência de quorum especial representa condição de eficácia jurídica da declaração, portanto, constitui regra instrumental, não regra de competência, de modo que em nada influi na competência do juiz singular, que continua normalmente investido do poder de reconhecer (logicamente em via incidental) a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo submetido a sua apreciação.

Neste sentido, a doutrina e a jurisprudência são pacíficas, reconhecendo a possibilidade de exame da inconstitucionalidade na via difusa por todos os componentes do Judiciário, seja juiz monocrático ou tribunal.

5.2.2 Efeitos

Os efeitos da decisão, quando a inconstitucionalidade é declarada em via difusa, são ex tunc, ou seja, retroativos, e inter partes, visto que só aproveitam as partes entre as quais é dada, não prejudicando nem beneficiando terceiros. Para estes, a lei ou ato normativo continua valendo, com força vinculante e obrigatória.

Todavia, se a causa chegar até o Supremo Tribunal Federal por meio de recurso extraordinário, e este declarar a inconstitucionalidade de determinada lei ou ato normativo por maioria absoluta de seus membros, essa decisão poderá ter seus efeitos ampliados, conforme previsão do art. 52, inciso X, da Constituição Federal.[17] Nestes casos, o Pretório Excelso após o trânsito em julgado da decisão, deve oficiar o Senado Federal para que suspenda a execução da lei ou ato normativo declarado inconstitucional por decisão definitiva daquela Corte. A suspensão é feita mediante resolução, a partir da qual os efeitos se operam erga omnes e ex nunc, valendo para todos os que não participaram do processo, mas somente a partir da publicação.[18]

5.2.3 Recurso extraordinário

O recurso extraordinário é o instrumento de controle de constitucionalidade que propicia ao Supremo Tribunal Federal manifestar-se sobre questão constitucional incidentalmente discutida em instância inferior.

As hipóteses de cabimento do recurso extraordinário estão elencadas no artigo 102, inciso III, da Constituição Federal, in verbis:

Art. 102 – Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe: […]

III – julgar, mediante recurso extraordinário, as causas decididas em única ou última instância, quando a decisão recorrida:

a) contrariar dispositivo desta Constituição;

b) declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal;

c) julgar válida lei ou ato de governo local contestado em face desta Constituição.

Sendo o recurso admitido relativamente às causas decididas em única ou última instância, tem cabimento tanto contra decisões definitivas, como terminativas e interlocutórias, desde que observados os requisitos constitucionais. Requer o prévio esgotamento das vias recursais ordinárias, contudo a decisão recorrida não precisa ser necessariamente proveniente de órgão colegiado, tendo cabimento o seja também por juiz singular (na hipótese de inexistir recurso ordinário).[19]

Embora pressuponha a discussão de um caso concreto, o recurso extraordinário não se presta ao mero reexame da matéria já decidida ou a corrigir possível injustiça da decisão, pois tem por objeto tão somente o aspecto jurídico-constitucional da causa. Trata-se, portanto, de recurso de fundamentação vinculada, conquanto a via recursal extraordinária tem por finalidade precípua tutelar a própria Constituição.

Assim, não basta o simples fato da sucumbência, sendo necessário que a parte sofra gravame em virtude de uma decisão que lhe seja adversa em razão de uma “questão constitucional”, sendo esta o fundamento exclusivo do julgado.

Com efeito, pressupõe ainda o prequestionamento da matéria, sem o qual o recurso extraordinário não é admitido. Conforme entendimento sumulado do STF (súmula 282), é insuficiente a questão tenha sido suscitada e debatida em causa, sobre ela é necessário ter havido julgamento expresso por ocasião da decisão recorrida[20].

Importa também ressaltar que o recurso extraordinário é desprovido de efeito suspensivo, de modo que não impede que a decisão impugnada produza efeitos desde logo, motivo pelo qual regra geral não comporta concessão de liminares, cujo deferimento só se dá em caráter excepcional e requer além dos requisitos comuns a toda cautelar – fumus boni iuris e periculum in mora, que o RE tenha sido efetivamente recebido por juízo de admissibilidade positivo no tribunal a quo.[21]

Quanto aos demais aspectos procedimentais do recurso extraordinário, estão previstos no Código de Processo Civil, artigo 541 e seguintes.

6 Alguns aspectos polêmicos

6.1  A Suspensão da Lei Declarada Inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal – Vinculação ou Discricionariedade do Senado?

Como visto, para que a declaração de inconstitucionalidade proferida pelo Supremo na via de exceção adquira uma eficácia abrangente, faz-se necessário a edição de resolução pelo Senado suspendendo a executividade da norma. É o que dispõe a Constituição Federal, em seu artigo 52, inciso X, verbis:

Art. 52. Compete privativamente ao Senado Federal: […]

X – suspender a execução, no todo ou em parte, de lei declarada inconstitucional por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal;

Discute-se, entretanto, a natureza dessa atribuição cometida ao Senado. Seria ela vinculada ou discricionária? Poderia o Senado Federal não determinar a suspensão do ato declarado inconstitucional por critérios de conveniência ou oportunidade?

A doutrina dissente a respeito.

Aqueles que entendem a atividade senatorial como de natureza discricionária[22], sustentam basicamente que a única interpretação possível do dispositivo em apreço seria no sentido de conferir ao Senado discricionariedade para decidir sobre a conveniência em suspender ou não a executoriedade da lei declarada inconstitucional pelo STF, pois de outra forma, seria conceber o Senado como um mero “chancelador” das decisões do Supremo. Já aqueles que defendem a natureza vinculada[23] dessa atribuição afirmam competir ao Senado apenas a verificação dos aspectos formais da decisão daquela Corte: quorum, Plenário, etc., que uma vez observados, devem implicar, necessariamente, na suspensão da lei eivada de vício.

Sem embargo das respeitáveis vozes em contrário, o argumento da primeira corrente se revela bastante frágil, conquanto embasado, ao que tudo indica, em mera vaidade do Legislativo. Em verdade, o ângulo de visão é que é equivocado, pois não se trata de minimizar a importância do Senado, mas apenas de reconhecer competências diferenciadas: ao Supremo cabe dar a última palavra sobre a inconstitucionalidade da lei ou ato normativo contrário à Constituição; e ao Senado verificar os aspectos formais da decisão e conferir publicidade ao ato – e não há nisso ofensa ou submissão alguma.

A função precípua do Supremo consiste exatamente em proceder à guarda da Constituição, e a Lei Maior é muito clara neste sentido, de modo que passar a decisão final acerca da inconstitucionalidade da norma para outro órgão implicaria em esvaziar-lhe a competência e a finalidade. De mais a mais, dar discricionariedade ao Senado para que suspenda ou não a lei inconstitucional seria possibilitar uma revisão do julgamento do Supremo, como se houvesse ainda uma superior instância, aí sim, com evidente afrontamento ao princípio da separação de poderes.

Por outro lado, deve ser consignado que a previsão de ampliação dos efeitos da decisão do Supremo pelo Senado foi originalmente elaborada quando o controle de constitucionalidade no país era feito, exclusivamente, pela modalidade difusa, com o intuito de evitar decisões contraditórias e possibilitar a eficácia erga omnes da decisão. Na verdade foi uma forma de complementar o sistema, tendo em vista que diferente dos Estados Unidos, nosso sistema não prevê a mesma força aos precedentes jurisprudenciais. Em razão disso, e tendo em vista a ulterior inclusão do método concentrado de controle, onde a decisão do STF tem efeitos erga omnes, seria plenamente defensável cogitar-se de uma futura alteração do texto constitucional no sentido de conferir esses mesmos efeitos ao julgado proferido em via difusa por aquela Corte, independentemente de ratificação do Senado.[24]

No Brasil, com exceção dos efeitos da decisão, o controle difuso quando exercido pelo Supremo e o controle concentrado, diferenciam-se em última análise, somente quanto à iniciativa e legitimação. Enquanto o primeiro é confiado a qualquer cidadão, o segundo apenas aos entes elencados no artigo 103 da Constituição. Isto porque o recurso extraordinário em sua razão de ser intrínseca, não se presta a proporcionar o acesso a uma terceira instância, mas a levar a conhecimento do Supremo provável inconstitucionalidade de lei ou ato normativo. A competência do STF para apreciação do recurso extraordinário se justifica assim, pela sua posição de guardião máximo da Constituição, não de mero revisor de julgados, conquanto tem em mira resguardar o próprio direito objetivo.

Com efeito, ainda que na via difusa a questão constitucional seja inicialmente decidida incidenter tantum, quando ela chega ao Supremo é apreciada mediante ampla análise valorativa, pois mais do que o caso concreto, o Tribunal está comprometido com a unidade jurídica do ordenamento e, sobretudo, com a Constituição Federal. Portanto, o exame da constitucionalidade seja por ocasião de controle in concreto seja por ocasião de controle abstrato, desde que procedida pelo Supremo, envolve uma análise ampla da matéria constitucional, não havendo motivos para que a decisão que propugne pela inconstitucionalidade de determinada lei produza efeitos diferenciados num e noutro caso.

De qualquer forma, em face do disposto no art. 52, inciso X, da CF/88, por enquanto os efeitos da declaração de inconstitucionalidade pronunciada em via difusa pelo STF, continuam dependendo de confirmação do Senado para adquirirem eficácia erga omnes e vinculante. Entretanto, tal atribuição não tem natureza discricionária, mas vinculativa, de modo que compete ao Senado avaliar apenas os aspectos formais da decisão do Supremo, mas não a conveniência da suspensão. Esse posicionamento certamente reflete a melhor interpretação do dispositivo.

Cumpre, todavia, ressaltar, que o STF[25] tem se posicionado em sentido diverso, tendo entendido que o Senado não está vinculado à sua decisão, disso resultando a não obrigatoriedade em sustar a lei ou o ato normativo conflitante. Nessa mesma linha tem se posicionado o Senado Federal.[26]

6.2  A Questionada Compatibilidade da Ação Civil Pública como Instrumento de Controle de Constitucionalidade por Via de Exceção

Outra questão bastante debatida pela doutrina, mas por sua vez ainda não pacificada também pelos tribunais, diz respeito à possível inadequação da Ação Civil Pública como instrumento de controle de constitucionalidade realizado por via de exceção.

A controvérsia tem por fundamento principal a eficácia das decisões em sede de Ação Civil Pública, que por tutelar direitos de natureza diferenciada[27] (titularidade plúrima, pulverizada, e objeto em regra indivisível), comporta efeitos abrangentes, fazendo coisa julgada ultra partes e erga omnes.[28]

Como já referido anteriormente, em regra a decisão na qual se reconhece a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo pela via difusa, opera efeitos somente inter partes, e apenas excepcionalmente, quando a questão chega ao STF é que se torna possível ampliar seus efeitos, caso em que mesmo a decisão definitiva do Supremo não é por si suficiente, sendo ainda necessária a ratificação do Senado, para a final, e a partir da publicação de resolução suspendendo a executividade da norma, adquirir efeitos erga omnes.

Assim, a eficácia da declaração de inconstitucionalidade proferida em Ação Civil Pública, segundo muitos argumentam, teria uma eficácia mais ampla do que a própria decisão do Supremo no controle de constitucionalidade difuso, o que tornaria o instrumento inadequado e conflitante, na medida em que implicaria reconhecer ao julgado de instância ordinária, efeitos que a decisão do STF normalmente só alcança através do controle abstrato ou concentrado, com evidente usurpação de competência da Suprema Corte.[29]

Neste sentido, as colocações de Gilmar Ferreira Mendes:

[…] tem-se de admitir a inidoneidade completa da ação civil pública como instrumento de controle de constitucionalidade, seja porque ela acabaria por instaurar um controle direto e abstrato no plano da jurisdição de primeiro grau, seja porque a decisão haveria de ter, necessariamente, eficácia transcendente das partes formais.[30]

De fato, é inegável que a eficácia da decisão proferida em ACP não se refere precisamente às partes formais do processo, mas às partes substanciais da relação jurídica, visto que os titulares do direito discutido em juízo, nestes casos, geralmente não figuram expressamente do pólo ativo da demanda, senão por representação de um dos entes legitimados à propositura das ações coletivas. Por essa razão, obviamente, os efeitos da decisão devem transcender às partes formais do processo, mas não por isso tais efeitos se confundem com os efeitos produzidos por ocasião do controle abstrato de normas.

No controle abstrato, a decisão declaratória de inconstitucionalidade produz coisa julgada com efeitos erga omnes e vinculantes, valendo para todos indistintamente, de modo que a lei ou ato normativo em desacordo com a Lei Maior não pode mais ser aplicada em nenhum caso. Já o reconhecimento da inconstitucionalidade discutida incidentalmente em ACP, gera efeitos erga omnes, mas apenas com relação àqueles subsumidos ao caso concreto, ou seja, vale para todos, mas todos os titulares do direito reconhecido diante da apreciação daquele caso concreto, e não contra todos indiscriminadamente. Como se pode verificar, a expressão “erga omnes” tem significação distinta em cada uma das hipóteses.

Com efeito, nada impede que a mesma lei considerada inconstitucional em face de uma determinada situação jurídica debatida em sede de ACP receba interpretação diversa perante um outro caso concreto. Assim, mais do que diferenças técnico-jurídicas entre a ACP e o controle concentrado, ao contrário do que afirmam alguns doutrinadores, há também dessemelhanças quanto aos efeitos práticos produzidos pelos respectivos institutos.

Também deve ser considerado que na Ação Civil Pública, a inconstitucionalidade é invocada como fundamento da demanda, como causa de pedir, de modo que a questão constitucional não constitui o objeto principal da ação, senão uma prejudicial de mérito, e como tal, não faz coisa julgada, como prevê expressamente a regra do artigo 469, inciso III do Código de Processo Civil[31][32].

De qualquer forma, tendo em vista que a decisão do Supremo em qualquer hipótese prevalece, não se vislumbra nenhum prejuízo, incompatibilidade, ou usurpação, especialmente porque as demandas coletivas em geral têm por objeto interesses de grande monta, ao menos se consideradas em aspectos coletivos, de forma que quando discutem incidentalmente questão constitucional normalmente as partes acabam esgotando as vias recursais ordinárias chegando até o Supremo por recurso extraordinário, o que possibilita a revisão da matéria constitucional pelo órgão de cúpula do Judiciário.[33]

Ademais, em se considerando que a ACP tem por finalidade a tutela de direitos coletivos e difusos, muitos deles somente exercitáveis por intermédio de ações coletivas, não seria demais afirmar que a não admissão do controle incidental nessas espécies de ação implicaria em violação do princípio do direito de ação, com injustificada negativa de acesso à justiça.

Assim, por qualquer ângulo que se olhe a questão, a utilização da Ação Civil Pública como instrumento de controle difuso de constitucionalidade é legítima, e como tal, deve ser preservada.

7 Conclusão

Como se pôde verificar, o controle de constitucionalidade das leis e atos normativos comporta uma gama variada de classificações tendo em vista os aspectos enfocados. No Brasil, ele é prevalentemente repressivo e jurisdicional, com adoção do sistema misto de controle: difuso e concentrado, com uma certa tendência à centralização, como apontam alguns doutrinadores.

Mas em realidade, essa tendência centralizadora, decorre mais de alguma construção doutrinária e jurisprudencial em torno da matéria, do que reflete propriamente uma vontade do legislador constituinte. A Constituição em si não revela qualquer preferência por um ou outro método de controle.

Como visto, o controle difuso permite a qualquer cidadão discutir a inconstitucionalidade de lei de forma incidental, ao mesmo tempo em que possibilita a apreciação da questão seja feita por qualquer juiz ou tribunal, hipótese bem mais consentânea com a idéia de democracia e participação popular, do que se poderia pretender no controle concentrado, cuja iniciativa fica circunscrita em grande parte a autoridades políticas.

Sendo o Brasil um Estado Democrático de Direito a idéia de controle difuso em tudo com ele se afina.

O que de fato enfraquece a via difusa, reafirma-se, não é a Constituição, senão a equivocada interpretação de alguns doutrinadores e operadores do direito, sobre questões como a do artigo 52, inciso X, da CF/88, por exemplo, que como se procurou demonstrar, trata de dispositivo criado para viabilizar a ampliação dos efeitos da decisão do Supremo, cuja finalidade está em aprimorar o sistema difuso e jamais em permitir a revisão do mérito pelo Senado, de modo que se refere a atribuição vinculada, não discricionária.

Por outro lado, há que se distinguir quando a inconstitucionalidade é reconhecida em instância ordinária e quando ela é reconhecida por decisão definitiva do Supremo. No primeiro caso, o controle se destina basicamente a possibilitar a defesa de direitos subjetivos prejudicados em virtude de inconstitucionalidade, no segundo, mais do que isso – visa tutelar a própria Constituição. O recurso extraordinário, conforme esposado, não se presta a viabilizar o acesso a uma terceira instância, tanto que para que venha a ser conhecido pressupõe seja ultrapassado rigoroso juízo de admissibilidade, além do que, tem por objeto apenas rediscutir a matéria constitucional e nunca a matéria fática. Como se percebe, o foco está em propiciar a guarda da Constituição.

Assim, a partir do momento em que a questão chega ao STF, esta passa a ser examinada mediante análise ampla, vez que o Supremo a realiza na qualidade de guardião máximo da Constituição, o que justifica os efeitos do julgado se operem erga omnes, competindo ao Senado, observados os requisitos formais, dar publicidade à decisão. Ademais, a inclusão do controle abstrato com previsão de eficácia erga omnes da decisão do Supremo, indica ser absolutamente plausível a proposta de, em uma reforma futura, independente de ratificação do Senado, empregarem-se esses mesmos efeitos à decisão prolatada pela Suprema Corte na via difusa, sem qualquer prejuízo[34].

No tocante a aventada inadequação da Ação Civil Pública como instrumento de controle difuso de constitucionalidade, as críticas também não procedem. Não se identificam os efeitos produzidos por ocasião da ADIN em controle concentrado, com os efeitos da questão decidida incidentalmente em ACP, pois como restou elucidado, a eficácia erga omnes tem significação bem mais restrita nesse último caso, bem como, sendo a questão decidida incidenter tantum, não faz coisa julgada. Sendo assim, eventual objeção quanto à apreciação de inconstitucionalidade argüida como prejudicial de mérito em ACP deve ser afastada, pois em flagrante descompasso com o princípio do acesso à justiça.

Considerando a argumentação deduzida quanto alguns desses aspectos mais polêmicos do controle difuso, facilmente se verifica que a assinalada “tendência centralizadora” não é uma questão de Constituição, mas uma questão de concepção, data vênia, equivocada.

Contudo, não obstante essas controvérsias, é certo que o método difuso de controle constitui um caminho de inquestionável importância, enquanto o mais apto a resguardar as liberdades e direitos individuais. Também é a modalidade que melhor se compatibiliza com o paradigma do Estado Democrático de Direito, na medida em que representa um sistema mais participativo, aberto e democrático.

De mais a mais, se o controle de constitucionalidade das leis e atos normativos tem por finalidade precípua preservar os valores consagrados pela Constituição, nada mais adequado do que atribuir aos cidadãos seus jurisdicionados essa iniciativa, o que só vem a fortalecer a legitimidade da Lei Maior como Lei Fundamental e suprema do país.

Referências Bibliográficas
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GRINOVER, Ada Pellegrini.  Código Brasileiro de Defesa do Consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto, Ada Pellegrini Grinover … [et al.]  5.ed.  Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1998.
______.  O Processo em sua unidade II.  Rio de Janeiro: Forense, 1984.
LEONEL, Ricardo de Barros.  Manual do processo coletivo.  São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002.
MENDES, Gilmar Ferreira.  Direitos fundamentais e controle de constitucionalidade: estudos de direito constitucional.  São Paulo: IBDC e Celso Bastos Editor, 1999.
MORAES, Alexandre de.  Direito constitucional.  13.ed.  São Paulo: Atlas, 2003.
______.  Jurisdição constitucional e tribunais constitucionais.  São Paulo: Atlas, 2000.
NERY JR, Nelson; NERY Rosa Maria de Andrade.  Código de processo civil comentado e legislação processual civil extravagante em vigor.  6.ed., rev. e atual.  São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2002.
PALU, Oswaldo Luiz.  Controle de constitucionalidade: conceitos, sistemas e efeitos.  2.ed.  São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001.
POLETTI, Ronaldo Rebello de Britto. Controle de constitucionalidade das leis.  2.ed.  Rio de Janeiro: Forense, 2001.
SÁ, José Adonis Callou de Araújo.  Ação civil pública e controle de constitucionalidade.  Belo Horizonte: Del Rey, 2002.
VELOSO, Zeno.  Controle jurisdicional de constitucionalidade. Belém: Cejup, 1999.
Notas:
[1] A respeito, ensina Paulo Bonavides (Curso de direito constitucional.  13.ed.  São Paulo: Malheiros, 2003, p. 296): “O sistema das Constituições rígidas assenta numa distinção primacial entre poder constituinte e poderes constituídos. Disso resulta a superioridade da lei constitucional, obra do poder constituinte, sobre a lei ordinária, simples ato do poder constituído, por um poder inferior, de competência limitada pela Constituição mesma”.
[2] Sobre o assunto, ver especialmente: PALU, Oswaldo Luiz. Controle de constitucionalidade: conceitos, sistemas e efeitos. 2.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. Em abordagem mais sintética, confira: MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. 13.ed. São Paulo: Atlas, 2003, p. 577-606.
[3] A fiscalização abstrata de constitucionalidade no direito brasileiro. 2.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 322, passim.
[4] Como observa Paulo Bonavides (Op. cit., p. 299-300), o primeiro país a adotar essa espécie de controle foi a França, por obra do jurista Sieyès. A opção por uma Corte Constitucional se justifica pela própria história política da França de desmandos e arbitrariedades do Judiciário francês na época do ancien régime.
[5] POLETTI, Ronaldo Rebello de Britto. Controle de constitucionalidade das leis.  2.ed. Rio de Janeiro: Forense, 2001, p. 62-66.
[6] O controle preventivo por iniciativa parlamentar fundamenta-se no princípio do devido processo legislativo, do qual decorre aos parlamentares o direito de participarem de um processo legislativo consentâneo com as normas constitucionais. (MORAES, Alexandre de. Jurisdição constitucional e tribunais constitucionais. São Paulo: Atlas, 2000, p. 224-226).
[7] O mandado de injunção praticamente perdeu a sua finalidade, devido a interpretação que lhe conferiu o STF, desviando-o do objetivo para o qual foi originalmente criado. Para maiores detalhes sobre a problemática do mandado de injunção, confira: POLLETI, Ronaldo Rebello de Britto. Op. cit.,, p. 219-231.
[8] Isto porque embora a idéia de controle de constitucionalidade já existisse, seus contornos e características só se fizeram mais claros e vívidos a partir da construção judiciária norte-americana no julgamento do caso Willian Marbury e outros vs. James Madison, em 1803. A respeito, as considerações de Oswaldo Luiz Palu (Op. cit., p.113-114): “Os precedentes do controle de constitucionalidade das leis existiam difusos, mesmo na História da Inglaterra ou antes; entretanto, a afirmação dessa doutrina deveu-se, sem dúvida, ao direito norte-americano”.
[9] Sobre o case Willian Marbury e outros vs. James Madison, consultar: Oswaldo Luiz Palu, op.cit., p.113-119; Paulo Bonavides, op. cit., p. 305-307 e 311-317 ; e Ronaldo Rebello de Britto Poletti, op. cit., p. 23-50.
[10] Inobstante o aparente caráter restrito do sistema difuso por alcançar apenas o caso concreto, não se pode olvidar a força das decisões como precedentes no direito norte-americano, especialmente quando emanadas pela Suprema Corte, em razão dos stare decisis ou valor dos precedentes, que embora não tenha caráter vinculativo, valoriza extremamente os precedentes jurisprudenciais, até mesmo pela regra natural e lógica de prevalência da decisão da Corte Superior em final instância.
[11] Alguns doutrinadores apontam a introdução do método concentrado/abstrato de controle desde a CF 1934, por ocasião da reclamação interventiva. Contudo, a representação instituída pela Emenda Constitucional 16/65 e a representação interventiva não se confundem. Enquanto aquela é mecanismo apto a garantir a observância de todos os dispositivos da Constituição, esta tem por objetivo solucionar conflito entre a União e os Estados apenas quando se tratar de violação aos princípios constitucionais sensíveis. Daí poder-se dizer que, na realidade, o seu escopo é resolver determinado conflito normativo, sendo, portanto, “uma fiscalização concreta de constitucionalidade, embora realizada em sede de ação direta”. (CLÈVE, Clèmerson Merlin. Op. cit., p. 89).
[12] Apesar da nomenclatura “via de exceção”, o controle pode ser feito tanto por exceção como por ação. Como bem pondera Ada Pellegrini Grinover (O Processo em sua Unidade II. Rio de Janeiro: Forense, 1984, p. 154), “exceção” indica a defesa oposta pelo réu e nem sempre é ele quem levanta a questão da inconstitucionalidade, de modo que a expressão é imprópria e inadequada para se denominar o controle difuso. Nestes termos, se posiciona a autora: “Prefiro, então, ao invés de contrapor ação direta de declaração de inconstitucionalidade à exceção, dizer que numa temos propriamente ação, enquanto no sistema difuso temos uma questão prejudicial, uma questão prévia, que diz respeito a outra relação jurídica, ou seja à adequação do ato normativo à Constituição, questão prévia que o juiz deverá apreciar antes da questão principal, exatamente para verificar se a alegada inconstitucionalidade existe, ou não”.
[13] MORAES, Alexandre de. Direito constitucional… cit., p. 589.
[14] Vale ressaltar que essa regra se aplica a todos os tribunais na via difusa e ao Supremo Tribunal Federal, inclusive, no controle concentrado. (Idem, p. 590).
[15] Porém, o Supremo Tribunal Federal tem entendido, que se a inconstitucionalidade da lei já houver sido declarada pelo guardião da Constituição, não há necessidade de se submeter o feito ao órgão especial ou plenário, em homenagem ao princípio da economia e celeridade processuais. (Idem, ibidem.)
[16] POLETTI, Ronaldo Rebello de Britto. Op. cit., p. 196-198.
[17] Tal disposição já consta de nosso ordenamento desde 1934, sendo considerada uma das grandes inovações da Carta Constitucional da época.
[18] Essa eficácia ex nunc, no entanto, é questionada por alguns autores. A questão é tratada por Ronaldo Rebello de Britto Polleti, op. cit., p. 118-129;  e também por Luiz Alberto David Araújo e Vidal Serrano Nunes Jr., Curso de direito constitucional. 7.ed.  São Paulo: Saraiva, 2003, p. 29-31.
[19] MORAES, Alexandre de. Jurisdição constitucional… cit., p. 253.
[20] Por conta disso, em sendo omisso o acórdão, a parte interessada deve interpor embargos de declaração, a fim de forçar o tribunal a se manifestar sobre a questão prequestionada.
[21] NERY JR, Nelson; NERY Rosa Maria de Andrade.  Código de processo civil comentado e legislação processual civil extravagante em vigor.  6.ed., rev. e atual.  São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2002, p. 914-915.
[22] Neste sentido, entre outros: Alexandre de Moraes, Direito constitucional… cit., p. 591-592, e Jurisdição constitucional… cit., p. 254 -255; Luiz Alberto David Araújo e Vidal Serrano Nunes Jr., op. cit., p. 29-32; Oswaldo Luiz Palu, op. cit., p. 145 e seguintes; e Paulo Brossard (o posicionamento do autor consta das diversas obras citadas).
[23] Entendendo tratar-se de atribuição de natureza vinculada, entre outros: Celso Bastos e Alfredo Buzaid entendendo competir ao Senado a avaliação dos aspectos formais da decisão do Supremo, e Lúcio Bittencourt, este último cujo entendimento é até bastante radical, pois entende competir ao Senado tão somente dar publicidade a essa decisão, e não mais que isso (o posicionamento dos autores consta da bibliografia supracitada).
[24] Compartilha desse entendimento Zeno Veloso (Controle jurisdicional de constitucionalidade. Belém: Cejup, 1999, p. 33) ao ponderar que ainda que o instituto da suspensão tenha sido bastante útil naquele contexto (1934), por permitir que a decisão do Poder Judiciário adquirisse eficácia erga omnes, inexiste razão para se manter a norma do artigo 52, X, CF/88 na atualidade, resquícios de uma época em que somente havia o controle incidental. Assim, afirma: “[…] uma reforma é necessária, para que se estabeleça, de uma vez por todas, que as decisões do Supremo Tribunal Federal, no controle de constitucionalidade, por qualquer de suas vias, sejam finais e definitivas, tenham eficácia erga omnes e efeito vinculante” (Idem, p.63).
[25] Mandado de Injunção n.º 460-9-RJ, Rel. Min. Celso de Mello, Diário da Justiça, 16 de junho de 1994, p. 15.509; e, Mandado de Segurança n.º 7.248-SP, Rel. Min. Victor Nunes Leal.
[26] Pareceres 154/71, 261/71 e 282/71, publicados na Revista de Informação Legislativa n.º 48/265 – ano 12 – 1975.
[27] São os chamados direitos metaindividuais, que são interesses e direitos que transcendem ao indivíduo isoladamente considerado, de modo que só podem ser satisfeitos sob uma perspectiva comunitária. Recebem outras denominações na doutrina, tais como: transindividuais, supra-individuais e superindividuais, e correspondem aos chamados direitos coletivos em sentido lato, compreendendo os direitos e interesses coletivos propriamente ditos, os difusos e, por ficção legal, os individuais homogêneos, cujo conceito legal vem disposto no Código de Defesa do Consumidor, art. 81, parágrafo único, e incisos.
[28] Para maiores detalhes sobre direitos coletivos, respectivos instrumentos processuais de tutela, e coisa julgada coletiva, veja amplamente: GRINOVER, Ada Pellegrini.  Código Brasileiro de Defesa do Consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto, Ada Pellegrini Grinover … [et al.]  5.ed.  Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1998; LEONEL, Ricardo de Barros. Manual do Processo Coletivo.  São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002; e SÁ, José Adonis Callou de Araújo. Ação civil pública e controle de constitucionalidade.  Belo Horizonte: Del Rey, 2002.
[29] Nesse sentido, como aponta Ricardo de Barros Leonel (Op. cit., p. 398), na doutrina: Arnoldo Wald, Usos e abusos da ação civil pública (análise de sua patologia); Ives Gandra da Silva Martins, Ministério Público – Direitos individuais disponíveis e ação civil pública, p. 251-260; Arruda Alvim Notas sobre a coisa julgada coletiva, in RePro Nº 88/31-57, ano 22, out-dez.,1997; e ainda Gilmar Ferreira Mendes, Direitos fundamentais e controle de constitucionalidade: estudos de direito constitucional. São Paulo: IBDC e Celso Bastos Editor, 1999, p. 356. Em posição intermediária, Alexandre de Moraes, Direito constitucional… cit., p. 594, ao afirmar que “o que se veda é a obtenção de efeitos erga omnes”, posicionamento um tanto insipiente se levado em conta que tais efeitos são próprios das ações coletivas. Em sentido contrário, entendendo a possibilidade de discussão incidental de inconstitucionalidade via ACP, entre outros: Oswaldo Luiz Palu, op. cit., p. 273-283, citando jurisprudência em ambos os sentidos (a favor: Reclamação 1733-SP, rel. Min. Celso de Mello, DJU 01.12.00 – Informativo STF 212, dez.2000; contra: RE 213.631-0, rel. Min. Ilmar Galvão – Informativo STF 184); Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery, op. cit., p. 1328 e 1332, também referindo jurisprudência (a favor: JTJ 184/78, 182/10; contra: RT 694/85); e ainda Ricardo de Barros Leonel, op. cit., p. 396-404, e José Adonis Callou de Araújo Sá, op. cit., p. 94 e seguintes.
[30] Gilmar Ferreira Mendes, op. cit., p. 356.
[31] “Art. 469. Não fazem coisa julgada: […]
III – a apreciação da questão prejudicial, decidida incidentemente no processo”
[32] Neste sentido, aresto da lavra do Exmo. Sr. Des. Álvaro Wandelli, Ap cív n. 41.335: “A coisa julgada erga omnes, em sede de ação civil pública, se circunscreve à parte dispositiva da sentença (in casu, ao impedimento da cobrança da TIP), não ofendendo, por conseguinte, o campo próprio da ação direta de inconstitucionalidade (por hipótese da legislação inquinada de inconstitucional). A circunstância de se apreciar incidentalmente a inconstitucionalidade de uma lei, em cuja sentença faz coisa julgada erga omnes (ação civil pública, artigo 16, da Lei n. 73447/85), não a identifica com o propósito da ação direta de inconstitucionalidade, porquanto, por força do disposto nos artigos 468 e 469, ambos do CPC, não se pode falar em autoridade da coisa julgada relativamente aos motivos, fundamentos e decisões de questões prejudiciais, constantes da sentença”.
[33] A respeito do assunto, anota Luiz Paulo da Silva Araújo Filho (Ações coletivas: a tutela jurisdicional dos direitos individuais homogêneos. Rio de Janeiro: Forense, 2000, p. 233) apud Ricardo de Barros Leonel, op.cit., p. 404: “quanto maior a importância da causa, maior, muito maior, a sua tendência em esgotar as instâncias e acabar no Supremo Tribunal Federal…”
[34] Logicamente com as necessárias adequações a fim de garantir uma análise realmente ampla da matéria, mediante cognição plena e exauriente da questão constitucional. Talvez fosse de se cogitar também do retorno da “argüição de relevância” o que melhor viabilizaria o processo.

 


 

Informações Sobre o Autor

 

Adalgiza Paula Oliveira Mauro

 

Advogada, pós Graduada em Direito Civil e Direito Processual Civil pelo Centro Integrado de Ensino Superior (CIES), mestranda em Direito Processual pela Universidade do Oeste Paulista – UNOESTE.
Maringá – PR

 


 

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