Da desclassificação do artigo 28 da Lei 11.343 de 23 de agosto de 2006 – Lei de drogas

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Em caso recente, onde houve a penalização do suposto infrator por tráfico de entorpecentes a qual o mesmo é usuário, trouxe a lume uma preocupação aos perseguidores da justiça, uma vez que alguns julgadores tem aplicado o artigo 28 da lei de drogas como mera faculdade, impondo o penalidade mais gravosa e comprometendo a incolumidade de dependentes químicos, pessoas já fragilizadas pelo vício adquirido.

Prescreve o artigo 28 da lei 11.343 de agosto de 2006, senão vejamos:

“Art. 28.  Quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar será submetido às seguintes penas:

I – advertência sobre os efeitos das drogas;

II – prestação de serviços à comunidade;

III – medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo.”

Muitas vezes, o indiciado é mero usuário, não havendo prova cabal capaz de incriminar o mesmo, e sem contar com a quantia ínfima encontrada, podendo até ser aplicado o princípio da insignificância, como defende o Doutor Luiz Flávio Gomes, in verbis:

“A posse de droga para consumo pessoal transformou-se, com a nova Lei nº 11.343/2006, numa infração "sui generis" (art. 28, que não comina pena de prisão). A ela se aplica, isolada ou cumulativamente, uma série de medidas alternativas (advertência, prestação de serviços à comunidade e comparecimento a programa ou curso educativo). Quando, entretanto, se trata de posse ínfima de droga, o correto não é fazer incidir qualquer uma dessas sanções alternativas, sim, o princípio da insignificância, que é causa de exclusão da tipicidade material do fato.”[1]

Nota-se que pela quantia apreendida, pode o magistrado aplicar o princípio da insignificância, observando com ponderação a vida social do acusado.

Assim é o entendimento da jurisprudência pátria:

"Entorpecente. Quantidade ínfima. Atipicidade. O crime, além da conduta, reclama um resultado no sentido de causar dano ou perigo ao bem jurídico (…); a quantidade ínfima informada na denúncia não projeta o perigo reclamado". [2] Sempre "é importante demonstrar-se que a substância tinha a possibilidade para afetar ao bem jurídico tutelado". [3] A pena deve ser "necessária e suficiente para a reprovação e prevenção do delito. Quando a conduta não seja reprovável, sempre e quando a pena não seja necessária, o juiz pode deixar de aplicar dita pena. O Direito penal moderno não é um puro raciocínio de lógica formal. É necessário considerar o sentido humanístico da norma jurídica. Toda lei tem um sentido teleológico. A pena conta com utilidade".[4]

"Trancamento de ação penal, crime, porte de entorpecente, maconha, pequena quantidade, inexistencia, dano, perigo, saúde publica, aplicação, principio da insignificancia. (voto vencido) (min. Paulo Gallotti) descabimento, trancamento de ação penal, crime, porte de entorpecente, maconha, uso proprio, hipotese, consumo, praça publica, irrelevancia, pequena quantidade, caracterização, tipo penal, perigo abstrato, violação, saude publica." (STJ, HC 21672-RJ, Rel. Min. Fontes de Alencar).

Em que se pese a fé pública dos nobres policias militares, em muitos casos a autoridade policial não logra êxito na busca da droga e não há convicção se há mercancia da substância entorpecente, não merecendo serem acolhidos os argumentos ofertados de que se tratava de tráfico, posto que, meros argumentos não servem para alicerçar um pedido de condenação, não havendo muitas vezes provas cabais de prática de mercancia da droga apreendida.

Com a devida vênia, como já ventilado, alguns magistrados aplicam o artigo 33 indistintamente, não observando os requisitos para concessão da desclassificação esculpida no artigo 28, tão pouco observando a quantia apreendida, não havendo indícios da mercancia da droga, estirpando o lapidar princípio garantidor da liberdade humana, qual seja, o princípio do in dubio pro reo, ou seja, na dúvida, que se decida a favor do réu e não contrariamente ao mesmo. Em um Estado Constitucional, Social e Humanitário de Direito, muito mais aceitável que se liberte um culpado do que se condene um inocente.

Esse é o entendimento dos nossos tribunais:

“TRÁFICO DE ENTORPECENTES. ART. 33, CAPUT, DA LEI 11.343/06. SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DA DEFESA. TRÁFICO DE ENTORPECENTES. DESCLASSIFICAÇÃO PARA USO PRÓPRIO. ART. 28, CAPUT, DA LEI 11.343/06. TESE ACOLHIDA. POSSE PARA USO PRÓPRIO EVIDENCIADA. CONTEXTO PROBATÓRIO DÚBIO E INCERTO. TESTEMUNHAS DE ACUSAÇÃO QUE NADA SABEM ACERCA DA DO EVENTO DELITUOSO. PROVA JUDICIAL INSUFICIENTE PARA CONDENAÇÃO POR DELITO DE TRÁFICO, DO ART. 33, CAPUT, DA LEI 11.343/06. DESCLASSIFICAÇÃO OPERADA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.3311.3432811.3433311.343. Inexistindo prova da autoria do crime de tráfico de substância entorpecente, mas apenas da posse desta para consumo próprio, impõe-se a desclassificação do crime para aquele previsto no art. 28 da lei 11.342/06.11.342” (7022266 PR 0702226-6, Relator: Jefferson Alberto Johnsson, Data de Julgamento: 13/01/2011, 3ª Câmara Criminal, Data de Publicação: DJ: 557)[5]

A doutrina, ao analisar as questões relativas à classificação dos delitos ou uso de drogas, é elucidativa no sentido de que:

Essa situação não comporta resolução teórica única, pois depende do caso concreto e das provas produzidas em cada processo. Porém, tem sido referencial para a jurisprudência brasileira a quantidade de droga apreendida, os antecedentes criminais do agente, quando voltados ao tráfico, bem como a busca do caráter de mercancia. Quem traz consigo grande quantidade, já foi condenado anteriormente por tráfico e está em busca de comercialização do entorpecente é, com imensa probabilidade, traficante. No entanto, aquele que possui pequena quantidade, nunca foi antes condenado por delito relativo a tóxicos, bem como não está comercializando a droga é, provavelmente, um usuário.” (in Leis Penais e Processuais Penais Comentadas – Guilherme de Souza Nucci – 2edição revista, atualizada e ampliada – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007 – p.318).[6]

No mesmo sentido, em havendo dúvida a respeito dos fatos, deve esta ser decidida em favor do réu, e conforme pacífico entendimento jurisprudencial:

“TJRS: Existindo dúvidas sobre a conduta delituosa, se usuário ou traficante, embora ambas passam conviver, reclassifica-se para o delito do art. 16, da lei 6.368/76, eis que o núcleo é comum a ambos os tipos (Ap. 713766621, 3ª C. rel. Elba Aparecida Nicolli Bastos, 04.05.2006)” (in Leis Penais e Processuais Penais Comentadas – Guilherme de Souza Nucci – 2ª edição revista, atualizada e ampliada – São Paulo: editora Revista dos Tribunais, 2007 – p.319)”.

Muitas vezes há provas de que o acusado seja traficante, logo, o mesmo não pode ser submetido às penas previstas no art. 33 da Lei n. 11.343/06. Quando muito, caso não haja a absolvição, o acusado deve ser enquadrado na figura típica do art. 28 da nova lei de drogas. Em referido artigo não mais há espaço para a aplicação de qualquer tipo de pena privativa de liberdade, devendo o acusado ser submetido a um das medidas previstas no citado art. 28 da Lei n. 11.343/06. Forçar uma condenação, é querer forçar uma estigmatização desnecessária e injusta do acusado de seu seio familiar e social o que, deveras, trará ao mesmo, sérias conseqüências à sua vida.

 

Referências:
1 GOMES, Luiz Flávio em http://jus.com.br/revista/texto/9180;
2 Cf. decisão de 18.12.1997, relator LUIZ VICENTE CERNICCHIARO, DJU de 06.04.1998, p. 175;
3 Cf. decisão de 30.03.1998, relator ANSELMO SANTIAGO, DJU de 01.06.1998, p. 191;
4 Cf. decisão de 21.04.1998, relator LUIZ VICENTE CERNICCHIARO, DJU de 17.08.1998, p. 96;
5 Cf. de 13.01.2004 – relator Jefferson Alberto Johnsson – Data de Publicação: DJ: 557);
6 NUCCI, Guilherme de Souza in Leis Penais e Processuais Penais Comentadas – 2edição revista, atualizada e ampliada – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007 – p.318).

Notas:
[1] GOMES, Luiz Flávio em http://jus.com.br/revista/texto/9180
[2] Cf. decisão de 18.12.1997, relator LUIZ VICENTE CERNICCHIARO, DJU de 06.04.1998, p. 175.
[3] Cf. decisão de 30.03.1998, relator ANSELMO SANTIAGO, DJU de 01.06.1998, p. 191;
[4] Cf. decisão de 21.04.1998, relator LUIZ VICENTE CERNICCHIARO, DJU de 17.08.1998, p. 96.
[5]  Cf. de 13.01.2004 – relator Jefferson Alberto Johnsson – Data de Publicação: DJ: 557)
[6]  NUCCI, Guilherme de Souza in Leis Penais e Processuais Penais Comentadas – 2edição revista, atualizada e ampliada – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007 – p.318).

Informações Sobre o Autor

Marco Junio Gonçalves da Silva

Advogado, Pós-graduado em Direito do Trabalho pelo Universidade Cândido Mendes, Doutorando em Ciências Jurídicas e Sociais pelo UMSA – Argentina, graduando em história


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