Dos pressupostos para responsabilizar penalmente a pessoa jurídica no ordenamento jurídico brasileiro

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Resumo: O presente estudo tem por escopo traçar algumas considerações acerca dos requisitos para responsabilizar penalmente a pessoa jurídica, indagando se esta, nos crimes ambientais, pode ser penalizada de forma isolada, ou seja, sem necessariamente comprovar-se a conduta delituosa de seus sócios. Para tanto, pretende-se discorrer a importância da instituição da responsabilidade penal da pessoa jurídica no ordenamento jurídico brasileiro, dando-se enfoque à ineficiência dos mecanismos tradicionais do Direito Penal para combater a criminalidade perpetrada sob o manto da empresa. E, com base nisso, demonstrar-se-á que a pessoa jurídica, em determinadas situações, pode ser processada pelo cometimento de crime ambiental, ainda que não se comprove de qual sócio partiu a ordem para a prática do ilícito penal.

Palavras-chave: Responsabilidade penal – pessoa jurídica – requisitos – pressupostos – comprovação – conduta humana – sócios – necessidade – crimes ambientais.

Abstract: This study aims at outlining some considerations about the requirements for the juridical person criminally responsible, whether this in environmental crimes may be punished in isolation, ie without need to prove criminal conduct of its members. Thus, it is intended to discuss the importance of establishing the criminal liability of juridical person in the brazilian law system, with focus on the inefficiency of the traditional mechanisms of criminal law to combat crime perpetrated under the cloak of the company. And on that basis will demonstrate that the juridical person, in certain situations, may be prosecuted by the environmental commission of crime, though not proof of any member left the order for the practice of criminal offense.

Keywords: Criminal liability – legal – requirements – assumptions – evidence – human conduct – members – need – environmental crimes

Sumário: 1. Considerações introdutórias; 2. Breve panorama acerca da responsabilidade penal da pessoa jurídica no Direito brasileiro; 3. Dos pressupostos e requisitos para responsabilizar penalmente a pessoa jurídica; 4. Da necessidade ou não de se comprovar a conduta delituosa dos sócios que integram a pessoa jurídica; 5. Conclusão; 6. Notas.

1. Considerações introdutórias

O ordenamento jurídico brasileiro, filiado ao sistema românico-germânico, ao prever, de forma inovadora, a responsabilidade penal da pessoa jurídica nos crimes contra o meio ambiente, rompeu com a tradicional concepção da teoria do delito, inspirada em Beling e Liszt (início do século XX), e aperfeiçoada por Welzel algumas décadas mais tarde, em sua conhecida teoria finalista da ação.

É certo que a doutrina brasileira ainda está longe de chegar a um consenso sobre a admissibilidade da responsabilidade penal da pessoa jurídica, a despeito das disposições constitucionais e legais que a regulamentam (art. 225, § 3º, da Constituição Federal de 1988, e art. 3º, da Lei n. 9.605/98).

Não obstante isto, a jurisprudência brasileira, inclusive a do Superior Tribunal de Justiça, tem reconhecido a constitucionalidade das disposições legais que regulamentam a responsabilidade penal da pessoa jurídica, não enxergando óbice no sistema legal pátrio para o rompimento do dogma de que o Direito Penal só poderia atuar repressivamente em face da pessoa natural, ou seja, o ser humano dotado de capacidade de entender e querer o caráter ilícito do fato. 

Sem embargo às intermináveis discussões sobre a admissibilidade da responsabilidade penal da empresa no ordenamento jurídico brasileiro, o presente estudo tem por escopo traçar algumas considerações ainda pouco exploradas na doutrina e na jurisprudência, que consiste em averiguar os requisitos para responsabilizar penalmente a pessoa jurídica nos crimes contra o meio ambiente, especialmente indagando se ela poderia ser processada e penalizada independentemente de seus sócios e diretores.

2. Breve panorama acerca da responsabilidade penal da pessoa jurídica no Direito brasileiro

Nos países filiados à tradição românico-germânica (maioria dos países do Continente Europeu e da América Latina), predomina o entendimento de que só o ser humano, individualmente considerado, pode ser sujeito ativo de crime, uma vez que somente este é dotado de inteligência, vontade e consciência, ainda que em tempos pretéritos pudessem ser condenados criminalmente animais e, até mesmo, defuntos, conforme destaca Ferrajoli.(1) Nos países que seguem o sistema do common law, como é o caso dos Estados Unidos, Canadá e Inglaterra, fulcrados em precedentes judiciais, não há empecilhos para admitir condenações criminais de pessoas jurídicas.(2)

Esse cenário, todavia, tende a mudar. A França, por exemplo, que também é filiada ao sistema românico-germânico, consagrou, em 1994 (data que entrou em vigor o novo Código Penal francês, editado em 1992), a responsabilidade criminal da pessoa jurídica.

Com a expansão progressiva de empresas e associações na sociedade moderna, despontaram-se novas formas de criminalidade, especificamente os delitos empresariais, integrantes do rol dos denominados crimes do colarinho branco, ou, no dizer de Luiz Flávio Gomes, macro-delinqüência econômica, que, segundo o penalista, agasalharia os delitos econômicos, financeiros, tributários, ecológicos, fraudulentos, entre outros.(3)

Essa delinqüência econômica é corolário de uma nova espécie de Direito Penal, que Hassemer veio a chamar de Direito Penal moderno, cujas características são diversas do Direito Penal tradicional (v.g., furto, homicídio, estupro, etc.), ultrapassando os direitos individuais universais, vale dizer, “não é o corpo, a vida, a liberdade, a honra, o patrimônio das pessoas como falava o Direito Penal clássico, mas, a capacidade funcional do mercado de subsídios, por exemplo, no caso da fraude aos subsídios; a saúde pública no caso de produtos farmacêuticos”.(4)

No estágio da atual da civilização, em que a globalização vem adquirindo cada vez mais intensidade, com o conseqüente avanço dos meios tecnológicos, as pessoas jurídicas passaram a integrar posição de maior relevo na vida social, sobretudo as sociedades empresárias, em razão do vulto dos empreendimentos que vem sendo manifestado em suas relações negociais. Entretanto, essas entidades, ao mesmo tempo em que beneficiam a coletividade, podem, em determinadas situações, causar-lhe danos de consideráveis proporções, como, por exemplo, nas situações em que seus membros a utilizam para prejudicar o meio ambiente.

Podem-se citar, ainda, as corriqueiras fraudes no âmbito da ordem econômica, em que as empresas, no afã de atingir elevadas cifras monetárias, empregam condutas ardilosas, no sentido de prejudicar a livre concorrência de mercado, afetando, geralmente, o interesse dos consumidores.

Nesse particular, Klaus Tiedemann deduz que os agrupamentos geram um ambiente que facilita e incita os autores físicos a cometerem delitos em benefício da pessoa jurídica. Sugere o penalista alemão, por essa razão, a idéia de sancionar não só os autores materiais (pessoas naturais), como também a própria entidade.(5)

No Brasil, a discussão se tornou mais acirrada com a promulgação da Constituição Federal de 1988, que segundo uma corrente doutrinária expressiva, introduziu, em seu art. 225, § 3º, a responsabilidade penal da pessoa jurídica, a qual veio a ser regulamentada pelo legislador ordinário por meio da Lei n. 9.605, de 12 de fevereiro de 1998 (Lei dos Crimes Ambientais).

Ao texto constitucional não faltaram críticas. Para alguns doutrinadores, o art. 225, § 3º, da Constituição Federal de 1988, não teria previsto a responsabilidade penal da pessoa jurídica. Para outros, o citado dispositivo constitucional até teria permitido a penalização da pessoa jurídica, mas não haveria como aplicá-lo, porque o Direito Penal brasileiro fora construído para penalizar exclusivamente a pessoa física (6).

Até o advento da Constituição Federal de 1988, os autores clássicos do Direito Penal brasileiro, dentre eles Nélson Hungria (7), Aníbal Bruno (8), Heleno Cláudio Fragoso (9), Bento de Faria (10),  Basileu Garcia (11), Magalhães Noronha (12), entre outros, adotavam o entendimento de que a pessoa jurídica seria incapaz de responder a processos criminais.

Malgrado a promulgação da vigente Constituição Republicana, há uma série de argumentos que propugnam pela irresponsabilidade criminal da pessoa jurídica, mesmo sob a égide da Lei n. 9.605/98 (Lei dos Crimes Ambientais), legislação esta que Cezar Roberto Bitencourt veio a chamar de “desajeitada, inadequada e equivocada”(13). Os principais argumentos, dos quais são partidários Bitencourt (14), René Ariel Dotti (15), Juarez Cirino dos Santos (16), Miguel Reale Júnior (17), Pierangeli (18), Luiz Regis Prado (19), Robaldo (20), entre outros, podem ser assim resumidos: a) impossibilidade de conduta (ação/omissão), incluindo o dolo e a culpa, b) incapacidade de culpabilidade, com seus consequentes pressupostos da imputabilidade, potencial consciência da ilicitude e exigibilidade de conduta diversa; c) lesão ao princípio da personalidade das penas; d) impossibilidade de aplicar pena privativa de liberdade ao ente coletivo.

Luiz Regis Prado, ao tecer suas críticas, até admitiria a responsabilidade penal da pessoa jurídica no ordenamento jurídico nacional, mas pondera que o legislador brasileiro teria se mostrado omisso no que concerne aos mecanismos para puni-la criminalmente. Sustenta Prado que o ordenamento jurídico francês, por meio de sua Lei de Adaptação de 1992, alterou inúmeros textos legais, com o intuito de se adaptar ao seu novo Código Penal, o que não ocorreu no Brasil (21).

Em que pesem todas as críticas da doutrina, não há como ignorar que, no Direito brasileiro, não há mais empecilhos para colocar a pessoa jurídica no banco dos réus.

Em primeiro lugar, no que concerne à crítica referente à impossibilidade de a pessoa jurídica sofrer pena privativa de liberdade, como a de prisão, denota-se que tal fato não tem suscitado maiores problemas na doutrina, pois se tem formulando outras formas para puni-la, como, por exemplo, aplicando-se penas pecuniárias, perda de bens, interdição temporária e até mesmo a sua dissolução, que, segundo Tiedemann, corresponderia à pena de morte da empresa (22). Essa última medida, por óbvio, deveria ser aplicada com cautela e somente em situações excepcionalíssimas, até porque os empregados seriam diretamente afetados com ela.

Acerca das penas aplicáveis às pessoas jurídicas, é oportuno lembrar do ensinamento de Muñoz Conde, que embora não tenha se mostrado plenamente favorável à responsabilidade criminal da entidade jurídica, grifa que:

“Pessoalmente, parece-me que o atual Direito Penal dispõe de um arsenal de meios específicos de reação e controle jurídico penal das pessoas jurídicas. Claro que estes meios devem ser adequados à própria natureza desses entes. Não se pode falar de penas privativas de liberdade, mas de sanções pecuniárias; não se pode falar de inabilitações, mas sim de suspensão de atividades ou de dissolução de atividades, ou de intervenção por parte do Estado. Não há, pois, por que se alarmar tanto, nem rasgar as vestes quando se fala de responsabilidade penal das pessoas jurídicas, senão simplesmente ter consciência de que unicamente se deve escolher a via adequada para evitar os abusos que ao seu amparo se realizam”. (23)

Na mesma linha de raciocínio, Claus Roxin, ainda que não tenha se posicionado quanto à admissibilidade da responsabilidade penal da pessoa jurídica, assevera que as sanções destinadas às referidas entidades desempenharão um relevante papel no futuro do Direito Penal, especificamente no que concerne ao combate à criminalidade econômica e ambiental, devendo abranger “desde consideráveis pagamentos em dinheiro até o fechamento da empresa” (24).

A Lei n. 9.605/98 (Lei dos Crimes Ambientais), na esteira do entendimento da doutrina, previu, em seu art. 21, as seguintes penas às pessoas jurídicas: a) multa; b) restritivas de direitos; c) prestação de serviços à comunidade. E, ainda, no art. 24 da Lei n. 9.605/98, assentou-se a possibilidade de liquidação forçada da empresa, que ocorre quando esta tenha a finalidade preponderante de permitir, facilitar ou ocultar a prática de crimes ambientais.

A invocada lesão ao princípio da personalidade das penas, sob o fundamento de que a condenação criminal de uma pessoa jurídica atingiria os sócios que a integram, da mesma forma, tem sido rechaçada pelos juristas. Segundo Shecaira, a lei penal brasileira estabelece penas privativas de liberdade, restritivas de direitos e multas. Contudo, nenhuma delas deixaria de atingir terceiros. Assim, quando um chefe de família tivesse sua liberdade restringida, a sua mulher e filhos também restariam privados, pois aquele poderia contribuir substancialmente com o sustento do lar. O mesmo argumento vale para a pena de restritiva de direitos, que também influiria na renda destinada à família. Por fim, com relação à multa, a maioria das vezes ela recai sobre o patrimônio do casal, ainda que só o marido tenha sido condenado.(25)

Wilfried Hassemer, ao comentar a nova criminalidade que paira sobre a Alemanha e, de um modo geral, sobre a Europa Ocidental, menciona que o princípio da personalidade da pena seria inconciliável com o Direito Penal moderno, porquanto, nessa espécie de criminalidade, os delinqüentes não agiriam individualmente, mas sempre em grupo. Normalmente, prossegue Hassemer, “há uma diretoria que toma decisões por maioria: ou seja, oito entre dez, nem sempre há unanimidade. Normalmente a decisão criminosa não é de uma pessoa, como no caso do assassinato, do estupro, do furto, etc”.(26)

É de ser relevado, também, que as penas que porventura forem aplicadas às pessoas jurídicas serão destinadas somente a elas, e não aos seus membros, porque a entidade responde pelo seu próprio patrimônio, lembrando-se que no ordenamento jurídico brasileiro prevalece a tese de que a personalidade da pessoa jurídica não se confunde com a da pessoa natural.(27)

Finalmente, com relação aos argumentos de que a pessoa jurídica não poderia ser responsabilizada em vista da impossibilidade de praticar conduta, elemento integrante do fato típico, ou possuir capacidade de culpabilidade, também não merecem agasalho. É que, conforme se demonstrará com mais vagar no final deste trabalho, há autores que defendem que a pessoa jurídica possuiria vontade própria, podendo, por essa razão, praticar uma conduta criminosa e agir com culpabilidade própria (distinta da culpabilidade tradicional, inerente à pessoa natural). Por outro lado, há autores que, mesmo entendo ser inviável a atribuição de conduta e culpabilidade própria à empresa, não vislumbram empecilhos, uma vez que a pessoa jurídica – na visão dessa corrente doutrinária – só poderia ser responsabilizada penalmente quando se comprovasse a conduta delituosa do representante que atuou em seu nome.

De todo jeito, as questões arraigadas no Direito Penal tradicional, ainda que erigidas à categoria de norma constitucional, não podem servir de obstáculo à concretização da norma constitucional que confere, de forma expressa, a possibilidade de a pessoa jurídica ser responsabilizada criminalmente.

A propósito, de acordo com o princípio da unidade da Constituição, abordado por Canotilho “todas as normas contidas numa constituição formal têm igual dignidade”(28), concluindo o professor lusitano que:  

“O princípio da unidade da constituição ganha relevo autónomo como princípio interpretativo quando com ele se quer significar que a constituição deve ser interpretada de forma a evitar contradições (antinomias, antagonismos) entre as suas normas. Como ‘ponto de orientação’, ‘guia de discussão’ e ‘factor hermenêutico de decisão’, o princípio da unidade obriga o intérprete a considerar a constituição na sua globalidade e a procurar harmonizar os espaços de tensão existentes entre as normas constitucionais a concretizar (ex: princípio do Estado de Direito e princípio democrático, princípio unitário e princípio da autonomia regional e local. Daí que o intérprete deva sempre considerar as normas constitucionais não como normas isoladas e dispersas, mas sim como preceitos integrados num sistema interno unitário de normas e princípios.”(29)

E, ainda, conforme o princípio da concordância prática ou da harmonização, impõe-se “a coordenação e combinação dos bens jurídicos em conflito de forma a evitar o sacrifício total de uns em relação aos outros”. (30)

Por conseguinte, ainda que a norma insculpida no art. 225, § 3º, da Constituição da República Federativa do Brasil, possa estar em aparente conflito com algum princípio constitucional (como afirmam alguns juristas), tal fato, por si só, não tem o condão de impedir que a pessoa jurídica seja responsabilizada criminalmente no Direito brasileiro, porquanto duas normas estabelecidas no texto originário da Constituição não podem ser conflitadas (o que pode ocorrer é apenas um aparente conflito de normas constitucionais, que devem ser solucionadas por meio de critérios exegéticos próprios)(31). E caso ocorrer este aparente conflito de normas, caberá ao hermeneuta, no caso concreto, interpretar as normas constitucionais da forma mais harmônica possível.

A jurisprudência, em sintonia com o texto constitucional e com a Lei dos Crimes Ambientais, tem reconhecido, reiteradamente, a possibilidade de a pessoa jurídica figurar no pólo passivo de ações penais por crimes ambientais. É o caso, por exemplo, do Superior Tribunal de Justiça, o qual assentou, recentemente, que “Se a pessoa jurídica tem existência própria no ordenamento jurídico e pratica atos no meio social através da atuação de seus administradores, poderá vir a praticar condutas típicas e, portanto, ser passível de responsabilização penal”.(32)

Essa tendência da jurisprudência também está de acordo com o pensamento de diversos juristas brasileiros, como é o caso de Sérgio Salomão Shecaira(33), João Marcelo de Araújo Junior(34), Vladmir Passos de Freitas e Gilberto Passos de Freitas(35), Fernando Capez(36), Celso Delmanto(37), Guilherme de Souza Nucci(38), Paulo Leme Machado(39), Fernando Galvão(40), entre outros.

Não bastasse isso, é de ser assinalado que o Brasil, em março de 2.004, ratificou a Convenção das Nações Unidas contra o crime organizado transnacional (também chamada de Convenção de Palermo), a qual, em seu art. 10, reconhece a possibilidade de se penalizar criminalmente a empresa por delitos praticados por organizações criminosas transnacionais. Por conseguinte, se a República Federativa do Brasil incorporou o referido tratado em seu ordenamento jurídico, é sinal de que se comprometeu a cumprir as disposições legais nele contidas, sobretudo no que diz respeito à responsabilidade penal da pessoa jurídica(41).

3. Dos pressupostos e requisitos para responsabilizar penalmente a pessoa jurídica

Partindo da premissa de que é admissível a responsabilidade penal da pessoa jurídica, resta analisar uma questão tormentosa no cenário jurídico brasileiro, que consiste em averiguar os requisitos e a forma para puni-la criminalmente, inclusive perquirindo se a entidade pode ser responsabilizada sem a comprovação da conduta delituosa de seus sócios.

A leitura perfunctória do art. 3º da Lei nº 9.605/98 revela a existência de dois requisitos precípuos para responsabilizar penalmente a pessoa jurídica. O primeiro deles, que não comporta maiores indagações, estabelece que a pessoa jurídica só pode ser sancionada criminalmente se o delito for praticado em seu próprio benefício ou interesse.  Esse interesse ou benefício de que trata o dispositivo supramencionado pode ser econômico, moral ou de utilidade. Portanto, o interesse ou benefício nem sempre estará interligado ao lucro, como, v.g., quando a pessoa jurídica, por meio de seus representantes, ocupa um território que é tutelado por uma área de preservação ambiental.(42)

O segundo requisito, por sua vez, é mais complexo, e estabelece que a responsabilidade criminal da pessoa jurídica depende da comprovação de que a “infração seja cometida por decisão de seu representante legal ou contratual, ou de seu órgão colegiado”.

 Existe forte corrente da doutrina sustentando que o art. 3º da Lei n. 9.6085/98 teria condicionado a responsabilidade penal da pessoa jurídica à comprovação da conduta humana de um dos sócios diretores ou representantes que a integram, albergando, assim, a teoria do ricochete (também chamada de teoria da dupla imputação ou do reflexo).

Essa teoria da dupla imputação, segundo Jean Pradel, fora adotada pelo Código Penal francês de 1.992, quando previu expressamente a responsabilidade penal da empresa. Para tal teoria, a pessoa jurídica só poderia ser responsabilizada criminalmente caso aferida a conduta dolosa ou culposa da pessoa física (representante da empresa) que praticou o ilícito em proveito da entidade. Na realidade, a conduta delituosa atribuída à pessoa jurídica seria “emprestada” da conduta da pessoa física. Por consequência, Pradel exemplifica que, se o Ministério Público, porventura, pretender processar uma pessoa jurídica, terá que demonstrar o dolo e a culpa da pessoa física que atuou em seu nome(43).

No entanto, há outra corrente da doutrina que sustenta ser prescindível a comprovação da conduta humana para responsabilizar penalmente a pessoa jurídica, adotando-se, assim, conceitos próprios de conduta, culpa e culpabilidade da empresa. É o que a doutrina chama de teoria institucional da ação. Tal premissa decorre do entendimento segundo o qual o ente coletivo tem vontade própria, podendo, inclusive, divergir da vontade de alguns de seus membros. Isto é corolário da teoria civilista da realidade(44).

A propósito, tem-se indagando que se uma pessoa jurídica pode realizar um contrato na esfera cível, respondendo civilmente pelos seus atos, nada obstaria que também pudesse ter capacidade para cometer crimes. É por isso que Von Liszt afirmava que quem detivesse capacidade de firmar um contrato também poderia celebrá-lo fraudulentamente(45).

Klaus Tiedemann observa que existe uma tendência em alguns países, inclusive naqueles que integram a Comunidade Européia, no sentido de alcançar uma categoria específica de culpa da empresa, fundada não apenas na imputação, como também em critérios já adotados no Direito Civil.(46)

O penalista alemão fornece um modelo interessante referente à culpa e culpabilidade, sugerindo um sistema de organização da empresa, no sentido de que a entidade se amolde a todos os métodos preventivos exigidos em Lei. Assim, caso o ato ilícito ocorresse por alguma negligência ou omissão referente aos controles preventivos e de organização exigidos para a empresa que originou o dano, estaria configurada a culpa e, em consequência, a responsabilidade criminal da pessoa jurídica.(47)

 Para Tiedemann, numa perspectiva ideológica, esse conceito próprio de culpa da pessoa jurídica, que o autor denomina culpa coletiva ou de agrupação (ou culpa social), não seria impossível introduzi-lo nos ordenamentos jurídicos ao lado da culpa tradicional, voltada ao ser humano.(48)

Diante dessas considerações, convém analisar se efetivamente é possível processar e condenar criminalmente uma pessoa jurídica independentemente da comprovação da conduta delituosa de seus sócios.

4. Da necessidade ou não de se comprovar a conduta delituosa dos sócios que integram a pessoa jurídica

É preciso refletir se efetivamente o legislador brasileiro teria optado pela tese do ricochete (também chamada de dupla imputação), haja vista que a necessidade de se penalizar criminalmente a empresa, segundo a doutrina, decorre, principalmente, da circunstância de a pessoa natural, propulsora da conduta delituosa decorrente das atividades empresariais, ser dificilmente identificada.

Logo, partindo-se do pressuposto de que a pessoa jurídica é uma realidade, com vontade própria, e não mera ficção (segundo entendimento da maioria dos civilistas)(49), seria conveniente adotar a tese de que ela poderia ser responsabilizada independentemente da conduta delituosa de seus membros.

O penalista alemão Claus Roxin, conquanto não tenha se posicionado quanto à admissibilidade da responsabilidade penal das pessoas jurídicas, sustenta que as sanções a serem-lhes aplicadas desempenharão um relevante papel no futuro do Direito Penal. Para Roxin, o princípio da culpabilidade pessoal, em se tratando de delitos empresariais, tende a ceder em face duma culpabilidade própria, destinada especificamente às pessoas jurídicas, justificando o citado penalista que, na criminalidade econômica e ecológica praticada sob o pálio de grandes e poderosas empresas, dificilmente se comprova a culpabilidade das pessoas naturais responsáveis pelo cometimento do delito. Sugere Roxin, por essa razão, que as sanções aplicadas às pessoas jurídicas se atrelem a uma falha de organização da empresa, independentemente de quem, individualmente, seja o culpado, contanto que se desenvolvam regras especiais de imputação às pessoas coletivas(50).

Essa opinião de Roxin está em conformidade com àquilo que Klaus Tiedemanm veio a chamar de culpa coletiva ou de agrupação, que seria uma culpa diversa daquela tradicional (inerente ao ser humano). Para Tiedemann, ambas as formas de culpa poderiam conviver conjuntamente, mas a culpa da empresa estaria interligada a questões preventivas. Caso se averiguasse que a entidade, por não ter tomado as cautelas necessárias, contribuísse para o cometimento do dano, dever-se-ia responsabilizá-la na forma dessa culpa diferenciada.(51)

Esses novos conceitos de ação (que alguns juristas chamam de “ação institucional”), culpa, dolo e culpabilidade, próprios para responsabilizar uma pessoa jurídica, a despeito de não terem entusiasmado muitos dos doutrinadores brasileiros, ao que parece, são mais eficazes para combater a criminalidade perpetrada no seio da empresa, ao revés de se aplicar a chamada teoria da dupla imputação, pois seria ilógico exigir a efetiva comprovação da conduta criminosa dos membros que dirigem e controlam a empresa. Isso, certamente, tornaria inócua a norma constitucional que prevê a responsabilidade penal da pessoa jurídica(52).

Aliás, interpretando, a contrariu sensu, o art. 3º, parágrafo único, da Lei n. 9.605/98, segundo o qual “A responsabilidade das pessoas jurídicas não exclui a das pessoas físicas, autoras, co-autoras ou partícipes do mesmo fato”, percebe-se que o legislador não condicionou a responsabilidade penal da pessoa jurídica à da pessoa natural que a compõe. Caso o legislador pretendesse condicioná-la, ele certamente não teria proclamado que a responsabilidade penal daquela não exclui a das pessoas físicas que participaram do fato delituoso.(53)

Nesse sentido, segue a reflexão de Vladimir Passos de Freitas e Gilberto Passos de Freitas:

“(…) observe-se que a responsabilidade penal da pessoa jurídica não exclui a das pessoas naturais. O art. 3º, parágrafo único, da Lei n. 9.605/98 é explícito a respeito. Assim, a denúncia poderá ser dirigida apenas contra a pessoa jurídica, caso não se descubra a autoria ou participação das pessoas naturais, e poderá, também, ser direcionada contra todos. Foi exatamente para isto que elas, as pessoas jurídicas, passaram a ser responsabilizadas. Na maioria absoluta dos casos, não se descobria a autoria do delito. Com isto, a punição findava por ser na pessoa de um empregado, de regra o último elo de hierarquia da corporação. E, quanto, mais poderosa a pessoa jurídica, mais difícil se tornava a identificar os causadores reais do dano. No caso de multinacionais, a dificuldade torna-se ainda maior, e o agente, por vezes, nem reside no Brasil. Pois bem, agora o Ministério Público poderá imputar o crime às pessoas naturais e à pessoa jurídica, juntos ou separadamente. A opção dependerá do caso concreto.”(54)

Assim, se o constituinte e o legislador resolveram quebrar o paradigma de que as pessoas jurídicas seriam incapazes de serem responsabilizadas penalmente, não faria sentido manter o dogma de que a conduta da pessoa física, sócia da empresa, deveria ser demonstrada no caso concreto. Isso, com a devida vênia, frustraria a razão teleológica estampada no texto constitucional, sobretudo porque o objetivo de responsabilizar penalmente a pessoa jurídica decorre do fato de os sócios que a integram, em suas planejadas fraudes, conseguirem ocultar-se sob o poderio da empresa, escapando-se da punição criminal.

E, por isso, é perfeitamente possível ao membro do Ministério Público, em sua denúncia, imputar a prática criminosa exclusivamente à pessoa jurídica, se, no caso concreto, não houver meios de se apurar quais os sócios atuaram de forma criminosa.

Esse raciocínio poderia conduzir à falsa impressão de que se estaria abrindo mão da responsabilidade subjetiva, que foi uma árdua conquista do Direito Penal, encabeçada nos ideais iluministas do século XVIII. Mas tal pensamento está equivocado, uma vez que a adoção da responsabilidade penal da pessoa jurídica, com a conseqüente dispensa da comprovação da conduta do sócio delinquente, pode ser adaptada a novos conceitos de conduta, dolo, culpa e culpabilidade.

Se as outras ciências do Direito estão em constante evolução e adaptação, é despropositado pensar que o Direito Penal deveria ficar estático, hermético, sem acompanhar a evolução da sociedade, inclusive no que diz respeito à proteção ao meio ambiente, que é uma preocupação de ordem global.

Vale destacar, por outro lado, que o Direito Civil, assim como o Direito Penal, também se pauta em critérios psicológicos no que tange à responsabilidade civil, mas, nem por isso, cria obstáculos para responsabilizar as pessoas jurídicas por atos ilícitos causados em decorrência de suas atividades. Por esse raciocínio, não seria despiciendo criar novos mecanismos para responsabilizar penalmente a pessoa jurídica.

Nessa ordem de idéias, André Vitu e Roger Merle, ao abordarem o assunto dentro do contexto da legislação francesa, professam que:

“A pessoa colectiva é perfeitamente capaz de vontade; ela postula mesmo a vontade, porquanto nasce e vive do encontro das vontades individuais dos seus membros. A vontade colectiva que a anima não é um mito, concretiza-se em cada etapa importante da sua vida pela reunião, a deliberação e o voto da assembléia geral dos seus membros ou dos seus conselhos de administração, de gerência ou de direção. Esta vontade colectiva é capaz de cometer crime tanto como a vontade individual. O direito civil reconhece-a de há muito com base no artigo 1382.º do Código Civil. Nada se opõe a que o direito penal adopte a mesma solução”.” (55)

A este respeito, cabe invocar a opinião de Shecaira:

“Não obstante as objeções normalmente formuladas ao reconhecimento da responsabilidade penal das empresas, não se pode deixar de reconhecer que as pessoas jurídicas podem ter – e têm – decisões reais. Elas fazem com que se reconheça, modernamente, sua vontade, não no sentido próprio que se atribui ao ser humano, resultante da própria existência natural, mas em um plano pragmático-sociológico, reconhecível socialmente. Esta perspectiva permite a criação de um conceito novo denominado “ação delituosa institucional”, ao lado das ações humanas individuais”(56).

No campo do Direito Civil, reconhece-se a possibilidade de a pessoa jurídica celebrar contratos e, no caso de descumprimento, vir a ser sancionada, independentemente de qual sócio partiu a ordem de não cumprir a avença. Esse fato comprova que a pessoa jurídica pode efetivamente ter capacidade de ação. 

A questão mais complexa refere-se ao dolo e à culpa, bem como à culpabilidade.

A pessoa jurídica, por ser desprovida de sentimentos, mercê de sua condição de ente inanimado, não poderia externar os elementos caracterizadores do dolo tradicional, entendido como a vontade e consciência de praticar o delito. No entanto, nada impediria que o operador do direito, no caso concreto, averiguasse a culpa e o dolo de forma genérica, quando não conseguisse constatar de qual sócio partiu a ordem do delito.

Esses elementos de culpa e dolo genéricos seriam apreciados externamente, vale dizer, não se faria necessário comprovar a conduta delituosa do sócio responsável pela conduta propulsora do crime ambiental decorrente das atividades exercidas pela pessoa jurídica. Bastaria ao aplicador da norma verificar, genericamente, que houve conduta delituosa em prol da pessoa jurídica, não importando de quem partiu a ordem.

Assim, por exemplo, se se verificar que determinados empregados da empresa estão explorando minérios sem autorização e em descompasso com a legislação ambiental, não se conseguindo aferir de qual sócio partiu a ordem, poder-se-ia processar criminalmente a pessoa jurídica (e eventualmente os empregados), pois neste caso estaria evidenciado que houve uma ordem para exercer atividade ilícita em prol da empresa. E, por estar evidenciado que houve deliberação para a extração irregular de minério em proveito da pessoa jurídica, não faria sentido exigir a comprovação da conduta delituosa dos sócios responsáveis pelo desenvolvimento da atividade ilícita, mercê da adoção desses novos mecanismos de dolo e culpa. 

Essa, também, é a opinião de Guilherme de Souza Nucci, para quem “caso se consiga somente verificar que a poluição adveio de ordem e em benefício de uma pessoa jurídica, mas não se atinge a identidade da pessoa física colaboradora, pode-se processar, de modo isolado, a pessoa jurídica”.(57)

Seguindo essa vertente, João Marcello de Araújo Junior exemplifica que, se um rio é poluído em decorrência das atividades de uma empresa, é evidente que há uma conduta desprovida de caráter ético ou moral. E essa conduta impõe uma responsabilidade originária da empresa, de fundamento social, já que a entidade possui a incumbência de atuar de acordo com a Lei.(58)

Afinal, em se tratando de danos imputados à Administração Pública, nos comportamentos omissivos, a doutrina e a jurisprudência brasileira descartaram a teoria objetiva (que só é aplicada aos comportamentos comissivos de seus servidores públicos), adotando a teoria francesa do faute du service (que estaria imbricada à teoria da responsabilidade subjetiva), segundo a qual, para que se responsabilize civilmente a entidade pública, é dispensável que se comprove a conduta ilícita do agente público, bastando que se demonstre, genericamente, a falha e a ineficiência do serviço público. Seria uma culpa genérica. (59)

Por força da teoria do faute du service, extrai-se que a doutrina reconheceu, ainda que implicitamente, uma espécie de ação e culpa própria das pessoas jurídicas prestadoras de serviços públicos causadoras de ilícitos civis.

Nesse passo, tem-se por oportuno extrair do ensinamento de Bandeira de Mello:

“Como pessoa jurídica que é o Estado, entidade real, porém abstrata (ser de razão), não tem vontade nem ação, no sentido de manifestação psicológica e vida anímica próprias. Estas, só os seres físicos as possuem. Tal fato não significa, entretanto, que lhe faltem vontade e ação, juridicamente falando. Dado que o Estado não possui, nem pode possuir um querer e um agir psíquico e físico, por si próprio, como entidade lógica que é, sua vontade e sua ação se constitui na e pela atuação dos seres físicos prepostos à condição de seus agentes, na medida em que se apresentem revestidos desta qualidade.

Assim, como o Direito constrói a realidade (jurídica) ‘pessoa jurídica’, também constrói para ela as realidades (jurídicas) vontade e ação, imputando o querer e agir dos agentes à pessoa do Estado.”(60)

A teoria do faute du service, constantemente aplicada nos Tribunais pátrios em condutas omissivas da Administração Pública no que toca à sua responsabilidade civil(61), poderia ser estendida às condutas criminosas ambientais cometidas no seio da pessoa jurídica.

Desse modo, caso não se identificasse o mentor da ordem que ocasionasse determinado dano ambiental em prol de sua empresa, poder-se-ia averiguar, genericamente, a culpa por parte do órgão colegiado da entidade, como, por exemplo, comprovando-se que determinados meios preventivos, exigidos pela legislação, não foram observados pelos membros da pessoa jurídica, o que motivou a degradação do meio ambiente. Nesse caso, seria dispensável apontar qual a pessoa física responsável pela inobservância dos métodos preventivos exigidos pela legislação, uma vez que tal fato poderia ser averiguado genericamente, atribuindo-se, por conseguinte, a culpa à empresa, que seria sancionada penalmente.

Por consequência, tendo em vista que a Constituição Federal rompeu com uma importante barreira do Direito Penal, pois permitiu que as pessoas jurídicas, nos crimes ambientais, também pudessem ser responsabilizadas criminalmente, é, no mínimo, ilógico, exigir do operador do direito, no caso concreto, o ônus de comprovar de quais sócios partiu a ordem da execução ilícita das atividades devastadoras do meio ambiente. Por outro lado, se o membro do Ministério Público tiver, em suas mãos, elementos comprovadores de quais sócios partiu a ordem delituosa do crime atribuído à pessoa jurídica, é prudente que ofereça a denúncia contra a entidade juntamente com os membros que atuaram delituosamente sob o seu manto.

O Superior Tribunal de Justiça, até o momento, tem preferido, ao que parece, a tese de que a responsabilidade penal da pessoa jurídica ficaria condicionada à comprovação da conduta delituosa de um de seus sócios-membros, mas é preciso refletir até que ponto merece ser mantido esse posicionamento, sobretudo diante da rotineira dificuldade de se identificar, no caso concreto, a conduta delituosa da pessoa física responsável pelo dano ambiental(62).

Em suma, se a pessoa jurídica detém capacidade de ação em outros ramos jurídicos, como sói ocorrer no Direito Civil e Direito Administrativo, nada impede que o Direito Penal reformule seus conceitos, no sentido de atribuir-lhe (à entidade) ação própria para o cometimento de crime, com os respectivos consectários do dolo, da culpa e dos elementos da culpabilidade.

5. Conclusão

Não obstante as críticas por parte de alguns doutrinadores nacionais, não se pode ignorar que o ordenamento jurídico brasileiro rompeu com o dogma que imperava o Direito Penal, segundo o qual só o ser humano poderia ser sujeito ativo de crime.

A Constituição Federal de 1988 é bastante clara a respeito do tema, não havendo como contestar a sua redação no que toca à possibilidade de se responsabilizar penalmente a pessoa jurídica por crimes ambientais.

 Por outro vértice, é preciso atentar-se a uma questão bastante relevante, e de grande repercussão prática e teórica, que consiste em averiguar se a pessoa jurídica, isoladamente, pode ser processada e condenada por crime ambiental.

Há forte corrente doutrinária e jurisprudencial, que, interpretando a legislação dos crimes ambientais, sustentam que a admissibilidade da responsabilidade criminal da pessoa jurídica, sem a comprovação da conduta delituosa de qualquer de seus sócios, poderia ensejar a responsabilidade objetiva, o que é incompatível com os postulados do Direito Penal contemporâneo.

Como se observou nesta pesquisa, tal premissa não está correta. Se a Constituição Federal de 1988 houve por bem estabelecer, de forma expressa, a responsabilidade penal da pessoa jurídica, é sinal de que rompeu com alguns dogmas do Direito Penal tradicional. E, por isso, não é despropositado pensar que alguns postulados do Direito Penal possam ser flexibilizados, reformulando-se conceitos imbricados à teoria do delito.

Para isso, como bem demonstrado no transcorrer desta pesquisa, poder-se-ia atribuir à pessoa jurídica conceitos próprios de conduta, dolo (ou culpa) e culpabilidade, aferindo-se, no caso concreto, se houve algum ato humano responsável pela atividade penalmente ilícita desenvolvida no âmbito da empresa.

Por uma questão de lógica, e atendendo a ratio do texto constitucional, que permitiu que as empresas figurassem no pólo passivo de ações penais ante a dificuldade de descobrir a autoria da pessoa natural propulsora da atividade ilícita desenvolvida pela entidade, não faz sentido exigir, como condição imperativa, a comprovação de qual sócio partiu a ordem para a execução do delito. Basta, numa perspectiva mais coerente com a nova criminalidade empresarial, averiguar, na situação concreta, se houve algum ato humano responsável pela atividade ilícita desenvolvida pela empresa, sem necessariamente apontar a pessoa física que atuou sob o escudo da entidade.

Assim, se, após esgotadas as investigações de determinado crime ambiental, o Ministério Público, titular da ação penal, não tiver indícios de qual sócio especificamente partiu a ordem do delito, mas possuir elementos de que a atividade devastadora do meio ambiente ocorreu em razão de algum interesse humano (diante das circunstâncias), é viável que deflagre a ação penal contra a pessoa jurídica isoladamente, atribuindo-lhe um dolo próprio.

Por exemplo, no caso de se observar que funcionários de determinada empresa estão procedendo à extração irregular de minério (sem autorização legal), com diversos maquinários específicos, tudo indicando que a beneficiária é a própria empresa, revela-se prudente que esta seja acionada penalmente, ainda que não se consiga apurar de qual sócio proveio a ordem. Isso porque, nesse caso, resta evidenciado que pessoas naturais, ainda que não identificadas, utilizaram a pessoa jurídica para a prática do delito.

Na eventualidade de o titular da ação penal possuir elementos atestando quais os sócios ordenaram a conduta delituosa, é conveniente denunciar a pessoa jurídica juntamente com os respectivos membros que comprovadamente atuaram sob o seu véu, conforme, aliás, preconiza a regra do concurso de pessoas, estampada no art. 29 do Código Penal c/c art. 2º da Lei n. 9.608/98 (Lei dos Crimes Ambientais).

Desse modo, atribuindo-se à pessoa jurídica conceitos próprios de conduta, dolo e culpabilidade, não há motivos para se falar em vulneração ao princípio que veda a responsabilidade objetiva, devendo o Direito Penal contemporâneo ajustar-se à finalidade do texto constitucional, no sentido de solucionar os delitos empresarias que vêm se alastrando na sociedade moderna.

Notas
1. FERRAJOLI, Luigi. Direito e razão: teoria do garantismo penal. Tradução: Luiz Flávio Gomes et al. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 390.
2. SANTOS, Juarez Cirino dos. A responsabilidade penal da pessoa jurídica. Direito e sociedade, Curitiba, v. 2, n. 1, p. 127/128 , jan./jun. 2001.
3. GOMES, Luiz Flávio. Sobre a impunidade da macro-delinqüência econômica desde a perspectiva criminológica da teoria da aprendizagem. Revista brasileira de ciências criminais, São Paulo, Revista dos Tribunais, a. 3, n. 11, p.  166, jul./set. 1995.
4. HASSEMER, Wilfried. Perspectivas de uma moderna política criminal. Tradução: Cezar Roberto Bitencourt. Revista brasileira de ciências criminais, São Paulo, Revista dos Tribunais, a. 2, n. 8, p. 45, out./dez. 1994.
5. TIEDEMANN, Klaus. Responsabilidad penal de personas jurídicas y empresas en el Derecho comparado. In: GOMES, Luiz Flávio (Coord.). Responsabilidade penal da pessoa jurídica e medidas provisórias. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 27.
6. Para examinar as opiniões contrárias à responsabilidade penal da pessoa jurídica, recomenda-se a leitura do seguinte livro: VIVIANI, Rodrigo Andrade. Responsabilidade penal da pessoa jurídica: aspectos controvertidos no Direito brasileiro. Curitiba: Juruá, 2008.
7. HUNGRIA, Nelson. Comentários ao código penal. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1955, v. 1, t. 2, p. 8.
8. BRUNO, Aníbal. Direito penal: parte geral. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1959, v.1, t.2,  p. 207.
9. FRAGOSO, Heleno Cláudio. Lições de direito penal. 11. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1987, p. 264/265.
10. FARIA, Bento de. Código penal brasileiro comentado: parte geral. Rio de Janeiro: Distribuidora Récord, 1958, v. 2, p. 127.
11. GARCIA, Basileu. Instituições de direito penal. 2. ed. São Paulo: Max Limonad, 1952, v.1, t. 1, p. 214/215.
12. MAGALHÃES NORONHA, E. Direito Penal: Introdução e parte geral. 33. ed. São Paulo: Saraiva, 1998, v.1, p. 113.
13. BITENCOURT, Cezar Roberto. Reflexões sobre a responsabilidade penal da pessoa jurídica. In: GOMES, Luiz Flávio (Coord.). Responsabilidade penal da pessoa jurídica e medidas provisórias. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 70.
14. BITENCOURT, Cezar Roberto. Reflexões sobre a responsabilidade penal da pessoa jurídica, p. 70
15. DOTTI, René Ariel. A incapacidade criminal da pessoa jurídica (uma perspectiva do direito brasileiro). In: PRADO, Luiz Regis (coord.). Responsabilidade penal da pessoa jurídica: Em defesa do princípio da imputação penal subjetiva. São Paulo: Revista dos Tribunais, 200, p. 150.
16. SANTOS, Juarez Cirino dos. A responsabilidade penal da pessoa jurídica, p. 133/134.
17. REALE JÚNIOR, Miguel. A responsabilidade penal da pessoa jurídica. In: PRADO Luiz Regis (coord.). Responsabilidade penal da pessoa jurídica: Em defesa do princípio da imputação penal subjetiva. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, p. 139.
18. ZAFFARONI, Eugenio Raúl, PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro: parte geral. 4. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001 p. 409/410.
19. PRADO, Luiz Regis. Responsabilidade penal da pessoa jurídica: Fundamentos e implicações. In: ______. Responsabilidade penal da pessoa jurídica: Em defesa do princípio da imputação penal subjetiva. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, p. 135.
20. ROBALDO, José Carlos de Oliveira. A responsabilidade penal da pessoa jurídica: direito penal na contramão da história. In: GOMES, Luiz Flávio (Coord.). Responsabilidade penal da pessoa jurídica e medidas provisórias. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 96
21. PRADO, Luiz Regis. Responsabilidade penal da pessoa jurídica, p. 129/130.
22. TIEDEMANN, Klaus. Responsabilidad penal de personas jurídicas y empresas en el Derecho comparado, p. 29.
23. MUÑOZ CONDE, Francisco. Principios politicocriminales que inspiram el tratamiento de los delitos contra el orden socioeconómico en el proyecto de codigo penal español de 1994, p. 16/17. Tradução do autor. Para melhor compreensão, transcreve-se do texto original em espanhol: “Personalmente, me parece bien que el actual Derecho Penal dispogna de un arsenal de medios específicos de reacción y control jujrídico penal de las personas jurídicas. Claro que estos medios deben ser adecuados a la propria naturaleza de estos entes. No puede hablarse de penas privativas de libertad, pero sí de sanciones pecuniarias; no puede hablarse de inhabilitaciones , pero sí de suspensíon de actividades o de disolución  de actividades, o de intervernción por parte del Estado. No hay, pues, por qué alarmarse tanto, ni rasgarse las vestiduras cuando se hable de responsabilidad penal de las personas jurídicas, sino simplesmente ser conscientes de que únicamente se trata de elegir la vía adecuada para evitar los abusos que a su amparo se realicen”.   
24. ROXIN, Claus. Estudos de direito penal.Tradução: Luís Greco. Rio de Janeiro: Renovar, 2006, p. 27/28.
25. SCHECAIRA, Sérgio Salomão. Responsabilidade penal da pessoa jurídica. 2.ed. São Paulo: Editora  Método, 2003p. 104/105.
26. HASSEMER, Wilfried. Perspectivas de uma moderna política criminal. Tradução: Cezar Roberto Bitencourt Revista brasileira de ciências criminais, São Paulo, Revista dos Tribunais, a. 2, n. 8, p. 48, out./dez. 1994.
27. VIVIANI, Rodrigo Andrade. Responsabilidade penal da pessoa jurídica: aspectos controvertidos no Direito brasileiro. Curitiba: Juruá, 2008, p. 65.
28. CANOTILHO, JJ Gomes. Direito constitucional. 7. ed. Coimbra: Almedina, 2003, p. 1183
29. CANOTILHO, JJ Gomes. Direito constitucional, p. 1223/1224.
30. CANOTILHO, JJ Gomes. Direito constitucional, p. 1225.
31. Para aprofundamento do assunto, recomenda-se a leitura de ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Tradução para a versão espanhola por Ernesto Garzón Valdés. Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 1993, p. 81-102.
32. BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 564960 / SC, Brasília, DF. Decisão: 02 de junho de 2005. Relator: Ministro Gilson Dipp. Base de jurisprudência. Disponível em: . Acesso em: 29 nov. 2006.
33.  SCHECAIRA, Sérgio Salomão. Responsabilidade penal da pessoa jurídica, p. 193-196.
34. ARAUJO JUNIOR, João Marcello de. Societas delinquere potest – Revisão da legislação comparada e estado atual da doutrina. In: GOMES, Luiz Flávio (Coord.). Responsabilidade penal da pessoa jurídica e medidas provisórias. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 89-92.
35. FREITAS, Vladimir Passos de; FREITAS, Gilberto Passos de. Crimes contra a natureza: de acordo com a Lei 9.605/98. 8. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 69.
36. CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: parte geral. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2003, v. 1, p. 140.
37. DELMANTO, Ceslo et al. Código penal comentado. 5. ed. São Paulo: Renovar, 2000, p. 59.
38. NUCCI, Guilherme de Souza. Leis penais e processuais penais comentadas. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 763/764.
39. MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito ambiental brasileiro. 13. ed. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 685-692.
40. GALVÃO, Fernando. Responsabilidade penal da pessoa jurídica. 2. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2003.
41. Sobre o assunto, cf. VIVIANI, Rodrigo Andrade. Responsabilidade penal da pessoa jurídica: aspectos controvertidos no Direito brasileiro. Curitiba: Juruá, 2008, p. 93-95.
42. SÍCOLI, José Carlos Meloni. Responsabilidade penal da pessoa jurídica, sistema de penas e reparação do dano na lei dos crimes contra o meio ambiente. In: BENJAMIN, Antonio Herman (Coord.). Manual prático da Promotoria de Justiça do meio ambiente. 2. ed. São Paulo: IMESP, 1999. p. 475.
43. PRADEL, Jean. A responsabilidade penal da pessoa jurídica no direito francês, Tradução: Berenice Maria Giannela. Revista brasileira de ciências criminais, São Paulo, Revista dos Tribunais, a. 6, n. 24, p. 53-57, out./dez. 1998. 
44. A teoria da realidade, que se divide em técnica e objetiva, é aquela que sustenta que a pessoa jurídica tem vontade própria, diferentemente da teoria da ficção, de Savigny, para quem as pessoas jurídicas seriam criadas artificialmente por Lei, ou seja, seriam imaginárias, não passando de pura ficção legal. Sobre a discussão da natureza das pessoas jurídicas, cf. VIVIANI, Rodrigo Andrade. Responsabilidade penal da pessoa jurídica: aspectos controvertidos no direito brasileiro. Curitiba: Juruá, 2008, p. 26-28.
45. Essa advertência foi citada por MIR PUIG, Santiago. Fundamentos e teoria do delito. Traduzido por Cláudia Viana Garcia e José Carlos Nobre Porciúncula Neto. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 171/172.
46. TIEDEMANN, Klaus. Responsabilidad penal de personas jurídicas y empresas en el Derecho comparado, p. 39.
47. TIEDEMANN, Klaus. Responsabilidad penal de personas jurídicas y empresas en el Derecho comparado, p. 39-40.
48. TIEDEMANN, Klaus. Responsabilidad penal de personas jurídicas y empresas en el Derecho comparado, p. 40.
49. Nesse sentido, ver BEVILAQUA, Clovis. Código Civil dos Estados Unidos do Brasil commentado. 7. ed. Rio de Janeiro: Livraria Francisco Alves, 1944, v.1, p. 221; RODRIGUES, Silvio. Direito civil: parte geral. 33. ed. São Paulo: Saraiva, 2003, v.1, p. 88; PEREIRA,Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. 19. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2000, v.1, p. 195; MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil: parte geral. 35. ed. São Paulo: Saraiva, 1997, v.1, p.101; REALE, Miguel. Lições preliminares de direito. 25. ed. São Paulo: Saraiva, 2000, p. 234.
50. ROXIN, Claus. Estudos de direito penal, p. 28;
51. TIEDEMANN, Klaus. Responsabilidad penal de personas jurídicas y empresas en el Derecho comparado, p. 39 – 45.
52. A respeito do tema, cf. VIVIANI, Rodrigo Andrade. Responsabilidade penal da pessoa jurídica: aspectos controvertidos no Direito brasileiro. Curitiba: Juruá, 2008, p. 100-114.
53. Nesse sentido, ver NUCCI, Guilherme de Souza. Leis penais e processuais penais comentadas. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 767.
54. FREITAS, Vladimir Passos de; FREITAS, Gilberto Passos de. Crimes contra a natureza: de acordo com a Lei 9.605/98. 8. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 70.
55. VITU, André; MERLE, Roger. Tratado de Direito Criminal. Apud: ROCHA, Manuel Antônio Lopes. A responsabilidade penal das pessoas colectivas. In: CORREIA, Eduardo et al. Direito Penal Econômico e Europeu: textos doutrinários. Coimbra: Coimbra Editora, 1998, v.1, p. 437.
56. SCHECAIRA, Sérgio Salomão. Responsabilidade penal da pessoa jurídica. 2.ed. São Paulo: Editora  Método, 2003, p. 194.
57. NUCCI, Guilherme de Souza. Leis penais e processuais penais comentadas, p. 767.
58. ARAUJO JUNIOR, João Marcello de. Societas delinquere potest – Revisão da legislação comparada e estado atual da doutrina. In: GOMES, Luiz Flávio (Coord.). Responsabilidade penal da pessoa jurídica e medidas provisórias. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 89-92.
59. Nesse sentido, ver DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo, p. 565; Ver, também, BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de direito administrativo, p. 899.
60. BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de direito administrativo, p. 890/891.
61. Nesse norte, cf. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 382054/RJ, Brasília, DF. Decisão: 03 de agosto de 2004. Relator: Ministro Carlos Velloso. Base de jurisprudência. Disponível em: . Acesso em: 28 nov. 2007.
62. BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 564960 / SC, Brasília, DF. Decisão: 02 de junho de 2005.

Informações Sobre o Autor

Rodrigo Andrade Viviani

Assessor de Desembargador no Tribunal de Justiça de Santa Catarina; Advogado licenciado; Pós-graduado na Escola do Ministério Público do Estado de Santa Catarina; Pós-graduando no curso de especialização de Direito Constitucional promovido pela rede de ensino Luiz Flávio Gomes – LFG e Universidade do Sul de Santa Catarina – UNISUL, em parceria com o Instituto Brasiliense de Direito Público – IDP

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