Da (In)Eficiência da Execução Provisória da Pena: Uma Análise Sob o Ponto de Vista Econômico

Quer participar de um evento 100% gratuito para escritórios de advocacia no digital? Clique aqui e inscreva-se grátis no evento Advocacia Milionária!

Autor: Filipe Lima Guedes – mestrando em Direito pela Universidade Católica de Brasília, advogado, professor de Direito do Centro Universitário Estácio de Brasília

 

Resumo: o presente trabalho busca encontrar na Análise Econômica do Direito fundamentos para afirmar sobre a eficiência ou não da execução provisória da pena conforme tem sido entendida e aplicada pelo Supremo Tribunal Federal. Sob o ponto de vista econômico para que se possa afirmar que o início antecipado da execução de uma sanção penal irá auxiliar na redução da criminalidade é necessária análise dos custos e benefícios sociais da decisão judicial que a determinar bem como os custos da operação criminosa para o indivíduo.

Palavras-chave: Análise Econômica do Direito. AED. Execução provisória.

 

Abstract: the present article seeks to find in the Economic Analysis of the Law grounds to affirm about the efficiency or not of the provisional execution of the sentence as it has been understood and applied by the Federal Supreme Court. From the economic point of view, it is necessary to analyze the social costs and benefits of the judicial decision to determine the costs and the costs of the criminal operation for the crime. individual.

Keywords: Economic Analysis of Law. AED. Provisional execution

 

Sumário: Introdução. 1. Análise Econômica do Direito. 2. Análise econômica do crime. 3. Da execução provisória da pena segundo o atual posicionamento do STF. 4. Da (in)eficiência da execução provisória da pena. Conclusão.

 

INTRODUÇÃO

A Análise Econômica do Direito (AED) trata-se de uma nova abordagem científica do Direito que tem como fundamento a análise de normas legais e decisões judiciais de modo a promover a eficiência, o que implica a maximização do bem-estar social (POSNER,2007). Mostra-se, portanto, como poderoso instrumental para realizar predições a respeito do comportamento humano, bem como para investigar eventuais desvios do comportamento esperado.

Nessa linha, parte-se da premissa de que os agentes são racionais e olham para o futuro. Ao tomarem decisões, levam em consideração seus custos e benefícios privados. O objetivo dos agentes, então, é o de maximizar seus benefícios incorrendo no menor custo possível (TABAK,2015).

Leis ou políticas públicas mal elaboradas levam à insegurança jurídica, reduzindo o bem-estar. Nesse sentido, o uso da AED para avaliar proposições legislativas e políticas públicas, em geral, é essencial. (TABAK,2015).

Nesse contexto, muito se discute atualmente a respeito da possibilidade da chamada execução provisória de sanções penais no âmbito do Supremo Tribunal Federal, sendo que, de um lado, há o entendimento que a rejeita por considerá-la afrontosa à Constituição Federal e, doutro, o de que se trata, em verdade, de medida necessária à efetivação de uma política criminal interessada na redução da própria criminalidade.

Assim, a presente pesquisa propõe analisar, ainda que de forma não definitiva, se a execução provisória da pena se mostra eficiência do ponto de vista da AED, de forma a desestimular a prática criminosa ao passo que aumenta os benefícios sociais obtidos a partir da antecipação da reprimenda e eventual diminuição do senso de impunidade que paira sobre a sociedade brasileira.

Para tanto, este trabalho está dividido em quatro seções, além desta introdução e conclusão. Na primeira seção, apresenta-se, de forma breve, ideias gerais sobre o referencial teórico da Análise Econômica do Direito.

A primeira seção será dedicada para explanação da própria Análise Econômica o Direito mas aplicada ao ambiente penal, relacionando-a diretamente à pena.

Em seguida, na segunda seção, será apresentado histórico acerca do entendimento da suprema corte brasileira, o STF, sobre a chamada execução provisória da pena, demonstrando a variação de entendimento nos quais já se assentou a corte até a que hoje tem prevalecido.

Na terceira seção analisaremos se, conforme a AED, a execução provisória da pena se mostra suficiente a externar a eficiência de uma política criminal que tenda a reduzir os índices de criminalidade, desestimulando a ação criminosa e aumentando os benefícios sociais.

Por fim, são delineadas as principais conclusões e as referências utilizadas para a elaboração da pesquisa.

 

  1. A ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO

Os estudos econômicos foram por muito relegados no meio jurídico, que não via nos modelos matemáticos um meio idôneo para demonstrar e aplicar os conceitos jurídicos no meio social. Contudo, a necessidade de melhor equalizar e dimensionar a extensão de seus estudos e efeitos, passou a ciência do Direito a admitir a utilização de métodos econômicos para se aferir as consequências das normas jurídicas e decisões judiciais na sociedade (FRIEDMAN, 2000), o que se traduz na chamada Análise Econômica do Direito (AED).

Pedro Pacheco Mercado (1994, p. 22-23), assim define  a Análise Econômica do Direito (AED): “el AED se define por la aplicación de la teoría económica, más precisamente, de la microeconómica del bienestar em el análisis y explicación del sistema jurídico[…] El AED nos aporta um nuevo instrumental, nuevas técnicas argumentativa y nuevas categorias que, extraídas de los desarrollos de la ciência económica, se presentam em este movimento como los pilares para la construcción de uma ciência jurídica a la altura de los tempos. La renovación de la ciencia jurídica como el análisis coste-benefício en la elaboración de las políticas jurídicas y en la justificación de las decisiones judiciales, la apertura decidida del discurso jurídico al tema de las consecuencias económico-sociales del derecho, o la consideración de la eficiência económica como valor jurídico son, entre outros, signos evidentes de esa innovación con la que el análisis económico del derecho se presenta a sí mismo”[1]

A análise econômica do direito, então, apresenta como principal finalidade a demonstração das consequências oriundas do evento jurídico sob análise, utilizando-se, para tanto, de diversas ferramentas teóricas e empíricas das ciências econômicas com o fito de melhor compreender a realidade jurídica, o que propicia visão diversa daquela tradicionalmente observada pelos estudiosos do Direito. (POSNER, 2007).

É por meio da AED que se pode antecipar quais serão algumas consequências de decisões judiciais, bem como avaliar quão eficiente uma lei será, oferecendo ao legislador um padrão útil, conforme os efeitos que se esperam. (GICO JR., 2010; COOTER, 2010). Ou seja, ocupa-se a AED de prever resultados futuros para atos jurídicos executados no presente, utilizando-se de mecanismos da Economia para auxiliar o Direito, principalmente aqueles ligados à Estrutura Microeconômica, que apresenta as decisões tomadas por indivíduos ou pequenos grupos deles de modo a buscar equalizar o melhor modo de alocação de recursos (COOTER; ULEN, 2010, p. 36).

Os agentes econômicos, por esse sistema, estudam os benefícios e os custos das diversas alternativas, comparando-os para que somente após tomem uma decisão. Esses custos e benefícios são avaliados conforme as preferências de cada um desses indivíduos e de acordo com as informações disponíveis no momento. Temos, portanto, que essa análise de custo X benefício é consequencialista, pois releva o que provavelmente irá ocorrer após da tomada de decisão e não os motivos pelos quais a tomada de decisão fora necessária (COOTER; ULEN, 2010).

Importante salientar que, economicamente, o ser humano faz escolhas racionais na busca de maximização ou potencialização de seus próprios interesses sempre que a situação fática na qual está inserido for alterada. É o que afirma Richard Posner: “the task of economics, so defined, is to  explore the implications of assuming that man is a rational maximizer of his ends in life, his satisfaction, what we shall call his ‘self-interest’” (POSNER, 2007).

A forma do agente, pois, potencializar seus próprios interesses, seus benefícios, é confrontá-los, ou seja, compará-los com os custos que envolvem a ação. E aqui não falamos apenas em custos financeiros, mas em todos os aspectos que influenciam ou que possam impedi-lo de agir conforme sua real vontade.

Importa esclarecer que, ao avaliar seus custos e benefícios privados, os agentes devem também levar em consideração os eventuais custos e benefícios sociais para que não sejam geradas externalidades (efeitos a terceiros que não participaram do ato), que podem ser negativas para a sociedade. Ainda, os agentes podem não ser totalmente racionais e incorrer em vieses de julgamento, o que pode levar a decisões que não necessariamente maximizam seu bem-estar (CAMERER; TALLEY, 2007; KOROBKIN; ULEN, 2000; JOLLS; SUNSTEIN; THALER, 1998; TABAK, 2015).

Para a AED, nesse contexto, o Direito tem como escopo a análise das normas jurídicas a fim de lhes proporcionar eficiência de forma a maximizar o bem-estar social (MACKAAY e ROUSSEAU, 2015; TABAK, 2015). As leis / normas jurídicas poderão se apresentar como um incentivo ou desincentivo para determinadas condutas, o mesmo podendo ser afirmado em relação às decisões judiciais.

Essa eficiência a ser buscada a partir da Análise Econômica do Direito poderá ser aferida conforme disposto por Pareto, mas também por Kaldor-Hicks. Aquele, busca identificar a eficiência ao afirmar que, a partir um ato, uma pessoa passe a uma situação melhor do que a se encontravara, mas ninguém poderá ser prejudicado por essa conduta (MACKAAY; ROUSSEAU, 2015; TABAK, 2015; COOTER; ULEN, 2010).

Kaldor-Hicks, por sua vez, admite a possibilidade de ganhadores e perdedores em razão de determinado ato, mas os ganhos necessariamente têm de ser maiores que as perdas, de modo que a eficiência será aferida em conformidade entre os custos e benefícios, sendo que estes precisam ser maiores que aqueles para que seja o ato, a norma ou a decisão judicial eficiente. Ou seja, conforme esse modo de aferição de eficiência, a maioria terá ganhos, mas uma minoria arcará com custos, o que adequará a norma ao seu principal objetivo, que é maximizar o bem-estar social (TABAK, 2015).

É cediço que o ideal seria uma sociedade em que os custos fossem equivalentes aos benefícios, o que configura o chamado equilíbrio social. Contudo, na realidade, falhas de mercado existem, podendo ser de quatro espécies: a) monopólio e poder de mercado; b) bem público; c) assimetrias funcionais graves; d) externalidades dos custos marginais sociais.

Serão estas últimas, as externalidades, o objeto do estudo do presente artigo, que podem ser definidas como qualquer interferência, seja ela positiva ou negativa, que determinada conduta do indivíduo possa ser observada e interfira no bem-estar de outra pessoa (GOMES, 2010), de modo a observarmos sua influência sobre o sujeito infrator à luz da execução provisória da pena nos moldes delineador pelo Supremo Tribunal Federal (STF) quando do julgamento do HC nº 126.292/SP, considerando, ainda o critério de eficiência segundo o critério de Kaldor-Hicks, pois entendemos que é o que melhor se adequa aos objetivos do presente estudo.

No próximo título passaremos a discorrer sobre a análise econômica do crime relacionada ao entendimento sedimentado pelo STF quando do julgamento que autorizou o início da execução penal mesmo antes de transitada em julgado sentença penal condenatória.

 

  1. ANÁLISE ECONÔMICA DO CRIME

A análise econômica do crime, que tem Gary S. Becker como percussor através do ensaio intitulado “Crime and Pulishment: A Economical approach”[2], busca associar alguns dos instrumentos econômicos, mormente os ligados à microeconomia, com o comportamento dos indivíduos que praticam crimes. Segundo Becker e seu modelo, os indivíduos fazem escolhas racionais para cometerem ou não crimes segundo uma análise dos custos e benefícios de sua empreitada (BECKER, 1968). Ou seja, pode-se falar que determinada prática delitiva compensa se os benefícios forem superiores aos custos.

Na avaliação dos custos de sua operação, o criminoso irá ponderar, dentre outros fatores, o ganho de capital que auferirá com a empreitada delituosa, bem como a probabilidade de que o Poder Público o capture e, mais, aplique contra ele algum tipo de sanção imediata.

Ou seja, a probabilidade de punição e que esta seja a mais rápida e eficaz possível é fator que aumenta os custos avaliados pelo raciocínio criminoso (COOTER; ULEN, 2010), sendo o anseio da sociedade que esse custo seja superior aos benefícios obtidos pelo criminoso com a prática do delito, chegando-se a solução ótima do ponto de vista econômico, qual seja, o crime passa a não compensar do ponto de vista econômico.

No entanto, para que possamos falar em pena ideal, precisamos identificar o custo do delito para o criminoso e os custos referente à manutenção deste aprisionado, o que recai sobre a própria sociedade. Nesse sentido, afirma Becker que o preço do aprisionamento é equivalente a soma dos ganhos perdidos com os valores relacionados às restrições de consumo e liberdade (BECKER, 1990).

Os custos para o criminoso, porém, por se tratar de fator subjetivo, variando de sujeito para sujeito, acabam sendo mitigados pela ideia de que as penas devem ser maiores para aqueles que obtém maiores lucros, ou seja, os delitos que causam maiores danos e, noutro lado, maiores benefícios ao criminoso, são aqueles cujas penas devem ser maiores e mais pesadas.

Nesse sentido, podemos afirmar que os custos do criminoso guardam estrita proporção com a condenação imposta, pois os benefícios e consumos relacionam-se positivamente com a pena imposta (BECKER, 1990). No entanto, salienta-se que o preço da mantença do indivíduo no cárcere não atinge somente o criminoso, mas também a sociedade, que é responsável por arcar com todos os valores que custeiam desde a construção até a manutenção dos presídios e cadeias do Estado.

Assim, importa salientar a necessidade de se conferir eficácia à Teoria da Dissuasão, pela qual identifica-se que a previsão de uma sanção deve ser capaz de inibir a prática delituosa, ou seja, a sanção tem como escopo dissuadir uma conduta tida como não aceitável pela sociedade (VIAPIANA, 2006).

Segundo BRENNER (2009), “a dissuasão é eficaz na medida em que muda ou mantém os cursos de ação dos mais diferentes tipos de pessoas existentes na população na direção de um comportamento comprometido com a legalidade”. A dissuasão, pois, assume papel intimidatório de forma a apontar à sociedade as atitudes tidas por inaceitáveis e, caso sejam praticadas, serão punidas na forma da lei.

Feitos apontamentos supra, passaremos a, na próxima seção, apresentar a possibilidade de aplicação ou verificação da eficácia dos conceitos e métodos da Análise Econômica do Direito em relação ao entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do Habeas Corpus nº 126.292/SP, pelo qual possibilita-se o início da execução provisória de pena privativa de liberdade mesmo antes do trânsito em julgado da sentença penal condenatória.

 

  1. DA EXECUÇÃO PROVISÓRIA DA PENA SEGUNDO O STF

Conforme a redação original dos artigos 393[3] e 594[4], do Código de Processo Civil, Decreto-lei datado dos idos de 1941, a pena privativa de liberdade deveria ser cumprida após condenação do acusado, seja em qual instância se desse ou se pendente a avaliação ou mesmo a mera possibilidade recursal, e assim se dava a aplicação jurisprudencial sobre o assunto, autorizando a prisão para início antecipado, em relação ao trânsito em julgado, da pena.

Mesmo a promulgação da Constituição Federal de 1988, que em seu artigo 5º, inciso LVII, prevê o chamado princípio da presunção de inocência, não foi suficiente para afastar e retirar eficácia dos dispositivos legais até então postos no ordenamento jurídico pátrio, ainda entendendo o próprio Supremo Tribunal Federal pela constitucionalidade da execução provisória, conforme HC n. 72.077, julgado pela Segunda Turma do STF em 03/03/1995 (HC 72077, Relator(a):  Min. MARCO AURÉLIO, Relator(a) p/ Acórdão:  Min. MAURÍCIO CORRÊA, Segunda Turma, julgado em 03/03/1995, DJ 16-06-1995 PP-18216 EMENT VOL-01791-04 PP-00691)

Apenas em 20 de junho de 2011, com a edição da Lei 11.719, sob o fundamento de que a exigência da prisão para que o réu condenado pudesse exercer seu direito de interpor recurso configuraria pressuposto inconstitucional frente ao princípio da presunção de inocência, fora o artigo 594, do CPP, revogado. O mesmo ocorreu com o artigo 393 do mesmo diploma legal, mas a partir da Lei nº 12.403/11.

O entendimento do STF, então, passou a se basear no que disposto no artigo 637, do CPP, que dispõe que “O recurso extraordinário não tem efeito suspensivo, e uma vez arrazoados pelo recorrido os autos do traslado, os originais baixarão à primeira instância, para a execução da sentença.”, consoante se extrai do julgamento do HC n. 85.886, de relatoria da então Ministra Ellen Gracie (HC 85886, Relator(a):  Min. ELLEN GRACIE, Segunda Turma, julgado em 06/09/2005, DJ 28-10-2005 PP-00061 EMENT VOL-02211-02 PP-00217 LEXSTF v. 27, n. 324, 2005, p. 454-461).

No entanto, o debate jurídico persistiu mesmo na âmbito de nossa suprema corte, com julgados que consideravam inconstitucional o início do cumprimento de pena antes do trânsito em julgado de sentença penal condenatória.

A não uniformidade das decisões proferidas pelo próprio STF fundamentou a necessidade de que o pleno do tribunal se manifestasse, o que ocorreu com o julgamento do HC 84.078, em 05/02/2009, pelo qual firmou-se o entendimento pela inconstitucionalidade da execução antecipada da pena por afronta o que disposto no artigo 5º, inciso LVII, da CF/88.

A partir de 2009, pois, prevalece o entendimento de que condenado criminalmente poderá ter antecipado o início do cumprimento de reprimenda corporal após julgamento por órgão jurisdicional de segunda instância, ainda que pendente julgamento de Recurso Especial ou Recurso Extraordinário, sob o argumento de que tais recursos não analisarão provas e fatos, não discutindo a justiça da decisão.

Tal entendimento perdurou, então, até 17 de fevereiro de 2016, quando o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do HC nº 126.292, alterou seu entendimento e passou a autorizar o início do cumprimento de pena de forma provisória, conforme a seguinte ementa: “CONSTITUCIONAL. HABEAS CORPUS. PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA (CF, ART. 5º, LVII). SENTENÇA PENAL CONDENATÓRIA CONFIRMADA POR TRIBUNAL DE SEGUNDO GRAU DE JURISDIÇÃO. EXECUÇÃO PROVISÓRIA. POSSIBILIDADE. 1. A execução provisória de acórdão penal condenatório proferido em grau de apelação, ainda que sujeito a recurso especial ou extraordinário, não compromete o princípio constitucional da presunção de inocência afirmado pelo artigo 5º, inciso LVII da Constituição Federal. 2. Habeas corpus denegado. (HC 126292, Relator(a):  Min. TEORI ZAVASCKI, Tribunal Pleno, julgado em 17/02/2016, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-100 DIVULG 16-05-2016 PUBLIC 17-05-2016)”

A partir de então, embora vários sejam as discussões doutrinária e mesmo jurisprudenciais sobre o assunto, ainda prevalece tal entendimento, o que foi atualmente confirmado, inclusive, no emblemático caso que envolveu o ex-presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva (HC 152752, Relator(a):  Min. EDSON FACHIN, Tribunal Pleno, julgado em 04/04/2018, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-127 DIVULG 26-06-2018 PUBLIC 27-06-2018)

Dessa forma, conforme todo o contexto histórico e a possibilidade de novos contornos e interpretações sobre o assunto, o Supremo Tribunal Federal, guardião da Constituição Federal, posiciona-se, atualmente, de forma a permitir o início de reprimenda penal antes de transitada em julgada a condenação.

Revelado isso, passaremos a apresentar, na próxima seção, se o entendimento firmado pelo STF, sob a ótica da Análise Econômica do Direito conforme brevemente explorado anteriormente, confere eficiência suficiente ao anseio social de diminuição da criminalidade.

 

  1. DA (IN)EFICIÊNCIA DA EXECUÇÃO PROVISÓRIA DA PENA

Conforme alhures abordado, a discussão jurídica acerca da possibilidade de antecipação da execução penal se dá sob o prisma da conformidade ou não do instituto com o princípio da presunção de inocência. No entanto, o que se passa a explorar no presente artigo é se, do ponto de vista econômico, a execução provisória da pena oferece a eficiência social almejada.

Na linha de raciocínio de Kaldor-Hicks, mesmo que parcela da sociedade perca, se a quantidade de ganhadores superar a de perdedores, caracterizada a eficiência social MENEGUIN; BUGARIN, 2012). E é justamente nesse ponto que se apoia a ideia de que a execução provisória tende a ser um dos mecanismos a conferir eficácia econômica para a diminuição da criminalidade, ao passo que aumenta os custos do criminoso, que terá ciência de que poderá ser conduzido ao cárcere tão logo mantida condenação por órgão colegiado.

Deverá o indivíduo ponderar os benefícios da empreitada criminosa com os custos dessa operação. Sabendo que poderá ser preso para cumprir futura pena já após julgamento em segunda instância, deverá avaliar se o usufruto dos bens conseguidos pelo crime, se o tempo que estará em liberdade e a possibilidade de cometer novos delitos continuarão compensando.

Nesse ponto, então, passa a ter mais valia o caráter de dissuasão das normas e decisões judiciais, vez que a tendência é que o indivíduo passe a acreditar que os atos criminosos não mais compensam, pois seus benefícios não superam os custos da operação, pois será levado ao cárcere mais cedo.

Mais uma vez, então, passamos a afirmação de que, para resolver cometer um crime, o indivíduo age e decide de maneira racional, ponderando, entre outros critérios, a probabilidade de ser punido (COOTER; ULEN, 2010).

Nesse sentido, o posicionamento adotado pelo STF até o julgamento do HC 126.292/SP se mostrava mais benéfico ao criminoso, que avaliava a demora em ser efetivamente punido com o cumprimento de pena como um custo consideravelmente baixo se considerado aos benefícios da manutenção de sua liberdade por período prolongado. Ademais, os custos sociais se mostravam evidentemente maiores que os benefícios, haja vista a tendência de processos mais longos em virtude da interposição de diversos recursos que tinham, por maioria, a simples intenção de adiar o julgamento definitivo dos processos e evitar, assim, o trânsito em julgado das demandas e, por consequência, que fossem os condenados obrigados a iniciarem o cumprimento das sanções corporais porventura determinadas.

A mudança de entendimento da suprema corte, porém, a partir do que julgado no HC 126.292/SP, tende a influenciar a tomada de decisões do criminoso, que passa a perceber mais custosa a operação criminosa ao passo que eventual condenação por órgão colegiado poderá lhe levar a iniciar o cumprimento de sua pena, independentemente do trânsito em julgado da decisão. Ou seja, com os custos para o criminoso maior, a probabilidade de delinquir diminuirá, pois o crime passará a não compensar como antes.

Do pondo de vista social ocorre o inverso, pois o senso comum de justiça e de cumprimento das decisões judiciais aumenta na mesma proporção dos benefícios que tem com o decréscimo da criminalidade que tende a ocorrer.

 

CONCLUSÃO

Com o presente artigo foi exposta uma singela análise do atual entendimento do Supremo Tribunal Federal sobre o instituto da execução provisória da pena sob a ótica da Análise Econômica do Direito.

Verificou-se que a AED é disciplina que deve ser instrumento para a consecução de uma política criminal que desestimule o crescimento da criminalidade, vez que poderá demonstrar, por exemplo, que decisões judicias que determinem o cumprimento de sanções penais de forma mais célere contribuem para o desestímulo do crime, ao passo que diminui os benefícios privados da empreitada criminosa, aumenta seus custos e, por consequência, fará com o que o indivíduo tenda à conclusão de que o crime não mais compensa.

No entanto, necessário se faz que os órgãos judiciais, em especial o Supremo Tribunal Federal, dediquem-se ao tema de forma a avaliar a viabilidade de sustentação da tese de aplicabilidade do instituto da execução provisória da pena de forma definitiva, bem como o Congresso Nacional dedique-se a realizar as alterações legislativas necessárias para que este instituto se torne normatizado e passe a ter vigência no ordenamento jurídico pátrio, posto que eficiente do ponto vista da AED, embora discutível juridicamente, o que poderá ser tema de outra pesquisa.

 

REFERÊNCIAS

BECKER, G. S. Crime and punishment: An economic approach. Journal of Political Economics n. 76, p. 169-217, 1968.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de outubro de 1988. Brasília, DF.            Disponível     em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 06 maio 2016.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. HC n. 72077, Relator(a):  Min. MARCO AURÉLIO, Relator(a) p/ Acórdão:  Min. MAURÍCIO CORRÊA, Segunda Turma, julgado em 03/03/1995, DJ 16-06-1995 PP-18216 EMENT VOL-01791-04 PP-00691. Disponível em: <http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=73533>. Acesso em: 15 mai. 2018.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. HC 85886, Relator(a):  Min. ELLEN GRACIE, Segunda Turma, julgado em 06/09/2005, DJ 28-10-2005 PP-00061 EMENT VOL-02211-02 PP-00217 LEXSTF v. 27, n. 324, 2005, p. 454-461.          Disponível       em:< http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=354366>. Acesso em: 15 mai. 2018.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. HC 91232, Relator(a):  Min. EROS GRAU, Segunda Turma, julgado em 06/11/2007, DJe-157 DIVULG 06-12-2007 PUBLIC 07-12-2007 DJ 07-12-2007 PP-00098 EMENT VOL-02302-02 PP-00284. Disponível em: < http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=499428>. Acesso em: 15 maio 2018.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. HC 126292 / SP, Relator: Min. TEORI ZAVASCKI, Julgamento: 17/02/2016, Órgão Julgador: Tribunal Pleno. Dje-100 DIVULG 16-05- 2016,       PUBLIC         17-05-2016.  Disponível     em: <http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=10964246>. Acesso em: 15 maio 2018.

COOTER, R. D.; ULEN, T. S. Direito e economia. 5. ed. Porto Alegre: Bookman, 2010.

DA SILVA, André Luiz Olivie. Os Direitos Humanos e o Estado “natural” de Fundamentação dos Direitos. Revista Seqüência, Florianópolis, n. 71, p. 133-154, dez. 2015.

CRISTÓVAM, José Sérgio da Silva. A Teoria da Ponderação de Princípios na Encruzilhada do Decisionismo Judicial: limita-me ou te devoro. Revista Seqüência, Florianópolis, n. 75, p. 219-242, abr. 2017.

DO CARMO, Sidney Gonçalves. Com PM em greve, ES tem aumento de violência e pede     ajuda            do       Exército.        Disponível     em: http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2017/02/1856179-com-pm-em-greve-es- tem-aumento-de-violencia-e-pede-ajuda-do-exercito.shtml. Acesso em: 18 abr. 2017.

FRIEDMAN, David D. What economics has to do with law and why it matters. Princeton University Press, 2000.

GICO JR., Ivo T. Metodologia e epistemologia da análise econômica do direito. Revista Economic Analysis of Law Review, v 1, n. 1, p. 7-33, jan./jun., 2010.

GOMES, Adalmir de Oliveira; GUIMARAES, Tomás de Aquino. Desempenho no Judiciário: conceituação, estado da arte e agenda de pesquisa. Revista de Administração Pública, Rio de Janeiro, v. 47, n. 2, abr. 2013.

LUCHETE, Felipe. Juiz manda prender ex-senador Luiz Estêvão, condenado em segunda instância. Disponível em: http://www.conjur.com.br/2016-mar-07/juiz- manda-prender-ex-senador-condenado-segunda-instancia. Acesso em: 22 de abril de 2017.

MACKAAY, Ejan; ROUSSEAU, Stéphane. Análise Econômica do Direito. Tradução Rachel Sztajn. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2015.

MENEGUIN, Fernando B.; BUGARIN, Maurício S.; BUGARIN, Tomás T. S. Execução provisória da sentença: uma análise econômica do processo penal. Revista Economic Analysis of Law Review, v. 2, n.2, p. 204-229, jul./dez. 2011.

MURAMATSO, Roberta; FONSECA, Patrícia. Economia e psicologia na explicação da escolha intertemporal. Revista de Economia Mackenzie, v. 6, n. 1, p. 87-112, 2008.

PORTO, Antônio José Maristrello; GOMES, Lucas Thevenard. Análise econômica da função social dos contratos: Críticas e aprofundamentos. Revista Economic Analysis of Law Review, v 1, n.2, p. 196-212, jul./dez. 2010.

POSNER, Richard A. El análisis económico del derecho. Trad. De Eduardo L. Soares, 2. ed. México: Fondo de Cultura Económica, 2007.

RUBINSTEIN, Ariel. “Economics and Psychology”? The Case of Hyberbolic Discounting. International Economic Review, v. 44, p. 1207- 1216, nov. 2003.

SALAMA, Bruno Meyerhof. O que é “Direito e Economia”?. In: TIMN, Luciano Benetti. Direito e Economia. 2. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2008.

SHIKIDA, Pery Francisco Assis. Considerações sobre a Economia do Crime no Brasil: um sumário de 10 anos de pesquisa. Revista Economic Analysis of Law Review, v. 1, n. 2, p. 318-336, jul./dez. 2010.

TABAK, Benjamin Miranda. Análise Econômica do Direito – proposições legislativas e políticas públicas. Revista de Informação Legislativa, Brasília, ano 52, n. 205. 2015.

 

[1] Tradução livre: “A AED se define pela aplicação da teoria econômica, mais precisamente, da teoria microeconômica de bem-estar na análise e explicação do sistema jurídico […]. A AED nos apresenta um novo instrumental, novas técnicas argumentativas e novas categorias que, extraídas dos desenvolvimentos da ciência econômica, apresentam-se neste movimento como pilares para construção de uma ciência jurídica a altura dos tempos. A renovação da Ciência Jurídica através da adoção da perspectiva interdisciplinar, peculiar pelo peso que tem à Ciência Econômica, a utilização de técnicas como a análise do custo e benefício na elaboração das políticas jurídicas, na justificação das decisões judiciais, a abertura decidida do discurso jurídico ao tema das consequências econômico-sociais do Direito, ou a consideração da eficiência econômica como valor jurídico, são, entre outros, sinais evidentes dessa inovação em que a Análise Econômica do Direito apresenta a si mesma.”

[2] Tradução livre: Crime e Punição: uma abordagem econômica.

[3] Art. 393.  São efeitos da sentença condenatória recorrível.  I – ser o réu preso ou conservado na prisão, assim nas infrações inafiançáveis, como nas afiançáveis enquanto não prestar fiança;  II – ser o nome do réu lançado no rol dos culpados.

[4] Art. 594. O réu não poderá apelar sem recolher-se á prisão, ou prestar fiança, salvo se condenado por crime de que se livre solto.

Quer participar de um evento 100% gratuito para escritórios de advocacia no digital? Clique aqui e inscreva-se grátis no evento Advocacia Milionária!

O Direito Processual Civil Contemporâneo: Uma Análise da Ação…

Quer participar de um evento 100% gratuito para escritórios de advocacia no digital? Clique aqui e inscreva-se grátis no evento Advocacia Milionária! Felipe Antônio...
Equipe Âmbito
53 min read

Análise Comparativa das Leis de Proteção de Dados Pessoais…

Quer participar de um evento 100% gratuito para escritórios de advocacia no digital? Clique aqui e inscreva-se grátis no evento Advocacia Milionária! Rodrygo Welhmer...
Equipe Âmbito
13 min read

O Financiamento de Litígios por Terceiros (Third Party Funding):…

Quer participar de um evento 100% gratuito para escritórios de advocacia no digital? Clique aqui e inscreva-se grátis no evento Advocacia Milionária! Autor: Fernando...
Equipe Âmbito
18 min read

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *